Capítulo 14
✧ Encrenca é com ela ✧
Olhei ao meu redor à procura de Amélia, pois já tive um "vislumbre" do que ela era capaz de fazer. Por mais que eu estivesse com ódio daquele moleque, não me sentiria bem se algo acontecesse com ele. Aliás, com ninguém. Ventou forte novamente e o rapaz fora puxado das mãos das pessoas que tentaram segurá-lo em vão: estava sendo arrastado em direção ao mar. Ele gritava apavorado, e não era pra menos. Corri o máximo que pude e o alcancei, o segurei pelas pulsos. De repente, nossos corpos foram arremessados de volta à praia. Ofegantes, olhamos incrédulos um para o outro. Eu sabia o que estava acontecendo, mas ele não, é claro. Em outro momento, teria achado a situação bem engraçada. Apavorado, o cara fugiu junto com a sua turma. Carina e Giovani vieram ao meu encontro:
— Vamos!— Eles me ajudaram a levantar da areia e saímos depressa da praia.
✧
Um tempo depois, cheguei em casa às escuras. Estava em um estado deplorável, sujo de areia da praia e todo encharcado. Entrei sem fazer muito barulho, segurando meus chinelos. Esbarrei-me em alguma coisa na sala e meu pé doeu demais, porém incrivelmente não balbuciei um pio. Subi as escadas com cuidado, entrei no quarto e me joguei do jeito que estava na cama. Sentia-me tão dolorido e cansado que apaguei momentos depois. Adormeci com a imagem dos cabelos esvoaçantes de Amélia na mente. A noite passou voando.
Acordei com batidas fortes na porta, e com os gritos de minha mãe.
— Não entre...! — Não soube direito o que responder, fiquei nervoso. Ela entrou de supetão:
— Bernardo! Onde você se meteu?! Sujou a casa inteira de areia, lama, eu sei lá! Você saiu que horas?
— Então...
— Quem autorizou que saísse? Você tem dezesseis anos! Dezesseis!
— Desculpa! Eu vou limpar tudo...
— Eu sei que vai limpar! E quero bem limpo! Mas também quero que não saia para vadiar! O que deu na sua cabeça?! Olha o que você fez com a sua cama! Meu Deus... Você tá proibido de sair de casa, é do colégio pra casa, ouviu?! — O que eu ia dizer? Estava todo errado mesmo. De repente, ela se aproximou e puxou o meu rosto para si, visivelmente chocada:
— Quem te bateu? Meu Deus do céu, Bernardo! Se metendo em briga? Quem te fez isso, meu filho?!
— Não foi nada...
— Como não foi nada?! — Ela me analisou mais um pouco e suspirou — Arrume toda essa bagunça, tome seu banho e desça. Lá embaixo a gente vê esse seu olho roxo! — Estalou a língua com olhar de reprovação e saiu do quarto. Sentia-me um pouco envergonhado. Já estava velho demais para receber broncas assim. Olhei para o estado deplorável em que estava a minha cama. O lençol todo sujo de areia. O lado bom é que hoje já era sábado, dia de faxina de qualquer forma. Lembrei-me de Amélia. Olhei ao redor, prendendo a respiração para captar o menor ruído. E foi então que me dei conta que eu havia dormido no quarto que tanto queria evitar. As portas da varanda estavam perfeitamente fechadas. Tudo aparentemente normal. A bagunça de sempre... Onde ela estaria?
Levantei-me e recolhi a roupa de cama para jogar dentro do cesto de roupa suja do banheiro. Chegando lá, fechei a porta que dava acesso ao quarto de Stefany. Quando ia tirar a camisa, olhei-me no espelho. Eu estava um lixo! Parei e pensei... Será que Amélia já tinha me visto sem roupa? Como nunca pensei nisso antes?! Toquei um lado do meu rosto e gemi de dor, devido ao inchaço. Depois passeei as mãos pelos meus cachos. Quer saber? Problema dela se me ver pelado. Vou deixar de tomar o meu banho por causa dos outros?
Entrei no chuveiro e deixei meu corpo relaxar na água quente. Mas por alguns momentos, olhava pelo vidro do box fumê para ver se tinha alguém me espiando.
Terminado de me arrumar, saí do quarto para ir atrás de uma vassoura. Mas vendo o estado em que deixei as escadas e a sala, decidi pegar outros utensílios também. É, parece que a faxina começou cedo para mim hoje.
Enquanto estava limpando os degraus da escada, Stefany passou por mim com um sorrisinho no rosto. Que raiva que eu tenho dessa guria, quando zomba assim de mim. Minha mãe apareceu da porta da cozinha:
— Ei! Por que não veio aqui ainda, pra eu ver esse teu machucado?
— Você disse que era pra arrumar essa bagunça primeiro, esqueceu? — Ela olhou de longe o meu trabalho e deu as costas.
Aproveitei que já estava ali mesmo e fui arrumar outras coisas. Uma hora ou outra lembrava da fúria de uma certa ruiva...
Horas mais tarde, parei para almoçar. Entrei na cozinha morto de fome, mas senti alguém puxar o meu braço, para que eu sentasse na cadeira. Era a minha mãe, com uma caixinha de primeiros socorros. Sentou à minha frente, com o rosto bem sério, e começou a olhar o meu machucado.
— Vai ter que colocar gelo. Tá inchado... Depois que desinchar, passe esta pomada — disse de forma seca, mostrando um medicamento e guardando-o de volta à caixinha. Em seguida, amaciou o tom de voz:
— Filho, eu já tive a sua idade. Além de mãe, eu sou sua amiga também. Você poderia ter me contado que iria sair...
— E você teria deixado?
— Provavelmente, não! — confessou, dando um leve sorriso — Sei que já moramos aqui antes, mas você era muito pequeno! Não deve lembrar de muita coisa. Os tempos mudaram, hoje em dia até no interior tem casos de violência, assalto. Não estou brincando! — Senti um puxão no cabelo quando suspirei com o seu discurso.
— Ai, mãe! Já entendi! — Ela quem suspirou agora com a minha resposta. Perda de tempo esse tipo de conversa comigo.
— Mal voltamos pra esta cidade ... E meu menino cresceu a ponto de aprontar uma dessas! E pra onde você foi, afinal de contas? — Ela se levantou e recolheu a caixinha de primeiros socorros, colocando-a debaixo do braço.
— Fui para uma festa na praia com o pessoal da escola... Um Luau, nada demais.
— Sei! — Ela abriu o congelador e assim que tirou uma bolsa de gelo, jogou-o no meu colo.
— Quando seu pai chegar de viagem, vai saber de tudo! — Olhei-a com raiva contida. Mas é um saco ser menor de idade, viu? Acho que nem passando dos dezoito anos vou deixar de ouvir sermão.
Ela foi saindo da cozinha, com um dedo indicador na minha direção:
— Vou passar na sua avó! Daqui a pouco tô de volta, ok? Sem rua hoje, mocinho!
— Só hoje? — Perguntei em vão. Ouvi ela se afastar e bater a porta da rua. Toda ação gera certas consequências, fazer o quê.
Enquanto eu viajava na maionese, Stefany apareceu e foi até o fogão mexer nas panelas atrás do almoço também. Estava entretida ouvindo musica no headphone, nem se quer olhou para mim. Ela é outra que também anda mudando... Talvez a minha mãe tenha razão mesmo. A garota fez seu pratinho nada modesto e saiu do meu campo de visão. Ainda bem, agora eu iria comer em paz. Ou talvez, não por muito tempo.
Estava sentado, com um olho no prato de comida e outro no celular. De repente me deparei com um prato rodopiando por cima da mesa, girando em seu próprio eixo. Devagar, quase num movimento hipnótico. Nessas situações sempre prendo a respiração por alguns instantes. Olhei rápido ao meu redor à procura da garota que provavelmente veio para me causar problemas. Encontrei-a sentada na bancada de granito, encarando-me de uma forma estranha. Cara, ela realmente existe! Nunca vou me acostumar com isso...
— Você me causou problemas! — Foi o que consegui dizer. Ela trocou a expressão do rosto para surpresa misturada com deboche.
— Eeeu?! — questionou, enquanto o prato continuava rodopiando à minha frente — Você se meteu nisso sozinho! Sua sorte era eu estar lá! — Fiquei um pouco confuso. Estava conversando com uma fantasma e não sabia quais argumentos usar. Espera...
— Calma, aí! Foi você quem disse que eu não deveria ficar enfurnado em casa!
—Mas eu não falei pra sair sem o conhecimento dos seu pais! — Lá vem ela falando como adulta aqui. O prato já estava começando a me irritar também.
— Por que não fala como alguém da sua idade? Você se acha superior, é? — Amélia revirou os olhos. De repente, deu-me um estalo:
— Por que você apareceu lá? Tava me vigiando? Não tem o que fazer não? — Ela me olhou com ódio e logo em seguida, o prato rodopiou no ar e foi lançado na minha direção. Se eu não tivesse me abaixado, o prato teria me arrebentado ainda mais a cara, mas foi parar na parede ao fundo.
— Você é doida?!
— O doido aqui é você! Sai de madrugada com um monte de irresponsáveis, todo mundo com um copo de bebida na mão — Semicerrei os olhos, indignado — E ainda chama outro rapaz pra briga e a doida sou eu?!
— Eu não tava bebendo! Eu não bebo! Nem eu e nem meus amigos!
— Você teve é sorte de eu estar lá! Seu ingrato! — Com as mãos, ela fez levitar outros pratos, que foram saindo um por um do armário e foram todos sendo lançados em minha direção. Saí correndo agachado, para fora da cozinha. Ouvi ela gritar de lá:
— Tá vendo que é covarde? Volte aqui!
— Não tenho medo de você! — Assim que respondi da sala, dei meia volta para sair de casa e dei de cara com ela à minha frente, num passe de mágica. Gelei a espinha.
— Eu não provoquei aquele cara de graça! Ele tava perturbando uma menina da minha sala... — Aquilo desarmou Amélia, aparentemente. Da fúria, seu rosto expressou uma cara de desdém e ela levitou para longe de mim. Voltei para a cozinha e visualizei o estrago. O pior é que nem poderia me dar ao luxo de reclamar mais, pois obviamente eu ainda tinha uma vida a perder, ao contrário dela. Mas a minha língua foi mais rápida que meus pensamentos:
— Garota, você é muito esquentada! Minha mãe vai me matar se ver esse tanto de prato quebrado! — Olhei para trás e a vi sentada no sofá, com um sorrisinho torto no rosto — Não posso nem almoçar em paz! Podia ter me machucado, se eu não fosse rápido...
— Engraçado que você não foi tão rápido assim na hora do soco, né?
— Olha só... - Apontei o dedo indicador em sua direção, afrontando-a.
— Tá falando com quem? — Olhei para a escada que dava acesso ao primeiro andar e vi Stefany me encarando. Estava com o headphone pousado no pescoço, e não tinha o prato do almoço em suas mãos. Se ela entrar na cozinha e ver a bagunça, minha mãe me deserda de vez.
— Caramba! Tô falando sozinho mesmo! Ou vai dizer que nunca fez isso? Vá cuidar da sua vida!
— É, parece que bateram demais na sua cabeça, né maninho? — Ela subiu as escadas rindo da minha cara. Olhei para o sofá e constatei que a ruivinha tinha sumido . Já eu tinha que dar um sumiço nos pratos quebrados antes da minha mãe chegar. Até perdi a fome depois dessa.
Limpei tudo e coloquei os cacos num saco de lixo, levando para fora de casa e assim não dar chance de minha mãe desconfiar. Tomara que ela não dê por falta de alguns pratos...
O resto do dia transcorreu dentro do normal. Para a minha sorte, meu pai ainda não havia chegado de viagem. Poderia dormir à noite um pouco mais tranquilo, pelo menos até amanhã.
Oiee, deixando este capítulo fresquinho...
Assistindo esse embate entre Bernardo e Amélia daqui da minha cama, peguei mais uma gripe 🤧😷
Um queijo e um beijo procês
Babi ☘️
Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top