Desconfianças

— Dormiu bem? — Enji perguntou para Kei que tomava café da manhã no restaurante do hotel.

— É claro, meu rei. — Kei tomou uma colherada de mingau. — Está de bom humor hoje?

— Algum dos investidores demonstrou interesse em sair para conhecer a cidade? — O empresário sondava Kei.

O garoto lhe olhou confuso e com um sorriso animado respondeu:

— Não, mas eu posso resolver isso. Tem interesse em sair com eles? Seria bom, pois eles vão embora hoje de tarde.

— Nenhum. — Enji olhou para o tamagoyaki no prato de Kei. — Já resolvi o que vim fazer aqui.

— Oh. — Kei pegou um pedaço do omelete com os hashis. — Eu gosto de café da manhã de hotel. Sabia, meu rei? E você?

Enji tomou um gole do chá verde e respondeu:

— Tanto faz. O importante é uma refeição equilibrada.

— Ah! — Kei apontou os hashis para ele. — Você tem cara de quem prefere um café da manhã tradicional, meu rei. Nada dessas coisas ocidentais tipo capuccino, ovos com bacon, cereal e leite.

Enji considerou o que o garoto falou, nunca havia pensado antes sobre. Kei continuou puxando assunto:

— Eu nunca estive na América, mas tenho curiosidade. Eu sei que você já foi pra lá, grandão. — Deu uma piscadela. — Gostou?

— Não há nada demais. — Enji perdeu a conta de quantas vezes viajou à América e Europa.

— Peraí. — Kei mastigava. — Mas você conheceu ou só foi a negócios? Por que se for o último você não conheceu então.

— Não há nada pra conhecer que não tenha a ver com negócios.

— Que chatice, meu rei! — Kei sacudiu os pés incrédulo. — Você não conheceu então. Nunca nem fez uma viagem de família pra Disneyland ou sei lá?

— Isso é perda de tempo. — Enji tomou mais um pouco do chá verde enquanto verificava a consistência do natto.

Kei suspirou.

— Não surpreende seus filhos não gostarem de você.

O empresário ficou pessoalmente ofendido, no entanto não retrucou o garoto porque de certo modo ele tinha razão.

— Uma viagem para Disneyland conquista qualquer um. — Kei divagou perdido em cenários imaginários. — Poderíamos ir para lá algum dia…

— Peça pra um dos seus “amigos”. — Enji rebateu num tom irritadiço.

Ele esperava que Kei respondesse que não existiam mais outros amigos além dele, mas não foi o que aconteceu:

— E o que faremos hoje, meu rei? — Desviou de assunto misturando a stevia no suco de laranja com a colher. — Nós só voltaremos amanhã no final das contas.

A irritação apenas cresceu com a escolha deliberada de Kei em pular para outro assunto como se mal tivesse entendido a implicação de Enji.

— Eu irei trabalhar. — Categórico. — Faça o mesmo.

— Eu terminei o meu trabalho ontem. — Kei afirmou despreocupado.

— Então você tem tempo para sair durante a noite o quanto quiser. — Enji foi ferino. Onde você esteve ontem? E com quem?

O loiro não captou a indireta:

— Mas não tem graça sem você, meu reeeeiii!

Mentiroso.

Kei continuou o argumento:

— E você é o CEO da própria empresa! Não dá pra ter um espacinho na agenda pro seu fã n⁰1, senhor n⁰1?

Era a primeira vez em todos aqueles meses em que se envolveram que Kei pediu, implorou, algum tempo para eles. Enji ficou compelido a conceder, porém Kei estava lhe chifrando com sabe-se-lá-quem bem debaixo do seu nariz. O que mais estaria fazendo?

— Pare de encher a paciência.

— Podemos sair para beber de noite. — Sugestivo. — Os investidores vão embora de tarde e não há câmeras nos corredores. Meu quarto tem uma banheira e sei que o seu também. Ninguém vai desconfiar.

Enji comeu um pouco do natto refletindo sobre toda questão. Kei queria muito sair, Enji conhecia seu passarinho traidor, acompanhando-o ou não, ele sairia e sozinho provavelmente arranjaria alguém e levaria-o ao hotel. O mero pensamento fez com que expirasse de ódio. Ser corno duas vezes na semana era demais para ele.

— Tem um bar no hotel. — Enji disse.

— Então temos um encontro? — Os olhos cintilaram dilatados de tanta animação.

— Não é um encontro. — Comeu mais natto. — E pare de falar essas coisas em voz alta.

O empresário passou o dia trancado no quarto trabalhando e vez ou outra pensando se Kei havia saído do próprio para se encontrar com alguém e lhe botar outro belo par de chifres. Incomodava muito o homem saber que Kei lhe corneava até em viagens de trabalho, nunca haviam definido exatamente o que tinham, mas achou que… achou que… que depois do incidente com o tatuado no apartamento não ficaria com outros. Estava enganado. Kei apenas não os levava mais ao apartamento, mas isso não significava que Kei não iria até eles. Enji olhou o relógio no pulso, faltavam poucos minutos para o horário em que marcaram.

— Você chegou, meu rei. — Kei abriu os braços cumprimentando-o quando Enji chegou no bar.

Ele passou direto pelo garoto que num muxoxo sentou no banco ao seu lado no bar.

— Quer pedir alguma bebida, bonitão? — Kei sorriu e apoiou o rosto no punho. — Eu pago.

— Não faça eu me arrepender disso. — avisou. Quando o bartender os atendeu, Enji pediu água sem gás com limão e Kei por um coquetel colorido.

— Eu? Jamais. — Kei pegou a taça fria. O bartender foi cuidar de outros clientes e então Kei complementou sua cantada: — Você vem sempre aqui?

— É assim que seduz homens aleatórios?

Confusão surgiu nos olhos do seu passarinho que adorava cantar em quintais alheios:

— Homens aleatórios? Como assim, meu rei? Você não é um homem aleatório, não existe ninguém como você.

Enji tomou um gole da sua água gelada sentindo a rodela de limão tocar seu lábio lembrando que as doces palavras bajuladoras de Kei tinham um fundo azedo.

— Adorei essa bebida. — Kei apontou para o líquido multicolor com o canudinho em espiral. — Tem gosto de festa noturna na praia.

— Que específico. — Enji desdenhou.

— Hahaha, eu fui numa festa noturna na praia que tinha essa bebida. Foi a primeira vez que provei.

— Foi em uma festa de — “algum dos seus homens” era o que Enji queria falar, no entanto disse: — um amigo seu? — o tom saiu como se tivesse perguntado o que pensou.

— Não, foi no lançamento de um produto da Comissão. Mas só podia uma bebida dessa por pessoa. — falou casualmente. — Até que deu pra me divertir. Você está se divertindo agora, meu rei?

— Pare de me chamar assim em público.

— Tudo bem, grandão. — Kei deu uma piscadela. — Não vai beber nada além de água com limão?

— Talvez eu tome uma vitamina.

— Ah. — Kei fez uma pequena cena de desanimação. — Isso estraga meus planos.

— Quais planos? De me embebedar e me levar para a cama igual a primeira vez?

Kei passou o dedo sobre a boca da taça e tão lascivo quanto disse:

— Achei que você não quisesse falar dessas coisas em público.

Enji o ignorou completamente. Kei se inclinou mais para si e ele sentiu o hálito quente do garoto contra a sua orelha:

— E foi você que me levou para a cama na primeira vez. Eu lembro muuuito bem.

— Você queria. — Enji não ousou olhar para o lado e ficar a milímetros de tocar a boca de Kei com a sua.

— Nós queríamos. — Kei logo após falar se afastou. — Eu ainda quero.

Enji tomou mais um gole de água olhando para frente:

— O que você quer de mim?
De verdade. — Fica comigo mesmo ainda querendo outros.

— Eu quero estar com você. — Foi a frase mais sincera que Kei disse na vida.

Enji sentiu o impacto sem acreditar. Por que alguém quereria estar com ele depois de tudo? Destruiu a própria família, abandonou Kei sem hesitar, seu temperamento era ruim e ficou cego pelo objetivo de ser o melhor.

— Eu gosto de tudo o que há em você. — Kei leu seus pensamentos. — Principalmente as suas tentativas de ajeitar as partes ruins.

— Você ainda gostaria de mim mesmo se eu não tivesse voltado?

— Pra quê tanto “e se”? Você voltou. É o que importa, Endeavor-san. — Kei ergueu a taça brindando. Enji não sufocou a pequena fagulha de alegria que brilhou no canto da sua boca.

Eu disse que voltava!
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Bjinhus!

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