Retrato
Há dois dias Enji pensava no que seus filhos lhe disseram. Andava a esmo pelos corredores da casa e seus pés lhe levaram para o quarto de Touya. A porta sempre entreaberta mostrando parte do memorial.
A mão de Enji tocou na madeira da porta e a deslizou para o lado devagar.
Parado na entrada sentiu o cheiro de incenso queimado, seus pés descalços arranhavam os painéis lisos no chão. Seu coração doía.
Ele entrou no quarto, nada mudou e tudo mudou.
A cama de Touya continuava arrumada e o guarda-roupas parado no canto como um fantasma vazio. Todos os móveis eram fantasmas.
As roupas de Touya foram doadas assim como seus brinquedos, mas não tudo. No memorial, havia uma caixa de madeira com alguns itens do filho pela falta das cinzas de um corpo. Uma bolinha, a camisa preferida e uma hélice com um dispositivo que a fazia ser lançada para longe. Nenhuma dessas coisas tinha mais o cheiro do seu filho.
No centro do memorial, entre os incensos havia o retrato de Touya, sério encarando a câmera. Seu cabelo totalmente branco e rosto totalmente triste.
Esticou a mão para o retrato, pegou-o e seus dedos tocaram o vidro que protegia a foto acariciando os cabelos do filho. Touya não olhava para si, olhava para além de todos eles.
Lembrou da fumaça, do calor e do prédio desabando. O retrato era menor que a sua mão tão pequeno quanto seu filho.
Touya sempre foi muito frágil, pequeno e sensível. Poderia o segurar na palma da mão quando nasceu e seu medo de machucá-lo era imenso.
Quando todas as notas dele eram altas e recebia elogios dos professores, Enji enchia-se de orgulho só para depois lembrar do quão frágil ele era. Da quantidade de remédios que tomava. E do propósito perdido. Touya era ideal e não era.
Não serviria para a vida que Enji queria, o estresse o quebraria e o mataria cedo. Não serviria para o sonho de ser o melhor.
"Por que eu existo então?" Touya perguntava chorando.
No final, não havia razão e não precisava ter. Não precisava seguir os propósitos ou objetivos de Enji. Nenhum dos filhos precisava, queria ter entendido isso mais cedo, porém sabia que na época era impossível.
Natsuo estava certo, deveriam haver consequências para seus atos e não havia perdão. Colhia tudo o que plantou.
Fuyumi estava certa. Touya se foi para sempre e precisava deixá-lo ir. Só lhe restava seguir em frente com o que tinha. Com quem tinha.
Lágrimas caíram sobre o retrato nas bochechas do filho indiferente a sua dor. Merecia isso.
Acariciou a foto uma última vez enquanto fungava e a colocou de volta ao memorial.
Acendeu pela primeira vez o incenso do lugar, olhou para a foto entre a leve fumaça que escondia o rosto do filho, menos os olhos que continuavam sem lhe observar.
Enji faria o máximo que poderia para Touya agora.
Juntou as mãos, abaixou a cabeça e rezou pelo filho.
O que acharam da atitude de Enji? E do capítulo? Deixem seus comentários, críticas, teorias e elogios.
Obrigado por lerem!
Até amanhã!
Bjinhus!
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