Capítulo 14: Condutas Rebeldes
*ALERTA DE GATILHOS: PRIVAÇÃO DA LIBERDADE E IMPOSIÇÃO FAMILIAR.
*RECOMENDAÇÃO DE MÚSICA DA TRILHA SONORA PARA O CAPÍTULO: Leave Like That - SYML, Jenn Champion
Em vestes formais escuras e boa parte do cabelo penteado para um lado por pressão de sua avó que detestava vê-lo com os fios tocando a testa, o menino carregou consigo sua mala de grande porte com as mãos, porém, recebeu ajuda do sacerdote para levá-la até o porta-malas.
O sorriso de Moniese se encontrou de orelha a orelha enquanto o padre se desagradou com a risada da Gregori. Resultou na cena mais gratificante de toda a sua vida: no futuro, seu neto se tornaria um seminarista.
O olhar do garoto abatido focou na casa das Demdike, esperançoso por ajuda, ao mesmo instante em que sua avó se despediu do padre.
Voltou ao céu e avistou cair em seu rosto um pingo de chuva, anunciando o dia em que deixaria sua cidade pela primeira vez, além da sua melhor amiga.
— Reverendo, me mantenha informada sobre tudo e nos mínimos detalhes. Preciso ficar ciente, pois quero que meu neto se encaminhe aos braços do Pai — ela apertou as mãos frias do clérigo¹, saudou animada e causou incômodo nele.
— Está bem, Sra. Gregori. Manteremos contato, mas considere que as escolhas serão do menino. Na condição dele preferir abandonar os caminhos no seminário, serão decisões exclusivas do Franco. O Santo Pai iluminará o trilhar de seu neto para compreender o que acha viável a si — notara que o garoto se mostrou insatisfeito. — Tudo bem, meu jovem? — Franco concordou ligeiro, aliviado pelo padre desconfiar daquela decisão precipitada.
— Certamente, Senhor Reverendo, pressinto que o garoto irá persistir. Sei bem que prosseguirá no sacerdócio. Confio em Deus e em mim. Não é, querido?
Frio, o menino concordou sem mover palavras ou despedidas. Se mostrou aflito com os olhares intimidadores da matriarca.
O padre ergueu as sobrancelhas e percebeu a soberba nas palavras daquela mulher. Moniese referia-se à pressão psicológica que envolvia um falso desejo de seu filho acerca de seu neto.
Sem se despedir de Gaya, Franco entrou quieto no carro junto ao clérigo, acomodado ao lado esquerdo do banco traseiro e percorreu os olhos direcionados ao lar das Demdike, no semelhante momento em que o veículo seguiu rumo à Hertfordshire.
Naquela ocasião, dois amigos se afastaram por influência de uma criatura desprovida de piedade. A Gregori desaprovava sua respectiva destruição e corrompia um jovem inocente.
Caso o pai estivesse presente, o lastimável destino seria extinto ao Franco.
Gaya descobriu da pior forma que seu melhor amigo havia partido sob pressão.
Moniese anunciou à cidade que o seu neto se encontrava num dos mais importantes internatos da Inglaterra e que no futuro se tornaria um exemplar seminarista, afastando-o de um provável relacionamento prolongado com a bruxa.
Seu orgulho ultrapassou limites, inclusive direcionou sua empolgação às Demdike e continuou a proferir injúrias contra as mulheres da família em público.
Alegou que Franco purificaria a árvore genealógica dos Gregori ao evitar se envolver com uma "bruxinha infame", complementando seu xingamento.
O determinado ataque foi de fato proferido na frente da garota, enquanto se colocava na presença de suas duas mães que reagiram banindo-a mais uma vez da floricultura aos tons elevados.
Porém, um dia, talvez a esnobe mulher pagaria junto à sua própria língua.
(...)
Passaram-se dois meses desde a partida e Franco permaneceu no internato. Gostava de lá por uma parte.
Das básicas disciplinas como Matemática, Literatura Inglesa, Ciências e outras, a rotina no instituto apresentava-se meramente divertida.
Cada garoto compartilhava o mesmo quarto com um colega, um ambiente complementado por duas camas e no decorrer das tardes de intervalo entre as aulas, costumavam interagir com diversos jogos para cumprirem horário.
Dos mais variados, desde futebol até xadrez, além dos treinos de dama, preferidos do garoto. Contudo, Franco evitava as aulas de natação por razões sinceras.
O próprio internato também oferecia auxílio psicológico para os que sentiam falta de casa ou experienciaram problemas com os familiares responsáveis.
E por solicitação do garoto, na ausência de sua frequente amizade com o Dr. Kai, Franco se viu na necessidade de requerer o acompanhamento de outro psicólogo na intenção de lidar com os traumas de sua vida, pois dificilmente se distanciaria da Afefobia.
Estava disposto a lidar consigo.
Ele encontrou tranquilidade em tudo o que não abrangia matemática e outros estudos de sala.
E devido a sua dedicação nas atividades extras, repararam que o empenhado menino se encaixava entre os garotos superdotados do internato.
À vista disso, o incluíram em torneios entre colégios da cidade, que abrangia o xadrez, dama e a escrita de literatura medieval avançada, aproximando-o e o acostumando com pessoas diferentes das que ele costumava ver diariamente.
Era um avanço para quem nunca obteve contato além das bruxas e sua família sanguínea, o que facilitava a comunicação.
Carregava em seu pescoço ao menos uma medalha de ouro, prata e bronze no final de algumas competições, contabilizando onze em cada vitória. Entretanto, concentrado nas suas habilidades, sentia-se solitário conforme seu habitual.
Nem mesmo quando perdia um torneio, seu emocional era abalado. Muito menos uma nota vermelha no cabeçalho de uma avaliação.
A saudade em razão da amiga e por mais incrível que parecesse, incluindo sua avó, torturava a cabeça do jovem
Gregori.
Se apresentava novo demais para se afastar das pessoas na qual amava.
Sua última crise de ansiedade sobreveio antes de repousar, amedrontou seu companheiro de quarto e ainda assim jamais havia ninguém que pudesse lhe telefonar no intuito de lhe tranquilizar.
Se pelo menos Gaya descobrisse o número de telefone do internato, poderia apoiá-lo e confortá-lo de alguma maneira, porém, por infelicidade, não aconteceu, reprimindo receios na cabeça.
Ainda não sabia como lidar sozinho.
Similarmente por outro extremo, o Dr. Kai insistiu em apurar através de Moniese referente ao paradeiro do garoto e manifestou preocupação em relação ao seu paciente. Contudo, nunca o visualizava apenas como um paciente.
Para o Dr. Kai, o menino Franco se revelava conforme um filho. Um detalhe em geral desconhecido entre psicólogo e paciente. Ele se importava com o garoto. De fato, todos que não faziam parte dos Gregori consideravam o jovem semelhante a um fragmento de suas famílias, diferente da avó, que sustentava o mesmo sangue em suas veias.
21 de Setembro de 2003: Três dias depois do Último Quarto Crescente
Entretanto, no dia vinte e um do mês de setembro, ao decorrer de uma tediosa aula de Literatura Inglesa num domingo de outono, à medida que o sisudo Padre Mohr rabiscava o quadro verde na companhia de pequenas lascas de giz — fazendo alguns dos alunos da frente espirrarem —, Franco, que se encaixava equivalente a um dos piores daquela classe, observou concentrado alguns estudantes brincar ao lado externo, por intermédio da grande janela de vitral preenchida por desenhos religiosos e emergiu em sua mente uma ideia bastante astuciosa.
No momento que o Padre Mohr se virou suntuoso na direção da turma e expressou inclemência, Franco, corajoso, ergueu a mão junto à sua inseparável luva de lã e chamou a atenção do professor sacerdote:
— Sr. Gregori, o que deseja?
Uma das sobrancelhas se levantou furiosa, quase descolando da pele no instante em que os demais viraram-se atentos ao menino, curiosos em descobrir o que Franco solicitaria.
Esperavam alguma insolência da parte dele. O Gregori disseminava rebeldia.
— Posso me dirigir ao banheiro? — estranho, apanhou a mochila do chão, instigou o padre que cerrou os olhos e enlaçou os braços, em suspeitas. — Situação... — pensou numa palavra adequada — ... emergente.
— Emergente são suas notas em Literatura Inglesa. Fique quieto na cadeira e em silêncio — voltou ao quadro.
— Padre Mohr, eu suplico — roçou as coxas no assento e fingiu descontrole de suas necessidades fisiológicas.
Para sustentar a astúcia, sua face sofreu junto aos lábios pressionados pelos dentes, gemeu ao simular desconforto e se contorceu fazendo os colegas chorarem de rir, além de reprimirem as gargalhadas
— Hum... — num semblante severo, buscou intimidá-lo. — Desde quando é preciso levar a sua bolsa ao toalete, Sr. Gregori? — empinou o nariz, caminhou no meio das carteiras e buscou se aproximar dele.
Mohr o analisou sofrer e mal externou preocupação.
— Satisfeito? — pôs uma das mãos para baixo de suas nádegas, como se o estrago estivesse feito. — Acabei de sujar as minhas calças, Reverendo.
Os demais falharam em ocultar as gargalhadas e Franco disfarçou falso incômodo, no entanto, o sacerdote lhe checou num olhar atento e averiguador.
— Fracassou em me enganar, Sr. Gregori. Não é a primeira vez que age assim. Sabe quantas vezes apreendi estudantes mentindo para mim? Se encontra suando frio e balançando suas pernas em nervosismo — Padre Mohr era um bom observador e acreditou que arruinaria o plano do garoto.
— Exatamente isso! Não estou mentindo. Eu de fato me... — fora interrompido entre a insistência.
— Sem mais palavras — o calou. — Portanto, em consequência disso, permanecerá em detenção durante o horário da refeição na sala do Reverendo Gaspar.
— Por favor, não faça isso, Padre Mohr! O Reverendo Gaspar é extremamente entediante — uniu as mãos em preces, debochou do sacerdote e suas súplicas se complementaram com o segundo esquema. Até aquela ocasião, tudo saía bem — Ele costuma cantar o constante cântico fúnebre há dias, aparenta que vivencia um luto eterno — os restantes zombaram e incomodaram o sacerdote.
— Silêncio! — calou a sala sob o olhar petrificante e regressou sua atenção ao jovem. — Sr. Gregori, só por este desaforo acompanhará o Reverendo Gaspar até às nove horas da noite — comemorou por dentro. — Ultrapassando o turno, retornará ao seu dormitório sem nenhuma reclamação. Está ciente disso?
Apesar de alimentar um aborrecimento acerca do Reverendo Gaspar, por um triz comemorou pela decisão. Todavia, carecia em entregar um personagem contrariado pelo castigo.
Ele confirmou por meio da cabeça e avistou o clérigo retornar à lousa e prosseguir com as explicações.
— Certamente meninos, abram na página, quatrocentos e noventa e nove. Hoje continuaremos com a leitura coletiva — seu corpo direcionou para um dos estudantes e seu indicador julgou ao apontar. — Sr. Fisher, não quero gracinhas mais uma vez enquanto escrevo. Da próxima vez limpará os banheiros com a língua.
— Ai, Padre Mohr. Sobre a Renascença Inglesa de novo? — um dos alunos deitou a testa sobre a página.
— Quer se juntar ao Sr. Gregori e Sr. Fisher também, Sr. Davies? — Franco bufou e exprimiu tédio. Aguardava pela sua detenção, mas torcia para ir sozinho. — Terei que lhe colocar para lavar as louças do jantar de cada um.
Na sala do Reverendo Gaspar se localizava a única janela livre de grades, unida a uma escada de emergência que dirigia ao exterior do internato, caso acontecesse qualquer evento urgente, visto que o cômodo encarava o grande portão, diferente das demais existentes.
A estratégia de Franco visava aproveitar a oportunidade em que seguiria ao seu quarto na finalidade de pegar sua mochila, elaborar alguma desculpa esfarrapada ao clérigo superior, encaminhar-se em direção à dependência do padre, suportar os depressivos cânticos e aguardar pela saída do sacerdote, quando normalmente o consente sozinho por minutos, conforme um descuido. Contudo, no fundo confiava no garoto.
Além de descer através da escada e atravessar a entrada até o momento do primeiro transporte que o levaria até Rye.
E durante o horário das refeições, essencialmente às sete horas da noite, o menino prosseguiu junto à sua mochila até a saleta ordenada, logo se idealizou cumprir o plano e repetiu a sequência na cabeça.
Por incrível que parecesse, fora bem recebido pelo senhor de idade e encaminhado para se acomodar numa das poltronas de couro:
— Franco, por qual motivo carrega sua mochila?
Reverendo Gaspar o observou abrir o acessório colocado no piso de madeira e se expôs confuso assim que ele retirou um pijama castanho de flanela com um lençol branco. Não compreendera sobre o que significava, porém, isso também fazia parte do esquema.
Bem no interior da bolsa, ocultava todos os seus itens importantes para a fuga e necessários ao seu retorno destinado à Rye.
— O Padre Mohr me instruiu que eu deveria dormir por aqui nesta noite, como uma punição, Reverendo Gaspar. Por essa razão, trouxe os meus pertences para descansar naquele sofá — apontou no sentido do estofado favorito do Reverendo, se mostrou cabisbaixo e fez beicinho. — Mas é claro, se me permitir e não for um incômodo — expressou tristeza e quase implorou por piedade.
— Ma-mas... — faltou palavras. — O Padre Mohr decidiu isso?
— Não só decidiu como ordenou que eu também trouxesse meu colchão com a cama — expressou seriedade para
conter a risada
O clérigo era muito inocente para acreditar nas mentiras do Gregori.
— Santíssima Trindade, que cruel! Por essa condição, o procurarei de imediato para exigir explicações.
— Está mais que correto, Reverendo! — o incentivou e acenou.
— Nenhum aluno deverá repousar longe de seu aposento, Sr. Gregori — o menino não comemorou por um fio, entretanto, retornou a uma falsa expressão submissa. — Me aguarde por um segundo, pois irei buscá-lo sem demora. Como ousa tratar os meninos dessa manei...
Ao sair pela porta, sua voz dissipou-se gradualmente, distanciou do local e ecoou pelos corredores numa constante reclamação.
Significou como o ápice ideal para que o garoto cumprisse suas artimanhas.
Observando a janela escancarada próxima das cortinas que balançavam em razão da brisa noturna, Franco se apressou a fim de arremessar a mochila no gramado, provocou um barulho abafado no capim, se atentou aos lados, assegurou que inexistia a presença de sacerdotes nas imediações e desceu desenfreado, impaciente para escapar daquela "prisão", sem escorregar os pés nos degraus.
Como experiência das madrugadas visitando sua amiga.
No instante em que o menino atingiu o chão, seus pés formigaram pela pressão. Ele abandonou o pijama, o lençol na sala e o Reverendo Gaspar retornou ao recinto acompanhado do Padre Mohr.
— Sr. Gregori?! Garoto? Por onde ele se encontra? Padre Mohr, situava-se exatamente neste lugar! — o Reverendo ainda insistia em procurar pelo menino no ambiente, no entanto, o Padre Mohr interpretara de imediato os planos de Franco ao visualizar as coisas deixadas por ele.
Correndo no interesse de vê-lo fugir com destino ao portão, Padre Mohr gritou e alertou ao restante dos clérigos nos arredores da instituição para avisar sobre o ocorrido.
— Apanhem-no! Não o deixem fugir! — furioso, Mohr esmurrou o apoio da janela e espremeu os lábios.
Franco, movido pela adrenalina, notou seu coração disparar no instante em que os clérigos chegaram capacitados a apanhá-lo a tempo.
Mas ao arremessar sua mochila para o outro lado da entrada, o garoto escalou rapidamente as grades no instante em que se esforçaram para alcançá-lo.
Ao recolher a bolsa com pressa, ele a pôs presa nas costas, riu eufórico e acelerou as pernas desesperadas ao longo do caminho de terra até a primeira e distante parada de ônibus num ermo iluminado por um único lampião.
Na exata hora, os padres se empenharam em abrir o portão trancado pelos cadeados, afobados para atingir o jovem Gregori que mordeu o lábio inferior e se conteve em xingá-los. Todavia, falharam.
As crianças da instituição correram apressadas para os dormitórios, interromperam a refeição e comemoraram apoiadas em suas janelas gradeadas de cada aposento em prol da investida impulsiva do rebelde. Não havia como deixar de apreciar aquele momento.
Ainda em sua sala, o Reverendo Gaspar telefonou à Moniese, desolado pelo que acabara de suceder.
Franco havia cumprido sua engenhosidade e prontamente, seu maior objetivo traçaria ao rever sua melhor e inesquecível amiga.
Tudo fora arquitetado no real intuito de reencontrá-la.
¹Clérigo: Sujeito que faz parte do clero, da classe eclesiástica, classe que se dedica ao sacerdócio (padre, sacerdote, etc.).
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