25 de fevereiro, 19:45 - Iris

—Então, hmm... O que... exatamente... aconteceu, para você se embebedar e dormir demais ontem? Se... Se não se importa de me contar essas más notícias agora?— Eu soprei um balão de chiclete, cuja cor imitava as minhas madeixas salmão, felizmente secas hoje. —Desabafar faz bem, sabe... — Assobiei discretamente na direção de Rena.

Rena recusou-se a falar sobre isso comigo desde ontem, e eu fiquei à espera de um momento de sossego para a provocar suavemente. Esse momento foi agora, quinze minutos antes da hora de encerramento, quando os clientes foram-se embora.

Eu já tinha feito a minha parte de arrumação, cantarolando alegremente através da minha seção favorita — o nicho para os pequerruchos.

O Piquenique de Um Milhão de Anos vendeu os quadrinhos mais coloridos da prateleira. Estávamos a espalhar o amor das crianças por quadrinhos em todo o lado, alimentando os seus maravilhosos sonhos super-poderosos.

Não estávamos apenas a vender quadrinhos. Estávamos a moldar futuras personalidades. Estes amados super-heróis inspirariam as crianças a tornarem-se as melhores versões de si próprios.

Rena ainda não tinha respondido à minha pergunta.

Voltei a insistir. —Sobre as más notícias...?

Apenas um humpf! desafiante e um vigoroso abanão de cabeça responderam, vindo do mostruário. O súbito movimento da volumosa coroa da cabeça de Rena destruiu o suporte das figuras de ação de Star Wars.

Consegui apanhar e embalar com segurança um Darth Vader em miniatura.

—Não sou desajeitada—, Rena finalmente resmungou, sem se virar. —O chão apenas me odeia, as mesas e cadeiras fazem bullying comigo, e as paredes atrapalham o meu caminho.

Numa escala de um a Hermione, o arbusto do cabelo da Rena ultrapassou os limites.

Talvez eu devesse ter usado a escala de um a Hagrid.

A cabeça de Rena bateu à volta enquanto ela atirava o rodo para o lado, o seu "Piquenique de um Milhão de Anos", branco e verde, salpicado com bolhas de sabão.

O seu rosto estava escondido atrás das franjas escuras.

Santo guacamole.

Será que ela... Chorava?

—Você está bem?— Estendi a palma da minha mão para a bochecha almiscarada dela.

Desta vez, Rena não recuou.

—Tenho plena consciência de que, há muitos anos atrás, concordamos que só te consolaria quando estivesse triste por causa dos encontros sexuais medíocres, mas... Tenho a sensação de que não é um desses casos, desta vez?

—Não, Iris—. Ela engoliu. —Não, não é.

—Rá!— Eu dei um soco triunfante no ar. —Eu sabia! Desculpa—. Acrescentei com um ar de ovelha depois de Rena me ter olhado de relance. —O que aconteceu?—

—Oh, Iris, eu simplesmente não sei o que fazer!— Rena caiu nos meus braços.

Apanhei o seu pequeno corpo com facilidade, tapando-lhe a nuca e permitindo uma inundação de proporções bíblicas para encharcar as minhas lapelas de casaco.

— Abriu uma Blackbury Comics logo ao virar a esquina.

—Espera, o quê? Quando?— A minha boca recusou-se a abandonar a forma "O" que tinha ganhado.

—Na semana passada. Não te disse imediatamente, porque não queria que se preocupasse. Esperava que isso não nos afetasse, Iris. Nós... não estávamos tão bem antes de eles chegarem. Mas agora? É que... Acho que não vamos sobreviver—. Rena mordeu a palma da mão e abanou a cabeça.

Blackbury Comics. Eles eram grandes. A maior franquia de Boston, Massachusetts. Eles tinham tudo: artigos, cartazes, presentes engraçados, memorabilia de filmes cult.

Muito maiores, muito mais brilhantes... muito... mais bem sucedidos no meio corporativo... Mais tudo.

Esta loja significava tudo para mim. Era o meu mundo inteiro.

Comecei a imaginar o que isto poderia significar, especialmente se tivesse de voltar para casa porque não conseguia pagar as minhas contas.

—Iris?— Rena assustou-me no meu já assustador devaneio.

—Desculpe! Acho que acabei de experimentar aquilo que chamamos de Efeito Dominó—. Eu falei, quase sem saber que tinha estado a puxar o capacete do pequeno Vader para dentro e para fora da sua cabeça. —Sei que temos de deixar de estar tristes e de ser espectaculares, mas eu... Não é um bom momento para mim. A minha vida não era sol, unicórnios e brilhantes ontem—. Cantarolava as linhas em frustração e comecei a passear pela loja.

A página de capa colorida das Aventuras do Capitão Smiley chamou-me a atenção.

Smiley! Isto fez-me lembrar o meu homem do vagão.

Percebendo que estava a sorrir, virei-me para enfrentar Rena. —Não se desespere. Vamos superar isso juntas. As coisas podem parecer um guarda-chuva preto agora. Mas pode haver sorrisos escondidos nas suas dobras.

Rena olhou para mim como se eu tivesse perdido a cabeça.

Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top