Capítulo 4 - papainoeldogorropreto.com
Dias se passaram após a morte de Marelyn, o natal se aproximava, não animando em nada Ryan, que mantinha a casa sem as cores e o brilho que a época exigia. Para ele, os dias passaram se arrastando, mas não fazia a mínima diferença — não em seu estado atual. Tudo o que ele sentia se acentuava com a chegada de um clima ainda mais frio, e a neve que se estabelecia timidamente.
Desde a morte de Marelyn as pessoas não sabiam ao certo qual era o estado dele, apenas resumindo a um luto. Ele não trabalhava mais, pulava algumas refeições e limitava o seu convívio social basicamente á Janette, que continuava trabalhando em sua casa — mas como empregada, depois de muito relutar, assim como quando foi contratada pela primeira vez na casa. Era ela quem, de vez em quando, fazia Ryan comer quando preparava o almoço, sem ao menos essa ser a sua função.
Algumas visitas apareciam, amigos do trabalho, outros mais íntimos, sempre recebidos de forma curta e rasa.
Sábado à tarde, Ryan estava trancado em seu quarto com a cara no notebook, totalmente focado. A voz de Janette o chamou junto de duas batidas na porta, ele se levantou e abriu a porta.
— O Simon tá aí, devo atender ele?
Ryan pensou por alguns segundos e a respondeu:
— Sim... Quer dizer, pode deixar que eu atendo.
Janette assentiu e saiu em direção á cozinha, Ryan foi até a sala de estar e abriu a porta.
— Ryan! — disse Simon, e o abraçou com empolgação, sem reciprocidade de sentimento.
— Entra...
Ele entrou e disse:
— Como você tá? Sei que nos últimos tempos você preferiu ficar sozinho... Mais na sua... Mas tenho me preocupado com você.
— Não precisa, eu só quis... Quero ficar na minha.
— Eu só quero que você saiba que pode contar comigo... pra tudo.
Ryan assentiu e a conversa se silenciou por alguns segundos.
— E o que você tem feito?
— Nada demais... Apenas pensando.
— Em?
— Em como sumir... — disse Ryan, e seus olhos começaram a encher de lágrimas. — Eu não sei... Eu só quero... Esquecer...
— Eu sei que a perda da sua mãe te afetou muito, mas também sei que você vai superar. Talvez precisa se dar mais pra isso.
— Não é só isso.
— E o que é mais? Se abre... O que realmente tá acontecendo?
— Não... Eu não posso... Eu não consigo — disse Ryan, foi até a porta e a abriu. — Eu acho melhor você ir embora.
— Mas...
— É melhor, Simon — interrompeu ele. — Por favor, vai embora.
— Tudo bem... — disse Simon. — Eu não vou insistir, mas saiba que quando você precisar, eu vou tá aqui.
Simon foi embora, e Ryan fechou a porta. Lentamente ele foi até o sofá e se sentou, começando a chorar, enquanto amassava o próprio rosto com as mãos.
A noite chegou. Alguém em um ambiente pouco iluminado escrevia, em pé, a continuação de uma carta, apoiado em uma mesa simples de madeira.
...Você foi a primeira, a única coisa que eu amei nessa vida, com você eu pude conhecer o amor, e eu sempre achei que isso não existisse...
Ryan usava o seu notebook em seu colo, no sofá da sala de estar, estava sozinho e totalmente concentrado. Ele pesquisava maneiras de entrar na deep web, e, pela sua apatia, podia-se dizer que já estava naquilo á algum tempo. Quando iria desistiu, algo como uma lâmpada acendeu em sua mente, seria a sua última alternativa.
Ele abriu uma nova guia na internet, entrou em sua rede social e abriu um chat com Simon.
Ryan: Vc lembra que planejávamos investigar aquele site? Na deep web?
Enviou a mensagem e aguardou, Simon não estava online.
Quase dez minutos se passaram, Ryan refletia jogado de maneira espaçosa no sofá, olhando para o teto, mas ainda aguardando com o notebook em seu colo. Foi surpreendido quando um som de notificação indicou uma resposta.
Simon: sim, pq??
Ryan rapidamente o respondeu:
Ryan: Então vamos
Simon: n toquei mais no assunto pq seria muito sem noção da minha parte
tbm achei que vc já tinha deixado isso pra la
Ryan: Eu ainda preciso descobrir a vdd, vc vai ajudar?
Simon: eu tenho novidades
Ryan: ??
Simon: Depois do seu acidente eu n desisti de entrar no site, então eu tentei sozinho
Ryan: Pq n me falou antes?
Conseguiu????
Simon: "n toquei mais no assunto pq seria muito sem noção da minha parte"
"tbm achei que vc já tinha deixado isso pra la"
Ryan: Ok
Funcionou ou n?
Simon: mais ou menos
Ryan: Como assim?
Simon: eu vi alguns prints do site em um chan, só vc vendo pra entender
parece que o site realmente é real, mas alguém pode ta brincando
Ryan: Que isso? chan?
Simon: é a mesma coisa q um fórum praticamente
Ryan: Me envia os prints
Simon: eu não salvei nada
sla, é perigoso
eu teria que entrar no fórum dnv e procurar o tópico que encontrei os prints
Ryan: Poderia ter ao menos tirado print do navegador né
Vou até aí
Simon: agora?? essa hora?
Ryan: Sim
Simon: n é melhor outro dia?
Ryan fechou o notebook e o jogou em cima do sofá, pegou suas chaves na mesa de canto e saiu de casa.
Simon navegava no computador em seu quarto, o interfone do apartamento tocou e ele foi até a sala atende-lo.
— Alô — disse Simon e foi respondido. — Pode mandar subir.
Desligou. Ele veio mesmo, pensou Simon.
Simon abriu a porta e aguardou Ryan do lado de fora. Alguns segundos depois ele apareceu.
— Não acredito que você veio mesmo...
— Vamos direto ao ponto — disse Ryan e entrou rapidamente no apartamento, Simon entrou em seguida.
Eles foram para o quarto. Simon se sentou na cadeira de frente para o computador, Ryan se manteve em pé.
— Eu não consegui entrar no site do livro porque o link não é aquele, o verdadeiro é meio que um código — disse Simon. — Então eu fui em busca de provas de que o site pelo menos existia.
— E cadê? — disse Ryan.
— Espera... Eu tenho que abrir tudo ainda.
A área de trabalho do notebook era uma bagunça e lotada, mas rapidamente Simon achou o aplicativo de navegação da deepweb e o abriu. Colocou o endereço de um site e deu enter.
Acesso Revogado
— O quê?! — disse Ryan. — Você me fez sair de casa pra não conseguir entrar?
— Você veio por que quis.
— Não acredito...
— Calma, você é muito apressado... Isso acontece mesmo, é só eu mudar o IP e fazer uma mágica aqui — disse Simon, Ryan suspirou. — Mais calmo agora?
Simon abriu outra aplicação, fez algumas ações nela e aguardou. Até que...
— Finalmente! — disse Simon empolgado. — Agora vai.
Simon colocou o site novamente e, dessa vez, entrou. Um fórum de aspecto velho abriu na tela.
— E agora?
— Agora só preciso achar o tópico.
— Só? — disse Ryan sarcasticamente.
— Não vai demorar tanto.
Simon passava de página em página em busca do tópico, mas não encontrava.
— Pera aí... — disse Ryan e apontou para a tela, fazendo Simon parar de rolar a página. — O que é aquilo? Volta...
Simon rolou a página para cima e parou assim que Ryan sinalizou.
Motivos para cometer suicídio + melhores métodos
Negros humilhados e mortos (vídeo)
— É... Isso é comum por aqui — disse Simon.
— Isso é... — disse Ryan, e balançou a cabeça negativamente. — Tira... tira.
Ryan se sentou na cama e Simon continuou a sua busca.
Depois de mais algumas páginas exploradas a expressão de Simon transparecia que finalmente ele havia encontrado o que procurava.
— Achei! — disse Simon, recuperando a sua empolgação inicial. Ryan rapidamente se levantou para ver.
— Cadê? Cadê?
— Aqui começa — disse Simon, e indicou na tela. — Eles falando sobre o site e alguns prints de algumas pessoas que entraram.
No tópico, Simon mostrava à Ryan vários prints postados por um usuário chamado DemonCandy do suposto site do Papai Noel do Gorro Preto. Neles, apesar de não tão claros, mostravam várias características do site: Venda de órgãos, entrar para a equipe com moeda virtual e investimentos em assassinato.
— Salva isso, Simon. — disse Ryan. — Salva tudo.
— Como assim?
— Salva essas imagens, salva o que estão falando sobre elas, tire prints... Eu vou levar isso à polícia.
Simon deu um curto e fraco riso, e disse:
— O que?! Isso é loucura, a polícia não pode fazer nada. Até por que isso pode nem ser real.
— Eu sei o que eu tô fazendo, e preciso que você tire print de tudo e me envie.
— Mas eles não vão fazer nada.
— Dá pra você fazer o que eu tô falando? — disse Ryan, em um tom de voz mais alto.
— Tá bom... Só acho que vai ser uma perca de tempo.
Ryan suspirou. Simon tirou print das imagens e de algumas conversas sobre elas que rolaram ali, salvou e enviou tudo por rede social á Ryan.
— Pronto!
— Até mais — disse Ryan, já saindo.
— Nem um obrigado?
Ryan parou, se virou e disse:
— Obrigado, Simon.
A manhã raiou como qualquer outro dia naquela atualidade de Harrison, o sol (bem) pouco presente enquanto os ralos flocos de neve ganhavam destaque. Ryan, em seu quarto, se preparava apressadamente para sair, fechou o zíper de sua jaqueta. Ele colocou o seu notebook em uma mochila, a colocou nas costas e foi para a sala.
— Aonde você vai? — disse Janette, que estava por ali arrumando uma estante, e fez com que Ryan parasse.
— Primeiro vou passar na papelaria, depois na delegacia — respondeu Ryan.
— Delegacia?! — disse Janette, em um leve espanto. — Por quê?
— Eu descobri algumas coisas sobre o caso do Papai Noel do Gorro Preto, coisas reais...
— Que coisas?
— Não tenho tempo de explicar agora... Pra resumir, encontrei alguns prints em um fórum na deepweb que mostram que o site existe, e que lá, eles cometem crimes.
— Mas... Ryan, você só vai perder tempo, eles não vão fazer nada.
— Simon falou a mesma coisa, mas eu vou pagar pra ver. Os prints são provas de crimes, eles têm que fazer algo!
— Vai por mim, a polícia não...
— Tarde demais — interrompeu ele e saiu de casa.
Ryan caminhou até a papelaria mais próxima — que ficava a cerca de 500 metros de sua casa —, nem a sua jaqueta era capaz de deixar a temperatuda mais agradável, mas esse detalhe não parecia aborrecê-lo.
Na papelaria, ele pediu as impressões dos arquivos guardados no seu notebook, sem enrolações. Aguardou alguns minutos e recebeu os prints impressos em suas mãos. Pagou e foi embora.
Em uma escrivaninha, a continuação de uma carta era escrita rapidamente por alguém.
...Eu queria que tudo fosse diferente, que a nossa vida realmente existisse, mas está fora do meu alcance...
Em uma sala na delegacia de polícia, Ryan estava com um policial á sua frente, ambos sentados á uma mesa, que os distanciavam.
— Você disse que tem uma informação importante pra nos dar... Sobre um crime — disse o policial. — Qual é o crime?
— É sobre o caso que saiu recentemente, sobre o Papai Noel do Gorro Preto — disse Ryan, e colocou prints impressos em cima da mesa. O policial franziu o cenho. — Olha essas imagens...
O policial deu uma rápida olhada nos papéis, e junto de uma leve risada disse:
— Tá certo... Obrigado pela sua contribuição, já pode ir.
— Só isso? Vocês vão fazer alguma coisa?
— Bom... é... Como se chama mesmo?
— Ryan.
— Bom, Ryan, você deveria saber que essa história de Papai Noel do Gorro Preto é pura ficção.
— Não, não é, e essas imagens que eu te trouxe provam isso.
— Provam exatamente o que?
— Você não vê? — disse Ryan e pegou os papéis. — Venda de órgãos, assassinato...
— Isso não são provas, são pessoas debatendo em um fórum, com imagens de um site que pode ter sido feito por qualquer um que saiba usar o Photoshop — disse o policial com clareza. — Você só tá tomando o nosso tempo, é melhor você ir embora.
Ryan largou os papéis na mesa, se levantou e foi até a porta para sair da sala.
— Ei! — disse o policial, e apontou para os papéis.
Ryan voltou, os pegou e foi embora.
— É cada maluco nessa cidade... — disse o policial em voz baixa.
Na saída da delegacia, Ryan acreditava que alguns policiais e pessoas presentes o olhavam fixamente, ele se apressou e saiu dali, se dando conta, depois, de que ninguém estava o observando. Enquanto caminhava á caminho de casa, rasgou os papéis das impressões feitas, deixando os seus restos picados voarem pelas ruas.
A cada dia que se passava, ficava cada vez mais difícil de Ryan voltar á uma rotina considerada normal. Olheiras já haviam invadido o seu rosto, e esse era apenas um dos sinais de que ele estava em uma fadiga duradoura. Faltavam apenas dois dias para a véspera do natal.
Ryan chegou em casa com algumas sacolas de supermercado em mãos. Foi até a cozinha, e colocou três das sacolas em cima da bancada. Com duas ainda em mãos, foi até o seu quarto, onde Janette arrumava sua cama.
— Janette, eu comprei algumas coisas, tá na cozinha — disse Ryan.
— Já vou lá guardar tudo — disse Janette, e reparou nas sacolas em sua mão. — E essas aí?
— São coisas minhas...
— Okay.
Ryan aguardou até Janette finalizar sua cama, e, quando ela saiu, se trancou no quarto. Jogou as sacolas na cama e retirou o que havia comprado: farinha, fermento e raticida em pó. Levantou a sua camisa, e retirou uma pistola de sua cintura, também a deixou na cama. Saiu do quarto, e foi até a cozinha.
— Ao fim do dia hoje você tá liberada do trabalho até depois do natal, okay?
— Por que? — disse Janette intrigada e parou de organizar a cozinha. — Não é porque tá chegando o natal que você precisa me liberar não tá? Eu posso ficar por aqui e só tirar folga no dia mesmo. Ou nem isso, por mim eu trabalhava.
— Não vai ser preciso. Só aproveita o descanso — disse Ryan. — E de jeito nenhum que você ia trabalhar num feriado, ainda mais se tratando do natal. Se eu fosse fazer algo, até te convidava, mas não vou comemorar.
— Sério? Por que não?
— Eu não tô muito no humor, achei que já tinha reparado... É só você dar uma olhada lá fora a noite, e ver como essa casa se destaca das outras — disse Ryan, e percebeu que Janette parecia não ter entendido. —Totalmente escura...
— É... Eu percebi... — disse Janette, meio perdida.
— Você também não vai?
— Vou o que?
— Comemorar o natal...
— Ah, não... Quer dizer, sim... — disse Janette, e Ryan demonstrou um semblante confuso, que logo se desfez. — Vou viajar para a casa dos meus pais... Na véspera.
— E você ia preferir ficar aqui trabalhando do que ir viajar?!
— Ah, é que viajar da trabalho, além disso nem tô com muita vontade de ir. Me da preguiça só de pensar em ficar horas em um avião pra no final lidar com uns parentes chatos.
Ryan riu e disse:
— É a vida... Bom, vou sair agora, dar uma espairecida, você já sabe como.
— Crianças!?
— Sim — disse Ryan, começando a se empolgar. — Vou fazer uma visita ao orfanato, e com alguns presentes que comprei pra cada uma das crianças.
— Que amor. Eu acho lindo essas suas atitudes — disse ela, e sorriu involuntariamente.
— Já eu acho que todas as pessoas poderiam ter essas atitudes. — Ele se despediu dela com um "até mais" e saiu.
Janette continuou arrumando a cozinha, até ouvir o motor do carro de Ryan ligar e dar partida. Ela caminhou até o quarto dele e tentou abrir a porta, franziu levemente a testa ao perceber que estava trancado. Tirou uma chave de seu bolso, a colocou na porta e conseguiu entrar.
Ao olhar a cama, Janette se surpreendeu com os itens que estavam ali, principalmente com a pistola. Ela se aproximou, e ficou parada observando.
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