9. Destinos entrelaçados
❀ Capítulo 9 | O Som das Flores ❀
𝑳𝒊𝒂𝒎
Liam teve uma ótima ideia quando a chuva começou a cair naquela tarde de sexta-feira. Aquilo não estava na sua lista — pelo menos, não naquele contexto — mas ele achou que aquela situação seria perfeita para cumprir um dos itens que havia colocado.
Ninguém esperava aquela tempestade, pois o céu ficara escuro de repente e fazia muito calor. Não havia muito o que fazer com aquela chuva toda, por isso, permaneceram fechados no chalé enquanto ouviam a água caindo e as árvores agitadas do lado de fora. Foi então que Liam teve uma ideia genial: fazer uma festa do pijama canina. Na verdade, o que estava realmente na sua lista era apenas assistir um filme que havia marcado sua infância — e aquela circunstância era perfeita para isso.
Para isso, ele ajudou Zoey a carregar seu colchão para o andar inferior, juntando-o com o outro. Eles fecharam as cortinas, arrastaram um móvel com a televisão para o meio do quarto e fizeram pipoca (que ele teve a brilhante ideia de comprar em um mercadinho próximo no dia anterior). Meg e Mel adoraram os colchões, Zoey estava animada para o filme (que também era um dos preferidos da infância dela) e a internet estava perfeitamente estável. Tudo parecia conspirar a favor dos planos de Liam, e ele ficou genuinamente feliz por isso.
Eles assistiram A Dama & O Vagabundo em silêncio. Vez ou outra o rapaz queria fazer um comentário, mas Zoey estava tão quieta e tão atenta ao filme que não quis incomodar. Quando os créditos começaram a subir na tela, Liam ainda se sentia um pouco nostálgico. Ele havia perdido as contas quantas vezes já assistira àquele filme em sua infância; e ao terminá-lo mais uma vez era como se o Liam de quase dezoito anos aos poucos voltava para o seu corpo.
— Acho que continua sendo um dos meus filmes favoritos — ele observou Mel e Meg dormindo ao pé do colchão. Ele jurava que elas haviam prestado atenção à televisão nos primeiros minutos do filme.
— É, eu assistia muito quando eu era criança — Zoey disse ainda olhando para os créditos. — O que reforçava a minha ideia de que cachorros são melhores do que gente.
Liam riu.
— Eu não consigo discordar — ele falou, tombando a cabeça em sua direção. Zoey se deitou, ainda olhando para a televisão; como se a posição anterior já não fosse mais tão confortável. Ela não disse nada, nem mesmo uma expressão bem-humorada.
O sorriso de Liam murchou. Ele quis perguntar se estava com raiva dele, se ele havia feito alguma coisa de errado — ou se ela estava chateada por perder um dia de praia. Ele duvidava que fosse pelo último fato, pois Zoey não se chateava por coisas fúteis como essa. Ele então chegou à conclusão — graças à sua sempre presente insegurança — de que a culpa era dele, mesmo sem saber o que ele havia feito de tão ruim.
— Aconteceu alguma coisa? — ele perguntou, temendo por um momento a resposta.
Zoey piscou os olhos, desviando o olhar para ele. Ela deu um sorrisinho sem graça e balançou a cabeça em sinal negativo.
— Não... Por que está perguntando isso? — ela perguntou. Liam percebeu que fora uma resposta automática.
O rapaz deu de ombros e também se deitou, escorregando as costas pelo colchão.
— Porque... Bem, você não parece muito confortável agora — ele soltou.
— Desculpe — ela disse baixinho, mas Liam estava tão próximo dela que foi impossível não ouvir.
— Por que está pedindo desculpas? — ele perguntou de imediato.
— Eu... — ele viu Zoey engolir em seco. Por um instante, Liam achou que estava ao lado daquela antiga Zoey que não conseguia falar. Ele não entendeu porque ela parecia tão ansiosa.
Liam ainda estava tentando adivinhar o que ele havia feito de errado quando sentiu os dedos de Zoey sobre sua mão esquerda. O rapaz se assustou, sem saber como reagir, pois não esperava por aquele gesto. O que isso significa?, ele se perguntou debilmente, congelado. Zoey afastou sua mão rapidamente, claramente arrependida, mas Liam não conseguiu fazer de conta que aquilo não havia acontecido. Sem pensar muito, ele trouxe a mão da moça de volta para a sua, entrelaçando seus dedos nos dela. Zoey não se mexeu, tão surpresa quanto ele.
Ambos estavam confusos demais para falar. Por isso, apenas ficaram lá, olhando para o teto do chalé e escutando o som da chuva, do vento, das folhas e das flores deslumbradas pelo frescor depois de tantos dias quentes. Liam sentiu de repente que todos os seus sentidos estavam mais apurados. Seus ouvidos escutavam toda a festa da natureza do lado de fora, a música baixa dos créditos do filme, a respiração de Zoey. Seus olhos reparavam cada detalhe do teto, as cores das paredes e da coberta sobre seus joelhos. E o mais impressionante de todos era seu tato. O toque de Zoey pareceu estar presente em todo o corpo de Liam, deixando-o ao mesmo tempo relaxado e alerta. Sua mente não conseguia pensar em mais nada a não no presente — coisa que parecia impossível para ele, sobretudo quando meditava. Ele não conseguia explicar o que estava sentindo, mas nunca havia sentido aquilo antes. Não de forma tão espontânea, e não com uma garota.
Ele ficou tão surpreso quanto Zoey, que ainda estava paralisada. Apesar da dúvida inicial, Liam não se perguntou mais o que aquilo poderia significar — ou porquê Zoey teve aquela atitude.
Mais tarde, à noite, Liam teve mais tempo para refletir sobre aquilo. Era como se a mão de Zoey ainda estivesse na sua, aquecendo sua palma e levando-o ao momento presente. Ele pensou nos motivos de Zoey estar e ter estado em sua vida. Lembrou-se do momento em que a vira pela primeira vez na escola, desinteressado de tudo e de todos. Também se lembrou do momento em que um dos professores perguntou seu nome, e Zoey não respondera — e foi aí que ele percebeu que havia algo de diferente nela. Eram muitas memórias envolvendo-a, e aquilo o fazia pensar se o destino deles estava de alguma forma entrelaçado; tal como suas mãos naquela tarde.
Liam trocou a música e consertou os fones em seus ouvidos, aumentando o volume. Quando seus pensamentos não o deixavam adormecer, colocava sua playlist favorita até o sono superar sua mente barulhenta. Mas, dessa vez, ele não queria espantar os pensamentos, e sim seu desejo de subir as escadas para perguntar a Zoey aquilo que ele não teve coragem de perguntar antes — e se eles poderiam ficar daquele jeito de novo, pois Liam havia gostado.
O rapaz saiu da cama, mas não foi até Zoey. Não queria incomodá-la naquela hora. Por isso, foi até a varanda e observou todo o jardim ao redor úmido. A grama estava mais verde e as flores pareciam mais coloridas. Os girassóis pareciam brilhar de um amarelo cintilante — ele nunca havia visto um amarelo assim — e era como se aquelas flores, a grama, as árvores e toda a natureza ao redor cantasse a canção que reproduzia em seus fones de ouvido. Ele olhou para as próprias mãos, para as cicatrizes em seus pulsos e nos antebraços; as quais ele não tinha mais vergonha de expor (apesar de estarem bem menos aparentes). Sentiu o vigor de todo o seu corpo e respirou o aroma que a terra havia soltado após a tempestade.
Liam não sabia explicar o que estava sentindo, mas sentiu orgulho de si mesmo por não ter desistido.
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