Tambor ▸ parte 2
Não preciso dormir, preciso de respostas!
Bendito, ou maldito, livro que cresceu de tal maneira que meu cérebro simplesmente não consegue desligar enquanto não descobrir o que acontecerá!
Eu sabia muito bem que essa é uma das possíveis desvantagens quando estou lendo uma história muito boa e envolvente: o sono nem dá as caras quando imergirmos como se deve no enredo. Mesmo assim, estou aqui na mais alta madrugada, e completamente pilhado.
Solto um curto suspiro ao ajustar os óculos na ponte do nariz, retomando a leitura.
E não consigo largar o livro até finalmente ler a última linha. Abro um largo sorriso. O final conseguiu me surpreender, e eu amo quando isso acontece. Deixo o leitor digital de lado, tiro os óculos e me vou me deitar. Fecho os olhos para esperar que o sono venha.
Porém, minha mente está acelerada demais e se recusar a me deixar descansar.
Quero alguém para falar sobre a história, mas quando olho para o lado, Fofinho está babando no travesseiro e com um sorriso tão feliz nos lábios que não quis acordá-lo e terminar com esse sonho bom que aparentemente ele está tendo.
Levanto-me da cama, e sem conseguir ficar parado, começo a caminhar pelo quarto, mas resolvendo que posso fazer muito barulho, saio do quarto e vou explorar a casa. Conheço bem o lugar, então não tenho medo de me perder. Tudo ali está tão silencioso que quase quero gritar apenas para preencher aquilo.
E então eu escuto um suspiro.
Sei que é nesse momento que os personagens de filmes e livros de terror vão investigar e acabam morrendo, mas agora na situação, percebo que é mais forte do que tudo e começo a caminhar na direção de onde escutei o suspiro.
O que encontro não tem nada de horrendo, na realidade é tão bonito, que a curiosidade se transforma imediatamente em atração.
Raquel, está sentada na meia altura da escadaria que dá acesso ao primeiro andar. Seus cabelos loiros caem em ondas perfeitas e brilhantes por seus ombros, acho que macias também. Está encostada no batente do lado direito e a luz da lua a ilumina tão suavemente que quase parecia uma visão.
Usa uma blusa que claramente é maior demais para ela, e com a perna levemente erguida, consigo ver um short de corações escuros. Uma vontade absurda de ver como uma camisa minha ficaria nela me fez travar no lugar.
Seus pés estão descalços e ela balança as unhas pintadas de rosa claro num ritmo que não conheço. Suas mãos apertam levemente um caderno com capa de couro e ela gira distraidamente entre os dedos uma caneta com uma estrela na ponta.
Ela está escrevendo algo?
Como se tivesse escutado a minha pergunta, ela ergue a cabeça de uma vez e diz com um sorriso amplo.
— Mas é claro! — Raquel abre o caderno fechado e o apoiando em suas coxas, começa a escrever. — Estava faltando era isso! — seu sorriso alarga ainda mais e tudo que escuto é o rabiscado apressado.
Nada no que eu estou vendo é engraçado, mas por algum motivo, me escuto soltando uma risada.
Ela imediatamente para de escrever, fecha o caderno numa velocidade impressionante e a caneta que ela segurava voa de seus dedos, caindo alguns degraus abaixo dela. Seu pescoço gira e aquela cascata áurea faz um movimento impressionante.
Fiquei me sentindo um pouco mal ao ver o susto naqueles belos olhos. Porém, senti uma pitada quentinha ao ver seus ombros relaxando quando ela reconheceu meu rosto, mas logo os ombros voltam a tensionar, mas só um pouco.
— Desculpe, não quis te assustar — digo, minhas pernas voltando a descer os degraus e vou buscar a caneta que ainda estava ali.
— Eu que não deveria estão tão distraída assim — ela responde e tenho um vislumbre de suas bochechas rosadas quando eu estendo a mão em sua direção, lhe devolvendo a caneta.
— Tudo bem, acontece — digo, dando de ombros.
— Você está aí há muito tempo? — a voz dela está um pouco trêmula e sinto a fragilidade do momento. Ok, ela não quer que eu saiba que ela está escrevendo, por mais que eu realmente nem saiba o que ela está escrevendo.
— Não, cheguei agora — respondo com um sorriso tranquilo e vejo a tensão sumir completamente de seus ombros. — Ri porque fiquei feliz que não era o único sonâmbulo por aqui.
— É, aparentemente não sou a única — ela abre um sorriso. — Fico feliz por isso.
Por mais que ela já tivesse bem colada ao corrimão, ainda sim afasta um pouco mais, e aponta para o "lugar" vago a seu lado. Se eu me sentasse no mesmo degrau que ela, ficaria um palmo acima de sua cabeça, e querendo olhar para seu rosto, escolho sentar um degrau abaixo.
Mas talvez não devesse ter feito isso, já que a primeira coisa que sai da minha boca quando olho para aqueles traços proporcionais e femininos é: — Oi Raquel.
— Oi — uma risada tão genuína escapa dela que me senti feliz por já estar sentado, pois aquele sorriso seria capaz de derrubar qualquer coração.
— Você esqueceu meu nome? — meu piloto automático toma conta e eu quase quero suspirar aliviado. Abro um sorriso largo e me afasto um pouco, colocando a mão no peito, brincando com ela.
— Claro que não Taz! — ela parece preocupada. — Como se você não fosse famoso o suficiente, ainda tem o fato que você tem uma tatuagem que nem se eu quisesse conseguiria esquecer assim tão facilmente.
— Não teria problema nenhum se você esquecesse, mas obrigado por lembrar — estico o braço e aliso com carinho a tatuagem em minha pele.
— Vou parecer intrometida demais se eu perguntar o que você está fazendo acordado uma hora dessas? — Raquel questiona encostando o queixo na palma de sua mão.
— Bobagem! Meu lado leitor não me deixou descansar nem mesmo quando eu terminei uma história que estava acompanhando. Pensei que fosse conseguir depois de descobrir o que aconteceu, mas pelo visto não foi o caso.
— Sei como é essas coisas. Já li alguns livros assim! Virei noites e desregulei meu sono completamente.
— Sério? Sempre estou em busca de histórias assim. Aquela que abala tanto, que afeta tanto o psicológico que quando a gente termina, só abraça o livro e solta um longo suspiro — digo empolgado.
— Esse livro acabou com meu emocional. Amei, cinco estrelas — ela completa.
— Exatamente... Você já teve vontade de escrever um livro? — pergunto pois não consigo tirar da cabeça o caderno e o jeito com que ela falava sozinha, anotando ideias.
— Na realidade já escrevi um. Estou no segundo — a voz dela sai tão baixa, num sussurro envergonhado, mas o silêncio que nos cerca faz com que eu consiga escutá-la com clareza. Raquel não está mais me olhando quando fala. — É interessante colocar as ideias assim no papel.
— Uau! Não acho que eu tenho a capacidade nem de escrever um conto! Onde é que posso encontrar a sua história para ler? — estou curioso.
— Não sei se você gostaria de lê-la. Na realidade eu escrevi uma história infantil para o meu sobrinho. Apenas imprimi as folhas e encadernei para ele. É o único exemplar...
— É, talvez não faça exatamente o estilo que estou acostumado, mas não posso me considerar um leitor se não me aventurar por outros gêneros e histórias — Raquel sorri com a minha resposta. — Vou parecer intrometido demais se eu perguntar a você sobre o que é o seu segundo livro? — devolvo, com o cuidado de utilizar as mesmas palavras dela de poucos minutos atrás.
— Para ser bem sincera, nem sei direito. Até o momento só tenho algumas frases perdidas, alguns esboços de personagem, nada com muita forma. Porém, tenho certeza de que será um romance — ela aperta levemente a estrela na ponta da caneta, e sinto a firmeza em sua voz.
— Acho que você está no local certo para escrever um romance... — aponto ao redor.
— É... Não foi bem por isso que eu entrei no programa, e não pretendo utilizar as coisas que talvez vivencie aqui para dar forma ao que quero escrever, mas não sei explicar muito bem, a situação parece soltar meus dedos — ela passa a unha levemente sobre a capa do caderno ao falar.
Penso em pedir para dar uma olhada no caderno, mas o modo como ela o está abraçando, tão defensivamente, não quero forçá-la a me mostrar apenas porque pedi.
— Mas você alguma vez já tentou escrever algo? — Raquel volta a conversar.
— Olha, já tentei. Não sou muito bom em criar algo do zero, mas já ajudei o pessoal da banda com as composições. Algumas trocas de palavras aqui e acolá, nada de muito significante... — dou de ombros.
— Ah, então você é um revisor — ela parece pensativa, então usa a caneta para prender seus cabelos.
Já li algumas histórias onde os autores descrevem os penteados femininos, onde cachos e fios de cabelo ficam soltos, emoldurando o pescoço delgado. Eu nunca tinha achado aquilo relevante até ver pequenas mechas de cabelo saindo de seu coque improvisado.
Os fios roçam levemente no pescoço enquanto ela gira as mãos não tão habilmente atrás da cabeça, prendendo o cabelo. Não sei se essa quantidade de cabelo que insistiu em permanecer solta a incomoda ou não, mas ela parece belíssima.
Estou me tornando um desses homens de livro, babando por uma mulher que apenas prendeu o cabelo na minha frente.
— Acho que não é para tanto, mas vou aceitar o cargo — balanço a cabeça levemente enquanto digo a frase, tentando reorganizar as minhas ideias.
— Pode não ser muita coisa para você, mas tenho certeza de que quem já recebeu a sua ajuda nisso é grato pelas dicas e apontamentos. Leitura crítica então? — ela volta a apoiar o queixo com a mão.
— É, acho que isso é mais a minha área. Posso indicar algum trecho que talvez não tenha entendido corretamente ou algum trecho que eu, na minha humilde opinião, ache que você possa melhorar. E mais uma vez, aceito.
— Quando eu tiver coragem para mostrar isso para pessoas além da família, você será o primeiro a ver — o sorriso dela é discreto, mas tão lindo que aperta meu estômago.
— Sinto-me honrado. Obrigado. E correndo o risco mais uma vez de soar intrometido, mas o que te impede de mostrar para mais pessoas? — indago curioso.
— Acho que é o clássico mesmo, tenho medo de ouvir algo que não goste sobre a história que tive tanto trabalho para fazer... Não sei se serei boa em ouvir críticas e quem sabe algo mais. Escrevi por diversão, nada mais — Raquel dá de ombros, querendo fazer como se aquilo não a incomodasse, mas algo dentro de mim dizia que ela se incomoda sim.
— Mas você se divertiu fazendo isso? — a pergunta escapa de mim antes que eu consiga controlar.
— Claro que sim! — e o modo como o seu olhar brilhou, mesmo na penumbra, me fez sorrir.
— Então você tem certeza de que, pelo menos, um leitor gostou. Você. E uma regra básica sobre a internet: não se apegue demais aos comentários. Já é mais do que suficiente fazermos uma coisa que gostamos e não machucamos ninguém com isso — digo com firmeza, e minha mão busca a dela que está apoiada em seu joelho. Dou dois tapinhas de leve ali, mostrando a verdade vivida em minhas palavras.
— Sabe, eu menti mais cedo... — ela confessa ficando corada. Não digo nada e espero que continue a falar. — Eu já tenho boa parte do livro escrita aqui nesse caderno...
— Tá tudo bem, não fiquei chateado por conta disso — e espero que a minha sinceridade tenha ficado evidente. — Okay, talvez tenha ficado curioso antes, e agora que falou isso essa curiosidade tenha aumentado, mas mais uma vez, tá tudo bem.
— Aqui, então acabe com essa curiosidade — ela fica um pouco mais ereta, e estende para mim o caderno de capa de couro. — Pode ler se quiser, e ser meu leitor crítico, também se quiser.
— Tem certeza? — questiono, pois, vejo que a mão que me entrega o caderno está um pouco trêmula, mas não menciono o fato.
— Tenho. Mas é bom você pegar isso da minha mão logo, antes que eu mude de ideia — ela ri.
Então faço o que ela pede e assim que o tenho em mãos, começo a folhear. Vejo a sua letra corrida, um pouco bagunçada, mas de uma forma legal combina com ela. Quando ergo um pouco mais o caderno, para que consiga ler algo com a faixa de luz que vem da janela, suas mãos agarram meus antebraços e ela me conduz a fechar o caderno.
— Okay, você pode ler, mas será que dá para não fazer isso na minha frente? — vejo aquele receio estampado em suas íris.
— Ah sim claro, desculpe — digo um pouco envergonhado.
— Tudo bem. Você pode ler se quiser agora. Acho que vou voltar para o quarto e tentar dormir um pouco. Teremos mais coisas para gravar amanhã... — Raquel estica o corpo, se espreguiçando. — E quer saber? Você também deveria tentar dormir um pouco.
— Vou tentar, mas não garanto nada — abro um sorriso. — Se você me vir com olheiras enormes por aí amanhã, já sabe o que é!
— Não sei se isso vai ser uma coisa boa ou ruim — ela mordisca o canto de seu lábio inferior. Cortando o contato visual comigo, ela fica de pé, esticando mais uma vez o corpo e desvio o olhar, acho que ela nem percebeu que suas pernas agora estão na minha linha de visão.
— Com certeza boa! Nunca que eu perderia o sono por uma história mais ou menos... — e então fico de pé, segurando com cuidado o caderno. — Boa noite então Raquel, obrigado pela leitura!
— Espero que goste, mas pode ser sincero caso não — com um aceno e um largo sorriso ela se despede.
O couro está quente sobre meus dedos e solto um suspiro. A noite ainda vai ser longa...
Olá leitores! Primeiro, quero pedir desculpas a todos vocês pela pausa no livro. Não entrarei em detalhes, mas perdi uma pessoa muito importante para mim no ano passado, e fiquei imensamente abalada/triste durante um bom tempo. Não vou dizer que agora estou 100%, mas estou bem melhor, e finalmente consegui voltar a produzir essa história que gosto tanto e que me traz tanta felicidade. Realmente espero que vocês entendam o meu lado e que voltem a acompanhar com a mesma alegria o Taz.
Ainda naquele flashback gostoso como vocês perceberam pelo nome do capítulo e pelos acontecimentos! E confesso que estava revivendo muita coisa da primeira história enquanto escrevia isso!
Agora no começo, como vocês podem perceber, ainda estamos flores, conhecimento e arco-íris. Precisamos desse pano para quando chegarmos lá na frente e rasgarmos tudo, não é mesmo?
Taz com consciência que está pensando igual aos "mocinhos" de alguns livros que lê é uma delícia de escrever, e eu vivo por isso! O moço é dramático e sabe como utilizar isso a seu favor. Raquel além de saber conversar com o lado leitor dele, ainda por cima mostrou um lado escritora que Taz mal sabia que precisava conhecer! Vamos lá continuar com essas conexões, encontros e ver até onde os dois vão se permitir.
Obrigada a todos vocês que estão acompanhando! Não se esqueçam de deixar aquele voto belíssimo e quem sabe aquele comentário para eu saber quem ainda está por aqui!
Ainda temos mais "recordar é viver", então aguardem um pouco mais enquanto essa história dos bastidores vai ficando cada vez mais clara.
Até a próxima semana pessoal!
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