CAPÍTULO 29
O Envelope Vermelho
Os efeitos da noite passada, estavam cobrando seu preço a Carlo que sentia a enxaqueca e náusea a todo instante. Levou a mão até os olhos e as têmporas, esfregando os indicadores, na tentativa de amenizar a cefaleia. Um gosto amargo na boca, fez com que corresse até o banheiro e expeliu tudo que havia ainda em seu estomago.
Se olhou no espelho e não gostou do que viu, decidindo entrar no box e tomar um banho demorado. A água fria batia em sua nuca, pra desperta-lo. Ficou assim, até que se sentisse revigorado.
Depois de se secar e comer algo leve, saiu para o quintal e nem acreditou no que fizera.
"Carlo, seu louco... Espero que saiba realmente o que fizera! " – Pensou
Apesar de tudo, não se sentia arrependido e sim, como se estivesse expurgado um tumor da consciência. Agora, iria terminar a última carta e tentar de tudo pra salvar o jovem Oliver. Rezava para que este ainda estivesse respirando, mas vindo daquele psicopata, tudo era possível.
Um tempo depois, já recuperado, deitou-se no sofá, com os pés esticados. Lá fora a chuva caia mansamente, dando ao resto do dia, um ar quase lúdico.
Carlo, abriu o envelope e além da folha, caiu uma ficha com um clipe, onde uma foto de uma família estava preso. Ele olhou, intrigado e ao olhar para ela, algo dentro dele deu um alarme.
A família da foto não era totalmente desconhecida...
Deixou a foto de lado, espertigando todo o corpo e pegando a folha dentro do envelope e iniciando a leitura, rezando que não fosse o que estava pensando:
FOLHA ÚNICA, ENVELOPE VERMELHO:
"Tudo começou há muito tempo atrás.
Senhor e senhora Chuang Yun e seus dois filhos estavam felizes, pois era Ano Novo chinês e eles iam passear com a família. Ele, um apicultor reconhecido na pequena comunidade e a mãe, uma mulher bondosa, dona de casa, que na juventude era uma eximia jogadora de xadrez. Largou tudo para cuidar dos dois filhos, um casal de gêmeos ao qual se esmerava em tratar com muito amor e sempre ensinando tudo que podia.
O pai não era diferente. Passou aos filhos, o amor e a arte da apicultura, além do hábito da leitura em idiomas diferentes. O filho, apaixonado e aplicado, aprendida com muita facilidade e logo se mostrou um menino tão talentoso e inteligente quanto a mãe.
Passearam pelo zoológico, foram ao parque de diversão e em seguida, foram jantar. Tudo tinha ocorrido bem, naquele dia e, após as festividades, o senhor Chuang mostrou aos filhos, seus envelopes vermelhos, que era uma tradição chinesa, presentar a quem se ama, um envelope vermelho no Ano Novo.
- Assim que chegarmos em casa, vocês poderão abrir os seus envelopes, está bem?
Os filhos o reverenciaram e, ansiosos se entreolharam. Era nítida a felicidade de ambos e a cumplicidade entre eles. O irmão pegou na mão da irmã, feliz com o dia maravilhoso que havia passado e logo se sentiu sonolento, deitando no banco, colocado a cabeça no colo da irmã.
Chovia muito naquela noite e o senhor Chuang dirigia com cuidado na estrada. Sempre temia e protegia a família acima de tudo.
Mas nem todo mundo pensava assim.
Um carro a toda velocidade, na contramão, invadiu a pista onde o carro da família vinha e bateu de frente com muita violência. Senhor Chuang tentou desviar, mas não deu tempo. A batida fora tão forte, que arremessou o casal através do vidro do carro, jogando-os a muitos metros de distância. Morte fulminante, onde o corpo da mulher foi dividido ao meio, com o impacto e o senhor Chuang teve todos os ossos do corpo quebrado e seus órgãos esmagados.
A menina da mesma forma, fora jogada para fora do carro, quebrando o pescoço, tendo morte súbita. O menino, apesar dos vários ferimentos, costelas quebradas e uma das pernas quebradas, sobrevivera.
Já o outro carro, onde um casal de adolescentes totalmente bêbados, tiveram escoriações e cortes superficiais.
O rapaz olhou o estrago que fizera e ligou para o pai, que era policial.
ELE SE PREOCUPOU EM SALVAR A PRÓPRIA PELE, AO INVÉS DE VER SE HAVIA ALGUÉM AINDA VIVO!!
O menino estava desacordado e quando despertou, estava no hospital, lutando pela própria vida, sem entender nada. Não sabia o que tinha acontecido, se estava sonhando, se era real. Ele estava dormindo na hora do acidente e não sabia que perdera seus pais e sua irmã. Só lembrava do envelope vermelho na mão de seu pai e a felicidade no olhar da irmã, fitando-o.
Ele levou muito tempo, se recuperando e só soube que sofreram um acidente de carro, que seu pai se chocara contra outro carro, na pista contrária. Ele nada entendia do que tinha acontecido na verdade. Não sabia nada do que tinha ocorrido naquela noite.
- Onde estão meus pais? E minha irmãzinha? Por que estou aqui?
Era o que ele sempre perguntava para as enfermeiras que o cuidavam. Ele via piedade no olhar delas, mas nenhuma resposta.
Muito tempo ele levou para se recuperar, até que uma senhora, assistente social surgiu para conversar com ele, acompanhada de um psicólogo.
Ficaram por um bom tempo conversando com o menino, explicando da melhor maneira possível o que tinha acontecido. Usavam de palavras suaves e gentis para dizer que o casal estraçalhou toda a sua família.
- Meu papai e minha mamãe morreram? Minha irmãzinha? – Chorava
Ele não conseguia entender. Seu pai jamais dirigiu rápido ou arriscaria a vida da família, numa data tão especial. Não. Eles estavam mentindo.
Logo que se recuperou, por não ter nenhum parente, foi levado pela assistente até uma casa para crianças órfãs. Ele estava aterrorizado, perdido e mortificado.
Ele era apenas um garoto traumatizado e sem respostas.
Aos poucos, tentava se adaptar a nova realidade. Uma realidade totalmente longe da que levava antes e a saudade dos pais e de sua irmã vinha todas as noites, fazendo-o acordar aos berros. Ninguém ali estava preparado para cuidar de um menino chinês, traumatizado e chorão.
Apanhava dos colegas, para que calasse a boca. Queriam dormir
Apanhava dos professores, por ser muito mais inteligente que eles. Queriam subtrair sua capacidade
Foi se anestesiando e guardando todo o rancor por todos ao seu redor. Ninguém se importava com ele, ninguém queria saber dele.
Mas, um dia, um casal surgiu e resolveu aceita-lo como pais adotivos intermitentes, ou seja, cuidariam dele até que surgisse algum parente ou algum casal interessado em adota-lo de maneira permanente. Eram famílias ajudadas pelo governo para suprir as necessidades da criança ou adolescente até que pudessem ter um destino definitivo.
E assim foi. Iniciou o calvário na vida dele.
O casal era desprovido de qualquer tipo de empatia e bondade. Apenas estavam interessados em receber um salário do governo para cuidar de crianças que ninguém queria. Ela, uma mulher totalmente submissa, entregue as drogas e ele, um pedófilo bêbado que não satisfeito em espancar os filhos adotivos, tinha que completar o terror com estupros e torturas.
Ele, para descarregar toda a raiva acumulada e o ódio das dores diárias que estava sofrendo, se vingava em animais da vizinhança e roedores da floresta.
Um dia, estavam todos almoçando latas de salsichas geladas, quando ele se atreveu e resolveu perguntar o que tinha acontecido com seus pais e sua irmã. A resposta foi um soco, que quebrou seus óculos
- Nunca mais fale, sem autorização. Entendeu bem?
Ele sentiu o gosto do sangue na boca e jurou que todos iam pagar caro por tudo que estava passando.
Naquela noite, esperou que todos dormissem, jogou querosene usado para o aquecedor, pelo chão e jogou o que sobrara de um cigarro, que ainda ardia no cinzeiro e fugiu para bem logo. Já quando estava numa distância considerada, olhou pra trás e viu a explosão.
Um sorriso macabro se instalou em seu rosto, outrora cheio de vivacidade, hoje carregado do mais puro ódio.
Por muito tempo ele morou na rua, até ser resgato por uma mulher bondosa, mas muito idosa. Ensinou-o latim, e como se portar a mesa e muitos outros truques, matriculou-o numa escola comunitária e em pouco tempo se destacou da turma, ganhando uma bolsa integral para estudos avançados em biologia no ensino médio.
Neste período, resolveu pesquisar sobre o que realmente havia acontecido com seus os pais e sua irmã e que fizeram de seus bens. Afinal de contas, eles tinham uma casa própria e um cultivo grande de mel e própolis
Foi quando toda a verdade emergiu das profundezas.
Um casal de namorados, que estavam retornando da comemoração de seu noivado, atingiu um carro na pista contrária. O rapaz alegou que o motorista do outro carro estava adormecido e invadiu a pista e que chamou a ambulância imediatamente. O pai do jovem, delegado na época confirmou tudo e que o homem americano, de origem oriental estava desorientado. A jovem, filha da famosa líder comunitária e esposa de um advogado, ajeitaram tudo e arquivaram o caso.
Sem sobreviventes, o governo tomou posso dos bens, como pagamento pelo estrago material
SEM SOBREVIVENTES...
O tempo passou e aos poucos descobriu a verdade selada. Mas, esperou a hora certa de resolver tudo.
ELE IRIA SE VINGAR.
Entrou para a faculdade, no mesmo ano que a boa senhora falecera. A única que o acolheu, morreu de pneumonia, sem ajuda alguma e ele jurou que nunca mais passaria por tudo aquilo tudo. Teve as melhores notas e ganhou um mestrado para estagiar em quaisquer universidades de renome a sua escolhe. Mas ele pediu para pensar em qual delas iria aceitar.
Tinha que saber onde estava o jovem assassino. Descobriu que era um escritor, casado com a bela jovem que o acompanhava naquela noite e pai de duas meninas
Eram um casal felizes, com duas filhas lindas...
Pesquisou tudo sobre ele, leu todos os seus livros. Foi até a sua casa e estudou dia após dia, todos os seus hábitos. Onde as meninas estudavam, como eram suas mochilas e uniformes. Estudou seus passos, onde jantavam e o nome do animal de estimação. Por meses, revirou seu lixo, anotando tudo que comiam e as correspondências.
Foi até a editora, onde seu empresário era sócio e analisou detalhadamente tudo que pudesse ajuda-lo no futuro.
Seus pais e seus sogros. Nada passou despercebido e tinha até a conta conjunta da família. Grampeou os telefones da casa da praia, no inverno, enquanto ela estava vazia e o mesmo fez na casa da cidade, quando viajou com a família.
Através dos seus livros, fezum mapa completo sobre como agia e como pensava. Recortou todas as entrevistase foi em todos os autógrafos. Recolheu dados confidenciais, hackeando seus e-mails.
Depois de ter em seu poder, material suficiente, arrumou a mala e ligou para a escola, escolhendo a universidade que desejava fazer mestrado e estágio como auxiliar bioquímico.
Para ele, só precisava de sorte e tempo. Tempo ele tinha de sobra e sorte, só dependia se o escritor iria abrir o primeiro envelope.
ESTA FOI A ÚLTIMA CARTA.
AGORA, FAÇA SEU ÚLTIMO CAPÍTULO"
Nada poderia descrever o terror no olhar de Carlo, naquele instante...
(1858 palavras)
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