Chantilly caseiro

O cheiro de bolo quentinho atingiu Fuyumi em cheio quando abriu a porta de casa.

— Oi, Fumi! — Natsuo tirava um bolo do forno. Usava luvas de cozinha, uma bandana na cabeça e um avental florido. — Fiz bolo.

— Oi! — Fuyumi viu o outro bolo sobre a mesa perto de uma vasilha de morangos cortados e outra com chantilly. Sem dúvidas era o chantilly caseiro de Natsuo, ele não comprava o pronto, dizia que era muito artificial.

— É para uma atividade da faculdade. — Mostrou o bolo na forma e fumaça que saía da massa dançava nos raios de sol que entravam pela janela. — Mas fiz outro para a gente.

Ele deixou o bolo recém-assado na mesa para esfriar, tirou as luvas e pegou uma faca serrilhada para cortar o bolo mais frio. Ele estava de muito bom humor, sempre ficava assim ao cozinhar e cozinhava muito bem. Fuyumi tinha certeza que ganhou peso nesses dias em que o irmão passava lá.

Natsuo dividiu o bolo em duas camadas e começou a colocar uma água doce na massa assada para deixar a massa molhadinha. Então com a espátula passou uma generosa camada de chantilly e colocou os morangos. Pôs a metade cortada do bolo sobre ela e confeitou. Estava pronto.

— Quer chá? — Natsuo sorriu e acendeu o fogo da chaleira.

Eles já haviam feito as pazes e Fuyumi não queria estragar o clima, mas era necessário, no entanto decidiu falar depois de terem comido:

— Natsuo, você precisa dizer para o nosso pai que não dormiu com o namorado dele.

Natsuo não tirou os olhos do prato:

— Ele finalmente admitiu?

Fuyumi engoliu em seco acabando com o sabor de chantilly na boca.

— Ele admitiu? — Encarou a irmã sério.

Fuyumi abriu a boca, mas nada saiu.

— Eu sabia que ele não admitiria! — Natsuo bateu o punho na mesa. — Sabia! Se ele não tem nada com Kei, por que seria importante eu desmentir uma história? Por que seria importante eu falar que não dormi com ele? Eles são nada afinal!

— Ainda não toquei no assunto.

— Não tocou?! Por que não?!

— Ele está muito triste, Natsuo! E esse incêndio só piorou as coisas…

O vinco entre as sobrancelhas de Natsuo desapareceu e seus olhos baixaram:

— Que bom que ninguém morreu… — Suas mãos foram para os joelhos.

Ela contou o tempo para Natsuo se recompor e continuou:

— Mas isso não impede de você falar que nada aconteceu.

— O quê?! Eu não vou lá!

— Natsuo!

— Fuyumi! Você já não contou? Por que eu tenho que ir lá?

Ela engoliu em seco de novo e encolheu os ombros:

— Não adiantaria eu contar, tem que ser você… — O pai só acreditaria se visse as palavras saindo da boca do próprio Natsuo. Não havia outro jeito.

— Já deu a minha cota de ver esse homem! E por que diabos ele acha que eu dormi com o amante dele?! Isso é ridículo! Que tipo de cara ele arranjou? É para combinar com a canalhice?! — Natsuo levantou da cadeira consternado.

— Eu não sei, mas tudo melhoraria se você dissesse a verdade.

— Não foi eu que menti! — Natsuo levou o indicador ao peito. — É ele que tava tendo um amante por aí sendo casado! Por que sou eu que tem que fazer tudo?

Então Natsuo parou de andar pela cozinha, não sabia muito bem o que fazer com as mãos sem o capacete da moto, cerrou os punhos ao lado do corpo, fechou os olhos e respirou fundo. Mais calmo, abriu os olhos e se concentrou em uma parte do fogão:

— Eu não consigo entender o porquê você ainda se importa e gosta desse cara. Mas isso é um direito seu, não posso e nem devo impedir. Se você e Shouto acham que algo bom pode sair dali… tudo bem, só que eu não vou. Não acho que gente assim muda, vocês não têm que achar nada como eu. — Era difícil falar para Natsuo. — Quero os dois felizes, queria que todos nós pudéssemos só esquecer esse homem e seguir em frente.

— Natsuo…

— É muito triste pensar o que Touya acharia de tudo isso enquanto essas notícias do prédio em chamas não param de aparecer no jornal. — Os olhos de Natsuo começaram a arder. — Queria meu irmão mais velho vivo e feliz também. E não importa o que me digam, não acho que ele seria feliz perto de Endeavor ou que ele não tem um mínimo de culpa e tudo foi uma tragédia. Nossas vidas foram uma tragédia por muito tempo, não quero que isso volte… — As lágrimas desciam como trilhas úmidas pelas bochechas vermelhas dele.

Fuyumi se levantou da cadeira e abraçou o irmão. Encaixou o rosto dele em seu ombro e acariciou os cabelos, fez isso durante muitas noites depois do incêndio de Touya quando Natsuo se esgueirava mesmo proibido para seu quarto.

— Também sinto falta dele. — Touya era como um dente recém-arrancado na sua boca que por mais que não quisesse se via distraída cutucando o espaço vazio. — Nada vai se repetir. Não somos mais crianças.

Natsuo soluçava enquanto se agarrava na irmã.

— Eu odeio ele. Odeio. — falava contra a manga dela.

— Tudo bem. — Fuyumi ninava-o como se fossem duas crianças inconsoláveis novamente. — Tudo bem.

— Mas eu amo você, Fuyumi! Amo mamãe! Amo Shouto! — As lágrimas dele atravessavam a roupa e suas palavras mesmo abafadas pelo tecidos eram altas e claras. Igual a quem dizia-as.

— Eu também amo você, Natsuo. Não querer se aproximar dele, não faz eu te amar menos. Sempre vai ser meu irmãozinho.

— Eu amo você, Fuyumi. Eu amo você, Fuyumi — Natsuo fungou e se afastou um pouco segurando os ombros dela. Soluçou. — E é por amar você que… — Outro soluço.

Os olhos deles estavam vermelhos como os morangos do bolo. Ele engoliu algo e continuou:

— E é por amar você que vou fazer isso: se ele admitir, eu vou lá no mesmo instante e falo. — Natsuo engoliu o choro. — Ele só tem que admitir, não abro mão disso, nem precisa ser na minha cara ou pra mim.

— Natsuo… — Tudo deveria ser muito difícil para o irmão. — Obrigada.

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Gente, estamos chegando em uma parte que eu não vou atualizar todo dia (não, a maratona não vai acabar) porque é um arco que eu quero postar completo de uma vez e dentro da ordem cronológica. Não se preocupem, vou avisar quando chegar!
Até amanhã!
Bjinhus!

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