CAPÍTULO XXVI - O VERMELHO DE PÁRIS

Na manhã seguinte, acordo e vou ao hospital com Heitor. O braço já estava doendo devido ao gesso molhado. Antes de ir, dou uma olhada no celular procurando alguma mensagem de Élio, mas nada encontro.

Heitor me deixa no hospital e vai trabalhar. Fico de ligar para ele assim que estiver terminado o procedimento. Isso não demora muito, já que é particular, pago pelo Sr. Geraldo, de novo. Se continuar assim, Heitor vai ter que trabalhar lá até os 80 anos.

Na saída encontro o seu Hyun um pouco agitado.

- Bom dia, Senhor Hyun. Tudo bem? – me aproximo e pergunto.

- Páris! – Ele parece muito contente em me ver - Que bom ver você. O que faz por aqui?

- Vim trocar o gesso...

- Tenho uma reunião com uns fornecedores – ele me interrompe - Você pode ficar com o Lucas? – ele fala ajeitando os óculos no rosto.

- Lucas está aqui? O que aconteceu? Ele está bem? – eu pergunto preocupado.

- Segundo a enfermeira, foi só um resfriado. Ele estava delirando de febre ontem à noite, então o trouxe pra cá, mas já foi medicado e está bem melhor, só esperando receber a alta. Você pode esperá-lo e levar para casa? – ele fala com sotaque coreano enquanto digita no celular.

- Claro. Sem problemas, senhor Hyun.

- Ele vai gostar de ver você, principalmente depois que passou a noite toda chamando seu nome. Vão de Uber e tomem cuidado, qualquer coisa me liguem. Assim que terminar a reunião, volto para casa – falou Senhor Hyun se afastando.

Como ele passou à noite me chamando, ele não estava delirando de febre? Será que ele estava sonhando comigo? Fiquei curioso. Vou para o quarto onde Lucas está.

- É aqui que estão precisando de um enfermeiro? – pergunto abrindo a porta.

- Páris! – ele olha sorridente. – Como soube tão rápido?

- Vim trocar o gesso e encontrei seu pai na recepção. Como você está?

- Tô bem. Foi só um resfriado. Talvez devido à chuva que pegamos.

- E como foi o sonho que teve comigo? Seu pai disse que me chamou a noite – falo brincando.

- Tá mais para pesadelo – ele fala ruborizando, para um pouco e continua – sonhei que ainda estávamos perdido na mata.

Estamos rindo quando o médico entra no quarto, conversa com Lucas e o libera, Senhor Hyun já tinha assinado a alta antes de sair. Mando uma mensagem para Heitor explicando tudo e pegamos o Uber. Em casa, Lucas pede comida por um aplicativo, almoçamos e comemos o bolo do seu aniversário de sobremesa. Depois vamos estudar para a competição que será daqui a alguns dias.

Algumas horas depois, nos deitamos um pouco para relaxar. Lucas fica olhando para o teto. Eu deito de bruços, coloco a cabeça no travesseiro e fecho os olhos.

- Páris, você é virgem? - pergunta Lucas.

- Sim! E você? – pergunto por impulso.

Ele para um pouco, talvez pensando se deveria responder. Finalmente fala:

- Eu também sou! Você pensa como será sua primeira vez?

- Às vezes - abro os olhos e fico encarando ele. - Penso em como vai ser, com quem será ou se vai ser prazeroso.

- Eu também - ele pensa um pouco e pergunta - Você pensa em transar com uma mulher?

- Não. Não tenho curiosidade, nem vontade.

- Já viu alguém pelado? - cada pergunta era antecipada por vários minutos de silêncio - Quero dizer pessoalmente.

Conto-lhe o que aconteceu com o João Pedro há três anos. Nunca falei para ninguém, mas confio no Lucas. E estamos nos abrindo um para o outro.

- Irado! - ele exclama assim que termino de falar.

- Já teve alguma experiência assim? – pergunto.

- Não. Eu não sei se eu teria coragem. Teria que ser uma pessoa que eu confiasse muito.

- Sei como é – falo desconfiadamente.

Deito e começo a pensar no Élio, ele parece ser bem mais experiente. Será que ele já teve muitas aventuras? Com homens ou mulheres, ou ambos.

- Vou tomar banho - Lucas levanta e vai ao banheiro.

Meia hora depois que Lucas está no banho, Senhor Hyun chega e me agradece por ter feito companhia a seu filho. Ele se oferece para me deixar em casa e eu aceito a carona.

Os dias passam voando e quando me dou conta as férias terminam. Élio não respondeu a nenhuma das minhas inúmeras mensagens de texto que mandei para ele, nem apareceu aqui em casa. Tenho conversado com o João Pedro pelo WhatsApp, evito conversar pessoalmente com ele desde o piquenique, mas, mesmo nas redes sociais, não tocamos nesse assunto. Hoje ele volta para o colégio militar.

- Oi - ele fala da porta do meu quarto - só quero me despedir de você.

Ele entra e me dá um abraço, correspondo sem jeito e constrangido, antes de sair ele fala:

- Se cuida!

- João Pedro! - eu chamo antes dele sair.

Ele para e me olha. Me arrependo de ter chamado e já não quero mais falar o que tinha em mente. Mas a curiosidade é maior.

- O que aconteceu no acampamento? – pergunto de uma vez.

Ele volta e senta na cadeira da mesa de estudos.

- Para você conseguir entender o que eu falei, terei que lhe contar algumas coisas - ele começa enquanto eu sento na cama - Você lembra do que aconteceu entre a gente?

Ele se refere ao tempo em que éramos crianças, quando quase sempre brincávamos os três juntos: meu irmão, ele e eu. Mas, algumas vezes, eles me mandavam pra casa e iam brincar sozinhos num quartinho que ficava nos fundos da casa dele. Eu sempre ficava curioso para saber que brincadeira eles faziam lá, mas nunca tive oportunidade. Há três anos, eu já tinha meus treze anos. Vi o João Pedro entrar sozinho. Fui atrás dele sem fazer barulho. Minha intenção era assustá-lo. Quando entro gritando, vejo ele em uma situação comprometedora.

- Poxa, Páris, eu tava quase lá - ele falou e continuou fazendo. Quer fazer também? Tem revista ali - ele falou apontando.

Peguei a revista que ele indicou e comecei a folhear, havia imagens de mulheres nuas em várias posições. Mas eu não sentia nada. Olhei para ele e comecei a sentir algo estranho.

- O Heitor faz isso também? - perguntei curioso.

- Sim - ele respondeu sem parar o que estava fazendo - Todo homem faz. Você nunca fez?

Balancei a cabeça negativamente. Ele parou e sorriu pra mim.

- Se quiser experimentar, é só fazer... O que eu estou fazendo - e recomeçou.

Tentei fazer igual, senti um incômodo e parei

- Quer ajuda? - ele perguntou se aproximando - eu faço em você e você faz em mim.

- Eu não - respondi rápido - isso é muito... gay.

- Claro que não. Os garotos fazem isso direto. É só "brotheragem".

- Você já fez isso com Heitor?

Ele pensou um pouco, depois respondeu:

- Sim. Já fizemos várias vezes.

Então eu aceito, e fizemos aquela "mão boba" até o final.

Ele sorriu e falou:

- Bem-vindo ao mundo da sacanagem, Páris! - e me dá um selinho.

- Você ainda lembra? - pergunta ele novamente me tirando dos pensamentos.

- Sim. Eu lembro - respondo com vergonha.

- Eu menti para você, eu nunca tinha feito aquilo com Heitor. Depois daquele dia eu não parei de pensar no que fizemos. Eu tinha gostado mas parecia errado, e eu tive medo do que iam pensar de mim. Então reprimir, apesar da vontade de estar com você fosse cada vez maior.

- Então aconteceu de meus pais me mandarem para o colégio militar - ele senta na cama ao meu lado. - Lá eu tive várias experiências. E, apesar da rigidez da escola, comecei a aceitar isso como parte de mim. Mas aí eu me toquei de uma coisa. Nenhuma experiência que tive lá, foi tão mágica quanto a nossa.

- Agora eu estou com o Élio. E eu o amo – eu falo.

- Foi o que percebi - ele continua. – Mas uma coisa que aprendi nessa vida é que não dá pra desistir sem lutar, eu tinha que te mostrar que também gosto de você. Cabe a você fazer a escolha.

- E o que você falou para ele? – Pergunto.

- Nada demais. Apenas o provoquei dizendo que você estava mais gostoso do que quando lhe conheci.

- Você é louco. - Levanto da cama - Lógico que ia dar confusão.

- Só quero mostrar que você tem outras possibilidades. Eu ou aquele oriental que não sai do seu pé, ou outro garoto legal. Não se prenda tão rápido, ainda há muita coisa pra você viver.

- Talvez! – respondo pensativo – mas sinto que estou onde deveria estar.

- Se ele te machucar, você tem meu número - ele se aproxima e segura minha mão - pode mandar mensagem que eu terei o maior prazer de vir até aqui quebrar a cara daquele playboyzinho.

Apenasdou um sorriso e tiro minhas mãos das dele. Ele se despede e sai.

Fico pensativo sobre tudo o que ele disse. E ainda estou preocupado com o Élio. Organizo meu material escolar com esses pensamentos na minha cabeça, em seguida vou dormir. Amanhã retornam as aulas.

Eu chego atrasado no primeiro dia de aula. O celular não alarmou e tive que sair às pressas. Vou para o lugar de sempre e encontro Guilherme sentado na mesma mesa com Élio, já que Joseph está sentado com Roberta. Assim que me vê Gui faz menção de levantar mas Élio segura no seu braço e o impede. Ele olha pra mim com uma cara de desculpas. Sem entender nada, eu vou sentar com o Lucas que, como sempre, está sozinho.

- Vocês estão brigados? – ele pergunta baixinho.

- Acho que não estamos mais "de nenhuma maneira" – respondo olhando para Élio. Ainda tentando entender o que está acontecendo.

A Professora Patrícia inicia a aula falando o quanto estava triste com o Instagram fake criado para denegrir a imagem "dos colegas", fala sobre a importância das mídias na sociedade atual, contanto que usado de forma correta. E finaliza sua discussão passando um trabalho valendo nota.

Temos que usar as redes sociais para fazer algo bom. Coisas que possam ajudar as pessoas. Postamos e marcamos a professora. Os trabalhos podem ser individuais ou em duplas. Thais, a professora de Matemática, interrompe a aula e fala:

- Com licença, posso levar Lucas e Páris?

- Mas é claro. Boa sorte, meninos. E não se preocupem com esse trabalho. Estão dispensados.

Thais nos leva para uma sala. Lá estavam dois professores e os outros selecionados para a competição: duas alunas do segundo ano e um casal do terceiro.

- Vocês foram escolhidos por serem teoricamente os alunos mais esforçados das suas turmas - ela começa a falar. – Dentro de alguns dias, é a primeira seletiva e eu deixei vocês livres para montarem seus planos de estudos. Mas, antes da seleção, quero saber se cumpriram a parte de vocês.

Ela faz um sinal com a mão chamando os outros professores. E continua:

- A partir de agora, cada dupla terá um cronograma de estudos e será acompanhada por um professor. Professor Aloysius acompanhará o primeiro ano; professor Silvio, o segundo e eu acompanharei o terceiro. Além disso serei a responsável pela equipe.

Ela entrega uma pasta para cada professor e Aloysius vem em nossa direção.

- Bom, meninos, tenho aqui 50 perguntas retiradas de competições anteriores. Vamos ver quantas vocês acertam - ele disse.

No final, eu acerto 25 e Lucas acerta 20.

- Está tudo bem. – ele fala nos acalmando, depois explica sobre o evento. - São duas rodadas para chegar à final. Cada rodada com três escolas. As perguntas são sorteadas. Podem cair muitas perguntas do primeiro ano ou poucas. Vocês têm que responder o máximo possível. Mas tentem relaxar, nervosismo não é bom para o cérebro. A partir de amanhã, vamos estudar toda tarde até o dia da competição. Eu vou levar vocês para o evento, passo na casa do Páris, às 17:30 horas e depois pegamos o Lucas. Combinado?

Dizemos que sim com a cabeça. Ele já ia levantando quando fala:

- Mais uma coisa: Vocês estão livres hoje à noite? Podemos ir ao shopping, vem um filme, tomar um sorvete.

- Completamente livres – eu respondo e Lucas concorda com a cabeça.

À noite, Professor Aloysius vem nos pegar, passa primeiro na minha casa, já que a do Lucas fica mais próximo do shopping. Assistimos um filme e depois vamos para a praça de alimentação. Conversamos sobre vários assuntos divertidos. O mais estranho é quando o professor pergunta:

- Páris desculpe a indiscrição, mas você conhece seu pai?

- Não - respondo.

- Mas você sabe quem ele é? – ele insiste.

- Não. Nunca o vi.

- E sua mãe? Não fala dele?

- Ele a abandonou sozinha, sem emprego, sem ter onde morar, grávida e com um filho de dois anos. É só isso que eu preciso saber sobre ele.

- Tudo bem. Desculpe ter tocado no assunto. – ele se desculpa e muda de assunto.

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