Capítulo 11: Advento do Apogeu
*ALERTA DE GATILHOS: ANSIEDADE, LUTO E PERSEGUIÇÃO.
*RECOMENDAÇÃO DE MÚSICA DA TRILHA SONORA PARA O CAPÍTULO: Never Enough - Piano Version - TWO LANES e Compassion - Shoshana Michel
2 de Abril de 2018
— Mãe, como isso foi acontecer?! — desesperada, Gaya chorava copiosa e as roupas estavam molhadas, mas apesar disso, Dane a acolhia com uma toalha seca. — Como aconteceu, mãe?! — se comunicava mediante o aparelho móvel de Dawson e faltava forças para questionar.
Os dois já haviam chegado apressados no hotel, Gaya, em inteiro sofrimento, conversava escorada perto da janela, seus olhos se atentaram na rua e Dane sentou-se no chão, encostado na cama, pensativo. Ou a digerir a notícia.
— Querida — fez uma pausa preenchida em dor —, sua avó falou com a Mãe Terra e como estava debilitada, Anika desejou descansar. Ela achava... — Delphine enxugava as lágrimas do outro lado da linha.
— Não, não... — a jovem se recusava a aceitar e esfregava as costas das mãos nas pálpebras.
De nada adiantaria, pois o choro era constante.
— Sobre Anya, sua mãe não possui condições para se comunicar, mas se encontra mais plena que nós duas. O que de certo modo me conforta.
— Vovó não deveria ter feito isso, mãe! Não pode ser! — o tom se elevou. — Por quê?!
Inexistia disposição em Gaya prosseguir no diálogo.
— Querida, deixe-me falar com Dante. Por favor. Não aceitarei que se esforce tanto feito agora. Transfira a ligação. É acerca do enterro da sua avó. Estamos nessa etapa, está sendo muito complicado para todas e creio que seria melhor conversar com você quando estivermos bem calmas.
Delphine precisava poupar a imensa tristeza da filha. Até o momento, sozinha, segurava toda a situação até o instante que Anya retomasse os sentidos.
— Fale para mim, mãe — apesar do tormento, queria estar a par de tudo. — Preciso saber os próximos passos. E-eu... — contorceu os lábios em lástima. — Eu necessito.
Não tinha para onde correr. Insistiria até a última paciência restar.
— Nesse dia oito, ocorrerá o funeral da sua avó e uma pessoa ficou encarregada de tomar conta de tudo. Hoje, não temos condições emocionais para lidar com as coisas.
— Então, chegaremos por aí, mãe.
Dane ansiou entender a respeito do que conversavam, levantou-se ansioso e seguiu até ela.
— Voltaremos à Rye. Quero vê-la. Me despedir. Não seguirei a vida se eu não fizer.
— Gaya... — Delphine falhou a voz ao arfar exausta por culpa do pesar.
— Te suplico, mãe.
O silêncio imperou na mulher que sustentava as próprias dores, da esposa e filha.
— Lhe esperaremos para que se despeça da sua avó. Precisamos de você, filha — a voz embargou. — Sabemos que Anika partiu feliz. Mas ainda não nos acostumamos.
— Nos reuniremos novamente e pela vovó.
Na circunstância que viviam, Rye se tratava de uma grande ameaça para a existência das duas vítimas. Porém, com a triste ida de Anika, para Gaya, nada mais importava além de um último adeus.
— Preciso conceder um último adeus à minha avó em Rye e a seguir disso, mudaremos de país em breves dias — ríspida, recusava o olhar perdido do corvo.
Desviou do rapaz e principiou a vasculhar suas roupas e a fechar algumas caixas que foram abertas. Começou a empilhar uma por uma, após arrumar forças do interior e Dane se juntou a ela.
Pretendia apoiá-la até o fim.
— Acha que podemos fugir? Depois de tudo o que aconteceu? — apanhou do banheiro objetos de higiene próprios, medicamentos e organizou na mochila que carregava.
— Não sei, eu... — respirou profundo e interrompeu o que fazia. — Acabei de perder minha avó e só tenho que vê-la antes de escapar — levou as mãos à nuca e o olhar fixou no abajur.
Mas não enxergava necessariamente a luminária. Havia parado no tempo.
— Sinto muito, Gaya. Sinto tanto...
Se aproximou, a recolheu nos braços entre as repentinas lágrimas da jovem, até ela se tranquilizar e enxugar os olhos vermelhos com as costas dos dedos.
— Conheço uma localidade na Escócia. Se fugirmos, é para onde eu iria se for o destino a viver em anonimato. Caso suas mães quiserem ir conosco, talvez a gente conte o que está acontecendo. Creio e ao pensar melhor, é mais seguro estarem ao nosso lado.
— Bem... — mirou um olhar vago. — O que faremos? Me enxergo perdida. À deriva.
— Desejo que descanse um pouco — a guiou pelos ombros e a fez sentar na ponta da cama. — Descerei para fazer o checkout amanhã cedo, posso ligar à proprietária mais uma vez para vir até aqui encerrar o contrato e pagarmos o que restou. E ligarei para a equipe de mudança agora no intuito de levar nossas coisas e irmos de moto.
— O que diremos à proprietária? Vão nos procurar e pegar informações dela — encaminhou as mãos às bochechas.
— Diremos que moraremos na Austrália. Não sei por que, mas surgiu feito a primeira ideia a se repassar.
Por um momento, Gaya riu desajeitada, ainda com o rosto inchado por culpa da tristeza. Mas, estranhamente, não vivia o luto como presenciou há tempos em Franco.
— Seguiremos o seu plano. Só quero ver minha avó pela última vez para esvaziar meu coração do peso que carrego pelo impacto.
As bruxas poderiam partir de diversas formas, mas no fim de tudo, havia a Madre Mortem para recolhê-las num descanso tranquilo. Não era morte de fato. Mas uma vida eterna em outro lugar bem distante do que conhecemos.
Resultava tarde da noite e Dane dormia relaxado no intuito de acordar cedo. Se dispôs a tomar todos os rumos na intenção de que voltassem tranquilos à Rye.
Contudo, Gaya carregava uma perturbadora insônia consigo. Entre a luz a adentrar por intermédio da janela, sentada na cama e focada na fenestra enquanto o rapaz repousava ao seu lado, a jovem chorou por minutos. As lágrimas mancharam o lençol e perfuraram o tecido.
Mexia nas unhas de modo a encontrar foco, enxugava o choro com as mãos e tudo era resultado da saudade por aquela que amou e continuaria a amar as memórias imortais.
Não queria emitir barulho ao fungar o nariz para acordá-lo, mas precisava chorar e se aliviar. Remover a carga de seu peito. Nunca conviveu com o luto repentino.
Tempos atrás, quando se recolhiam de frente à lareira, ao cair do inverno, a avó contava acomodada na poltrona como o fim se tratava de uma passagem com destino a uma nova vida. Diziam que bruxas renasciam e a Mãe Terra se encarregava disso.
Então, a etapa da morte para as Demdike transitava entre a saudade, ausência e orgulho.
Na saudade restam as boas lembranças, apesar de haver negação.
Na ausência, as bruxas aprendem a conviver com a falta da curandeira que descansou. Nessa fase, há a compreensão de que a falecida se encontra num lugar de descanso.
No orgulho, a bruxa se transforma numa força que move suas parentes que ficaram. Nesse período, há comemorações, tributos e respeito ao pedido de uma bruxa: prosseguir a vida com felicidade em honra à curandeira que faleceu.
Pois nenhuma bruxa descansa se as demais lamentam por sua partida.
Nem todos os mortais viveriam por bastante tempo ou descansarem em paz conforme as bruxas.
A importância de Anika era imensa para Gaya e ela não se importava tanto naquele instante com a carreira. Embora as Demdike achassem que deveria se priorizar.
Mas para Gaya, se priorizar, envolvia a família. Se alcançou sua vivência em Londres e se tornou quem se evidenciou, partiu das queridas bruxas.
As mães e avó sacrificaram tudo para proporcionar uma vida digna a uma jovem que sentia a carência pela anciã. Porém, o que imperava nas sobreviventes de Pendle, era a admiração por quem foi Anika Demdike.
7 de Abril de 2018
— Gaya, como está?
Despertou entre o olhar embaçado ao notar uma sombra de braços enlaçados diante da janela, que se dirigiu até a borda do colchão.
— Só ficarei aliviada ao chegar em Rye — bocejou e se espreguiçou.
— Tudo bem — se ajoelhou e acariciou o cabelo crespo da jovem. — Olhe, já fiz o checkout no hotel, expliquei à proprietária que iremos morar na Austrália, ela compreendeu e agora o caminhão de mudanças chegará em minutos. Acho melhor começarmos a nos organizar.
Gaya se levantou de imediato e o corpo dolorido ressaltou. Mas ao redor, quando olhou, notou que Dane pôs tudo em ordem. Apenas levariam as coisas para baixo. E ela se sentiu mais tranquila. Em excelentes mãos.
Ao deixarem o lugar e apagarem vestígios, a viagem de Londres de volta à Rye pareceu uma eternidade para Gaya, que se agarrou no rapaz enquanto o caminhão seguia na frente. O percurso se mostrava cansativo e nem ao menos determinaram uma pausa.
Necessitavam chegar a tempo no destino.
O endereço, devidamente repassado por eles aos rapazes da mudança, os tranquilizou caso cortassem alguns caminhos de modo a evitar trajetos proibidos às motocicletas.
Ainda restaram boas lembranças em Gaya durante a vivência na capital. Contemplava sua partida com a cabeça encostada sobre as costas do rapaz que evidenciou aflição em voltar até onde deixou a família de corvos.
No exato instante, na antiga casa que Gaya residia em Londres, a proprietária já mostrava a residência a um novo inquilino. A mulher se animou com as coisas deixadas em ordem. Os dois se dispuseram a organizar com excelência antes de saírem.
— E aqui fica o jardim — apontou enquanto segurava uma pasta nas mãos. — Bem cuidado pela residente anterior, diferente de quando apresentei a casa.
O homem fez uma vista curta ao ambiente. Não se importava tanto com jardins. Sua expressão seca desagradou à mulher que apresentava.
— Notável e bem cuidado mesmo — a senhora sorriu e concordou. Agia daquele jeito de modo a convencer novos residentes a alugar. — Saberia me informar acerca de quem era a tal moça? Recebi uma recomendação de uma jovem para alugar a moradia. Deve ser a mesma — mentiu.
Não conhecia ninguém que tivesse lhe recomendado a habitação.
— A Srta. Demdike? — questionou animada. Havia gostado da jovem. — A quem se refere?
— O que disse? — o nome lhe sobressaltou as sobrancelhas e a voz.
— A antiga inquilina. Ela viajou hoje ainda para a Austrália com outra pessoa. Acho serem namorados ou algo assim porque morou por um período aqui — o guiou pela casa e chegou ao porão. — É... aqui o rapaz explicou que a porta se quebrou durante a mudança, mas foi pago o conserto para reformarmos.
Depois o levou até a sala, onde ele parou diante da janela e observou a paisagem externa, ao passo que a proprietária consultava as plantas que restaram no cômodo.
— Bem, então mais tarde retorno na intenção de comunicar sobre o aluguel — virou-se contra a luz e se mostrou aterrorizante. — Por enquanto falarei com minha esposa para saber o que acha. Entende como esposas são analíticas nas escolhas, não é?
Sorriu amigável, de dentes amarelos e a dona da casa recebeu e retribuiu da similar forma.
— Tudo bem, Sr. Artur. Ficarei ansiosa para retornar e avise à sua companheira que o bairro é seguro para seus filhos brincarem. Tudo é muito próximo e turístico. Creio que irão amar.
— Ah, sem dúvidas! — gargalhou forçado.
Logo que saiu do lugar e desceu a escada, após se despedir da senhora, Artur aguardou que a proprietária se afastasse da residência, seguisse seu rumo mediante a alameda, virasse uma esquina e do bolso sacou um aparelho telefone no intuito de tratar de assuntos urgentes.
— Padre Artur — uma voz rouca lhe atendeu. — Atualizações?
— Não vai querer saber — passou a ficar furioso e cerrou os dentes à medida que caçava presenças na rua. — Dane Dawson e a cantora fugiram.
O sangue ferveu em ambos numa intensidade alarmante.
— Como deixou isso acontecer, Artur! Nunca pensei que a incompetência saísse algum dia de você!
— Escaparam feito vento. Você quer o quê? Que eu estale os dedos e os traga de volta? — recobrou a paciência. — Mas o que me surpreendeu, foi ter descoberto que Sol Basil... — respirou imersivo e até caótico — ... é a fachada de uma maldita Demdike.
— O QUE DIZ?! — gritou através da linha. — Você mente, não é? Não posso crer!
— Jamais mentiria e ocultaria tal informação preciosa — um carro escuro lhe aguardava na esquina e foi ao encontro do veículo até adentrar. — A bruxa sempre esteve aqui nesse tempo inteiro, Padre Maria. É agora que precisamos reunir todos. Temos que matá-la ou assustá-la da pior maneira possível. Nosso pássaro será apanhado.
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