Equilíbrio entre medidas e pesos
Notinha (cabeluda): Nesse capítulo tem descrição de violência e tortura.
...
Lúcifer Motta não vivera somente na luz, também foi um homem que habitou em trevas da humanidade. Há muito escolhera a migração, andava pelos recantos do mundo tentando se entreter com algo, cansou e resolveu se juntar ao pai e o irmão novamente.
"Quanta maldade nesse mundo.Minha Lola anda desolada, mas ainda não posso lhe proporcionar uma alegria natalina. Oh senhor William, cuida dessa "criatura" direito." Ele pensa ao entrar no carro. Sua intenção é de ir ao interior para interrogar José, com base nas informações que Serafim lhe passara recentemente. Antes, ele deveria ir à delegacia, pois Cesar tinha um recado.
— Cesar, fale.
— Fomos ameaçados por aquele advogado rico, Fernão Silva e Oliveira de sermos retirados pelo Ministério Público. Primeiro, ele disse que não tinha assuntos comigo porque sou seu assistente, depois disse que eu não era nada além de um chupador de pau do delegado, depois ele...
— Resuma.
— Ele disse que não sabe o que você ainda está fazendo no cargo. E que não compreende porque não prendeu a viúva. A propósito, está segura?
— Sabe que sim. Vou para o interior, pois o intimado não compareceu. Mandou quantas intimações?
— Três, senhor. Acho que ninguém é tão paciente como o senhor, Lúcifer. Ele deve ser preso. Desacatou-me tanto quanto o advogado o fez. Vai meter aquele infeliz na cadeia?
— Sua convivência com Serafim não foi algo tão positivo, Cesar. Até mais tarde.
— Lúcifer... mande lembranças àquele malvado. — Cesar sopra sorrindo, antes do chefe sair para cumprir seu trabalho.
Há quanto tempo Serafim e Lúcifer não se aproximavam? Se fosse pelo mal que existe já teriam se aproximado antes. Era Bill. Bill estava muito velho e seus filhos achavam que ele precisaria de ajuda sem demora.
"Pobre Serafim" Motta pensa. Seu irmão desde criança sonhava com o fim dos eventos ruins no mundo. Lembrou-se de quando começaram a se distanciar, eles tinham entre dez ou doze anos...
"— Lúcifer, papai disse: olho por olho. Porque você não reage e bate nos meninos que fizeram isso com sua cara? — Serafim limpava o sangue no nariz do irmão, inconformado que ele não revidava."
"— Serafim, papai diz que nem tudo é resolvido assim e que também temos que dar a outra face, sermos mais tolerantes."
"— Isso não é justo!"
"— Papai é justo e bom."
"— Se ele fosse justo, a nossa mãe não teria sido levada."
"— Papai não manda na morte, Serafim."
Serafim tinha três anos a mais que o irmão mais jovem, crescera nele o desejo que punir as pessoas das mesmas formas que estas aplicavam o mal aos outros. Para ele a justiça sempre significou igualdade! Um revide à altura. Por isso começou a matar muito cedo e afastou-se do pai e do irmão.
Passados muitos anos, casou-se e resolveu ser pai. Seu filho pequeno dissolveu muito de sua fúria, tanto que ele resolveu através de outros meios, fazer sua justiça e entrou para a política. Membros do próprio partido não o "abraçaram" e Serafim descobriu que havia um ninho de cobras entrelaçadas, venenosas e mortais em sua volta.
Fora perseguido pelos próprios correligionários, mas venceu e candidatou-se ao cargo de prefeito da cidade de médio porte onde vivia naquela época. No primeiro mandato quase conseguiu fazer com que o povo se curvasse diante de sua justa forma de governar. Seu pai e irmão se orgulharam dele e pelo pequeno filho, Serafim jurou que não mataria mais. Mas não pode cumprir, pois mataram Jessé, seu filho e a mãe da criança, de forma cruel enquanto ele amarrado assistia... Quando atiraram em seu corpo, nenhum daqueles homens sabia que Serafim não morreria. Ele viveu e sua crueldade não obedeceu limites...
"— Pai, seu filho precisa ser contido. — Lúcifer e seu pai olhavam desolados, sete estacas enfileiradas frente a prefeitura."
"— Não posso. Assim como não me intrometo na forma como conduz sua vida, meu filho."
"— Ele matou e decapitou sete pessoas. Isso não traz paz, nem é justiça, isso é vingança."
"— A dor é dele, Lúcifer, deixe-o."
"— Sim senhor, pai."
...
Bill se lembrou de Bianca Mello, a jovem que corria a ele para observar pequenos "milagres", como consertar uma patinha quebrada, costurar um corte ou impedir que animais morressem quando ela os resgatava e escondia-os com Bill. Bianca acreditava nele, quando todos se afastavam ante o boato de que ele era algo de outro mundo, um animal selvagem ou algo mais sinistro. Tudo o que ele sempre quis foi ter paz em seu canto isolado, ser do seu jeito e fazer as coisas do seu modo onde cabia fazê-las.
Sentado na grama olhava a gata que amamentava sua cria daquele ano. Foram tantas que ele perdera a conta, desde que Bianca a trouxe para ele. Os pais da jovem não gostavam de gatos por causa dos pelos e pediram para uma governanta degolar a gata prenha enquanto sua filha estivesse na escola. Sem coragem de fazê-lo, ela contou a moça que teve a ideia de entregar ao velho urso da montanha.
Betânia também olhava com divertimento para a gata que estava sempre mal humorada.
— Bill. Me falou que teve uma mãe... — Betânia perguntou a ele.
— Querida, não tive mãe.
— Ah... entendi. Só falou aquelas coisas porque quis me deixar mais a vontade.
Bill estava temeroso que ela fosse afetada pela conversa com Serafim. Não permitiria que Betânia se tornasse amarga como era seu filho primogênito.
— Não deixe o ódio tomar conta de si, ele é um veneno para a alma.
— Depois que conversei com o delegado, lembrei-me de quase todas as coisas que ouvi naquelas noites. Sentia o cheiro da colônia do meu... do Rafael e nessas horas alguém gemia de dor, mas eu achei que era ele. Pelo que entendi ele está vivo.
— Rafael foi dado como morto e você e Ramiro são suspeitos de terem dado cabo no homem. Ramiro não vai voltar e Rafael sendo localizado, ainda faltará você. Pode voltar para os braços de sua mãe e responder processo ou quem sabe, abrir mão de ter sua vida de volta... isso significa, ficar aqui conosco e não poder mais sair.
— Bill... sabe, desde pequena onde eu fosse era motivo de desprezo. Nunca fui aceita como mulher, estando dentro desse corpo, por mais delicada que eu seja. Eu não tenho um lugar para ir e minha mãe precisa viver a vida dela. Não quero atrapalhar e tampouco confiaria em outras pessoas.
— Seus ferimentos na alma, ainda perturbarão, mas é incrivelmente forte, minha menina. São quase quatro meses que aqui está e percebo que sarou muito de sua dor. Tem seu lugar nessa casa e em nosso coração, Betânia. E não chore, bobinha.
— Bill, obrigado. Bill, como é seu outro filho?
— Meu filho mais novo é paciente. É um bom menino, você vai gostar dele. Serafim anda precisando de uma bronca. Logo terei que intervir.
...
Motta rumava à área rural com seu veículo preto e empoeirado. Tirou os óculos e colocou no console. Desceu do carro, chamando a atenção do padeiro que retirava uma forma de bolachas do forno de barro. O pequeno garotinho que por ali brincava, jogou areia nas bolachas e um grito "perfurou" os tímpanos do delegado. José arrancou o cinto de sua cintura e o levantou, envolvendo a criança com primeiro golpe nas costas.
Uma criança que não aparentava três anos tomando uma punição de adulto. No segundo golpe, o braço do homem foi segurado.
— Um pai pode corrigir um filho que erra, mas nunca sem ensinar antes.
— O que você quer? Já veio gente da polícia e o senhor já esteve aqui perguntando coisas.
— Recebeu três intimações, porque não foi à delegacia?
—Seus colegas de profissão têm razão de lhe arremedarem pelas costas.
Motta deu uma risada e cuspiu o chiclete. Olhou para José que ria dele.
— Está corajoso, José. Não tem medo ou respeito por minha autoridade?
— O senhor não assusta ninguém com essa "panca" toda. — José fez menção de se virar, mas Lúcifer lhe abordou:
— Podemos tomar um café em sua cozinha? Estou esperando um agente que quer lhe fazer umas perguntas.
— Um policial de verdade ou igual ao senhor?
— O que prefere? Um policial de verdade, ou um tipo paciente igual a mim? Escolha e não haverá chance de mudar depois que ele chegar.
— Prefiro que você sente em cima disso. — José mostrou-lhe o dedo do meio. — Deixe o outro policial de verdade, fazer seu trabalho e depois sumam daqui. Estou ocupado. — José puxou o filho pelo braço e sem piedade deu-lhe mais duas cintadas.
Lúcifer ficou sério de repente e olhou para o céu. O azul límpido dado pelo dia ensolarado foi rapidamente coberto por nuvens cinzentas. O som do ronco turbinado aumentou com a aproximação. O motorista parecia não temer em se espatifar contra uma muralha se houvesse.
Serafim!
Seu semblante era de serenidade. Não havia sorriso em sua cara, porque ele desaprendera isso em sua longa existência. Viver como uma pessoa comum lhe irritava um tanto, mas aquela manhã o tiraria do tédio: interrogaria uma pessoa.
— Lúcifer leve o menino para outro cômodo, junte-o com a mãe dele. — Disse Serafim com sua voz branda.
Motta obedeceu seu irmão e José contrariado, cheio de fúria sentiu vontade de ser ácido com o outro agente que parecia tão inofensivo quando o delegado. Quando Serafim retirava os óculos, era muito parecido com uma figura celestial e seus olhos azuis eram angelicais.
Na cozinha pequena e simples, os três homens sentaram-se.
— Sou Serafim, o senhor é José?
— É o que dizem. O que querem me perguntar? Não sei de nada.
— Sabe e só precisa confessar. Digo-lhe que doerá bem menos. — Serafim ameaçou. — Não consegue se mexer?
Em pânico, José se percebeu imobilizado, era o medo e a culpa que o "amarraram" a cadeira.
— Eu estive com doutor Fernão, que é advogado e ele disse que se viessem me perturbar, era para chama-lo. Ele é advogado!
José ouvira do pai de Rafael, que os policiais estavam sob controle e que Motta logo seria afastado por incompetência. Afinal, ele achava que Lola e a família de Ramiro deveriam ter sido punidos de alguma forma, pela "morte" de Rafael. O padeiro deu uma risadinha e apontou com a cabeça, para Serafim.
— Vocês dois sabem de algo. Acharam o travesti vagabundo? Podem me levar preso, mas saibam que sou intocável. Sou protegido pelo advogado e ele vai caçar qualquer um que por um dedo em mim.
— Realmente estou com muito medo desse advogado. — Lúcifer respondeu sério.
— Quem violentou a moça e cortou-lhe os dedos do pé? — A pergunta de Serafim fez o sorriso apagar no rosto agora pálido de José. — Tenho poucas perguntas e cada resposta convincente, vai lhe poupar um "pequeno" desconforto.
— Ninguém fodeu mulher nenhuma, só um maldito travesti. Gente daquele tipo é a coisa mais nojenta que existe.
José estava perturbado e temeroso, não conseguia se mexer na cadeira. A sensação era horrível. Serafim retirou um alicate do bolso, ajoelhou-se e puxou o pé do padeiro, de modo que ficasse apoiado em sua coxa. Retirou o chinelo de dedos e perguntou:
— Quem assassinou Ramiro?
— Ele fugiu... Não... o que vai... aahhh. Meu Deus... — Os gritos de dor certamente alertariam até os vizinhos que moravam há uns dois quilômetros de sua casa.
— O que está esperando? Cada vez que eu não obter a resposta, lhe arranco um dedo. Agora são nove nos pés e dez nas mãos. Não me faça repetir muito, ou logo não vai poder escrever e nem amassar seus pães.
— Vá a merda! Não sei de nada. AHHHH! Meu Deus, maldito, socorro... não, não... foi, foi Rafael, Rafael o matou.
— Está com fome?
— Não... porque estão fazendo isso?
— Coma. — Serafim empurrou os dois dedos cortados e ensanguentados dentro da boca do padeiro, depois levantou-se e buscou água para que ele bebesse. Mas antes de chegar, o interrogado havia vomitado. — Não foi assim que fizeram com a esposa de Rafael?
— Ele que mandou, ele mesmo que ajudou. Ela estava amarrada e com uma coisa na cabeça. Ela era homem, um desgraçado que enganou todo mundo. É uma abominação, um herege.
— Rafael executou Ramiro?
— Sim, sim, ele! Ele o fez. Tinham outros dois caras que foram contratados, desses que matam por dinheiro e não sei onde estão, mas sei nomes e posso ajudar. Mas por favor me solte.
Lúcifer alcançou uma faca de cortar carne ao irmão sem que ele pedisse, mas antevendo que ele a queria.
— De quem são essas crianças?
— Meus filhos, eu... não, não.... ai Jesus Cristo... — Serafim punha a faca sobre o dedo mais grosso e com pressão da palma da mão fez a lâmina afiada penetrar na pele, carne, nervos e destrinchou o osso com pratica de um carniceiro. José chorava, gritava e na perda de suas forças, urinou. — São do Ramiro.
— Quer perguntar algo, Lúcifer?
— Ele preferiu você...
— Doutor Motta, eu tenho um amigo importante, o pai de Rafael, interroguem ele. Levem as crianças e me prendam, eu confesso tudo. Nena cansou de cuidar daquelas crianças, olha, leve-os. Por favor não corte mais nada...
— Esse advogado, o tal do homem importante, que na sua inocência pode acabar comigo e o delegado Motta, ele sabe onde o filho está? Sabe que o corpo enterrado não é de Rafael?
— Sim, claro que sabe. Eu não sei de mais nada. Eu confesso o que fiz de errado, mas não me machuquem mais, por favor.
— Isso não funcionou para a coitada da moça. Se eu lhe amordaçasse e continuasse a "brincar" com seu corpo, hum? Sinta como que funciona. — Serafim usou o alicate novamente e separou-o o quinto dedo do pé.
— Eu escutava as conversas deles. Por favor, chega...AHHH...
— Realmente é muito bem informado para um padeiro de merda, igual você.
— Serafim, está sendo sádico. Ele está cooperando. Vou levar as duas crianças comigo, saiba que se tiverem muito machucadas, Serafim voltará e não quero isso.
— Leve-as por favor... eu não queria ser pai. São do Ramiro... leve-as, leve... mas não deixe aquele homem chegar perto de mim, doutor. Doutor... vou preso, não é? Por favor me coloque dentro da cadeia. Não me deixe aqui.
— Está com medo do seu "amigo" advogado? Ele é seu amigo, nada de mau lhe acontecerá. Aqui meu serviço está concluído, irmão. Vá e leve o mau tempo consigo.
José fora libertado após contar minuciosamente o que fizeram com Betânia e Ramiro. O próximo seria Fernão... quiçá Rafael apareceria e os dois infelizes que ajudaram. Nena acabou se enforcando antes do delegado entrar no quarto, precisando arrombar a porta e socorrer as crianças amedrontadas.
Na ida de Serafim os dois cachorros lhe rosnaram. Mas para Lúcifer, balançaram o rabo e correndo entraram no Opala preto, indo embora com o homem e as duas crianças.
....
— Oh Betânia, enquanto esteve na delegacia, eu e Marvin fizemos um bolo de Natal. Veja. — Tino estava exibindo o bolo de glacê batido à mão. — O Marvin que não quis ajuda. Ele só implica comigo, Bill.
— Como a pessoa se entrega. — Bill decidiu carregar a jovem risonha até dentro de casa e seus irmãos trouxeram as muletas.
Fora um dia cansativo para ela, mas por sorte naquela noite eles tiveram a companhia uns dos outros, comida simples e assuntos alegres, como os cães e a galinha dos ovos premiados.
— Premiados?
— Claro, tem alimento melhor e mais simples que um ovo? — Tino defendeu e cochichou para ela. — Enterrei alguns para jogar na cabeça do delegado Serafim. Ele que não me apareça aqui. Ah, a propósito, Feliz Natal.
*****
Oii pessoal, entrego-lhes mais um capítulo e uns cabelos brancos aqui, kkk
Não tenho previsão de final ainda, mas não devo demorar para encerrar a história. Por isso agradeço muito pelo carinho e paciência.
Muito kisses, abraços e amor! Bora ser feliz.
Opa, feliz não, doente. Segundo uns por aí... (?) Eu morro e não vejo tudo...
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