O mau não dura para sempre
Menções de violência neste capítulo. Acima coloquei um trecho da Trilha Sonora do filme o Gladiador, na minha opinião uma das melhores trilhas sonoras. Uso muito pra escrever, além dos meus "metais" hehe... Vale a pena ouvir, é emocionante. Beijos do "cabiludo".
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Completamente machucado, o homem foi facilmente colocado na caixa de madeira, mas ela ficou pequena, sobrando as canelas e pés para o lado de fora, que um rapaz assustado tentava ajeitar. Ele estava com medo, chorava de dor e as lágrimas queimavam seu rosto. Gritos de horror abafados pela mordaça, escapavam de Betânia.
Ambos só podiam chorar suas dores.
Betânia tinha crises de hipotermia e tremia, chegando à palidez mórbida. O genital masculino totalmente encolhido ficou exposto a gozação e aos chutes naquela região. A dor lhe tirava a consciência por vezes, mas os prantos horríveis do homem, despertavam-na. Brilho de lâmina, golpes de machado, som de ossos partidos, urros agonizantes, ruídos de martelo pregando a caixa onde ele fora preso. Então foi colocado de qualquer jeito dentro de um buraco fundo para ser enterrado vivo.
O que reservariam para ela?
"Deus porque permite isso?" — Betânia pensava enquanto chorava. Toda esperança de continuar viva a tinha abandonado. Talvez, se Deus tivesse a tal da misericórdia que ela tanto pedia em oração, tudo aquilo não passaria de um horrível pesadelo.
Os homens se juntaram na tarefa de cobrir a caixa de madeira, e após isso, as conversas deles cessaram, o que indicava que haviam partido. O dia amanhecia e a chuva havia parado, ventos gelados judiavam do corpo nu da jovem que perdera as forças até para chorar. Ouviu um ruído de motor de carro e gritou como conseguia, mas apenas um som gutural saía. Desespero!
Deixaram-na para morrer de fome, frio e tristeza. Seu corpo tremia forte. Mataram seu marido e iam terminar de matá-la, ao cair da noite. Suas amarras lhe impediam de mexer-se sem doer muito, tinha seus braços na frente do corpo, canelas amarradas, outra corda funda em suas coxas, outra em seu peito para manter os braços rentes, não lhe permitindo ter mobilidade.
"Rafael, obrigado por ter sido bom comigo. Rafael..." Ela pensava com dor no coração.
De bom grado aceitaria todas as dores do mundo se pudesse salvá-lo. Não estava sob seu controle, então era melhor que ele morresse bem rápido.
O tempo passava tão devagar, que minutos tinham o espaço de horas e talvez, com sorte, ia morrer ali mesmo. Seria uma dádiva. Seus agressores cuspiam nela e a chamavam de abominação. Falavam que o deus deles não abria as portas do paraíso para alguém igual a ela. Sob violência imensurável, a obrigavam agradecer a Deus pela punição que recebia. Será que Ele queria isso dela?
Onde estava Aquele que poderia responder? Milagres pareciam se esconder de Betânia. Só via um caminho vermelho cheio crueldade, sangue e injustiça. Queria que de uma vez ceifassem sua vida.
O frio era cortante sobre pele nua, machucada, cuspida e torturada. Ninguém a ouviria. Podia gritar, mas a mordaça abafava o som. Poderia morrer que jamais lhe encontrariam. Corvos apareciam ao anoitecer, mas ainda eram piedosos, ou quem sabe pacientes. O cheiro de carne apodrecida os atraia. Sobre o buraco no qual o homem fora enterrado, as aves carniceiras pisavam.
Betânia perdera-se na noção do tempo e na contagem de quanta violência as manhãs lhe trariam. Quantas vezes lhe penetraram, com objetos e braços, quantos desmaios e quantas vezes chegara a seu limite. Por que contar? Todas as manhãs cinzentas lhe causavam dor, tardes geladas, sofrimento e a noite, o terror. Já tinha morrido. O que faltava a eles a lhe infringir?
O saco de feltro foi tirado de sua cabeça há dias, poderia ver os monstros chegando. Sons de vozes e risos traziam o seu desespero. Lá estavam, surgindo entre as árvores os seus algozes. A jovem fechou os olhos com força e prometeu não mais abrir... Já sabia como seu dia aconteceria em lampejos de memória.
Mas... houve algo que os enxotou, uma força acima da força dos homens que a agrediam todos os dias. Muito antes de tocarem nela novamente, eles desapareceram apavorados.
*Lembranças*
"Cheiro de carniça, sabor de coisas pútridas que lhe faziam ingerir, fedor de urina e as próprias fezes. O ânus anestesiado pela dor não a deixavam entender que parte do seu prolapso retal estava fora do corpo e ela não tinha mais forças para fazê-lo entrar."
O limiar da dor, Betânia suportou, então provavelmente o frio que a levaria. Um vento gelado, raios e relâmpagos anunciavam outra alteração no clima daquela região. Ela sentia com os olhos fechados, estando pronta para desencarnar.
Uma escuridão pesada e repentina foi lançada sobre ela, envolvendo todo seu corpo. No início achou que fosse terra ou lama, pois seu estado de semiconsciência não lhe mostrava nada com clareza. Também lhe pareceu papelão ou couro.
Aquele era o fim e fora abraçada pela morte.
Constatou que a morte era uma força poderosa que a levantava do chão, suspendendo-a no ar e que a carregava em seus nos braços. Finalmente, o vazio se estabeleceu sobre sua existência.
No vazio, onde tudo era escuridão não adiantava abrir os olhos. Nesse lugar não tinha sofrimento, nem lembranças, nem mesmo o frio era presente. Não havia ar a sua volta. Apenas um balanço estranho e cadenciado. Quem sabe, sua alma estava num lugar longe do corpo e seus agressores não lhe alcançassem mais. O sofrimento da carne terminara.
Passou muito tempo, e subitamente ocorreu-lhe algo que indicou que não estava morta. Ouviu o som de um raio caindo próximo e quase ficou surda. Então as dores recomeçaram. Ainda estava na escuridão plena, mas sentiu vida. Infeliz vida que voltava e consigo trazia o medo.
Esperava que a qualquer momento as torturas recomeçassem e essa espera lhe agoniava. Que findasse de uma vez!
Sua fraqueza e raquitismo lhe trouxeram tosses, desmaios e delírios. Acontecia vez ou outra, de Betânia sentir algo gelado sobre o corpo e imaginava que era o lodo no qual ficou jogada por dias. Algo estranho voltava a lhe envolver. Sua mandíbula era forçada sem gentileza para que engolisse algo. Mas ela vomitava e debilmente implorava que cessassem com aquilo.
Algo gosmento e morno era esfregado em seu nariz e bochechas, sua psique lhe mostrava um enorme cão de focinho preto que lhe lambia. Ele rosnava e grunhia.
Sentiu algo fustigando seu intestino, era menos doloroso, mas ainda assim incômodo. As vezes sentia-se molhada e com frio, outras vezes com calor excessivo, falta de ar e escuridão que cobria-lhe a alma como se fosse fumaça escura.
Jurava que tinha um grande cão de focinho preto a lhe fuçar os cabelos picotados grosseiramente, enquanto mãos tentavam separar suas pálpebras. Sentiu cheiro de fumaça e pelos roçando em seu nariz, as cócegas lhe fizeram rir. Concluiu que a dor lhe abandonou, mas a loucura a tinha em seus braços.
Sons de choro, chuva, corvos e trovões ainda perturbavam fazendo seu corpo se encolher num lamaçal fétido de urina, merda e sangue. Não abria os olhos naquele inferno. Seu coração esmagado dentro do peito causava-lhe lágrimas, medo e horror. Maldizia em seus pensamentos as vozes que lhe faziam ameaças. Forçavam-lhe. Matavam-na pouco a pouco. Maldizia sua força em lutar contra a morte. Era forte, Betânia ou Bento não morria e isso era um castigo. Seu grito saiu forte dos lábios abertos... "NÃOOOOOO"
Num surto ela fez extraordinário... Betânia abriu os olhos.
Descobriu-se deitada numa cama macia no interior de um quarto de madeira em aspecto rústico. O ambiente era pequeno contendo um guarda-roupas, cortinas claras esvoaçantes, um criado mudo com um copo de água. Parecia limpo. A porta estava aberta e por ela entrou um beija flor que saiu pela janela. Sons de pássaros cantavam pra ela. Raios de sol tocavam um de seus pés destampados do qual as unhas foram arrancadas.
Seria o paraíso ou outro delírio? Como se fosse uma miragem em meio ao deserto, a ela pareceu não se tratar de um lugar real. Nem mesmo a visão de um rosto angelical e olhar dócil que analisava os seus olhos. Se fosse céu, ele era um anjo. Parecia-se com um anjo.
Mas, e se aquele jovem segurando um prato de caldo cheiroso desaparecesse e no seu lugar voltassem seus algozes? Com receio entreabriu a boca e o sabor de legumes, levemente salgados, lhe fizeram sentir alegria e prazer em viver. Mas o medo transformou em num gosto amargo dos dejetos que lhe fizeram ingerir e ela vomitou.
— Desculpe... — Betânia há muitos dias ouvira-se apenas gritando por misericórdia então assustou-se com o som de sua voz.
O rapaz ruivo saiu correndo do quarto e ela ficou envergonhada com medo de ser punida. Mas ele voltou com balde, pano e roupa de cama limpa. Com habilidade trocou o sobre lençol que cobria Betânia, limpou onde estava sujo e fez um gesto para que ela ficasse deitada. Talvez ele fosse estrangeiro ou mudo, pois gesticulava mandando-a sentar-se e erguer os braços. Com dificuldade ela o fez, pois todo o corpo doía quando se movimentava, e da mesma forma ágil, ele arrancou a camisa grande que ela vestia e enfiou outra.
Depois disso, o jovem saiu do recinto e demorou muito para retornar. Mais tarde trouxe a ela pão, queijo, ovos cozidos e chá. O aroma e aspecto da comida presenteava todos os seus sentidos, ela aceitou e beliscou o alimento com cuidado. Seus olhos nunca abandonavam os do rapaz que parecia encantado com ela. Para finalizar, bebeu uns goles do chá refrescante de hortelã.
— Onde estou?
O rapaz juntou as sobrancelhas e balançou os ombros lentamente, expressando que não sabia. Com essa nova tentativa de conversa Betânia foi abandonada e aproveitou a sonolência para fechar os olhos.
Abriu-os muito rapidamente, pois tinha medo de retornar ao inferno.
Lutaria contra o sono, faria isso com toda a bravura. Mas o sono pesava quilos sobre suas pálpebras e tentava fechá-las. Ela não aceitaria isso, jogou o lençol de lado e viu um dos pés enfaixados, e ele parecia mais curto que o outro. Mexeu aquele pé e descobriu que os dedos estavam ausentes...
Não chorou, pois não conseguiu. Queria entender onde estava e porque teve que passar por tudo aquilo. Deus permitiria isso? Lembrou que na igreja disseram que "os efeminados não herdarão o reino dos Céus", então, o sofrer era merecido?
Deus não ama pessoas iguais a ela?
Desistiu da luta e caiu no seu pesadelo horrendo...
""— Por favor, não os corte, não me maltrate mais... não fiz mal ninguém... — Pedia aos prantos desesperados, quando lhe "informaram" o que fariam com seus dedos dos pés"
"Aves carniceiras eram "convidadas" ao banquete."
O som de algo batendo fora do quarto, fez com que Betânia acordasse do pesadelo. O rapaz gordinho entrava com dificuldade para trazer a ela água e um jarro de formato estranho. Não o perturbou com perguntas e notou que ele mexia em seu órgão genital. Descobriu que podia urinar e fechou os olhos ao fazer. Pelo menos não lhe removeram o pênis.
O jovem ia e vinha, limpava, dava-lhe de comer e beber e ao final do dia fez um gesto exaltado para que ela levantasse da cama. Mas ela não conseguia, tinha medo.
Ele bradava com as mãos apressando-a e estendeu a mão rechonchuda para que ela usasse de apoio. Betânia fez várias tentativas de se por de pé, mas o medo a fez entrar em desespero e choro convulsivo.
— Por favor, não me maltrate mais, eu não consigo. Está doendo. Meu pé está machucado.
O ruivo pôs as mãos na boca espantado e correu para fora do quarto, voltando com uma caixa branca de onde retirou gaze, esparadrapo, tesoura e rolos de faixa. Havia também um líquido transparente num frasco e um tubo de peróxido de hidrogênio. Ela se recusou a olhar quando ele desenrolou a faixa que estava em seu pé. Sentiu a ardência dos produtos aplicados em seu ferimento e voltou a olhar quando ele enfaixava carinhosamente o pé mutilado.
Queria muito banhar-se e quem sabe ele tentou lhe "dizer" isso. Não queria levantar e olhar o que fizeram em seu corpo, sabendo que tinha recebido vários cortes.
Anoiteceu, ela ficou olhando para a lâmpada amarela e implorando para que não a apagassem. Sua janela fora fechada, mas era ainda assim uma brisa geladinha entrava pela veneziana. Uma cigarra e grilos inventaram de fazer uma "serenata". Era música pura e era bom de ouvir.
Ocorreu uma pequena cena engraçada quando o jovem ruivo entrou no quarto e abriu as janelas, fazendo um ssshhhhhh irritado querendo calar os insetos. Betânia esboçou um riso e de repente percebeu que o som cessara.
A luz ficou acesa e ele despediu-se dela com um beijo na testa.
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Oii Pessoal!!! Tudo numa nice?
Espero que não esteja muito assustador o conto. Eu tô adorando escrever as primeiras resoluções, vamos ver o que acontece... se ficar bom, tentarei me aventurar no meu gênero preferido que é ficção científica, a longo prazo.
Mas é isso, deixo aqui o meu coração, carinho e desejos das melhores coisas em suas vidas♥
Um semana muito além ótima a todos 🐻🐱🦉🐼💙💚💜💛
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