Capítulo 6


✧ Ver para crer ✧

Um tempo depois, a chuva amainara. Nervoso, olhei para os lados, notando que a rua estava deserta. Havia uma pequena árvore mais à direita, fui então me abrigar abaixo dela.

Respirando mil vezes melhor, fiquei a observar a casa do outro lado da rua. Agora podia pensar com mais clareza sobre o que tinha acabado de presenciar. O que era aquele lugar, afinal? Desde a mudança, nunca tinha me dado conta que havia algo de tão estranho por ali...

E eu vi uma garota. Sim, era uma garota no espelho do guarda-roupa. Não havia notado até então sua presença no quarto, mas a vi no reflexo do espelho... Estava confuso.

Queria saber as horas. Aqui do lado de fora, aparenta não ser tão tarde quanto eu pensava. Cadê eles, que não chegam?

Antes eu queria saber quem era ela...

Melhor não. Eu sabia exatamente o que queria, ou melhor, o que não queria: voltar para aquela casa. Aquele quarto.

Um carro se aproximou e me tirou dos pensamentos confusos. Eram eles, até que enfim chegaram! E se vissem a bagunça? Ou pior, se a vissem... Levantei-me, sentindo dores pelo corpo e tentei correr até lá. Eles já haviam entrado pela garagem.

— Pai! Mãe! — Chamei-os, entrando pela porta da frente. Sentia-me tenso. Olhava para todas as direções, só esperando para ser arremessado contra a parede novamente. Ninguém respondeu ao meu chamado. Isso não era um bom sinal.

Fui até a sala, as luzes estavam acesas. Andei devagar. Segurava minhas mãos perto do rosto, como sempre fazia quando estava nervoso.

— Filho! — Gritou minha mãe. Entrei em desespero. Corri até o pé da escada e quando estava prestes a subir correndo no intuito de salvá-la, ela apareceu lá no topo:

— Chegamos tarde, não foi? Mas trouxemos comida pra você! — de roupão, ela desceu as escadas e chegou até mim — Tomou chuva, querido? Tava aonde? — perguntou, passando as mãos em meus cabelos molhados. Eu nada respondia, estava muito confuso. Deveria contar?

Aqui não é seguro.

— Tava lá fora... Com um amigo.

— E pegou chuva pelo jeito, não é? Venha, deve tá com fome... — comentou, olhando-me de um jeito estranho. Ou será que era eu, quem aparentava estar estranho?

— Tá tudo bem, meu amor? — Chegamos à cozinha e ela pousou as mãos em meus meus ombros agora. Senti uma pontada de dor.

Temos que ir embora.

— Tá tudo bem, mãe. Só tô com fome! — Tentei sorrir, mas já sabendo que não ia conseguir, dei um beijo em seu rosto. Ela sorriu em resposta.

Tudo que eu queria dizer, não disse. Devo ter enlouquecido. Tem uma "coisa" lá no meu quarto, algo que logicamente não é deste mundo. E eu estou aqui jantando, como se nada tivesse acontecido. Devo contar, mas não consigo. Por quê?

Meu pai e Stefany chegaram minutos depois, os dois de pijama. Enquanto eu jantava, eles contavam como tinha sido lá na praia. Lamentaram ter chovido, mas passaram o tempo num quiosque bacana e na volta jantaram na casa de minha avó.

— Pensei que estivesse lá em cima, Bernardo —Falou meu pai, sentado num banco ao meu lado — Tentei abrir a porta de seu quarto, mas estava trancada.

Esforcei-me para engolir a última garfada ao ouvir aquilo. Tentei não passar as mãos em meu rosto, demonstrando meu nervosismo. Fingi limpar o queixo.

— Err... Esqueci, eu acho. Agora tenho que andar assim por causa de certas pessoas, não é? — Olhei para Stefany, indicando o falso motivo da porta trancada. Ela revirou os olhos.

— Me poupe! Eu tenho mais o que fazer! Seu quarto não tem nenhuma porcaria que me interesse, fique sossegado! — Disse e logo em seguida saiu da cozinha cantarolando.

Fui lavar meu prato, enquanto meus pais conversavam. Bem, pelo menos não viram a bagunça que está o quarto. Mas havia uma coisa mais importante para me preocupar agora.

Aonde irei dormir? E como vou dormir, depois de tudo que aconteceu...?




Onze e quinze da noite, todos foram dormir. Despedi-me de minha mãe no corredor, mas fiquei parado feito estátua, de frente para o meu quarto. A porta estava fechada. Ainda deveria estar trancada, pelo que meu pai disse no jantar. Eu não ia testar a maçaneta agora, não ia me arriscar novamente. Esperei que todos já estivessem em seus quartos e desci as escadas sem fazer barulho. Fui até o sofá e me deitei para dormir ali mesmo. Mas era óbvio que não iria conseguir fazer isso.

Na verdade, eu bem sabia o porquê de não ter contado para eles...

Mesmo aqui na sala, ainda sentia que havia perigo... Deitado, mantinha-me numa posição meio rígida, como se preparado para correr assim que ouvisse algo suspeito. Eu sou medroso pra essas coisas, um completo idiota. Coitado de alguém que dependa de mim para se salvar.

Chega, que infantilidade minha. Estou enrolando a mim mesmo! Oras, por que eu não contei logo o que aconteceu hoje à tarde?

Foi por... curiosidade. Pode ser uma atitude meio egoísta, mas é por isso que não contei, ainda. Lógico que vou contar. Se é que vão acreditar em mim.

Eu que nunca acreditei nessas coisas, eis que me aparece o quê? Um fantasma, só pode ser. Ou então... Ah, se for brincadeira de alguém!

Idiota. Relaxei no sofá. É ridículo, mas como explicar?

— Olhe, quer saber... Preciso ver pela segunda vez! Ver para crer! — Sussurrei alto para mim mesmo. "Se houver a segunda vez, é claro", pensei em seguida.

Levantei-me do sofá decidido. O medo não fazia mais parte de mim — pelo menos, não agora . Tinha que agir em silêncio. Iria lá somente para verificar, só isso. Estava até liberado para dormir aqui na sala mesmo. Mas eu tinha que descobrir a verdade. Era melhor pra mim. Era o melhor para a minha família.

Podia ter sido alguém que invadiu a casa e como estava escuro, não pude ver bem quem me golpeou.

Mas podia ser outra coisa também.

Subo as escadas lentamente, sem acender uma luz sequer. Isso contribuía para o pânico vir surgindo, mas eu me proibi de sentir medo de novo.
Posicionei-me em frente ao meu quarto, e para minha surpresa, a porta estava entreaberta como hoje mais cedo. Somente uma fresta. Aproximei-me para espiar e então a vi.

Ela estava próxima à varanda, que estava aberta. O vento balançava as cortinas brancas, e seus cabelos também. O quarto, a esta hora da noite, tomara um tom azulado, devido à luz da lua refletindo na piscina. Isso a fazia mais branca. Seu cabelo era claro, parecia ter um tom avermelhado. Usava um vestido longo, até os joelhos... Ela olhava para o céu, eu acho.

Era uma garota e ela estava realmente ali. Mas de alguma forma, sua imagem me parecia enevoada, não sei como explicar.

As cortinas indicavam agora que o vento havia ficado um pouco mais forte, então senti o cheiro de terra molhada. O som da chuva chegou e a garota virou seu rosto repentinamente em minha direção. Seu olhar sério me atingiu e fui novamente sugado para o interior do quarto. Não sei como não gritei.

Mas olhando mais de perto agora, poderia ter motivos suficientes para gritar. Ela não era real. Ou era, tanto faz. Sua imagem era vazada. Eu podia ver o outro lado, no caso, a cama. Vendo o quarto agora, percebi que ele não estava mais bagunçado, tudo estava na mais perfeita ordem.

A garota me olhava inexpressiva, mas eu podia jurar que não tinha bons pensamentos ao meu respeito. Ela levantou sua mão direita e no mesmo instante, senti-me sufocado. Ali no chão, não conseguia entender porque ela estava... me enforcando. Senti como se suas mãos estivessem ao redor do meu pescoço. Ela concentrou seu olhar em mim.

— Ver para crer. — Ela enfim, falou. Meu pescoço fora mais apertado, eu me contorcia no chão. Minhas mãos procuravam em vão tirar o que me sufocava, mas não havia o que tirar. Eu estava ajoelhado diante dela. Esta, me vendo agonizar, pendeu a cabeça para o lado. Parecia fingir pena ou estava apenas assistindo. E continuou:

— Por que só ver, se você pode sentir? —Em seguida, algo me suspendeu um pouco mais para cima. Minhas vistas estavam quase escurecendo.

— Por favor... – Implorei.

— Este quarto é meu, você é o intruso! Para o seu bem, que não haja a terceira vez.

Assim que ela proferiu essas palavras, fez um gesto com a mão que mantinha em minha direção, o que me fez ser lançado para fora do quarto. Praticamente fiz um strike com o corrimão das escadas. Bati tão forte que segundos depois, apaguei. A porta do quarto foi se fechando aos poucos, restando somente a escuridão para mim.

Acordei de manhã cedo, sentindo um cutucão na perna esquerda. Muito dolorido, olhei para cima e vi Stefany. Ela parecia estar pensando: "O que este doido está fazendo dormindo aqui, no meio do corredor?"

— Me deixa em paz... — Foi o que consegui dizer.

— O que tá fazendo aí? Virou o mascote da família, é? — provocou, com as duas mãos na cintura. Levantei-me, ignorando-a totalmente. Incrível como ainda consegui ficar de pé. Na verdade, um pouco curvado por conta da dor.

— Vou falar pra mamãe que você anda "sonambulando" por aí! — e voltou para o seu quarto.

— Faça o que você quiser, só cale a boca... — Falei com minha nova voz de grogue. Sentia-me muito mal. Eu não tinha dormido, mas sim, apagado. Fui até a porta do meu quarto e quando toquei na maçaneta, lembrei-me da noite anterior.

"...que não haja a terceira vez."




Mais um capítulo entregue!

Parece que Bernardo perdeu o quarto dele... Acabou descobrindo que o quarto já tinha dono, ou melhor dizendo, dona!

Veremos o que vai acontecer...

Amplexos,

Babi ☆

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