Sala de visitas
— Você é o pai de Kei.
— Kei? — o assassino ficou surpreso com o apelido e então respondeu: — É.
Silêncio imperou na sala, Enji não parava de se surpreender com a semelhança entre os dois, mas não demonstrava. O nariz era diferente, um pouco mais reto e Enji tinha a impressão de que Kei e o pai tinham a mesma altura.
As algemas chumbadas na mesa de metal que seguiam até o pescoço do homem era um aviso constante e um fortificador do silêncio entre os dois. Mas nada se comparava aqueles olhos, era ali que estavam os vácuos de humanidade do homem e fazia Enji acreditar que alguém que parecia franzino poderia ser realmente perigoso.
— Keigo me contou o que você fez. — Enji quebrou o silêncio.
Kyo mexeu levemente o pulso e se reencostou na cadeira, suas correntes tilintaram. Ele abriu os lábios por um instante e então falou:
— Segundo os policiais e juízes, eu fiz muita coisa. Outras ainda estão em investigação. Você tem que ser mais específico.
— Você se diz inocente? — Enji ergueu uma sobrancelha incrédulo e transtornado.
— Estão gravando nossa conversa. — Kyo apontou com o queixo para a câmera no canto superior da sala. — É claro que sou inocente. — Keiichi Kyo sorriu para ela.
— Não estão gravando, paguei pra não gravarem.
— Os mesmos métodos da Comissão. — Keiichi Kyo sorriu. — Eles compraram a sua empresa? Não fiquei sabendo.
— Acho difícil saber de qualquer coisa fora daqui no seu caso.
— Aaaah, eu sei de muita coisa. — Keiichi Kyo apoiou os cotovelos na mesa.
— Tipo o quê?
Keiichi Kyo segurou um risinho, ele gostava de rir demais.
— Que Todoroki Enji jamais venderia sua amada empresa e que a Comissão está muito fodida. — Ele se inclinou nas últimas palavras para Enji e voltou a se reencostar na cadeira. — Mas nada que não possa ser resolvido com muito dinheiro que é o que a Comissão tem de sobra.
— Os guardas lhe contaram?
O criminoso riu.
— Está em todos os noticiários. Os dados da Comissão foram hackeados e vazados. O hacker vazou toda a vida de Kei e outras pessoas. — Enji afirmou.
— Não, não. — Kyo sinalizou com o indicador. — Não foi um hacker. Foi uma pessoa de dentro.
Enji fungou desprezando a hipótese:
— É quase impossível alguém entrar lá sem autorização ou sem ser notado. A pessoa tinha acesso a todos os arquivos e os pegou.
— Como sabe? — Enji repudiou novamente.
— Porque eu que fiz o sistema de segurança da Comissão assim como o seu. — Kyo sorriu lânguido.
— O que?!
Ele expandiu o sorriso:
— Várias empresas de tecnologia da informação copiaram as minhas bases e engines sem me dar qualquer centavo. Acredita? Bom, elas só facilitaram minha vida de qualquer forma.
— Você nunca mais chegou perto de um computador. — Enji rebateu incrédulo.
— As pessoas acreditam mesmo nisso? — Kyo parecia querer morrer de rir.
As sobrancelhas do empresário franziram.
— Por que você acha que não me enforcaram ainda? Falta de corda? Eu faço há anos trabalhos para a Comissão e se um dia ela me largar, ainda tenho o trabalho para o governo. Redes internacionais online de crimes.
— Isso é ridículo.
— É provável que eu morra depois dos seus filhos. — Dessa vez Kyo não conseguiu segurar o riso.
Enji estava atônito com as loucuras que Kyo falava. Não podia nem fingir que eram mentiras.
— Eu posso ajustar o sistema de segurança da sua empresa se quiser. — Kyo sugeriu. — O seu é uma cópia bem malfeita.
— Você tentou dar um golpe na minha empresa.
— Não tentei — Kyo se defendeu —, fui preso antes e o seu sistema atual foi depois disso.
— Você não parece mais tão fodão agora.
Keiichi Kyo deu de ombros:
— É, eu meio que exagerei com o lance de matar yakuza.
— Não há lugar seguro no Japão pra você. — Enji leu as notícias, haviam vários grupos atrás de Keiichi Kyo.
— Só a prisão. — ele sorriu. — As pessoas na fila da morte ficam em celas individuais separadas de outros presos, sabia?
Enji entendeu perfeitamente o que o criminoso.
— Você ainda vai passar sua vida na cadeia.
Keiichi Kyo deu de ombros sereno.
— Eu tenho uma tv na minha cela.
— Como baixaram tantos arquivos sem ninguém perceber? — Enji ainda de braços cruzados o acusou.
— Não baixaram de uma vez, foi um trabalho de formiguinha. Paciente. E por anos. Mas eu avisei que baixar por mais que tenha criptografia era um problema.
— Por que expôr Keigo?
— É uma boa pergunta. Mas várias pessoas também foram expostas... ou eram para ser ou tinha uma jogada pessoal por trás.
Kyo suspirou e complementou:
— É difícil responder.
— Keigo tem uma historia que sem dúvidas chamaria muita atenção. — Enji olhou para Kyo de cima a baixo.
— O que torna mais difícil responder. — Kyo sorriu como se não tivesse nada a ver com isso. — Ainda mais que quem vazou não tinha nada contra Keigo. Pelo o que me contaram.
Enji prestou muita atenção. Kyo percebeu, seus olhos brilharam ácidos e ele umedeceu os lábios antes de abrir o sorriso e perguntar:
— Quer saber quem foi?
Enji não respondeu, era tudo o que Kyo esperava.
— Foi Nagant. — o criminoso afirmou simples.
Sabia quem era Nagant, ela era uma das profissionais mais competentes que conhecia. Ilibada, era inacreditável. Contudo, há algum tempo não ouvia nada sobre ela no meio.
— Por que ela faria isso? — Enji questionou sério.
— Por que eu matei tantos yakuza sabendo que ia me ferrar em algum momento? Por que você veio aqui me dar o prazer desta visita? Às vezes a pessoa só é doida.
Kyo continuou:
— Ela sempre vinha aqui me visitar e ficar de olho para que eu não transformasse o computador em uma bomba o que não dá para fazer sem palha de aço. Traga na sua próxima visita.
— Você revela muito para alguém que não confessou nada no tribunal.
Kyo sorriu:
— Faz tempo que não recebo visitas fora da Comissão. Mas você não é o primeiro. — Indicou. — Ainda mais quando esse alguém é o meu genro.
Os olhos de Kyo cintilaram em expectativa, o sorriso parado no rosto e as mãos algemadas descansando na mesa.
— Sou amigo de Keigo. — Enji não hesitou.
— Pfff. — Kyo desprezou divertido. — Amigo? Subornou uma prisão inteira, mandou desligar as câmeras e a primeira coisa que me pergunta é se sou pai de "Kei". Grandes amigos.
Enji enrugou o nariz com raiva.
— O pirralho sempre foi — Ele ergueu o pulso e inclinou a mão pra baixo. — Não que seja problema.
— O pirralho chegou longe, hein? Conseguiu seduzir o ídolo da infância. Por que não me conta como ele fez?
— Keigo não me seduziu.
Kyo riu alto jogando a cabeça para trás. Respirou fundo e voltou a focar na conversa. Enji queria socá-lo.
— Foi você que seduziu ele então?
Uma veia dilatou na testa de Enji.
— Você é muito velho pra isso? Logo você morre e ele arranja outro.
O homem bateu os dois punhos fechados na mesa e avançou furioso para Kyo. Parou. O criminoso riu surpreso, mas não deu nenhum sinal de recuo.
— É assim que você trata seu sogro?
Respirou fundo e sentou-se de volta na cadeira.
— Me contaram do histórico do pirralho. Cuidado, cornão.
— Quem contou?
— Hahaha, esse prazer você não terá. Mas o pirralho é obcecado por você desde sempre. — Deu de ombros. — Por que se preocupar?
Enji voltava a si, sentia o estresse esquentando sua cabeça e saindo pelas narinas.
— Kei me contou várias coisas sobre você. — Enji começou.
— Vocês estão sérios, hein?
Ignorou e continuou:
— Você fez o que ele me disse?
— O que ele disse? — Kyo relaxou mais na cadeira.
— Goro.
— Sim. — Kyo nem hesitou.
A frieza dele assustou, mas não surpreendeu Enji.
— Fez Kei ajudar com a lona?
— Sim. — Kyo respondia como se fosse um jogo de verdadeiro e falso. — Ele se divertiu.
Enji imaginou Kei andando descalço sobre as sacolas e usando fita para grudá-las uma na outra.
— E os baldes?
— Sim.
Enji ficou enojado.
— Você levou uma facada?
— Sim.
— Satoshi?
— Tudo o que Keigo contou é provavelmente verdade. — Kyo ficou entendiado. — Por que veio aqui? Quer saber se ele não mentiu pra você?
Enji não respondeu.
— Eu disse para ele que não se pode contar com ninguém. — Kyo falou distraído. — Satoshi tem sequelas dos tiros, não é? Ou foi muita má sorte minha ele sair ileso?
— Você atirou nele na frente de Kei.
— Por que falar o que já sabe? Falei um monte, espero que retorne o favor. Satoshi tá fodido? Sim ou não?
— A Comissão ainda tem negócios com você. — Enji repugnou. — Agora todos sabem que tipo de empresa são.
O presidiário sorriu como se tirasse um ás da manga:
— Eu sei um monte de coisas da Comissão, o que vazou é só a ponta do iceberg, se acontecer qualquer merda comigo toda a merda deles vai ser jogada no ventilador. É um acordo mútuo.
Enji surpreendeu-se e perguntou:
— Como o que?
— O único jeito de eu trair a Comissão é se alguém me tirar daqui vivo.
— Quanto você quer?
Kyo suspirou em divertimento:
— Dinheiro não vale nada aqui. E eu tenho dinheiro de sobra fora.
Os olhos de Kyo eram como um pântano ácido, sua expressão calma não escondia os perigos no fundo.
— Por que não atirou em Kei? — Enji perguntou.
Algo nadou nas águas paradaa daquele pântano agitando levemente a superfície.
— Eu não tenho ideia do que você tá falando.
— Você não atirou nele. Por quê?
— Ainda não tenho ideia do que você tá falando. — Kyo repetiu apático.
— Não tem interesse em saber dele?
— Nós três sabemos — respondia lânguido — que eu estou melhor sem ele e ele sem mim.
O empresário ficou calado por uns instantes e disse:
— Seu filho foi a única coisa boa que você fez. — Talvez a única semelhança que Enji tinha com o criminoso era essa.
Ele se levantou da mesa pronto para ir embora.
— Kei está bem. — falou encarando-o antes de partir.
Os olhos de Kyo o acompanharam. Eram um mistério. Enji não soube dizer o que viu ali.
O que acharam do encontro com o sogrão? E do capítulo? Deixem seus comentários, críticas, teorias e elogios.
Obrigado por lerem.
Até logo!
Bjinhus!
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