Livraria

— O que foi? — Kei perguntou se aproximando devagar com as mãos nos bolsos do casaco.

— Nada. — Enji guardou o celular no bolso da calça.

— Seu filho não responde suas mensagens? — Kei sugeriu.

Enji inspirou fundo e torceu o nariz irritado, não que Kei fosse a causa da sua irritação apesar de ter grudado em si e se oferecido sem convite para acompanhar Enji, o grande motivo é que o palpite de Kei estava certo: Shoto não respondia nenhuma das suas mensagens e todo dia Enji enviava novas.

— Ele está numa fase rebelde. — Enji disse. Natsuo também estava numa fase rebelde desde os seis anos. — Não é cuidadoso em escolher as amizades. Anda com pessoas que podem atrapalhar o futuro dele.

— Ah, ele é garoto. — Kei puxou uma camisa da arara de roupas. — É normal. Vai dizer que você não andou com uma galera esquisita quando mais novo? — Kei analisava a camisa.

— Não. Eu tinha foco no meu objetivo.

— Uau. — O loiro exclamou fingindo surpresa. — Meu rei sempre tão determinado. — Virou com a roupa presa no cabide e a colocou na frente do homem para mensurar o tamanho.

— Ele tem que selecionar pessoas que o farão crescer como profissional.

— Que chatice. — Kei devolveu o cabide com a roupa para a arara e passou a procurar outra. — Às vezes tudo o que adolescente quer é andar com quem os faça se divertir.

— Não acho que aquele pirralho mal-educado de boca imunda traga alguma diversão. — Enji foi ríspido.

— Oh, você tá falando daquele com o cabelo — Kei apontou para a própria cabeça e gesticulou para o cabelo como se fosse o bagunçar —, o tal do Biribinha?

— Não sei o nome dele. — disse.

— Deve ser Biribinha. — Kei já tinha escolhido outra blusa e a testava novamente em Enji. — Ele parece engraçado de se conviver. Adolescente é assim, só quer se divertir.

— Você era assim? — Incrível como a frase estava no passado porque realmente não fazia muito tempo que Kei deixou de ser adolescente.

— Claro que não, grandão. — Kei sorriu. — Eu era sério, quieto e só andava com gente que enriquecia minha alma.

— Pare de bobagens.

— É sério, eu ficava longe de más influências.

— Porque você é a má influência.

Kei cobriu os lábios se fazendo de magoado:

— Você não se cansa de ferir meus sentimentos?

— Pare de bobagens.

Enji olhou para a blusa vermelha, não fazia o seu gosto e era muito esquisita:

— O que você acha que tá fazendo? — questionou impaciente.

— Nah, só olhando umas roupas em você, meu rei. Você fica bem de vermelho. Por que não leva essa?

— Não viemos aqui para isso. — Enji cruzou os braços sobre o peito e fez a sua expressão irritada de sempre. — Você me fez desviar do caminho porque disse que queria comprar meias. Não tô vendo meia alguma.

— Aqui não tem as que eu quero. — Kei explicou. — Tudo bem, tudo bem. — Pôs a roupa de volta na arara. — Vamos para o seu destino, grandão. Mas a blusa ficaria bem em você.

— Já tenho roupas o suficiente. — Enji matou o assunto e se pôs a andar.

Mas é claro que Kei não o deixaria morrer sem um último suspiro enquanto acompanhava o homem:

— Ternos, blusas sociais e camisas pólos. Poderia tentar um novo visual além dessa variação de pai de família, pastor e agiota.

— Do que você me chamou?

— De gostoso. — Kei sorriu.

— Não foi isso o que eu ouvi e pare de falar essas coisas em locais públicos.

— Ué, se você ouviu por que perguntou?

— Foi um erro permitir que você viesse junto. — Enji meneou.

O garoto agarrou seu braço todo feliz e disse exalando satisfação:

— Foi nada, grandão. Estou aqui para te ajudar.

— Não pedi sua ajuda. — Nem adiantava empurrar Kei para longe do seu braço pois o garoto voltava como um câncer. Péssima comparação. Agora lembrou de Yagi esmorecendo aos poucos naquele sofá e da relação que tinha com Kei, resolveria esse assunto logo, mas não agora.

Depois de saírem da loja e andarem mais alguns metros pelo shopping, Kei soltou seu braço e apontou para uma máquina de bebidas:

— Vou pegar um café para mim, meu rei.

— Não vou te esperar.

O rosto de Kei se apagou um pouco e disse tacanho:

— Vai ser rapidinho.

— Vejo você na livraria. — Enji se virou e começou a caminhar, não aguentava quando Kei lhe dava aquele olhar pidão de alguém quase sem esperanças porque Enji sempre acabava cedendo. O que esse moleque estava fazendo consigo mesmo?

A livraria era enorme, Enji checava a parte de romances e se perguntava se não seria melhor mandar o seu assistente comprar os livros afinal não entendia nada sobre. Ouviu o som de uma lata com gás sendo aberta:

— Interessado em romances, grandão? — Kei apareceu do seu lado segurando uma latinha de energético de café gelado. — A gente pode viver o nosso.

Enji soltou o livro que segurava, calado Kei era um poeta, o garoto tomou um gole da bebida e ofereceu logo depois para o homem que recusou pegando outro livro.

— É para a minha filha.

— Awn. — Kei suspirou encantado e tomou mais um gole, só ficava calado quando tinha algo ocupando sua boca.

Fuyumi naquele dia respondeu que gostava de romances, mas não especificou qual tipo passando logo ao gosto do irmão seguinte que se resumia em videogames, esportes e motos, por fim disse que Shoto gostava de soba.

— O que acha desse? — Enji perguntou mostrando a capa para Kei.

— Sei lá. — Kei deu de ombros. — Parece chato. Esse aqui parece melhorzinho. — Pegou um com uma capa de um cowboy sem camisa encostado numa cerca de madeira com o chapéu escondendo o rosto, mas não o abdômen sarado.

Era óbvio o mau gosto.

— Terrível. — Enji disse.

— Parece bem interessante. Tem um cowboy, uma mocinha em perigo e um garanhão preto no pôr do sol. Olha só. — Kei mostrou a contracapa.

— Não vou dar essa porcaria para a minha filha. Devolva.

Kei folheou o livro, seus olhos pararam em uma passagem para lê-la.

— Uau. — Kei fechou o livro com a mão livre. — É melhor não comprar esse mesmo.

Devolveu para o stand e então disse:

— Vou dar uma olhadinha ali e já volto. — Apontou para alguma seção que Enji não prestou muita atenção.

Depois de olhar mais livros sem saber o que fazer, Enji foi até um dos atendentes no caixa e pediu para levar todos os livros de romance que não fossem porcarias exatamente com essas palavras. A mulher selecionava no computador do estoque e pediu o endereço de entrega, Enji sentiu a falta de algo: uma cabeça que parecia cheia de penas e não calava a boca afinal tudo estava silencioso demais. Enji mandou a atendente seguir com a compra enquanto daria mais uma olhada pela loja.

Andava para onde Kei apontou quando um rapaz com pressa segurando algumas revistas pediu licença para passar na sua frente, Enji cedeu passagem e o funcionário agradeceu acelerando o passo.

— Aqui estão os volumes anteriores. — O atendente falou com um sorriso para alguém que Enji não conseguia ver pois a prateleira escondia a figura agachada. — Fica muito bom desse para frente.

— Espero que sim. — Enji reconheceu a voz de Kei. — Eu tava quase desistindo, muita enrolação no passado dos vilões.

Kei se levantou de onde estava. O loiro tinha a mesma altura do atendente vestido no uniforme azul e avental, não parecia haver muita diferença de idade entre os dois.

— Acho que vou levar. — Kei afirmou.

— Que bom! — O atendente falou empolgado mais do que o necessário. — Esses são meus volumes preferidos.

Enji se aproximou para observar melhor, o atendente devia ser um universitário que estava tão ocupado sendo pedante perto de Kei que não notou a chegada do homem, Kei por sua vez estava distraído lendo as páginas da revista em quadrinhos.

— Se você deixar seu número na loja, eu posso avisar quando chegarem volumes novos no estoque. — o atendente falou como quem não quer nada, mas todas as suas palavras saíam descontraídas demais.

Enji cruzou os braços sobre o peito, estava logo atrás do funcionário que se retrocedesse dois passos trombaria com peito do homem. Enji chamou categórico:

— Keigo.

Kei levantou os olhos da revista e sorriu ao ver o empresário:

— Terminou, grandão?

O atendente confuso virou se deparando com a parede de músculos e irritação bem às suas costas. Enji era tão alto que sua sombra cobria o jovem por inteiro e esse não fazia questão de abaixar o nariz mostrando o quão desprezava e achava patético o funcionário da loja.

— Boa… tarde… senhor… — ele praticamente gaguejou a voz afinando e se perdendo na frase. Deu um passo para trás para sair da cobertura da sombra daquele homem que parecia uma geladeira industrial Eletrolux duas portas com capacidade de matar só com o olhar.

— Já vamos? — Kei perguntou curioso. — Eu nem terminei de ver o que vou levar.

Enji estreitou o olhar para as revistas nas mãos do atendente, Kei as pegou e agradeceu.

— E sobre o número? Você vai querer saber quando chegarem novos volumes? — o rapaz criou coragem para continuar falar.

— Pode… — Kei começou, porém parou quando Enji fungou irritado. Olhou para o homem confuso.

— O senhor precisa de ajuda? — o atendente perguntou.

Enji olhou com ainda mais desprezo para o rapaz.

— Quer algo, grandão? — Kei perguntou.

Quero que esse inútil suma da minha frente, pensou. O rapaz voltou a se encolher sob olhar do mais alto. Nervoso direcionou a pergunta para Kei:

— Seu tio precisa de algo?

— Tio? — Kei ficou ainda mais confuso.

— Tio?! Quem você pensa que… — Enji soltava fogo pelas narinas e antes que pudesse dar uma lição naquele universitário de charme barato Kei interrompeu.

— Haha, tio! — Kei gargalhou. — O senhor é tão engraçado! — O loiro se aproximou agarrando-se ao seu braço.

O atendente ficou sem reação.

— O senhor não disse que temos que ir embora? — Kei continuou e seu dedo deslizou até o bíceps do homem. Não era um comportamento comum entre tio e sobrinho.

— Ele disse isso?

— Disse sim, com os olhos… nos conhecemos tão bem! Às vezes eu até o chamo de pai. — Kei apoiou a cabeça em Enji. — Obrigado pela ajuda. — Kei sorriu para o atendente e se virou logo depois para o grandão irritado: — Vamos embora, titio?

Enji se desvencilhou de Kei e ajeitou a manga amassada:

— Não me chame assim.

— Claro, meu rei.

— Rei? — O atendente perguntou mais confuso ainda. — Vocês…

— Ninguém pediu sua opinião. — Enji o acordou para vida. — Sua falta de profissionalismo é latente. — Cuspiu as palavras como se brigasse com um dos seus funcionários. — Espero que esse não seja o seu plano A de carreira.

— Eu faço engenharia.

— Ninguém perguntou. — Enji rebateu autoritário deixando o funcionário mudo. Se virou para Kei e disse pela primeira e última vez: — Não temos o dia todo. Vamos embora.

— Quem você acha que é?! Pensa que porque é grande é dois… — O atendente começou a falar bravo, porém Enji já tinha lhe dado as costas.

— Desculpa pelo grandão! — Kei disse casualmente e seguiu Enji até se colocar ao lado dele.

Enji não falou nada até chegarem ao caixa, então quando Kei pagaria as revistas, Enji pôs a mão sobre a sua impedindo-o:

— Eu pago. — Tirou o cartão de crédito da carteira.

Os olhos de Kei brilharam surpresos.

Olá, gostaram do capítulo?
Bjinhus!

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