Capítulo 20
FUGA
Liza
Nathaniel é um nome comum, sim!
Não é não!
Deixe de ser paranoica, Liza!
Amanda me tirou da minha batalha interna ao me segurar pelos ombros e arregalar os olhos para mim:
— Ainda temos tempo, vamos correndo ao mercado e teremos a noite toda para preparar tudo.
— Mas a cozinha está preta! Eu quase queimei tudo hoje, esqueceu?
— Já sei! A gente limpa o quintal hoje e faz o jantar lá fora, vai ficar até mais bonito. — Abriu um sorriso, feliz com a solução encontrada.
— Você sempre me salva! — Não quis lembrar que nenhuma de nós duas sequer sabia como era o quintal dos fundos da casa, pois ficava na zona da bagunça, que ninguém queria arrumar.
— Então vamos, mãos à obra! — Amanda adorava a pressão de última hora, nunca foi muito organizada.
— Tenho uma ideia que vai facilitar. Eu te dou a lista de compras e fico aqui arrumando tudo.
Fiz a lista e entreguei a ela, que foi correndo ao mercado.
Eu não queria nem imaginar o quanto podia estar bagunçado, mas não daria a Amanda à pior parte. Peguei a vassoura, a pá e o cortador de grama. O quintal estava praticamente coberto por caixas de papelão abandonadas, sem falar no tamanho do monte de lixo acumulado no canto. Peguei as caixas, uma de cada vez, e as levei para frente da casa, o lixeiro as levaria pela manhã. No que me pareceu ser a vigésima e última caixa, Amanda já voltava com as compras.
— Por que você não chamou o Ben? — Olhou claramente assustada com a quantidade de lixo e peso que eu carreguei sozinha.
Peguei metade das sacolas de sua mão e fui até a cozinha. Amanda levou o resto.
— Ah, deixa ele em paz! Ele deve estar cansado, nem saiu do quarto. E eu já acabei com as caixas, agora só falta cortar a grama, varrer o chão e levar a mesa e as cadeiras lá para fora.
— Ou seja, tudo, né, Liza? A vantagem de ter um homem em casa raramente aparece, e quando acontece, você não aproveita. Não sei como fui ficar amiga de alguém boazinha desse jeito! — Ria, se divertindo com a incredulidade com que eu a olhava agora.
— Quando você fala assim, quase me convence de que só quis que ele morasse conosco por isso — fingi desapontamento.
Enquanto eu trabalhava no quintal cortando a grama, Amanda cortava as frutas e os vegetais como eu havia pedido. Conversávamos aos berros, os quais eram abafados pelo motor do cortador.
— Ben, finalmente você acordou! Já estava pensando em chamar os médicos para tirar você da cama! — berrou Amanda, animada, ao vê-lo parado no corredor entre a porta do quintal e da cozinha. Ele nos olhava parecendo confuso, provavelmente tentava entender o motivo daquele alvoroço.
— Resolvi descer quando comecei a sonhar que vocês duas gritavam por serem atacadas por um cortador de grama.
— Engraçadinho. Aproveite e vá lá fora ajudar a Liza. Ela deve estar precisando. Faz duas horas que está cortando e varrendo.
— Eu ouvi isso, tá, Amanda? O Ben pode voltar a dormir. Desculpe se te acordamos! — gritei do lado de fora.
Ben chegou ao quintal e tirou a vassoura da minha mão.
— Vá para a cozinha antes que a Amanda estrague a comida, eu termino aqui — debochou dos dotes culinários dela.
— Não, é sério, pode voltar a dormir. Estou quase acabando.
— Para de ser chata e vai logo, Liza! Mas antes me diga, qual é o motivo disso tudo?
— Amanhã à noite vou servir o jantar de aniversário da Raquel, lembra?
— Não, claro que eu não lembro. Mas você tinha esquecido? — Arqueou as sobrancelhas e sorriu.
— Rá! Bem que você queria! — Eu lhe dei as costas e fui para a cozinha antes que ele visse que havia acertado na mosca. — E esteja aqui amanhã às sete horas!
— Sim, senhora! Mal posso esperar.
A pia estava uma bagunça. Amanda cortava os ingredientes e eu os temperava. Trabalhamos um bom tempo ao som do cd de Evanescence.
Tarde da noite, Ben e Amanda foram dormir e me deixaram sozinha na cozinha. A casa, de repente, me pareceu morbidamente silenciosa. Comecei a arrumar espaço na geladeira, para guardar tudo que havíamos preparado. Ignorei a brisa gelada de cortar os ossos que invadiu o recinto, apesar de todas as janelas estarem fechadas. Apressei-me em guardar tudo, assim, poderia correr para a cama.
Não tem nada aqui, Liza! Não há porque ter medo.
Tentei me convencer, mas o ar me dizia o contrário. Ficou estático, pesado. Minhas costas enrijeceram, eu poderia jurar que havia alguém atrás de mim. Meu pulmão ardeu com o cheiro de sal, de terra, de orquídea. Fiquei imobilizada naquela posição. O pânico se alastrou por minhas veias, eu estava aterrorizada demais para me virar. Pelo reflexo na panela que eu segurava, vi uma sombra se mover na porta. Um vulto. Meu batimento vibrou violentamente na garganta. Levantei-me em câmera lenta, pronta para correr. Quando fiquei em pé, todos os meus poros se arrepiaram. Um hálito quente falou perto do meu ouvido. Soou como uma serpente. Uma voz que salivava.
"Lizaaaaaaaaaa"
Parei de respirar. Fechei os olhos e contei até dez. Eu devia estar presa em algum pesadelo.
— Liza, você é sonâmbula?
Soprei o ar com força ao ouvir Ben. Não percebi ele se aproximar.
— Não, Ben. Estava terminando de guardar as comidas de amanhã.
— Que cara é essa?
— Nada — menti. — É sono.
— Então, vai dormir. Você está estranha.
Meneei a cabeça e subi a escada para meu quarto.
Será que agora eu passei a ver coisas? Sei apenas que nas últimas semanas, bastava eu ficar sozinha para esses acontecimentos macabros aparecerem. Às vezes eu tinha a sensação de estar sendo perseguida, desde o dia em que acordei no Penhasco. Mergulhei na cama e puxei o edredom até o pescoço. Criei uma falsa segurança, como se o tecido pudesse me proteger. Uma calma sutil me atingiu quando peguei o travesseiro. Havia um restinho do cheiro de Nathaniel na fronha. Abracei-o com força e minha mente borbulhou de dúvidas.
Onde estaria Nathaniel?
Seria ele o convidado especial de Raquel?
O jantar seria um desastre se ele não aparecesse? E se ele aparecesse, como eu conseguiria agir naturalmente?
De onde vem essa voz que ouço?
Por que essas sombras me perseguem?
Entrei em estado de alerta.
***
Nathaniel
Aqueles dias que passamos distantes foram uma tortura para mim. Antes de poder explicar o motivo, deixei-a no escuro mais uma vez. Alguma coisa me puxou essa manhã, e me prendeu aqui.
Não sei que lugar é esse. Mas não consigo sair.
O que quer que seja é muito mais forte do que eu.
Concentrei-me como nunca para chegar até o quarto, e já sentia que era puxado de volta.
Observei Liza abraçar com força o travesseiro onde dormi.
Pobre Liz. Eu a estava abandonando com frequência, mas nenhuma das vezes foi de minha vontade.
Eu sentia a sua falta, como sentiria dos batimentos em meu peito, mas não poderia abandonar minhas buscas. Precisava descobrir o que estava acontecendo e o que eram aquelas sombras da noite de seu aniversário, antes de expô-la ainda mais ao perigo.
Minha proximidade, lhe trazia ameaças.
E a ameaça, agora, estava atrás de mim.
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Olááá, e aí gente? O que será que vai rolar nesse jantar?
Beijossss
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