Tem dias em que pensamos: "Melhor seria se eu não tivesse saído da cama, e eu estava vivendo esse exato dia."

Era o décimo terceiro dia do ano de 2022, o dia estava ensolarado e era um daqueles dias em que você daria tudo para ir para a praia ao invés de ir trabalhar no shopping em uma loja que o ar-condicionado quebrou e seu gerente vive dando em cima de você.

Assim que cheguei no serviço, Daniela, a novata, falou que Durval havia mandado que eu colocasse toda a mercadoria que estava no meio da loja no estoque.

Demorei dois minutos para entender que Daniela estava falando do Senhor Muniz. Estranhei, pois ninguém na loja chama o gerente pelo primeiro nome, mas não queria tirar conclusões precipitadas. Comecei a pegar a mercadoria quando Daniela, que era caixa e não vendedora como eu, falou:

- Em ordem de cores, seguindo a paleta de cores colada na porta do estoque.

Revirei os olhos e continuei meu serviço. Por volta das 11:00 horas, o Senhor Muniz chegou acompanhado por uma garota loira, como ele. Ela parecia ter por volta de uns 18 anos. O gerente a apresentou como Monique, sua sobrinha e nova funcionária. Dez minutos depois, o Senhor Muniz me chamou em sua sala e me despediu. É claro que, mesmo sendo um emprego chato, eu preferia estar trabalhando a estar desempregada. Sem pensar muito, soltei:

- Porra, Senhor Muniz, nem é o caso de eu ser a melhor vendedora dessa loja. Também não é o fato de você estar se envolvendo com a operadora de caixa e agora colocar sua parente na vaga que era minha; o fato é que o senhor não poderia ter me demitido assim que cheguei para trabalhar? Assim eu poderia ter aproveitado o dia e ter ido à praia. Outra coisa, foi você ter mandado eu arrumar 245 camisas e 150 calças em ordem de cor, seguindo a paleta de cores do arco-íris, bem no dia que o senhor iria me demitir. Se o senhor tem TOC, arrume o estoque o senhor. Peguei os papéis sobre a mesa e saí da loja em direção à praça de alimentação, fui até a cervejaria Baviera e pedi o de sempre. Lisa trouxe um chope preto com um dedo de colarinho; paguei, sentei em uma mesa da praça e liguei para Lucas, meu namorado.

- Essa hora ele deve estar em casa fazendo algum vídeo de Minecraft para postar na plataforma vermelha.

A ligação chamou até cair, liguei novamente e Lucas finalmente atendeu:

- Oi, Sofi. - Meu namorado falou com a voz estranha.

- Lucas, vou passar aí pra te pegar, se arruma, vamos almoçar no quiosque Lanterna dos afogados e depois podemos passar o dia na praia. - Falei entre um gole e outro de cerveja.

- So, acho melhor você não vir aqui... é que eu estou ocupado... porra, toma cuidado com o dente. - Essa última parte Lucas falou gritando. - Desculpa, Sofia, acho melhor a gente terminar.

- Puta que pariu, fui demitida e ainda descubro que meu namorado está me traindo. O que mais esse dia me reserva?

Eu me vi no olho do furacão, com a minha vida profissional e amorosa desmoronando diante dos meus olhos. Bebi toda a tulipa de cerveja como se estivesse morrendo de sede e fui para casa. Eu mal havia colocado os dois pés na sala quando minha mãe me falou:

- Sofi,  sua avó ligou e falou que sua bisa está em seus últimos dias de vida. Minha mãe está mandando as passagens para irmos nos despedirmos da Dona Elena.

- Mãe, a gente nem conviveu com a bisa direito. Eu a vi umas duas ou três vezes quando era criança, e você não a viu muito mais do que isso. Tem que parar de deixar a Vó Maria se meter em nossas vidas. Sem falar que eu não estou muito bem, fui demitida e Lucas terminou comigo...  preciso de um dia de praia com a Manu e a Bia  para melhor meu humor...  A última coisa que eu quero no momento é ter que ficar sorrindo para parentes que não conheço.

- Sua bisa não pensou que você  não era íntima dela quando mandou o dinheiro para seu curso de inglês, para comprar se celular  e a viagem para Bahia.

- O que adianta  o curso de inglês se ela fala espanhol? Não vamos conseguir trocar meia dúzia de palavras. - Falei revirando os olhos, sabendo que minha mãe não iria sossegar até me colocar dentro de um avião.