Capítulo 50
O ANEL
Liza
Como eu havia imaginado, Nate se irritou quando mencionei o convite de Ethan para ajudá-lo na escolha do anel de noivado.
— Você não vai, Liza.
— Sabe que eu nunca imaginei que um anjo pudesse ser cismado? — Eu detestava saber que era a causa da irritação dele. Nate tinha o tronco recostado na cabeceira e as pernas esticadas sobre a cama. Sua expressão estava dura como pedra.
— Para, Liza. Você está me matando de rir — disse sério e cruzou os braços fortes. Obviamente não mudaria de opinião. — E eu não sou cismado, sou apenas atencioso. Não posso confiar nele depois do que aconteceu no Natal.
— Nate, foi um pedido inocente. Eu achei até gentil da parte dele me incluir. Ele sabe que desejo participar, porque se dependesse da Raquel, eu nem o conheceria. Aliás, foi você quem os apresentou quando vendeu o Pallais para ele e salvou Raquel da cilada na festa das asas. Deveria estar feliz, estão juntos graças a você.
— Você também foi contra no início — ele bufou.
— Contra o casamento. Não contra o Ethan.
— Sejamos honestos, Liza. Não acha que é tudo rápido demais?
Eu sabia que a discussão estava perdida, ele ainda não havia se movido um milímetro.
— Não acha que seria hipocrisia pensar dessa forma, Nate? Levando em consideração como tudo aconteceu conosco?
— Não, foi diferente.
— Como?
— Você sabe. Não preciso explicar. — Ergueu as sobrancelhas como se fosse algo óbvio.
— Não me convenceu. Se há uma coisa que a Raquel sempre soube, é o que ela não quer. E se ela o quer, não há nada que eu possa fazer.
— Isso não quer dizer que precisa ajudá-lo a escolher o anel. Parece que ele usa isso como pretexto para ficar sozinho com você.
— Quase parece que está com ciúme. Apesar de não fazer o menor sentido. — Ele revirou as esmeraldas que brilhavam furiosas.
— Se eu pudesse voltar no tempo, não os teria apresentado. Eu mal o conhecia. Mas não imaginei que pudesse estar enganado quanto a ele. Imagine só, um anjo estar errado a respeito de outra pessoa. Você não acha estranho que ele tenha conseguido fazer isso?
— Ele não fez nada, Nate.
— Ele esconde algo. Eu sei disso.
— Você não sentia isso antes do Natal. O que sente agora é humano, por isso essas intuições. Não vem do seu lado anjo, conheço o sentimento. Chama-se paranoia.
— Adoraria concordar com você — rosnou olhando o teto. De repente, o olhar dele pareceu se iluminar com alguma ideia. — Tudo bem, você vai. — Estendeu a mão para mim quando viu meu sorriso se abrir. — Mas eu vou junto — concluiu. Seu semblante dizia nitidamente que o assunto estava encerrado.
— Não. Ele vai perceber que você está indo como guarda-costas.
— Não. — Exibiu o sorriso de canto de boca, que clareava seu olhar. — Porque ele não poderá me enxergar.
— Mal posso esperar. — Derrotada, voltei a me deitar ao seu lado.
— Liz, eu não posso deixar você sair desprotegida.
Nate se inclinou para cima de mim e beijou minhas bochechas, uma de cada vez. Depois me encarou com seus olhos penetrantes e perfurou toda a barreira defensiva que eu havia construído. Sem resistir, puxei-o pela nuca e o beijei.
***
Acordei tarde na manhã seguinte com o cheiro de panquecas, e a expectativa do que me aguardaria na saída com Ethan para a escolha do anel. Ben e Amanda já haviam saído para o trabalho. Por sorte, ou azar, eu já nem sabia mais, a Sra. Barbara havia me dispensado mais uma vez de ir trabalhar.
Nate cantarolava na cozinha. Colocou a mesa com sucos, pães, geleias e flores que eu não havia comprado. Nitidamente tentava compensar o que estava por vir. Eu tentava ficar mal-humorada, só tentava. Porque ele era irresistível demais. Vestia uma calça jeans e um pulôver preto de manga comprida,dobrado até o cotovelo. Absurdamente sexy.
— Bom dia, Liz.
— Bom dia. Acordou animado?
— Claro. Eu dormi com você. — Ele piscou o olho.
Abri um sorriso espontâneo e sentei na cadeira próxima a janela.
Nate parecia muito satisfeito quando terminamos de comer as panquecas. Eu estava ansiosa.
— Não vejo como pode achar isso divertido.
— Mas verá. Prometo.
Corri para a porta ao ouvir a campainha. Nate sumiu, eu fiquei instantaneamente nervosa.
E se Ethan notar algo? Fiquei tão ocupada com o meu mau humor que me esqueci de perguntar se eu serei capaz de vê-lo.
Girei a maçaneta.
— Liza! — Ethan sorriu radiante. — Estou muito feliz por aceitar o meu convite.
— Obrigada, Ethan.
Saímos em direção ao carro. Procurei por passos que não eram os meus na neve, mesmo me sentindo ridícula.
Como Nate entraria no carro? Sem pensar, abri a porta de trás e esperei alguns segundos antes de fechá-la e ir até o banco da frente.
Ethan me analisou, confuso.
— Desculpe, estou distraída. Esqueci que Raquel não está no carro.
Sentei-me e mexi o retrovisor para olhar o banco de trás. Vazio.
Comecei a me sentir angustiada.
Será que Nate desistiu da ideia e foi embora?
Encostei-me desanimada na janela e vi pelo espelho duas esmeraldas piscarem para mim, com um sorriso divertido no rosto. Sorri de volta e olhei assustada para Ethan, que manobrava alheio a minha aflição. Ele não via Nate. Aquilo foi surreal.
Em poucos minutos, chegamos a uma rua cheia de lojas aparentando glamour. Do outro lado da calçada, avistei uma enorme joalheria. Nem me perguntei por que nunca havia reparado, era óbvio. Eu não frequentava essas lojas e não ligava para joias.
Descemos do carro. Nate andava atrás de mim. Uma vontade enorme de ficar espiando pelo meu ombro me tomava a cada dois passos. Ele notou e veio para o meu lado antes que meus gestos o dedurassem a Ethan.
Entramos em uma loja de anéis. Todos pareciam caríssimos. Raquel iria adorar. Nate parou ao meu lado e recriminava cada anel que Ethan segurava. Ele fazia careta e sacudia a cabeça, quando Ethan pedia um novo anel ao atendente.
Eu estava achando aquilo cômico. Soltei uma pequena gargalhada e fingi tossir em seguida para disfarçar.
— Adoro quando cumpro as minhas promessas — sussurrou com sua voz suave em meu ouvido.
Fiz sinal para que Nate se calasse. Não iria conseguir me controlar se falasse comigo. Ele fingiu trancar a boca e soltei outra gargalhada. As vendedoras me olharam com desprezo, porque eu ignorava Ethan.
Não sei há quanto tempo Ethan segurava um anel a minha frente. Vi que ele sustentava um olhar triste, quando minha vista focou a loja novamente.
— Desculpe, Ethan. — Limpei a garganta. — Este anel é lindo!
Então eu olhei de verdade para a joia. Um brilhante, púrpura, lapidado discretamente com uma sutil insinuação de um coração. O seu contorno era formado por pequenos cristais.
No instante em que olhei para o anel, cada fibra do meu corpo passou a desejá-lo de forma doentia. Perdi o ar. Passei a precisar daquele anel. Alguma coisa obscura dentro de mim disse para matar Raquel, se fosse necessário.
Um nó de angústia apertou minha garganta.
— Experimente, Liza. Assim saberei se caberá em Raquel.
Os olhos escuros de Ethan reforçaram o meu desejo. Eu queria. Eu precisava. Era meu. Seria sempre meu. No minuto que o segurei com a ponta dos dedos, minha angústia se multiplicou. Precisava usá-lo. Nunca mais o tiraria. Segurei o anel com a mão esquerda e estiquei o anular da mão direita, pronta para deslizá-lo no dedo.
Uma sensação quente se espalhou por meu corpo quando duas mãos fortes me agarraram nos ombros. Foi como sair de um transe. Pisquei e olhei tonta para o anel que ainda segurava. As palavras saíram de mim, mas não fui eu quem as disse. Foi Nate:
— Não posso, Ethan. Raquel detestaria saber que experimentei o anel dela. — Depositei o brilhante de volta em sua mão.
— Mas não vou contar a ela. — Ele segurou a joia e me ofereceu novamente. Parecia ansioso.
— Não. Preciso ir. Desculpe, acabo de lembrar, estou atrasada para o trabalho.
Ethan estreitou seus olhos escuros para mim. Senti as mãos de Nate em meus ombros. Saímos da loja e andamos até um lugar suficientemente discreto. Nate nos levou de volta à minha casa.
Meu quarto diminuiu perante sua fúria.
— Eu sabia. Desgraçado! Não, eu não vou deixar! Preciso descobrir o que ele tem a ver com isso tudo.
Encolhi-me na cama.
— Liza, não se assuste. Prometo, não deixarei nada de mal lhe acontecer. — Nate se aproximou de mim.
— O que deixou você assim? — Passei a mão em seu rosto. Vê-lo daquela maneira me entristecia.
— O anel que Ethan lhe ofereceu não era da loja. Ele o tirou do bolso. Primeiro imaginei se ele o estaria roubando, mas depois ele o ergueu à sua frente e você ficou estranha. Havia algo macabro naquele objeto. Por pouco você não foi hipnotizada.
— Então foi isso o que aconteceu?
— Você lembra?
— Lembro-me de sentir que em um segundo mataria pelo anel, e de no outro, estar perfeitamente normal.
— Eu a livrei da hipnose. Tive medo de não conseguir, era poderoso. Nunca senti isso antes.
— Mas por que Ethan faria algo assim? Como?
— Não posso dizer agora, Liza. Mas vou descobrir. Preciso que passe o resto do dia no Penhasco.
Movi a cabeça para cima e para baixo, sem prolongar o assunto. A tensão dele se aproximava de algo palpável. E eu não queria lembrá-lo de que havia algo muito pior para nos preocuparmos. Além de simplesmente não conseguir ver Ethan como uma ameaça. Ele agia de modo estranho às vezes, mas me parecia ser a mesma pessoa de sempre. Acho que desejei a joia, como nunca quis um objeto em minha vida. Talvez, fosse um instinto para impedir o noivado.
Tentei me convencer disso, mas minha mente foi incapaz de ignorar os acontecimentos estranhos, cada vez mais frequentes. Nate bufava a minha frente e não havia nada que eu pudesse fazer para acalmá-lo.
Li mais uma vez o calendário na parede: Dezembro. O réveillon estava chegando. Em um ímpeto de fúria, arranquei as folhas da parede. Eu não precisava daquele lembrete diário. Meu próprio corpo pulsava como um relógio.
Em três noites, teríamos a virada do milênio.
A voz de Madame Nadja se tornou a minha pior maldição:
"... De um jeito ou de outro, algo se perderá na virada do milênio."
Analisei o rosto apreensivo de Nate.
Eu sabia que ele seria capaz de qualquer coisa por mim. Mas no fim das contas, talvez eu precisasse salvá-lo. Mesmo sem fazer a menor ideia de como isso seria possível. Eu faria. Sem hesitar.
Abracei-o e me despedi dele com um aperto horrível no peito. Não soube dizer se foi o medo ou intuição. Nate me deu um beijo rápido e desapareceu. Abri o armário e peguei o livro que ganhei de aniversário, Cem Anos de Solidão. Assim teria algo com o que me ocupar, enquanto o esperasse. Fui para o Penhasco.
Meus poros se eriçaram quando recostei na árvore e retomei a leitura. Pouco tempo depois, descobri o motivo.
E foi por algo muito pior do que eu imaginava.
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Oláá, e aí? O que estão achando?
Não tenho conseguido responder aos comentários, peço desculpas. Primeiro tive problemas no PC e agora estou tratando a cervical =/
Mas continuem comentando pq eu sempre leio e adoro saber o que estão achando! <3 Não esqueçam da estrelinha!
Beijoss
Amanhã tem mais um!
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