Capítulo 7

Quando voltamos ao apartamento já era bem tarde e Babi decidiu que iria tentar se resolver com o Tony no dia seguinte, após o trabalho. Ele tinha passado o dia inteiro ligando, de cinco em cinco minutos ligava. Quando ela disse que voltaria no dia seguinte, ele se acalmou um pouco e reduziu a quantidade de ligações de uma por hora, no final das contas era sempre assim.

Sorri ao me lembrar do drama que foi no primeiro mês em que Babi se mudou. Ela definitivamente só ia lá para dormir e outras coisinhas mais, mas tomava banho aqui, comia aqui, passava o dia inteiro aqui. Sempre ficava lamentando por não saber o motivo de ter trocado a amiga dela por um menino. Apesar de ser o amor da vida dela ele era só um menino, o que fazia todo o sentido é, claro. Quem iria gostar de morar com meninos?

Eu é que não.

O Barry estava exausto, tinha passado o dia inteiro correndo e indo de colo em colo, acabou dormindo em toda a viagem de volta. Coloquei Bar na cama, na area de serviço, pra eu poder dormir. Tomei um banho e coloquei minha calcinha preferida pra dormi - que obvio era uma vermelha com o logo do flash - e uma camisa surrada do meu time de futebol, sentei no sofá com as pernas cruzadas e observando a Babi que estava em uma conversa melosa com o Tony, uma conversa digna de deixar alguém com a glicose alterada a milhares de quilometros.

- Eu sei, amor, eu volto amanhã. Hoje vou ficar aqui com a Liv. Você sabe que sempre sinto falta dela. – Barbara falava com uma voz dengosa, depois de um breve silêncio continuou – mas também sinto a sua falta, meu bebêzinho. – engoli um riso e Babi me lancou um olhar de sarcasmo e cumplicidade – Eu volto amanhã, prometo, meu lindão. Tchau.

Barbara desligou o telefone e foi o máximo que eu aguentei, caí na gargalhada e ela me acompanhou se jogando do meu lado no sofá.

- Você não presta! – acusei.

- Claro que presto, e eu não posso ser julgada por querer que ele corra um pouco atrás do prejuízo.

- Realmente não pode.

Depois de alguns segundos de silencio, apenas interrompido por um longo suspiro meu, Babi resolveu falar.

Para a minha total agonia.

- Ok, você ta o dia inteiro pensativa e quase não fala, o que aconteceu com você?

Soltei um suspiro pesado, mentir não adiantava, ela perceberia. Muito menos me fazer de desentendida. Eu também precisava do colo dela e a melhor opção era falar.

- Sonhei com ele de novo. – falei por fim.

- Você me disse que isso tinha parado, quando foi isso? – Babi me fez deitar no colo dela e ficou alisando o meu cabelo com carinho.

- Tinha parado – gemi em lamento –, mas voltou ontem de noite – contei o sonho em detalhes, sonho esse que ela já conhecia de trás pra frente.

Ele era um amigo de infância que foi embora quando eu ainda tinha seis anos e ele tinha treze. Tinha prometido escrever todo mês e até cumpriu com a promessa por algum tempo, mas conforme o tempo passava, as cartas chegavam com intervalos cada vez maiores e cada vez mais curtas, até que parou de escrever. Eu cheguei a mandar uma carta perguntando o motivo, mas ele nunca respondeu.

Como nossos pais eram amigos eu sabia que estava bem, mas ele nunca mais entrou em contato. Era como um irmão pra mim e a distância me fez sofrer muito. Foi aí que conheci a Babi. Na época as cartas ainda estavam sendo mandadas, porém com prazo longo e para aplacar a saudade e ocupar a mente eu comecei a fazer handebol e nos conhecemos lá. Mostrei a ela as cartas e como podia, sempre tentava me manter animada, quando tinha as crises de saudades que duraram anos, e já fazia uns dois anos que não aconteciam, até agora.

Eu sei que parece meio idiota, mas ele era uma pessoa muito importante na minha vida e o que mais me machucava – machuca – foi ele ter se afastado sem dar nenhuma justificativa. Simplesmente passou a me ignorar. Saber que ele significava mais pra mim do que eu significava para ele fazia meu peito doer e machucava meu orgulho.

- Ai, amiga, isso logo vai passar você vai ver só. Sempre superamos isso, né?

Concordei com a cabeça e ela logo tratou de mudar de assunto, me contando suas experiências sexuais mais loucas. Isso sempre nos rendeu boas gargalhadas até decidirmos que era hora de ir dormir para mais um dia de labuta na manhã seguinte.

A semana passou completamente indolor. Do trabalho para casa e da casa para o trabalho, apenas os passeios a noite com o Barry que mudaram a minha rotina e a minha forma de ver as coisas. Eu era muito bem recebida em casa e obrigada a fazer exercicios noturnos para o Bar também poder andar. Não sei como pude viver tanto tempo sem um animal. Barbara tinha voltado pra casa dela depois do trabalho e me ligou a semana inteira para saber como eu estava, o que não ajudava muito porque me fazia lembrar do sonho mesmo que a intenção dela fosse ao contrario.

Eu sabia que ela tinha as melhores das intenções, então sempre dizia que estava otima e fingia não saber do que se tratava. Levei a coversa pelo lado positivo, dizendo que não tinha mais sonhado daquele jeito, o que era otimo, então por essa logica a semana tinha sido otima.

Conforme a sexta-feira se aproximava, mais ansiosa eu ficava - principalmente por ser feriado na proxima segunda – e estava naquele exato momento atracada em uma coxinha.

Me encontrava sentada na cadeira próxima ao balcão no laboratório. Sim, eu sei que é errado, anti-higiênico, não faz parte do manual de boa conduta, blá, blá, blá, mas eu estava ansiosa então tem que existir um desconto para isso. Sem falar que no momento não estava mexendo com nenhuma substancia e a chefe do laboratório tinha saído. Conclusão: todos estavam aproveitavam para comer. Eu não conseguia entender o motivo de tanto nervosismo. No dia anterior eu tinha deixado cair um tubo de ensaio simplesmente por ter me distraído pensando em sabe-se lá o quê. A sorte foi que não tinha nada dentro e como resultado fiquei por ter que pagar o tubo de ensaio e levei uma bronca daquelas.

Ouvi um barulho no corredor e a voz da fera se fez ouvir - ai senhor - engoli o mais rápido que pude, quase me engasgando e todos começaram a correr para guardar ou engolir o que estavam comendo. Comecei a engasgar com a massa e olhei para Carol, a colega de trabalho que estava mais próxima - eu vou ser pega, eu vou ser pega – meus olhos gritavam.

Ela entendendo o meu desespero deu um tapa bem forte nas minhas costas e tive certeza de ouvir uma ou duas costelas quebrando, mas funcionou já que a coxinha desceu lentamente. Murmurei uma obrigada e voltei para o experimento que estava fazendo.

- Essa foi por pouco, em – Carol sussurrou do meu lado.

Concordei com a cabeça ainda horrorizada com a ideia de ser pega e sentindo a coxinha descer feito pedra.

- Já pensou se a Agnes ver? Não quero nem imaginar.

A porta se abria então olhei para o Júlio que estava na outra bancada de frente pra mim, fiz um gesto com a mão para que ele limpasse o jaleco, e limpou desesperado meio segundo antes da nossa megera favorita colocar a cabeça pra dentro nos observando com aqueles olhos de águia.

- Valeu – Júlio agradeceu ajeitando os óculos, uma mania dele que eu achava muito fofa.

Júlio é um ano mais velho, todo desajeitado e tímido, era um bom colega e sempre prestativo com todos. Ele é um rapaz até que bonito o que combinava perfeitamente com a maravilhosa personalidade que tinha. Júlio tem cabelos pretos quase azulados e olhos castanhos claros, magro demais e sem músculos definidos – pelo menos nenhum que ficasse a vista – alto, algo perto de um metro e oitenta e cinco centímetros.

Ofereci um sorriso de cumplicidade ao Júlio e voltei a me concentrar no meu trabalho antes que a Agnes resolvesse soltar fogo pela boca.

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