Capítulo 3
O ENCONTRO
Três meses depois...
Liza
Depois de perder o emprego em Los Angeles alguns dias atrás, decidi ouvir o conselho do Delegado Machado de seguir em frente. Quer dizer, resolvi tentar. Passamos quatro meses tateando no escuro. E ele prometeu prosseguir com as investigações, mesmo após o caso ter sido arquivado. Prometeu entrar em contato, caso alguma pista surgisse.
Após o desaparecimento dos meus pais, passei a cuidar de tudo sozinha, e por tudo digo, buscas por pistas, trabalho, e a responsabilidade por uma irmã rebelde. Senti-me envelhecer quinze anos em quatro meses. A minha sorte foi que meus pais investiram em uma poupança, desde o meu nascimento, até que eu completasse 21 anos. Caso contrário, não sei o que teria sido de mim e Raquel.
Confesso que andava cansada, mas nada poderia apagar as minhas dúvidas. Porque não eram apenas questões, e sim, dois buracos vazios em meu peito. Dois buracos que eu forrei com o trabalho, com as buscas por L.A., me preocupando com Raquel, que não colaborava em nada, e sonhando acordada com um par de olhos. Verdes, como esmeraldas, no topo de um magnífico Penhasco.
Gritei inúmeras vezes, para o teto do meu quarto:
— Pai?! Mãe?! Onde estão vocês?!
Claro que nunca obtive respostas, e com o tempo, fui obrigada a me conformar. Acho que resignação era a palavra.
Então é isso... Hora de seguir em frente.
Será que alguém consegue? Será que Raquel e eu vamos conseguir?
Minha irmã se transformou em outra pessoa, rebelde, parecia ter raiva de mim. Mas eu precisava ser paciente, afinal de contas, agora era eu a responsável. De qualquer maneira, não havia mais volta. O último mês na pensão da senhora, Schneider, estava quitado. Nossas malas, dentro do carro. Em meu íntimo, eu desejava que essa fosse a nossa última mudança. Iríamos morar com Ben e Amanda, meus dois amigos de infância. Eu estava ansiosa para encontrá-los. Tê-los por perto, com certeza, melhoraria as coisas.
A casa ficava em Winterhill. Uma pequena cidade no norte dos Estados Unidos, famosa por suas belezas naturais, suas construções no estilo da Inglaterra do século XVIII, e por possuir a sede da melhor faculdade de direito do país.
Como carregávamos muitas malas, achei melhor alugar um carro para chegar a Winterhill. Além de o carro ser velho e lento, minha irmã fazia questão de reclamar a cada quinze minutos, sendo pacientemente ignorada por mim durante todo o trajeto da viagem.
— Será que não tinha um carro pior para você alugar?
— O carro é o suficiente para atender as nossas necessidades do momento.
— Eu não quero mais me mudar! Basta eu começar a criar algum afeto pelo lugar em que estamos, e você resolve ir embora.
Mudei a estação do rádio e não respondi. Mas não poderia ignorar a afirmação de Raquel. Era como se tudo em nossas vidas caminhasse dois passos à frente e recuasse dois passos atrás.
Chegamos em Winterhill. Subi os degraus da frente da casa, carregando as duas primeiras bagagens, e estaquei diante da porta, porque Raquel se recusava a sair do carro. Apesar da minha insistência e dos olhares curiosos dos vizinhos, ela me ignorava, enquanto eu acenava e a chamava. Permanecia estática com a pose de "estou ignorando você". Ela era muito boa nisso. Suas formas de mulher adulta aumentavam a sua convicção. Raquel enrolava seus longos e volumosos cabelos pretos nos dedos. Fitava um ponto fixo à sua frente, para evitar me encarar com seus olhos azuis cobalto, idênticos aos do nosso pai. Larguei as malas, voltei até o carro e me inclinei na janela do carona.
— Será que você pode tentar não tornar as coisas mais difíceis?! — pedi nervosa com a situação.
— Eu me recuso a ficar aqui! Vou voltar para Califórnia!
— Ótimo. Aproveite e mande lembranças à família. Ops! Esqueci que sou tudo o que você tem agora!
Após meu comentário, ela abriu a porta do carro com força e passou correndo por mim. Mas antes de entrar na casa, tropeçando nas próprias pernas, vi de relance seus olhos cheios de lágrimas. Percebi que havia sido cruel, mas, Raquel deveria estar facilitando em vez de criar empecilhos, pois sofríamos da mesma perda. Segurei as malas e me preparei para segui-la. E algo inesperado aconteceu. Meus pés colaram no chão. Arqueei as costas quando uma suave brisa moveu meus cabelos. Fechei os olhos e pensei, instintivamente, nas duas esmeraldas do homem do Penhasco. Não sei o motivo, mas não desisti de encontrá-lo novamente. Passei noites e noites imaginando seu rosto, certa de nosso reencontro.
— É você? — perguntei em voz alta e olhei para os lados.
Não havia ninguém ali. Apressei-me em entrar em casa antes que me flagrassem falando sozinha. Senti-me atormentada, mas se podia existir algo bom nessa tormenta, esse algo com certeza era ele. Mesmo sem nenhuma lógica, sem nenhuma prova, eu soube... Era ele. Reconheci o calafrio eletrizante que somente o homem do Penhasco poderia me provocar. Só sei que por um instante, poderia jurar que alguma coisa acariciou os fios perto de minha nuca.
***
O homem do Penhasco
Liza, Liza...
Você não faz ideia do quão perto estou de você.
Seja bem-vinda a Winterhill.
Estarei próximo. Muito próximo...
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