23.07.18 - Segunda



De: [email protected]
Para: [email protected]
Assunto: Discutimos... =(


Boa noite, amiga, como passou o final de semana?

O meu não foi lá aquelas coisas...

Meus sonhos têm sido estranhos ultimamente. Em todos eles eu estou em um lugar escuro e cercado por uns caras que ficam me encarando de uma forma nojenta e se aproximando... E quando eles começam a me tocar, eu acordo. E então, tento dormir novamente, e vem o mesmo sonho...

Isso tem sido horrível. Parece que nem dormindo posso me sentir bem... E quando estou acordado fico lembrando daquele dia.

O sábado foi menos ruim. Com o Lucas aqui, eu meio que consegui me distrair. É que, quando ele está, me permito deixar a mente mais livre, sei lá... É como se ele fosse um dissipador de preocupações: brincar com ele, rir com ele, acaba me dando alguns oásis de tranquilidade. Faz a inocência dele e a vida sem problemas de uma criança chegar até mim (isso, claro, até eu me ligar de que meus problemas não se vão com um sorriso).

Nós brincamos de pega-pega no meu quintal, em volta dos berçários de flores enquanto o Nicolas assava umas carnes na churrasqueira. Ele não participou da brincadeira, apenas ficou olhando... Eu sabia que ele só não tinha voltado a insistir ainda por causa da presença do Lucas.

Ele tem estado sempre com aquele olhar preocupado para mim. Assim como eu, ele tenta sorrir, mas depois de um tempo passa. Com a Jack é quase o mesmo, só que ela consegue ser mais zen: tentou arrancar de mim os fatos, mas depois do meu silêncio acabou falando que era para eu contar com ela assim que me sentisse melhor para revelar "o que quer que fosse".

Eu quero, e não quero contar. Um dos meus medos é de demonstrar fraqueza, ou de parecer exagerado demais...

Bom, pesquisei na Internet, e descobri que o que aquele cara fez é realmente considerado como um estupro.

É tão irreal, quando lembro. Parece parte de um sonho ruim. Mas sei que não foi sonho porque parte da sujeira do desgraçado pingou na minha calça e no meu tênis. Eu escondi numa sacolinha de supermercado, debaixo da minha cama.

Lembrar disso faz eu passar mal. Sem exagero: estou enjoado só de escrever sobre.

No domingo, depois que o Lucas foi embora (e eu fiquei bem longe pra não me encontrar com a megera) finalmente ele chegou em mim com aquela cara decidida. Eu estava na casa deles (passei a noite lá, numa das "festas do pijama" com o pinguinho) e foi num momento em que a Jaqueline tinha dado uma saída no mercado.

"Zak, não aguento mais ver você assim... Me fala o que tá acontecendo... Foi algo que eu fiz?". Porra, isso foi horrível. Eu já tinha falado que não era nada que ele tivesse feito, mas mesmo assim ele me fez essa pergunta, de novo. Repeti pra ele que não era nada disso, mas ele literalmente avançou pra cima de mim, e praticamente me prendeu contra a parede. Bem, óbvio que não à força (ele não é um ogro que nem o desgraçado do Marcus), mas ele ficou na minha frente, com as mãos espalmadas na parede.

Eu estava praticamente preso, entende?

Em qualquer circunstância, ter ele assim diante de mim faria eu querer mais. Faria eu querer que ele me tomasse, e, coisa e tal. Mas naquela hora, tudo veio à tona. Ser encurralado contra a parede me deu um desespero horrível... Era como se as coisas estivessem se repetindo.

Eu entrei em pânico total, e empurrei ele. Gritei "Fica longe de mim"... Mas pra pessoa errada... =(

Ele quase caiu no chão com meu empurrão, e ficou me olhando com tristeza, como se eu tivesse dado um tapa na cara dele.

Amiga, eu quis morrer ao ver o Nicolas assim...

Acho que com isso eu piorei a situação, porque ele se afastou e disse "Tudo bem... Eu fico".

ISSO NÃO ESTÁ CERTO! Eu fiz tudo errado mais uma vez! E eu simplesmente não conseguia falar nada. Absolutamente NADA! Nem desculpas eu consegui pedir, de tão embargada que estava minha garganta. Se eu tentasse falar, só iria começar a chorar que nem uma criança idiota e fraca.

Mas eu sei que estou sendo idiota e fraco neste momento.

E o que eu fiz? Bom, fiquei olhando pra ele, apenas olhando pra ver o que mais ele falaria, mas ele não disse mais nada. Deu as costas, e foi pra cozinha. Pelo que ouvi, ele estava pegando ingredientes pra fazer algum doce. E o Nicolas só cozinha em duas situações: ou quando está muito animado, ou quando está triste demais.

Até hoje, eu nunca tinha visto ele cozinhar por causa do segundo motivo...

Com isso, eu não aguentei mais ficar lá. Voltei pra minha casa. É claro que a Jaqueline chegou mais tarde e foi bater na porta do meu quarto, perguntando por que o irmão dela está fazendo bolo com cara de bunda (foram as palavras dela). Eu abri a porta, mas nem coloquei a cara pra fora. Só disse "A gente meio que discutiu", e ela forçou a entrada e me abraçou.

Só me abraçou.

Não ficou perguntando nada. Não ficou querendo que eu explicasse a porra toda.

Acho que eu precisava desse abraço. Só queria chorar sem que ficassem insistindo "conta, conta, conta".

...

Durante minhas pesquisas (sobre estupro masculino) descobri que acontece mais do que imaginamos, mas que é raro que contem.

Eu entendo bem eles. Não dá coragem... Existe um estigma grande demais sobre isso. Um tabu, sei lá.

Tem uma voz bem chata na minha mente que fica insistindo em dizer que, por ser homem, eu deveria saber me defender. Por ser homem, isso não deveria ser tão chocante.

Mas que inferno de pessoa que decidiu isso?

Homem não chora... Homem não pode agir assim, homem isso, homem aquilo...

Um bando de regras que a sociedade cria, tentando colocar as pessoas dentro de camisas de força e cabrestos para que tenhamos as atitudes que cabem dentro dos conceitos torpes delas.

Enfim. Às vezes eu simplesmente tenho vontade de gritar na orelha de todos.

...

Hoje foi um dia pacato. Fiz o que tinha que fazer no Pântano dos Mosquitos (o Nick, quando veio para cuidar das plantas, me cumprimentou com cuidado... como se eu fosse um cão nervoso – não o culpo), depois fui até a prainha de bike e fiquei fazendo "nada". Só olhando a água, as poucas pessoas que andavam por lá numa segunda-feira...

Quando eu voltei, perto do pôr-do-sol, o Nicolas estava falando adivinha com quem ao telefone? Exatamente com o filho do demônio.

O Marcus vai vir no próximo sábado para pegar o último carregamento de flores. Depois disso, a Belson Flora não vai mais trabalhar com eles (como os preços aumentaram, a família dele procurou outros fornecedores).

Com isso, já sei exatamente o dia que preciso sumir daqui. No sábado estarei MUITO longe, para não ver nem a cor do desgraçado.

...

Amiga, acho que vou ficar por aqui. Mandei este e-mail apenas para te atualizar mesmo, pois minha vontade ultimamente é de simplesmente nem existir.

Não tenho tido fome, e nem sono.

Em breve estarei mesmo parecendo um Drácula.

Boa noite para nós dois, anjo-irmã...



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Hey readers! Eu, Lyan, estou passando apenas para agradecer todo o apoio que vocês têm dado ao nosso Isaac. As mensagens maravilhosas que escreveram (e as mais enérgicas, contra o Marcus) são importantes demais.

Fico feliz de ler cada uma das linhas de vocês.

Só tenho a agradecer.

Um grande abraço de um caracol que está feliz por não estar só nesta jornada ❤❤❤



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