Capítulo 38: Colarinho Santo

*ALERTA DE GATILHOS: SITUAÇÃO ABUSIVA DE TRABALHO.

*RECOMENDAÇÃO DE MÚSICA DA TRILHA SONORA PARA O CAPÍTULO: Habit - Gabrielle Shonk

Uma fila gigantesca na rua guiava para o clube de jazz logo que Gaya desceu do táxi e pagou ao motorista que entrou numa alameda após o local.

Seu vestido de costas nuas e brilhoso de chiffon vermelho desenhava as curvas de seu corpo.

Ela apenas carregava o essencial consigo numa bolsa de ombro da mesma cor, um scarpin dourado e cabelos presos no topo da cabeça, o que permitia seus fios caírem no rosto.

Gaya andou elegante ao lado das pessoas que aguardavam entrar e chamou a atenção de muitos que apenas vestiam roupas mais simples.

Ao se aproximar da entrada vigiada por um segurança mais baixo que a bruxa, ele a interrompeu em gestos bem antes de subir um dos degraus.

— Documento, por favor — apanhou um pouco nervosa sua identidade da bolsa e entregou ao rapaz.

Ele analisou a foto, olhou diretamente para a jovem, comparou e suspeitou. Mas se tratava da mesma pessoa.

Nada havia mudado.

— Onde está seu ticket? — devolveu o documento.

Cruzou os braços, consentiu a passagem de um casal e permitiu que a música abafada pela acústica escapasse para a rua.

— Fui convocada pelo clube para substituir a antiga cantora. Pode conferir.

Apesar de ansiosa e revoltada, a Demdike mantinha sua classe.

— Ah, não me diga. Conte outra, senhorita — riu anasalado e recolheu o documento de outro frequentador. — Pode entrar — respondeu outro cliente.

De repente, a porta se abriu e do interior saiu a mesma mulher de mais cedo, porém bem-vestida como Gaya.

Seus olhos encontraram a bruxa e seu sorriso comemorou a chegada da artista que se aproximou para cumprimentá-la.

— Olha ela bem aqui! — animou-se e o envergonhou. — Lhe aguardávamos.

Ela olhou confusa para o segurança que abaixou a cabeça.

— Rupert não te deixou entrar? — ficou brevemente irritada. — Esta é a nossa nova cantora. O que tem contra ela?

— Perdão, senhorita — desculpou-se com a funcionária.

— Sabe que não deve desculpas a mim — reclamou.

— Perdão, senhorita... — os olhos se dirigiram para a Demdike.

— Sol Basil — as sobrancelhas da funcionária se ondularam e desentenderam. — Na próxima eu lhe entrego uma cópia da minha fotografia para lembrar de mim.

Presenteou o homem com dois tapinhas no ombro.

Logo que passaram da entrada e Gaya fora revistada por mais uma guarda-costas, a mulher sanou a dúvida.

— Sol Basil? — excedeu o pedestal de segurança enquanto a banda testava os instrumentos e equipamentos no palco.

— Meu nome artístico — sorriu ao também ultrapassar. — Prefiro que me chamem assim por aqui, caso eu comece a me apresentar com frequência.

— Entendido. Confesso ser mais fácil pronunciar que o seu próprio nome, se não for incômodo — ambas riram. — Então lhe apresentarei pelo seu nome artístico, exceto para o administrador, caso faça parte do clube. Sem problemas?

— Nenhum — selaram as mãos.

Vaughan se tratava de um lugar fascinante para sair numa noite despretensiosa.

O clube, tão iluminado por dentro com luminárias amarelas de teto, além das paredes, cheirava a café, fora os aromas adocicados e amargos que preenchiam cada espaço, até as escadas que levavam para cantos que Gaya não conhecia até o momento.

As paredes mesclavam entre as cores vermelho cereja e marrom nublado, o tablado onde uma banda de jazz destacava seu trompetista talentoso.

Ele atraía o auditório sentado em cadeiras de madeira que também degustavam drinques coloridos saídos com rapidez do bar lotado por aqueles acomodados em banquetes que não buscavam observar quem beijava a noite com jazz. E sim apreciar com os ouvidos, enquanto viravam copos de bebida com pequenos cubos de gelo.

Gaya se apresentaria em sequência da banda e por incrível que parecesse, ela estava animada para que ocorresse.

A idade do público variava, contudo, a maioria se evidenciava no grupo da melhor idade.

Mais idosos que jovens no clube de jazz, igualava aos frequentadores do clube de dança situado no fim da rua.

Sem dúvidas Anika Demdike amaria aproveitar as noites londrinas junto ao seu amado, memorável e falecido marido.

— Venha, "o patrão" nos aguarda — as mãos abanaram.

Gaya e seus olhos reluzentes pela beleza do clube, estava distraída com o local, mas fora despertada.

Ainda no térreo, ambas entraram numa sala mediana preenchida por um homem de cabelos platinados e molhados para trás que aparentava estar na faixa dos setenta anos de idade.

Sua face quase amorosa sobressaiu entre o paletó de cetim verde-esmeralda.

— É a nossa cantora, Abigail? — abriu os braços para Gaya, que se sentiu incomodada, pressionada a abraçá-lo.

Porém, o abraço foi de longe caloroso.

Só concedeu leves tapinhas nas costas da bruxa, logo se apartou e retornou para sua poltrona de couro.

— Sente-se, senhorita — apontou para uma das duas cadeiras à frente da mesa.

Abigail a acompanhou ao lado.

— Serei breve, pois apenas restam poucos minutos para que cante — certificou no relógio dourado de pulso.

— Ma-mas, eu vim para cumprir o ensaio e depois de fato cantar, Senhor... — se inclinou para frente e esqueceu por um momento.

Lillard — a mulher soprou em seu ouvido.

— Sr. Lillard — completou. — Mas se temos pouco tempo para fecharmos um acordo, gostaria de saber se receberei por cada apresentação.

— Por hora de show, além da gorjeta dada pelos clientes — ele recuou o corpo para trás e enlaçou os braços, quase deitado na cadeira. — Mas não se preocupe.

Gaya considerava aquilo muito pouco de se receber. Porém, auxiliaria no máximo em Londres.

— Lillard, ela de fato precisa treinar antes de se apresentar. E se não estiver segura na frente da plateia?

— Mas não temos mais tempo, Abigail. Acredito que ela vai se sair bem se de fato for uma cantora de qualidade — levantou-se do assento e ajustou o blazer.

As duas se entreolharam assustadas, mas a Demdike gesticulou e acalmou a moça que imaginava em tudo dando errado.

No momento, um rapaz bateu na porta e abriu com permissão do Sr. Lillard. Buscava se informar sobre onde andava a cantora.

— Apenas cinco minutos, Lillard. Não podem encher a cara com bebidas para aguardar a entrada da banda. Só tocaremos cinco músicas e pronto.

— Fique calmo. Já temos nossa artista — apontou para Gaya que se desajeitou, porém, ergueu-se e arrumou o vestido no corpo.

Enquanto caixas aéreas de som tocavam baixo, um instrumental com trompetes, piano e bateria, Gaya quase transpirou de nervosismo ao testemunhar mais pessoas adentrarem o clube e se espalharem nas cadeiras.

Pareciam formigas famintas por açúcar.

— Não se preocupe. Prestam mais atenção na música e nossas aparências são descartáveis — buscou confortá-la, mas já era tarde demais. — Sempre chegam para apreciar o som. E todo o repertório da noite está preso ao piso de madeira. São músicas conhecidas.

— Aham... Assim espero — sua voz tremeu e riu nervosa.

O pianista soprou por trás dela e passou na frente feito vento, em direção ao palco já ocupado pelos demais integrantes animados por mais uma noite.

Chegou sua hora — ergueu os dois polegares e animou a bruxa. — Boa sorte.

Para todos nós — sibilou.

Gaya respirou tão fundo que custou a inalar todos os perfumes daquela atmosfera, lhe sufocando entre aromas florais e adocicados.

Não havia se preparado feito uma profissional experiente, não recebera mais instruções para evitar constrangimentos, ela precisava agir por conta própria e seguir o exemplo ensinado pela professora de performance na academia:

"Entenda o palco como um fragmento seu. Você precisa se sentir em casa, a banda é uma família, a audição é guia e seu corpo é um receptor e emissor da melodia".

Tudo estava alinhado para recebê-la.

As luzes amareladas focaram no centro de madeira escura, o público comentou e cochichou entre si sobre a bela dama que subia cautelosa por cada degrau para tocar o tablado, a banda se colocou preparada para mais uma noite, porém, não imaginavam que aquela seria a grande noite.

Uma quase reinauguração do ambiente.

Os cochichos diminuíram e se dissiparam, a Demdike observou poucas faces distraídas daquela banda, notou com desconfiança alguns homens de idade subirem pela escada ao lado do palco, respirou imersiva para focar em sua performance, se atentou na primeira música que cantaria e sorriu tímida. Pois se tratava da canção mais bela que entendia como ninguém.

I'd Rather Go Blind — o pianista anunciou, avisou acerca da precedente canção e ela consentiu com a cabeça.

Três minutos exatos da demora proporcionada por Gaya, que havia congelado na frente do microfone.

Ela respirou trêmula na companhia das pálpebras fechadas ao passo que os holofotes desviaram na sua direção.

Os espectadores ansiavam pela música, não tomaram conhecimento até o momento sobre qual seria interpretada.

Alguns pigarrearam durante o silêncio, outros sussurraram curiosos e tudo principiou.

Lá situava-se ela, como uma deusa descansando nas nuvens. Sua face reluzente devido à maquiagem era de inquietar a cabeça de qualquer pessoa.

Sua mão tocou suavemente o microfone no pedestal, enfeitiçou as pessoas e seus quadris dançavam leves de um lado para o outro, no ritmo lento, como pequenas ondas nascendo na costa.

Ela sustentou os olhos recolhidos, de côncavos profundos e prosseguiu nos trechos mais sublimes de Etta James, como se todo sentimento de um amor interrompido massacrasse as pessoas naquela plateia.

Desabafava através da música até arrepiar o último fio do cabelo de quem contemplava.

O administrador, entusiasmado com a presença dela, jurou ser uma das melhores e inigualáveis vozes que passaram naquele local,

Abigail acreditou ouvir uma voz celestial dos céus e a banda custava a crer se Gaya Demdike guardava todo aquele talento.

Ou melhor, Sol Basil.

A plateia se empolgou ao presenciar aquela gloriosa mulher disseminar a essência da canção que precisava ser entoada e exaltada com a alma perpetuada sob sua pele.

A voz assumia como um complemento para a magnífica e encantadora Demdike, embora fosse somente a sua aura afetuosa a responsável pela comunicação.  

Todos mal arriscaram respirar para evitar ruídos, atentos e ávidos no show estonteante. 

Cada momento perdido seria ultrajante.

Logo que finalizaram a performance, sem exceção alguma, os espectadores impressionados levantaram-se de imediato entre uma chuva de aplausos e assobio.

Expressaram admiração, além de respeito, ao mesmo instante em que os integrantes se entreolharam estupefatos, ainda evidenciados pelos holofotes em suas faces deslumbradas.

Desacreditaram naquele acontecimento e na responsável pela voz.

Aquela resultava na primeira música entre a sequência e o público implorava por mais.

— Eles te adoraram... — o pianista abraçou Gaya, que sorriu calorosa.

— Sol Basil — foi segura em suas palavras ao apresentar nomes. — Eles nos adoram.

Completou ao mirar nos olhos dele e marcou sua felicidade em mais um sorriso extenso.

Em curto tempo, cada dinheiro por apresentação que entrava sanava poucos problemas financeiros sofridos por Gaya.

O público ainda a buscava como na primeira vez, contudo, sua relação com o administrador se estreitava num fio.

Uma linha tênue interligava os dois que não se suportavam mais. Fora os demais cantores, bandas, funcionários que não toleravam nenhuma palavra ou atitude do ser mais asqueroso naquele momento.

Lillard não pensava em música. Seus olhos eram gananciosos.

A banda que lhe acompanhava, cada integrante, recebia cinco vezes mais que ela e achavam que Sol obtinha o mesmo valor que todos, embora estivessem por mais tempo no clube.

Porém, Gaya carecia em adquirir materiais importantes na academia para prosseguir com os estudos, enviar uma quantia que pudesse auxiliar sua família à distância e tudo o que juntava ainda não era o suficiente.

Lillard lhe oferecia migalhas.

Sem permissão, também se intrometia com "sugestões" acerca de suas roupas, em busca dela se portar mais "comportada" na frente do público.

Pois, segundo suas falas diretas para a jovem: "apesar de abrir durante as noites, ainda continua a ser um local recatado".

Mencionou sobre seus vestidos marcantes nos quadris e decotes profundos que a moça amava evidenciar.

Visto que tudo naquele ambiente se tornava um caos relacionado ao seu convívio com o homem insuportável, Gaya precisava se distrair um pouco.

Escapar das perseguições, xingamentos não respondidos por medo de perder seu único emprego.

Há tempos que ela desejava romper sua rotina compartilhada entre casa, estudos e trabalho.

Exausta, aos finais de suas apresentações, quando as luzes ardiam em seus olhos, Gaya passou a frequentar um pub bem reservado e pouco iluminado por trás do clube de jazz, recomendado por Abigail, que considerava se embebedar para suportar a presença de Lillard.

Uma fuga de suas frustrações por um breve momento de alívio.

Nem mesmo o perfume daquele homem asqueroso mantinha o estômago delas em ordem.

Não se tratava também da primeira vez naquele espaço.

Já conheciam Sol Basil por suas performances e voz sublime que atravessava as paredes do espaço.

Preferia conversar com os garçons, se manter sociável, pois, não considerava ter reais amigos em Londres.

— Hoje Abigail não vem.

Lançou a bolsa de ombro sobre o balcão e se sentou na banqueta de couro, rente ao bartender que se tornara um conhecido.

Inaugurado em 1883, McNeil se tratava de um ambiente tradicional com assentos e mesas de madeira, fora alguns lustres antigos e papéis de parede baratos com listras e flores comuns de se encontrar em tecidos para almofadas.

Cheirava a café, álcool, nicotina e a rádio sempre se mantinha disponível na estação que comunicava ou narrava jogos de futebol.

Às vezes a televisão se sustentava ligada quando o Liverpool jogava — atraindo uma boa quantidade de clientes — e desligavam logo que o time de futebol não era mais assunto.

— Abigail só pede água gaseificada. Disse que se tornou uma nova pessoa — ele brincou logo que ambos bateram as mãos e se cumprimentaram. — É bom te ver aqui novamente.

— Corey, eu também me tornaria só por culpa daquele imbecil que cheira a mofo — apoiou os cotovelos sobre a superfície e aguardou sua bebida favorita naquele pub.

O rapaz alto de cabelos castanhos que tocavam os ombros e olhos de avelã, vestido num avental sobre uma camisa social preta, apanhou um copo médio de vidro, buscou uma cereja fresca, água tônica com açúcar no refrigerador, misturou no recipiente e entregou nas mãos da cantora.

— Tônica e cereja, como sempre deseja — se inclinou para ela, apoiou os cotovelos na madeira e seus punhos cerrados sustentaram o queixo — Aproveite como nunca, Senhorita Basil.

— Obrigada, Corey.

Ergueu a bebida no ar, saudou a única companhia mais próxima no recinto e concedeu seu primeiro gole da noite.

Bem frequentado, o local ainda estava cheio para aquele horário de fechamento.

— Você ainda continua por lá. Mas até quando?

O bartender se afastou dela, puxou um pano de limpeza do ombro, umedeceu com um líquido perfumado posto numa das prateleiras de bebida e principiou a esfregar o balcão em círculos, removendo manchas de garrafa dos clientes que já se foram.

— Trabalho naquele lugar porque preciso. Não porque quero — revirou os olhos e bufou.

Em seguida, deu mais um gole e mordeu um pequeno pedaço da cereja até não restar mais nada.

— Mesmo sendo a artista da casa?

Lançou o pano de volta ao ombro, regressou a se inclinar para ela e prestou mais atenção.

— Ser a artista da casa não me torna digna de receber melhor do que já ganho. Estou lá apenas para saciar os olhares. Nem minha voz faz mais efeito como antes — ele abaixou os olhos, manteve no balcão e entortou os lábios em desaprovação. — Às vezes sinto a vontade de lhe perguntar se possuem um espaço para contratar novas pessoas.

— Não acho que deveria deixar seu currículo aqui — notou um dos garçons se aproximar deles. — Tenho uma leve impressão de que o administrador do clube e meu chefe são os mesmos indivíduos. Digo, não fisicamente, mas a índole fede da mesma maneira.

— Então desisto — riu triste e finalizou a bebida com mais um gole.

— Você merece bem mais que isso, Senhorita Basil.

Era bem estranho escutar lhe chamarem por outro nome, mas preferia que fosse assim.

Para preservar sua imagem.

— Corey, uma cerveja caramelizada para a Srta. Sol Basil.

O garçom leu o pedido registrado no pequeno bloco de anotações.

— Não entendi — o bartender sorriu desconcertado.

— Para mim? — Gaya estava confusa.

— O pedido saiu daquele senhor ali. Pediu que tratasse como uma cortesia — deu de ombros. — Não tenho nada a ver com isso.

O rapaz não se intimidou ao apontar para um idoso de cabelo preto — nitidamente falso e mal colocado na cabeça —, com barba rala e falhada.

Aparentava se incluir na faixa dos setenta anos, vestia roupas muito comportadas e usava óculos de grau tão pequenos que apertavam o osso de seu nariz.

Descarado, ele acenou e evidenciou um sorriso bem malicioso para Gaya, que sentiu seu estômago embrulhar.

Quase lançou toda bebida sobre o balcão limpo pelo Corey.

— Diga que não aceito cortesias de estranhos — ficou de costas para o desconhecido. —

Mas também diga...

Puxou a bolsa para perto, caçou algo por dentro até retirar um canivete metálico de cabo vermelho escarlate que disparou sua lâmina brilhante, prateada e curvada

— ... que a cortesia dele está afiada.

— Fique tranquila, Srta. Basil — o bartender abaixou a mão dela, buscou pela calma e demais pessoas notaram. — Não vai querer que esse acontecimento chegue aos ouvidos do administrador, não é?

A Demdike guardou a lâmina e pôs o canivete de volta na bolsa.

No clube, ela disfarçava a arma num tecido falso da bolsa, ocultada por baixo das chaves da casa e fazia com que a vistoria apenas encontrasse o molho.

Nas roupas ela ocultava entre o decote.

Decidiu se armar em casos mais arriscados com Lillard. Sabia o bastante para se defender.

O garçom tratou logo de riscar o pedido, agiu da forma que ela determinou e repassou a mensagem para o estranho que desmanchou o sorriso amarelo.

— Ainda vai querer a cerveja? — aproximou-se do refrigerador, preparado para servi-la.

Ela pensou um pouco e olhou para o lustre acima deles. Seria a primeira oportunidade de beber.

— Me passe aqui — educada, tomou a garrafa e o abridor da mão dele. — Não tenho mais o que perder, não é? — a tampa de metal caiu no balcão.

Do outro lado no pub, o estranho se ergueu irritado, chutou levemente as cadeiras próximas, contudo, incomodado, ainda deixou uma cédula e mais algumas moedas trocadas sobre a mesa.

Também fez uma breve continência à distância para Gaya, que tratou como uma provocação, saiu do estabelecimento, tomou seu sobretudo e pôs sobre os ombros.

No momento que o recolheu, algo reluzente e dourado se sobressaiu no tecido cinza grafite.

— Corey, venha cá — o indicador direito os uniu novamente — Sabe de quem se trata aquele homem?

Ele inalou todo o ar misturado daquele ambiente, ergueu as sobrancelhas e coçou o couro cabeludo.

Observou os lados, medroso por algo, voltou a se inclinar para Gaya, cochichou e pôs sua mão na frente dos lábios.

Reparou em algo naquele sobretudo? — perguntou num tom sigiloso.

Uma pequena coisa brilhante e dourada logo que ele passou abaixo do lustre — saboreou o primeiro gole da cerveja.

Bem que não era ruim. Mas aceitou só aquela garrafa.

Corey afirmou com a cabeça, comprimiu os lábios e coçou o queixo. Até aquele instante ninguém se interessava por ele para preparar mais bebidas.

Promete guardar algo? — suou frio e Gaya notou uma ínfima gota escorrer da testa dele. — Que não ouse contar nem para quem mais ama?

Meus lábios são como um túmulo — selou o sinal da cruz sobre a boca fechada.

O rapaz confiava nela.

Do bolso de seu avental ele apanhou um broche dourado em formato de uma árvore seca contornada por uma cobra enroscada no tronco.

Como sua mãe era uma excelente e experiente conhecedora de pedras preciosas e metais, recordou uma vez que Delphine lhe ensinara a identificar ouro puro em detalhes de um jarro presenteado por bruxas da Irlanda.

Ela colheu com cuidado o objeto nas mãos, o analisou atenta, solicitou o pano que o rapaz usava, limpou cuidadosa o broche com a parte mais higienizada do tecido e pediu vinagre com urgência.

Corey desentendeu, mas acatou seu pedido.

Assim, saiu da cozinha, entregou para ela e a notou derramar dois pingos sobre o objeto.

Ouro puro — ele riu anasalado, cruzou os braços e expressou confusão. — A cor permaneceu a mesma e não oxidou.

Quem lhe ensinou sobre isso?

Uma das sobrancelhas se elevou, em dúvida.

Minha mãe, Delphine. A maior estudiosa de metais e pedras preciosas que você jamais conheceu — continuou a analisar o broche com mais atenção. — E essa é a forma mais simples de se reconhecer.

Ele apanhou sua corrente dourada do pescoço, olhou para ela e sorriu.

E também... — devolveu o broche para ele, e escondeu das demais pessoas por ali — ... significa que é um objeto de valor. Principalmente se notarmos as figuras nele. Porque pelo que sei, broches com símbolos tão inusitados me fazem entender que pertence à membros formados da medicina ou...

Ou...? — ainda sabia.

Sociedades secretas, como naquele programa do canal sete, que investiga sociedades secretas pelo mundo inteiro.

Ela se animou.

Isso é uma lenda urbana, Srta. Basil.

Recolheu um pedido de outro garçom e principiou a preparar a bebida solicitada.

Apesar de haver uma semelhança nos broches daquele homem e o que guardo, não deve se aproximar de algo dessa magnitude — começou a sibilar baixinho. — Onde já se viu sociedades secretas?

Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top