E seu segredo

— NOTAS INICIAIS —

Olá, olá! Essa a primeira vez que estou postando uma original e também é a primeira vez que me desafio a escrever algo tão diferente e com tão poucas palavras.

A intenção de participar desse concurso era sair um pouco da zona de conforto e ver o que eu conseguiria desenvolver. Depois de finalizado, eu gostei bastante do resultado e criei dois personagens que eu gostaria de mostrar um pouco mais no futuro \o\

Espero que vocês gostem e possa me apoiar nessa história também!

Agradeço imensamente a minha alma gêmea, @girassoldegaveta por ter revisado e dado sua opinião quanto a esse universo criado~

Boa leitura!

— * —

"Você pode fugir quantas vezes quiser, mas o seu passado vai voltar para te assombrar, Thales. Cedo ou tarde, ele vai voltar."

Thales sabia que era verdade. Naquela noite, ele perdeu o homem que era seu namorado e melhor amigo por um erro que cometeu. Seu passado retornou da pior maneira para assombrá-lo e lembrá-lo que uma vida mundana estava longe de seu alcance. A felicidade não era um privilégio concedido em sua vida.

Agora Thales estava diante da cidade abandonada de Soturno, o lugar que guarda seus maiores sorrisos e também a sua ruína.

Todas as noites ele ouvia o eco da voz de seu pai repetindo aquela frase dentro de sua mente. O som ficou mais alto quando parou diante dos portões enferrujados da entrada de Soturno. Thales jurou nunca mais colocar os pés no lugar que o expulsou e o acusou de crimes que não cometeu, mas ainda assim aqui estava ele, disposto a provar sua inocência vinte anos depois, por meio de uma carta anônima de alguém que dizia saber a verdade.

Era um tiro no escuro, mas a carta dizia que ele deveria seguir uma pista básica deixada em seu quarto queimado na mansão. Naquele quarto, Thales encontraria as respostas necessárias.

A decisão de se tornar um detetive veio das acusações infundadas da polícia e das lágrimas que derramou todas as noites. Era incapaz de dizer a verdade. Não podia revelar onde estava ou o que fazia, não depois do erro que cometeu. Todo mundo descobriria seu pecado.

Com os desaparecimentos, apontar os dedos para o filho do fundador da cidade tornou-se oportuno. O garoto magro demais, pálido demais, de cabelos escuros e olhos heterocromáticos, um castanho e o outro lilás, totalmente diferente de seus pais e que tinha interesse no filho do diretor do colégio. Era como se ele fosse o estranho da família, em todos os sentidos aos olhos dos demais, embora houvesse uma explicação para isso. Ele não era da família.

Thales apareceu na porta da família Bloom e foi acolhido por Eva, sua mãe adotiva, que tomou para si um carinho que Thales nunca imaginou receber um dia. Quando ela faleceu, Thales percebeu que não era bem vindo naquela casa. Ouvia o irmão mais velho dizendo que ele era estranho e que fugia todas as noites. Ouvia o pai dando ordens para o segurança da família impedir que Thales saísse sozinho, como se ele fosse um prisioneiro.

Nada disso funcionava. Thales era esperto demais e isso os assustava.

Ele inspirou o ar seco da cidade e se assustou com o silêncio. Soturno era sempre tão alegre e agora parecia morta. A grama estava comprida e as flores despedaçadas, bem diferente de como ele se lembrava, mas ainda era estranhamente familiar.

Thales dedilhou o portão, ouvindo o barulho do metal ressoar contra sua pele no instante em que o sino da porta da antiga padaria tocou. Seus olhos seguiram a direção do som a tempo de ver alguém entrando no lugar.

Por que tinha alguém ali?

Ele rodeou a entrada procurando a passagem secreta que usava para fugir de seu pai na juventude. Ela ainda estava ali. Esgueirou-se por entre os arames farpados e soltou um chiado quando um dos arames pontiagudos rasgou seu terno cinza.

Engatinhou pela grama, resgatando a memória de quando ele e Gabriel — o tal filho do diretor que não podia sonhar que estavam juntos — saíam correndo pela noite, em meio a risadas, com uma garrafa de vinho roubada do estoque da casa de um dos dois. Eles corriam para longe de suas casas, na intenção de se afastar da pressão que sofriam. Ainda assim, era uma vida feliz.

As ênfases foram tantas que, infelizmente, sua alegria não durou tanto tempo assim e as suspeitas de toda a cidade recaíram sobre Thales. Tudo desmoronou quando Gabriel desapareceu sem deixar vestígios.

Thales correu pela rua até chegar na padaria. Trancada. Ele esfregou o vidro empoeirado e olhou para dentro, mas tudo parecia intocado, como se ninguém nunca tivesse pisado ali. Agora Soturno não passava de uma cidade fantasma.

Thales parou de andar no momento em que avistou a entrada da mansão. Lembrava de estar ali, parado, naquele mesmo local, vendo seu quarto em chamas quando alguns moradores revoltados invadiram o terreno e jogaram uma garrafa de bebida barata bem na janela do cômodo.

Ele ouviu as palavras grosseiras dos moradores pedindo para que seu pai, Arthur Bloom, o fundador da cidade, expulsasse o próprio filho na intenção de que os desaparecimentos acabassem, porque ele era demoníaco e não tinha mais salvação.

Não era ele. O causador dos desaparecimentos era outra pessoa, mas, novamente, como poderia explicar o que fazia tarde da noite todos os dias sem que assustasse os moradores? Como poderia explicar a terrível coincidência de que aqueles três jovens, inclusive seu próprio namorado — mesmo que ninguém soubesse disso —, tinham desaparecido quando ele sequer estava em casa para provar sua palavra?

Gabriel o entendia, mas ao mesmo tempo não o conhecia por completo. Ainda assim, Thales sentia que seria aceito se decidisse ser verdadeiro. Contudo, antes de ser sincero consigo mesmo e com o próprio namorado, ele o perdeu. O sorriso de Gabriel foi a última coisa que viu naquela noite, antes de se despedir e deixar que ele pegasse o caminho de volta para a casa.

Naquela mesma noite, Gabriel desapareceu. Duas noites depois, foi a vez de Amanda, sua amiga de infância. Três noites depois, Felipe, seu antigo colega de classe. Thales estava ligado a todos os desaparecidos e não tinha argumentos para provar sua inocência. Era claro como o dia que ele seria o primeiro suspeito. Talvez o único.

Thales se espremeu entre os portões entreabertos da mansão e caminhou até a varanda. A porta estava aberta, como se seu pai sequer tivesse se dado ao trabalho de fechá-la. Não havia mais nada além de um espaço vazio e empoeirado.

Thales caminhou até o centro da sala e seus olhos se entristeceram quando viu a parede coberta de fotografias. Todas as suas fotos estavam lá, rasgadas, como se ele fosse um monstro que deveria ser esquecido.

Ele subiu as escadas e, ao chegar no topo, encontrou a porta preta de seu quarto. O cômodo estava do mesmo jeito que deixou quando foi consumido pelo fogo. As chamas foram contidas antes que se espalhassem pelo resto da mansão. Thales empurrou a porta e sentiu a sola de seus sapatos sociais pressionarem alguns de seus objetos pessoais. Era incapaz de reconhecê-los por causa das cinzas.

Seus olhos percorreram o quarto. Uma parte dele estava chamuscada e a outra completamente destruída. Sua cama, posicionada em frente a janela despedaçada pela garrafa, foi a primeira a sucumbir às chamas. Estava claro que a intenção dos moradores era que Thales estivesse dormindo e fosse levado pelo fogo do inferno como o suposto demônio que era.

Thales andou pelo quarto, procurando qualquer pista. Abriu gavetas e armários, mas não encontrou nada de relevante, apenas papéis queimados e fotos antigas.

Fotos. Fotos de Thales e todas as pessoas que foram importantes para ele ou que passaram por sua vida naquela cidade maldita. Fotos de Thales e...

Ele jogou uma das gavetas no chão e recolheu todas as polaroids antigas que havia tirado com seus amigos na adolescência, antes de decidir para qual Universidade iria. Mesmo que as fotografias estivessem danificadas, Thales conseguiu identificar a maioria dos rostos.

Suas pernas tremeram quando, escondido entre as fotografias, Thales encontrou um dos registros mais antigos. Ele, Gabriel e Daniel, o irmão de Amanda. O mesmo Daniel que iniciou no seminário e que desapareceu sem dizer nada a ninguém. Padre Horácio contou que ele havia ido para outra igreja, longe das memórias ruins de Soturno.

Thales vasculhou o resto das fotos e notou que, em todos os registros onde havia um dos desaparecidos, Daniel também estava, com sua beca impecável e a bíblia debaixo do braço.

Pensou no seu segredo, no padre Horácio, nos seminaristas... As peças começaram a se encaixar.

De repente, Thales ouviu o ranger de uma das portas do corredor e se virou de forma abrupta, certo de que estava sozinho na velha mansão. Temendo que pudesse ser a mesma pessoa que entrou na padaria antes de desaparecer, ele resolveu investigar. Era o seu trabalho afinal.

Ele agarrou um abajur de metal queimado, caído ao lado da porta do banheiro, e decidiu usá-lo como uma arma provisória. Não seria suficiente caso alguém o atacasse, mas podia servir de distração. Com passos silenciosos, Thales saiu do quarto e caminhou em direção à única porta entreaberta do corredor. Antes de investigar seu quarto, Thales garantiu que todas as portas estavam fechadas.

Havia alguém em sua velha casa.

Era como se o piso de madeira do corredor ameaçasse ceder sob seus pés, mas Thales continuou andando devagar. Ele ouvia o forte ruído de sua própria respiração enquanto era consumido pelo sentimento do desconhecido.

Ao se aproximar da porta, Thales se pressionou contra a parede. A pessoa estava dentro do quarto de seu irmão e sua única vantagem era tentar pegá-lo de surpresa. Ele ergueu o abajur, segurou-o firmemente em suas mãos e avançou para dentro do cômodo, mas tropeçou em alguma coisa e caiu no chão.

Thales se virou rapidamente, com medo de ser atacado pelas costas, mas arregalou os olhos diante do que viu. Um corpo sem vida jogado no chão.

Ele observou ao redor. O quarto de seu irmão não possuía nenhum objeto pessoal, somente alguns móveis antigos e livros da época do colégio que deixou para trás. A janela posicionada em frente a cama, como em seu próprio quarto, estava aberta e a cortina flutuava com o vento.

Definitivamente, alguém esteve ali.

Ele se sentou sobre os calcanhares, as mãos tremendo, e agarrou o corpo para virá-lo em sua direção. Seus olhos se arregalaram ainda mais e suas pernas pularam para trás quando reconheceu o cadáver.

— Padre Horácio — murmurou.

Havia um bilhete colado ao cadáver com a mesma caligrafia da carta anônima que recebeu.

"Ele mereceu. Ele não era quem dizia ser. Daniel também não. Nós dois sabemos o que eles eram e o que sabiam."

Thales engoliu em seco. A pessoa que estava por trás daquelas cartas parecia conhecer todos os seus segredos. Era perigoso o pensamento de que seu passado o rondava daquela forma outra vez. Ele foi trazido até Soturno para relembrar seus pecados.

Thales se levantou com as pernas trêmulas e se forçou a arrastá-las para fora do cômodo.

Tinha receio de encontrar o corpo de Daniel depois de ver seu nome escrito no bilhete. A pessoa da carta anônima afirmou que sabia quem era o responsável pelos desaparecimentos, mas Thales não imaginou que fosse no plural da palavra.

Sem olhar para trás, ele desceu as escadas às pressas e deixou seu corpo cair no chão quando saiu da mansão. O silêncio da velha casa era tenebroso, mais sufocante que as noites onde ele voltava para casa escondido, com passos camuflados, na intenção de não ser pego.

Thales fechou os olhos e apoiou as mãos na terra para inspirar e soltar o ar devagar. Sentia seu corpo em alerta absoluto, parte de sua mente implorando para ir embora e nunca mais colocar os pés em Soturno outra vez.

Ele não precisava descobrir a verdade porque, no fundo, já sabia.

Ainda assim, ele queria atestar sua inocência e sair de Soturno com a mente limpa. Thales havia cometido um erro e conviveria com aquele pecado pelo resto da vida.

Agora alguém estava lhe dando a oportunidade de se ver livre.

O silêncio deu lugar a um som familiar. O ranger dos portões da mansão que estavam entreabertos. Thales abriu os olhos bem a tempo de ver uma sombra de cabelos longos e escuros, com um estranho manto preto, correndo pelo mesmo caminho de onde ele veio.

Thales se levantou e correu o mais rápido que pôde, impressionado com a velocidade com que o desconhecido percorria Soturno. Quem quer que fosse, o estranho conhecia a cidade muito bem, pegando atalhos que Thales se esqueceu que existiam.

Soturno não era uma cidade tão grande, mas era possível se perder nela. Thales falhou em tentar acompanhar o ritmo da pessoa desconhecida, e foi deixado para trás para lidar com uma bifurcação.

Na direita, ele encontraria o colégio-igreja, lugar onde estudou um dia e onde com certeza encontraria o corpo de Daniel. Dava para sentir. Se fosse para a esquerda, Thales entraria no cemitério da família de Gabriel. Era o último lugar que cogitou pisar, no entanto, por algum motivo, o desconhecido o levou até lá.

Então decidiu virar para a esquerda, caminhando sobre as pedras cobertas de musgo até encontrar a entrada do cemitério particular da família Campos. A lápide de Gabriel sempre foi a mais bonita e, mesmo depois de tantos anos, ela ainda parecia bem cuidada, destacando-se entre as demais.

Thales se agachou e tocou no nome entalhado na pedra, sentindo a imensidão da saudade. Por todos esses anos, ele se perguntou onde Gabriel estava e se havia sofrido. Sabia que aquela lápide era uma formalidade, um buraco vazio diante da ausência de um corpo. Desejou ter flores consigo, mas sabia que, onde quer que estivesse, Gabriel detestaria o gesto.

Thales olhou para cima. A mansão da família Campos estava intacta, exatamente como era quando abandonou a cidade. Ninguém tinha intenção de retornar a Soturno, nem mesmo para recuperar algo que havia esquecido, com receio de se afogar ainda mais nas memórias daquela tragédia.

Ele se levantou e deu as costas para a mansão, pronto para ir embora. O ruído das portas de vidro fosco, empoeiradas pelo tempo, chamou sua atenção. Elas foram abertas.

O caminho até a entrada parecia estranho. Em todos os anos vividos ao lado de Gabriel, Thales nunca teve a permissão de entrar pela porta da frente. Na verdade, se não fosse pelo namorado o convidando para entrar pela janela de seu quarto, ele nunca colocaria os pés naquela mansão. Era cômico como a família Campos o odiava, mas nunca fez nada contra sua integridade em respeito aos seus pais.

Thales empurrou as portas enquanto os raios de sol da tarde iluminavam o local. Por fora, a mansão parecia abandonada, mas por dentro estava nova e repleta de vida. Os móveis estavam limpos, as janelas tinham cortinas novas e as paredes estavam pintadas. Era como se alguém morasse ali.

Ele continuou andando e a porta de vidro atrás dele se fechou, o que fez Thales pular no lugar e colocar a mão sobre o peito. Ele foi para a sala de estar, um cômodo que se tornou sombrio por causa das cortinas fechadas. O fogo da lareira era sua única fonte de iluminação.

Sentada sobre a poltrona preta, ao lado da lareira, estava a pessoa que encontrou no portão da mansão Bloom alguns momentos atrás. O cabelo escuro caía sobre um dos olhos cor de mel, as pernas cruzadas enquanto a mão apoiava o queixo. Quando ele sorriu o coração de Thales parou no mesmo instante. Sua voz rouca ecoou pelo cômodo:

— Finalmente encontrei você.

Era como se estivesse em um de seus sonhos, em uma versão um pouco mais realista e estranha. Aquilo não podia ser verdade e, ainda assim, ele estava diante de seus olhos.

Gabriel era lindo e não havia mudado nada desde a última vez que se viram.

— Como?

Quando Gabriel se levantou, suas botas não fizeram barulho. Seus passos eram leves, como se flutuasse ao invés de andar. Em questão de segundos, estava diante de Thales, o sorriso ladino se tornando ainda maior em seus lábios.

— Você não era o único com segredos. — Ele tocou no ombro de Thales e o rodeou, abraçando-o por trás. — Eu sabia o que você era, do mesmo jeito que o padre Horácio também sabia.

— Então... — Thales engoliu em seco, fechando os olhos ao sentir o toque do namorado. — O que aconteceu?

— Apesar da sua natureza, você tinha apreço pelas almas. — Gabriel deslizou as mãos pelos braços de Thales e entrelaçou seus dedos. — Apreço pelas almas que eu cuido. Mas o padre Horácio... Ah, aquele homem manipulou direitinho todo mundo.

— Você o matou?

— Claro que sim. — Gabriel soltou sua mão e caminhou até a poltrona, apoiando-se nela e olhando para Thales com seriedade. — Ele era um caçador, Thales. Não havia padre ou seminaristas naquela igreja, eram todos caçadores de vampiros há anos. Caçadores que decidiram te matar depois daquela noite.

Thales prendeu a respiração. Durante toda a sua vida em Soturno, ele tentou esconder quem era para evitar caçadores. Sabia que seu erro foi ter caído em tentação e matado um visitante desconhecido atrás da igreja, onde padre Horácio o encontrou com o garoto morto em seus braços. Na época, ele acreditou que o problema era seu envolvimento com garotas e garotos de Soturno, algo muito mal visto nos anos 80. Thales deixou para trás as memórias do que fazia com suas presas inconscientes após a alimentação.

Sua confiança nas pessoas de Soturno foi maior do que deveria e ele acreditou, por um momento, que havia encontrado paz. Nunca imaginou que um mero padre, que não era quem dizia ser, lhe traria tantos problemas.

Quando o padre Horácio começou a chamá-lo de demônio, ele se sentiu encurralado. Acontecia tudo outra vez. E, apesar de não dizer em voz alta o que Thales era, o fato das pessoas o olharem torto era suficiente para ele compreender que não era mais bem vindo em Soturno.

O problema é que Thales não sabia que isso poderia ser uma armadilha e, tampouco, que ele usaria pessoas próximas como isca. Com a intenção de atraí-lo para fora da cidade e matá-lo como um animal acuado e solitário.

— Quando eu fui embora... Por que ele não veio atrás de mim?

— Porque eu nunca deixei ele sair dessa cidade — confessou Gabriel, revelando um sorriso ainda mais largo que enfatizava seus caninos pontudos, que não eram tão grandes quanto os de Thales. — Ele queria você e eu jamais deixaria isso acontecer.

— Por que você não veio atrás de mim?! — Thales perguntou com a voz alta, lágrimas se formando no canto dos olhos ao ver o sorriso do ex-namorado. — Por que não me contou o que estava acontecendo?

Gabriel soltou um suspiro e seu sorriso murchou. Ele sabia que precisaria enfrentar aquela pergunta e que, embora tenha alimentado seu amor por todos aqueles anos, ainda corria o risco de Thales simplesmente dar as costas e ir embora, consumido por mágoa.

— Eu não podia voltar sem descobrir toda a verdade. Um dos meus amigos tentou me matar e queria fazer o mesmo com você! — explicou, se aproximando de Thales outra vez e tocando em seu rosto. Ele fez um carinho sutil em sua bochecha, enxugando a lágrima que escorreu sobre a pele fria. — Eu também não podia sair. Estava enraizado nessa cidade até descobrir onde todos os corpos de todas as almas estavam. Faltava apenas a Amanda e o Felipe.

Thales se sentiu tolo, mas sabia que seu pecado foi quem o fez passar por tudo aquilo. Se vinte anos atrás tivesse desistido da vida mundana ao lado de Gabriel, ele teria notado os caçadores bem debaixo de seu nariz. No entanto, seu desejo de viver como um humano era muito maior, e ele deixou de lado tudo o que podia lembrá-lo de quem era: um maldito vampiro em busca de sangue e morte, como no passado. Foi ingênuo o suficiente para deixar que padre Horácio o visse com uma presa durante suas escapadas noturnas.

— Não foi culpa sua — enfatizou Gabriel, puxando-o para um abraço. — Eu sinto muito que você tenha passado por tudo isso, mas agora acabou. Ele está morto. Daniel também. Eles estão todos mortos.

Por um momento, Thales se permitiu absorver as palavras de conforto que tanto desejou ouvir. Ele também abraçou Gabriel, apreciando a colisão entre suas peles frias, e só então percebendo que o namorado sempre foi daquela forma. Thales é quem foi tolo demais para ignorar os sinais.

No entanto, havia uma coisa que Thales tinha certeza absoluta, e isso era o fato de Gabriel não ser um vampiro.

— O que você é então? — perguntou finalmente, afastando-se do namorado e o encarando nos olhos.

— Ah, meu amor... — Gabriel sussurrou, tocando a ponta de seu nariz com o dedo, o sorriso de antes se iluminando outra vez. — Eu sou o guardião do pecado da cidade de Soturno e você... Bom, você é o meu maior pecado.

FIM

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