Um doce rapaz...
Por Eliseu...
Isso começou há quatro anos atrás, mas me lembro como se fosse hoje, que meu exame de colesterol deu 300 e o médico, aquele cavalo, disse:
— Tá meio gordinho, precisa fazer uma atividade física.
Ai que ódio quando a pessoa chama a gente de gordo, eu odeio.
— Sim, eu não dou aula sentado, coração. Corro de uma escola pra outra...
— De carro?
— Tá, como que vou a pé de um bairro pro outro? Que que isso tem a ver com colesterol?
— Posso falar?
Ai que cavalo, esse cara. Só porque é cardiologista, não quer dizer que é o dono da verdade absoluta. Cruzo os braços com a expressão: Vai desembucha!
— Tá... você tá com vinte e nove anos, 1,66 e 82 quilos, colesterol alto e está exposto a um nível alto de estresse. Seu coração é uma bomba...
"Blá, blá, blá", completo mentalmente. "Dou aula de história, gato. Quer ouvir uma?"
— Resumindo, exercício físico e blá, blá... Certo, me dá logo o atestado, a receita que tenho que almoçar correndo... tenho prova já na primeira aula.
Pelo tesudo do médico, eu até ia querer ter uma parada cardíaca, mas pela chatice dele, resolvo que vou correr, andar de bike, dar a bunda ou qualquer coisa que me faça gastar energia. Sei que não quero ver a cara desse chato tão cedo. Nunca precisei de médico, pois minha saúde é de ferro e me decepcionei, sinceramente. Nem sequer precisei tirar a roupa.
Posso ser tamanho G, mas eu não tenho neura com minhas gorduras não, meu ex adorava.
Mas porque terminei com ele?
Resposta: Conflito de interesses... Alejandro, meu chileno amoroso, era mais menina que eu e bem no fim a gente era mais amigo que namorado. E antes de rolar estresse, foi melhor separar. Peguei minhas coisas, abracei ele e aluguei um apartamento no centro. Sempre quis morar no centro...Enfim, lugar novo e uma chance de conhecer um bofe por essas bandas. Não tinha muito luxo nos móveis, mas o apartamento era grandinho.
Eu posso ter meus defeitos, mas sou uma pessoa pro que der e vier, então fiz amizade bem rápido no prédio novo e levei fama de melhor pessoa, quando uma vó, veio "chorar" pra mim no elevador, que precisava fazer uma cirurgia e não tinha com quem deixar o Lulu, desgraçado, praga do inferno daquele cachorro.
Mal sabia o que isso ia me custar. Mas tudo bem, a véia melhorou e o cachorro foi embora com ela. Só que ela espalhou isso pra todo mundo:
"Aquele menino é de ouro, tudo que precisar dele, ele ajuda, vê se ele não pode ficar com seu filho nos domingos, ele é professor e fim de semana não faz nada".
Nada contra criança, mas eu não curto não, já aturo na escola...Em casa eu quero paz. Ainda mais o filho da Janaína com o Capiroto. Porque ele não era gente. Imagina que grudava meleca debaixo da mesa de granito, peidava do meu lado e comia salgadinho coçando o pinto.
Depois do segundo domingo eu falei que não dava mais e a dona do apartamento só alugou pra mim porque eu não tinha criança. Mentiraaa! Claro que saí disso na boa. Vai se foder, verão e a vagabunda queria ir tomar sol e deixava o "exuzinho" comigo. Se fosse por doença, uma necessidade... mas pra ir na praia se bronzear, afffs.
Depois com aquela cor, marca de biquíni e toda gostosona, a Jana só me atrapalhava nos esquemas por aqui. Sem chance. Cansei dessa vaca entrar comigo no elevador quando eu tava de olho num sujeitinho e ela chegava espalhando o cheiro de Lilly do boticário no ambiente.
Eu tava "cagado" sem sorte mesmo, tinham uns caras que eu tava de olho, mas ou eram tudo passivo que nem eu ou hétero (incubado). Aí o Eterno lá de cima olhou pro Eliseu aqui e mandou um milagre de olhos verdes, cabeça raspada, com uma barba por fazer de dois dias, provavelmente calçando 39, calça social grafite, camisa branca de manga curta que deixava o antebraço peludo amostra, uma bunda boa, mas a mala, amiga, daquela de encher a mão. Não sou uma pessoa muito reparadeira ou detalhista, mas vocês precisavam era conferir isso tudo.
— Bom dia, querido. — Ele me cumprimenta com essa educação, enquanto o perfume bom dele me deixa "bêbado". Ah, bêbado eu fico muito fácil...
— Ah, bom dia Túlio. Nossa tô dormindo nas calças.
— Eu imagino. Você dá aulas os três períodos, não é?
Ele lembrou disso?
— Então...
Ai eu não acredito, fiquei com rosto quente, devo estar vermelho. Túlio sorri, lindo!, chega mais perto e pede...
— Posso?
— Claro, por favor...
— Teria como dar uma chegadinha pro lado... que vou pra garagem.
— Ah, claro. Nossa... eu também. É o sono, desculpa.
— Não por isso, querido. Bom dia e bom trabalho.
Entro no meu carro e lembro de respirar. "Que macho!" Se eu não quebrar o jejum agora, não sei quando. Mas vale a pena, só vendo o macho gostoso que é o Túlio, pra entender o calor nas partes que me dá.
Dia normal na escola. Normal assim:
"Professor, posso tomar água?"
"Sor, o Cleiton soltou pum aqui do meu lado".
"Profi, não apaga esse lado do quadro, não terminei de copiar".
"Psor, porque "degolariaram" o Tira?".
"Que Tira, garoto?"
"Tiradentes, hahahaha"
A turma toda dá risada e eu surto, umas vinte vezes até o recreio do vespertino. Na sala de professores entro do meu jeito "discreto" de ser, e a Miriam que é da Igreja, me dá bronca.
— Sossega a periquita, rapaz.
Ela pode ser crente, mas é o máximo. Amo essa estranha da Miriam, pois ela me censura de forma carinhosa, me abraça e tenta fechar minha boca quando conto pra ela minha primeira vez.
Cleber é mais senhor e nada diz, só olha sério e umas outras professoras que já são da farra colocam a maior pilha em mim.
— Ui Ivana, tira essas tetas do meu braço, eca. Desencosta.
— Só tu né Eliseu, rejeitar um material desse aqui.
Tá certo que a Ivana é bem atraente e eu amo essa "suja", mas me amo ainda mais do meu jeito "alegre" de ser.
— Querida, você sabe bem do que eu gosto.
— Eliseu. — Miriam precisa me censurar vez ou outra. — Ainda vou te arrastar pra igreja comigo, seu sem vergonha.
— Ai, me leva mesmo... preciso de uma benção de olhos verdes que mora no meu prédio. Affs, precisa me ver conversando com ele, tô quase fazendo a "discreta"...
— Tu, hahahaha... Isso eu queria ver. — Ana Clara que é professora de séries iniciais. Vive grudada em mim e disse que sua maior tara era ter uma noite comigo. Nada contra a aparência dela, porque também sou gordinho, mas ela tem uma dificuldade imensa pra entender que não vai rolar nunca, nem do dia de são Nunca. — Eliseu faz o jeito "normal", ai deixa eu ver como que é quando você faz jeito de homem...
— Sou homem, aiii criatura, fica difícil te aguentar com essa besteira... Gente, que saco...
E não adianta brigar com ela, pois a perereca não desgruda. Gente, eu não odeio as mulheres. Na verdade as amo, amo de paixão e sou um admirador do potencial feminino. Mulheres são guerreiras, são lindas e maravilhosas. O que odeio é ficarem focando nisso, nessa questão de tentar me "converter" ou me "curar"... Ah, que vão tomar no cu, isso me irrita.
Faz uns meses que o Túlio se mudou pra cá e nada de ele morder as iscas que jogo. Então, eu "atiro pra matar" enquanto esperamos um dos elevadores parar:
— Sua ex mulher é fisioterapeuta?
— Ah, sim. Opa, deixa eu te ajudar com essa caixa, querido.
— Ei Túlio, você costuma dar uma saidinha? A gente podia comer um lanche aqui na frente, dia desses...Tomar um chopinho com isca de camarão...
Ele não responde, fica pensativo parecendo meio triste.
— Se eu comer um lanche ali daquela lanchonete, vou precisar dobrar o treino...
— Ah que é isso, olha pra você, tem tudo firme, nem barriga tem... Pior que papo de gordo é só comida, né...
Dou uma risada e ele ri comigo quando entramos no elevador.
— Você não é gordo, Eliseu... Tem boa aparência... Olha, aquele lanche de picanha deles é bom...
— Então vamos... Deixo as caixas lá em cima e a gente desce pra comer... podemos pedir o gigante, aí ele servem aberto no prato pra nós dois...
Túlio não responde e dessa vez sobe até meu andar calado. Sem dizer sim ou não. Gosto desse cara e queria que ele desse uma chance pra gente se conhecer melhor. Mas tá difícil. Depois, eu já tive suspeitas de que ele é do babado, porque fico olhando ele segurar os documentos e sei lá, ele já deu pinta mais de uma vez... Mas pode ser que não é...
— Pronto, ai Túlio que bacana, entra... Vou fazer um café pra gente, espera...
Mas ele já está perto da porta.
— Eliseu, me desculpa, cara. Não quero que você crie expectativas comigo. Tenho uma pessoa e não gostaria de dar motivo pra desconfiança... Gosto muito dele...Você é um cara 100%...
— Ah... ele...
É ele! O ridículo do Braz, projeto de ator pornô.
Sabe aquela pessoa que nunca te fez nada, mas o santo não bate? Esse cara é assim. Não gosto dele e ele fica sorrindo com aquele sorriso de comercial de "pasta" de dente. Lógico que o Túlio prefere aquele cara, só um daqueles anéis que o Braz usa dava pra comprar um sofá, rack, TV e um tapete bem peludo. E o relógio? Não sei... não conheço eles pra ficar falando. Melhor eu me concentrar na minha vidinha...
Pior que quanto mais a gente "apanha", mais a gente gama e passaram-se alguns anos assim. Túlio com aquele português peludo, fedendo a perfume caro e... eu com meus esqueminhas.
Tendo um esquema aqui e outro ali, a gente nunca conhece direito a pessoa, mas aceita ficar só pra não sentir tanta solidão. Eu já ouvi muito:
"Ah, você nem é gordo, é gostoso."
"Capaz, Eliseu, me amarro num gordinho."
"Isso é excesso de gostosura."
"Pra que emagrecer? Tá bom assim."
Mas então porque eu tô sozinho? Se ninguém liga pra aparência?
E o meu jeito afeminado?
"Eu gosto do seu jeito."
"Cada pessoa tem seu jeito."
Ninguém liga pra isso também, mas continuo sozinho.
Na época que o Túlio casou, eu tava com um cara, um que conheci na academia, por incrível que pareça.
Na metade de 2016, decidi que não queria mais ser fofo e sim sarado, durinho e gostoso. Lógico que com minha cara bonita eu nunca tive neura, gosto do meu rosto, mesmo bolachudo, tenho um sorriso bonito e covinhas igual minha mãe. Na verdade, eu sempre me achei bonito do meu jeito e em algum momento percebo que associei minha "beleza" fora de padrões como a solidão que deixa minha cama gelada no inverno.
Meus anos avançam rapidamente e isso me preocupa, pois logo posso morrer de velho e sozinho. Já cheguei nos 33 anos e ainda tô solteiro. Dizem que piscianos são sonhadores e dramáticos, não me acho dramático, sonhador até concordo. Ainda bem que não me iludo.
Fiz uns meses de academia só pra perceber que eu não tava feliz com aquilo. O boy ficava me pressionando pra correr, mudar toda minha alimentação e passou a me elogiar quando atingi alguns resultados, mas acabei ficando deprimido. Sentia fome, sentia cansaço e mágoa em perceber que pra ter alguém me paparicando, eu tinha que alterar minha configuração externa.
Se com todo meu conteúdo, formação acadêmica, família "gente boa", independência e simpatia, eu não amarro ninguém, não vai ser com uma "casca" feita na academia que vou amarrar.
Novembro passado, eu chutei o balde, mandei o Roberto se fuder e enfiar o supino inteiro no rabo. Imagina que ele disse essa frase na academia:
"Vamo detonar esse "panceps".
A gente até ouve isso... aguenta meia dúzia de débil mental rindo...
"Eliseu tá com físico de jogador, né mor"
Eu bem idiota ainda fui perguntar:
"Sério, mor... Você acha?"
"Só se for jogador de dominó".
Imagina que fiz barraco. Só fui expulso do ambiente pela agressão, por um "maromba" que jamais vai chamar a polícia e pra ter que contar que tomou uns tabefes de um gordinho boiola.
Antes só...
Entrei na jornada: em busca do amor, mas primeiro por mim mesmo, é claro. Meu amigo arrumou um gigante e casou, porque que eu não? Deve ter alguém por aí me esperando...
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O pessoal, eu de novo... escrevi umas linhas sobre o Eliseu que não terá a mesma doçura do Bombonzinho, mas sim, seu próprio jeito doce de ser.....
No próximo capítulo, apresento o Marçal...
Abraços e carinho a todos!!!! ♥
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