I - Hedonismo
Passei boa parte da minha juventude fazendo as mesmas coisas que qualquer adolescente faz. Frequentando festas, raves, todo tipo de coisa que envolva sexo, bebidas, drogas e música pesada. Eu me sentia o cara. Era perfeitamente capaz de qualquer coisa, vivendo desse jeito por anos. Uma vida de hedonismo e de libertinagem.
Já dispensei várias manifestações de amor, sentimentos, dispensei vários tipos de sermões e criei inimigos por conta do meu estilo de vida. E eu não ligava nem um pouco. Eu realmente achava que eu estava certo em seguir minha vida assim até que este mundo se acabe.
O grande problema é que com o tempo fui percebendo que isso era vazio. Era repetitivo. Era insuficiente. Passou a ser insuficiente, aliás – pois esse descontentamento veio bem depois da auto-reflexão.
Deve ser por isso que hedonistas não param pra pensar. Porque se você para pra pensar, você cresce. Você muda. E ninguém quer mudar.
...
Nunca tive medo de viver da forma que vivi, pecando e agindo como se minhas atitudes não tivessem consequência. Eu sabia que não faria diferença, pois não iria ao inferno. O diabo era meu amigo.
Muito infantil da minha parte, eu sei. Mas depois de um bom tempo a ficha caiu. Eu finalmente entendi que o inferno não era só lá. O inferno era aqui também. Na Terra. Nesse lugar cheio de gente imunda. Nessa vida vazia e de sofrimentos.
Antes, o que eu responderia com "deve ser uma merda!", agora eu respondo com um simples "não sei..."
Por que eu estou sentindo a necessidade de buscar algo além de mim? Será que o tempo na Terra e com os humanos está causando essa mudança em mim?
...
23 de Setembro de 2012.
BOATE MORNINGSTAR
...
— Vodka ou Tequila? — pergunta a bargirl.
— Absinto! — respondi.
A bargirl enche de bebida enquanto me olha num clima sedutor. Essa boate é a mais aclamada da cidade de Los Angeles, nos Estados Unidos. A música é na moda, o típico pop e eletrônico – o que seria a cultura popular (não alta cultura, pois de cultura esta porra não tem nada). Moças rebolando de vestidos colados no corpo, caras se acabando na bebida, o paraíso hedonista.
— Sua sorte é que você é um VIP daqui, se não jamais poderia beber isso, ainda mais com esse estilo de samurai. — a bargirl diz, enquanto me olha.
Eu tomo minha bebida calado. Não vou largar minha katana só porque "o normal é andar como gente normal." Se uma ameaça aparecer, estarei preparado. A Yamato é o nome de minha Katana, me dada de presente desde a infância.
Em um único gole acabo com a absinto. O teor alcoólico dessa bebida é cerca de 80%, e eu consigo beber como se fosse água, sem nenhuma complicação.
— Cadê ele? — eu pergunto, batendo o copo no balcão.
A bargirl guarda a garrafa e se inclina no balcão, com aquele sorriso:
— Você sabe que o chefe é um homem ocupado.
— O cara vive transando e usando entorpecentes. — eu retruco.
— Você também. — a bargirl começa a rir, como se estivesse ironizando.
Procede.
A música da boate aumenta o volume. Duas garotas bêbadas se aproximam, encostam no balcão e já me olham com aquela malícia feminina.
— Não vai pagar uma bebida pra gente, meu amor? — uma delas me pergunta enquanto dá um sorriso sedutor.
A outra me cerca do outro lado e diz:
— Você paga a bebida e depois a gente paga outra coisa pra você...
Eu dou um sorriso, e claro, tento levar as duas para o meu quarto reservado – afinal, não poderia ter sido diferente. A bargirl diz:
— Eu disse. — ela dá uma risada de canto. — Você é assim!
— Cala a boca. — não me seguro e começo a rir também, respondendo as provocações. — Não começa. — eu digo, agarrando as duas garotas pela cintura com aquela pegada bem firme.
Uma delas pega uma garrafa de tequila adocicada. A bebida saiu por minha conta, mas elas nem vão conseguir beber isso – a não ser que elas não se importem com a puta ressaca.
Horas depois...
Depois de muito sexo, muito calor e muita ação, uma delas disse que tinha entorpecentes e que estava louca para usar. Não dá pra acreditar que essa maluca tinha LSD do efeito mais forte. Ela guardava aquilo dentro da bolsa sem nenhum medo, o que mostra a facilidade que é de se entrar com drogas dentro de boates. A droga estava disfarçada de bala da marca Halls. Nós três usamos a droga, e em mim teve um efeito um tanto peculiar:
Já consumi LSD diversas vezes e os efeitos eram sempre os mesmos: de prazer. No entanto, com o tempo, o efeito passou a trazer ansiedade e agora está trazendo uma crise meio depressiva.
Vi que a vida tinha mais a oferecer do que apenas prazeres momentâneos. Do nada "bateu a bad" como dizem os jovens hoje em dia.
Até quando isso vai?
Esse estilo de vida...
Eu passei essa noite transando com duas garotas que nem sabem meu nome. Isso a princípio é tentador, mas vazio. Dentre as milhões de vezes que fiz isso, por que eu me importo agora?
Como é se apaixonar, criar laços?
Como é amar?
...
Eu não devia estar me perguntando isso...
No dia seguinte...
Depois da grande noite, eu me vesti com meu terno ao estilo Morningstar e fui embora da boate. Estou começando a gostar dessas vestimentas mais formais. Eu desapareci por um tempo. Fui sentar num banco de uma praça qualquer enquanto fumava charutos cubanos da mais alta qualidade. Criei esse hábito de fumar charuto depois que comecei a pensar mais nas coisas.
Eu estive pensando a razão de eu estar sentindo as coisas que sinto. Antes eu não reclamava de viver transando, bebendo, usando drogas e tudo mais. Por que isso está mudando? É como se eu tivesse "cansado" da vida vazia de antes.
De repente...
Alguém se aproxima...
— Bom dia, Amenadiel. — digo, enquanto tiro o charuto da boca.
Um anjo surge, se "teletransportando" para o meu banco. Anjos tem essa capacidade de transitar rapidamente pra qualquer lugar da terra.
Eu vivia com medo de ser capturado por anjos ou demônios. Vivia preocupado com o dia em que teria que usar minha Yamato. Mas esse medo passou há muito tempo, tanto que não fico nem um pouco surpreso em me encontrar com Amenadiel aqui sozinho. Não é a primeira vez que vejo um anjo ou converso com um.
O Amenadiel é um dos anjos mais velhos do reino dos céus. Ele diz:
— Você sabe que o juízo final está chegando... sabe?
— Veio aqui perguntar se sinto algum arrependimento? — pergunto, colocando o charuto na boca e sem ligar muito para o que ele diz.
Amenadiel sabe ler a alma das pessoas. Mentir pra ele é quase impossível. Ele diz:
— Eu sei que você tem. No fundo tem. E o Senhor Todo Poderoso também sabe.
Eu fico calado, sem expressões. Não sei o que dizer, e nem tenho o que dizer.
— Mentir pra si mesmo é uma falta de virtude muito grande. Talvez a pior delas... — ele toca meu ombro. — ...Devia ter aprendido isso com sua mãe.
— Foda-se. Não quero essa responsabilidade. — eu tiro a mão dele do meu ombro.
Ele suspira, dizendo suas últimas palavras antes de ir embora:
— O apocalipse vem aí, garoto. Decida qual lado você vai estar.
...
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