Capítulo 2 - Felicidade

Ainda que fosse cansativo,

Ainda que eu não me divertisse.

Eu aceitei cada pedaço medíocre de ração,

Eu aceitei cada pedaço medíocre de amor.

— Do Kyungsoo?! — a voz do homem de branco tinha um tom de descrença.

O psicólogo não conseguiu responder uma única palavra no exato momento. Estava desacreditado. Tudo no que acreditara durante anos havia se tornado extremamente diferente.

— J-Jongin? — gaguejou, boquiaberto.

— Me leve de volta para o Mestre! Você me tirou do Mestre, não foi? — havia raiva na voz de Kim Jongin, aquela mesma raiva inocente e indefesa da qual Kyungsoo foi alvo alguns bons anos antes.

— Jongin, acredite ou não, eu estou tão surpreso quanto você. — Kyungsoo explicou calmamente, não querendo assustar o outro. — E-eu, eu nunca pensei que fosse voltar a ver você. 

A vítima virou-se de lado, abraçando o bicho de pelúcia, não querendo olhar para Kyungsoo. Tinha os mesmos sentimentos daquele dia: mágoa, frustração, tristeza. Porém, dentro de si, alguma coisa de diferente queimava. 

— Talvez tivesse sido melhor assim. — resmungou, com um tom de birra que para o Do era clássico. 

Um sorrisinho brotou nos lábios do mais baixo. Depois de tanto tempo, o modo de agir do outro lhe trazia uma sensação gostosa e nostálgica que lhe aquecia o peito. 

Kyungsoo suspirou, se aproximando da cama onde estava deitado o homem birrento que estava virado de costas para ele.

— Você me odeia? — questionou baixo, no ouvido do mais alto, a voz saiu um tanto rouca da garganta, fazendo com que um sentimento estranho se apoderasse dele.

— Aham. — mentiu, fraquejando na emissão sonora que saiu mais baixa que o imaginado.

— Então por que não jogou o Monggu fora? — perguntou retoricamente, tomando a liberdade de tocar os cabelos castanhos bagunçados. 

O sorriso sumiu dos lábios de Kyungsoo quando o mais novo virou-se para si novamente. Lágrimas começavam a se formar em seus olhos, junto com um bico natural. A face começava a ganhar um rosado característico. 

— Eu confiei em você. — disse, com a voz embargada. — Você foi a única pessoa, fora o Mestre, em quem eu confiei.

Kyungsoo se sentia mal em vê-lo daquela forma, mas sabia que não poderia ter acontecido de outro jeito.

— Eu te pedi para que fugisse comigo, Nini. — lembrou ele, utilizando o velho apelido que poderia dobrar o outro. — Eu não poderia ficar. Tenho uma vida, e pensei nos meus sonhos naquele momento, mas você preferiu ficar com aquele, aquele…

— A única pessoa que eu tenho! — Jongin esbravejou, magoado. — É isso que ele é.

Do Kyungsoo suspirou. Se já não gostava daquele homem metido a intelectual antes, agora que sabia que não era parente de Jongin, e sim um sequestrador participante de uma organização criminosa, queria que ele queimasse no mais fundo dos infernos.

— Como se sente? — interrogou, com a voz suave. Não queria que o outro se sentisse ameaçado ou voltasse a se estressar.

— Você se importa com os meus sentimentos por acaso? — ironizou o paciente, sem muita maturidade. 

Kyungsoo suspirou. Talvez fosse necessário começar de outra forma. Lembrou-se das palavras da diretora do centro de apoio. 

— Está com fome? Aprendi a fazer aqueles biscoitos que você gostava. — falou com carinho. — Você pode comer algo que te trouxerem e comer os biscoitos como sobremesa. O que acha?

Uma risadinha sarcástica escapou dos lábios do outro. No fundo, não achava nenhum pingo de graça na situação. 

— Você está brincando comigo?! — Jongin murmurou.

Kyungsoo manteu a boa postura, como o bom psicólogo que era. 

— Eu fiquei sabendo que você está sem se alimentar, Jongin. Você quer ficar doente?

— Eu quero que me devolvam ao Mestre! — exigiu ele. — Eu não pertenço a vocês, eu pertenço ao meu Mestre.

O mais baixo sabia que aquilo seria complicado. Porém, ao ver quem cuidaria, sabia que seria mais complicado do que imaginava. Talvez devesse explicar para a diretora que o conhecia e que seria melhor cuidar dele sem tanto impacto emocional, mas sabia que se saísse por aquela porta e não voltasse ali, estaria piorando ainda mais a situação, aumentando a bagunça na cabeça de Jongin.

— Nós iremos conversar sobre o Cientista depois. Agora, precisamos que você se alimente. — falou, se dirigindo para uma das janelas mais próximas e a abrindo, deixando que a iluminação adentrasse o quarto. — Eu prometo que depois que acabarmos com isso, você será grato e feliz.

— Eu não posso ser feliz sem o meu Mestre. — Jongin voltou a falar, com peso na voz. — Se vocês acham que são os heróis nessa história, vocês estão errados.

O ouvinte suspirou, procurando buscar as melhores palavras no fundo de sua cabeça. 

— E por acaso você era feliz com ele, Jongin? — foi a única pergunta que fez.

O homem de branco engoliu em seco, pensando consigo mesmo naquelas palavras.

— Eu vou te deixar pensando na resposta e vou pegar algo para você comer, me espere aqui. — Kyungsoo pediu, se retirando do lugar. Deixando para trás um homem confuso e com lembranças à flor da pele.

○ ○ ○

09 de Abril de 1972,

Nyeonsae, Gangwon-do,

Coreia do Sul

O Cientista estava feliz, e dava para se ver em seu rosto. O Cientista tinha um novo rato. O novo rato se mantinha quieto, respirando o ar que passava por uma pequena abertura naquela grande mala onde fora obrigado a estar. A mala foi depositada no chão da grande casa e logo a porta foi trancada.

A criança respirou fundo, assim que ouviu o zíper ser aberto. O homem o tirou dali rapidamente e beijou seu rosto de forma molhada. Jongin não falou nada, ainda que não entendesse o motivo de ele ter tirado suas roupas tão rapidamente.

— Vou te banhar, te colocar roupas limpas. Não podes ficar assim. — Ele falou, lhe levando para outro cômodo. 

O banheiro do lugar era enorme, com azulejos amarelo pastel nas paredes e no chão. A enorme banheira se encontrava vazia. O Cientista o deixou sentado em cima da pia de mármore para encher o local com água, sabonete e sais de banho. O menino apenas observava curioso, mas não fazia nenhuma pergunta para o outro. Estava triste, por isso se mantinha quieto. O homem lhe colocou naquela água e passou as mãos por suas costas e cabeça, lhe banhando. Dez minutos se passaram ali, mas, novamente não soube contar, pois não sabia sair dos quatro. 

Foi seco rapidamente, sem muita cerimônia e o homem lhe colocou uma camisa vermelha que estava grande demais, indo até seus joelhos, mas não era como se tivesse muita noção de tamanho, e também lhe pôs um calção largo.

Grudou a cabeça no peito do homem, cansado de todo o pranto que derramara no caminho, sonolento.

Ele lhe levou até uma mesa cheia. Havia kimchi, carnes, arroz, sopas e doces ali. O homem lhe entregou os jeotgarak e uma colher. 

— Sabe comer sozinho? — perguntou ele, levando uma porção de arroz até a própria boca.

A criança anuiu, levando desengonçadamente um pouco de arroz pego nos jeotgarak para a boca. Mesmo no meio daquilo tudo, não deixava um sorriso escapar de seus lábios. Mantinha os olhos vazios e baixos.

— Não está gostoso? — o Cientista perguntou, estranhando a reação. 

— Eu sinto falta da minha mamãe. — ele sussurrou. — Eu estou mais bonito?

— Está sim.

— Acha que agora que estou mais bonito, ela me aceitaria de volta? — perguntou, com a garganta seca.

A raiva queimou dentro do adulto, mas não demonstrou aquilo. Deixou com que um largo sorriso tomasse conta de sua face. 

— Não querido, ela não te quer de volta. — respondeu, com um tom de voz doce que contrastava com sua fala. — Sabe por que ela não te quer? — questionou, recebendo uma negação com a cabeça como resposta. — Porque nenhuma outra pessoa senão eu quer você. 

As lágrimas voltaram a brotar nos olhinhos pequenos do menino. 

— Mas ela é minha mamãe… — murmurou, com a voz embargada. 

— Sua mamãe é malvada, como aquelas crianças de hoje mais cedo, lembra?

— E-ela só não sabe como ser uma boa mamãe de vez em quando, mas ela não é ruim. — gaguejou, limpando as lágrimas que escorriam da face morena.

— Jongin, se ela o amasse lhe teria abandonado? — ele aumentou o tom de voz.

A criança colocou os pés pequenos em cima da cadeira, cruzando os braços em cima dos joelhos, escondendo a cabeça ali para chorar, começando a tremer.

O homem levantou-se, então, da cadeira onde estava sentado e se dirigiu até o lado do menino, acariciando suas costas.

— Poderia parar de chorar? — pediu, em seu ouvido, retirando lentamente alguns objetos dos bolsos.

— Por que? — o menino perguntou baixinho, virando-se para o outro e se assustando ao ver uma seringa e um bisturi nas mãos dele.

— Porque eu quero te ver feliz...

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