Capítulo 4 - parte 1 (rascunho)

"Conhecer os outros é inteligência, conhecer-se a si próprio é verdadeira sabedoria. Controlar os outros é força, controlar-se a si próprio é verdadeiro poder."

Lao Tsé.


Apolo conduzia com calma sem desejar forçar o carro naquela estrada ruim. Embora não estivesse muito quente, fechou as janelas e ligou o ar porque havia muita poeira e assim tinha bem mais conforto. Olhou para o céu e notou que estava muito carregado, tão escuro que parecia ser de chumbo, uma virada do tempo com uma velocidade vertiginosa para a época do ano. O vento começou a ficar muito forte a ponto de sentir a sua interferência sobre o veículo que abrandava a velocidade quando vinha de frente.

Reduziu a velocidade e observava a ventania que rodopiava e mudava de direção com frequência, abanando o carro todo e isso passou a preocupá-lo porque, se o vento tinha força para chacoalhar o veículo, poderia vir a se tornar um pequeno tornado, ideia reforçada pelo fato de que agora ele criava vórtices, levantando espirais de poeira do chão, ao mesmo tempo que alguns raios e trovões apareciam ao acaso. Já tinha escurecido tanto que ele precisou de acender os faróis de neblina para evitar que outro carro não o visse.

Um trovão muito forte fez com que olhasse para cima, assustado, e voltasse a reduzir ainda mais a velocidade, concluindo que talvez não fosse má ideia retornar ou procurar abrigo em algum local próximo. Segundo os seus cálculos, não andou mais de cinco quilômetros desde que saiu do sítio, mas, só de pensar em ver a cara do criminoso, achou melhor continuar porque poderia vir a perder a paciência com ele.

Voltou a olhar para a estrada e, assustado, pisou no freio com toda a força antes mesmo de se atinar que estava prestes a atropelar um homem. Com o vento e a estrada em péssimas condições o carro não reagiu como seria de se esperar naquela velocidade tão baixa e derrapou alguns metros, parando logo após atingir o sujeito que caiu. Foi tudo rápido e fugaz, quase como uma silhueta, mas o barulho do impacto era bem real e, arriscando a vida naquele tempo louco, Apolo saltou fora do carro e correu para a frente, todo curvado para enfrentar o furacão que parecia estar a diminuir de forma sutil. Quando viu o homem caído, espantou-se tanto que parou de correr e ficou a olhar para ele de queixo caído porque o que estava à sua frente era uma armadura medieval. Por uns segundos ficou e tentar se lembrar do que havia nos arredores do hotel fazenda, mas eram só fazendas mesmo e nenhum hospital psiquiátrico. Olhou em volta à procura de algo que esclarecesse, mas era tudo deserto. O vento decaiu tanto que já podia ficar de pé e aproximou-se mais, observando desconfiado até que a armadura ergueu o braço e soltou um gemido. Nesse momento, Apolo deu um salto para a frente e ajudou-o a se levantar.

Precisou de fazer uma força danada para o colocar na posição sentada, encostado ao carro. O estranho, na certa algum maluco, levou as mãos ao elmo e tirou-o, olhando para o feiticeiro. Tratava-se de um homem ainda novo, dotado de olhar vivo e astuto, coisa que não combinava nem um pouco com um maluco qualquer. Assim que virou o rosto para si, arregalou os olhos e começou a dizer:

– Salve, estranho. Sois vós Apolo, filho de Matheus, que é filho de Ricardo, que é filho de Zacarias, que é...

– Tô ferrado – resmungou, fazendo um gesto para interromper o discurso. – Pare, sou sim, mas quem é o senhor?

– Sou sir Allan da corte britânica do rei Henrique...

– Chega – ordenou, enérgico. – Já tive a minha cota com Morgan. Vamos fazer o seguinte: eu pergunto e o senhor responde de forma objetiva e abreviada, certo?

– Sois Apolo e estou aqui para...

– Pare – fez sinal com o dedo em riste e ele calou-se.

– Foi Morgan quem o enviou?

– Quem mais poderia ser, senhor, é claro que foi Morgan que deseja...

– Uma coisa de cada vez – disse Apolo. – Primeiro vamos sair da estrada antes que nos atropelem. Que estranho, mas o tempo melhorou de repente que até parece que vai limpar! Consegue levantar-se?

– Se me ajudardes, ficará muito mais fácil – respondeu Allan, erguendo o braço e apoiando-se no para-choque.

Apolo ajudou e descobriu que era uma tarefa complicada carregar tamanho peso no corpo. De pé, frente a frente com o cavaleiro, notou que ambos tinham quase a mesma altura e compleição física, apesar de ele ser ligeiramente mais alto. Por isso, disse:

– Você vai tirar essa armadura maluca e vestir uma roupa decente. Se insistir em usar isso, será internado na certa.

– Sou um nobre e cavaleiro do rei – disse, ofendido. – Um homem da minha estirpe não usa roupas de plebeus. Chega a ser uma blasfêmia!

– Morgan mandou o senhor para me ajudar, não foi? – perguntou. Depois complementou. – Diga apenas sim ou não.

– Sim.

– Muito bem, ele explicou para o senhor que está quase mil anos na frente do seu tempo?

Allan coçou a cabeça e disse, com uma careta.

– Até falou, mas confesso que não entendi direito...

– Meu amigo – disse Apolo. – A mais simples das armas modernas furam a sua armadura e matam o senhor antes de contar até três, então não adianta como proteção. Além do mais, se vai ser minha babá, não pode ficar a chamar atenção.

– Vossa o quê? – perguntou ele confuso. – Bem que sir Morgan me avisou que vós falais muito estranho.

– Esqueça, pelo amor de Deus – insistiu Apolo. – Apenas faça-me o favor de tirar a armadura. Eu vou lhe dar roupas limpas.

– Muito bem – disse sir Allan, após pensar. – Tendes razão em não chamar a atenção. Então, farei isso.

– Ótimo, – Apolo sorriu e foi para a traseira do carro, pegar uma muda na mochila. – Aqui está.

– O que é isso? – perguntou o cavaleiro, apontando o veículo, curioso. – Não tendes cavalos para a carruagem?

– Isto é um carro e anda sem cavalos – respondeu Apolo. – Vamos, eu ajudo a tirar a armadura.

Foi uma aula prática e tanto, a extração da armadura. Considerando que isso não era coisa que se ensinasse nas escolas da atualidade. Primeiro vinha a parte externa, composta de bastantes peças de metal rígido e complicada de tirar em alguns lugares que chegavam a ter pinos a encaixá-las. A seguir, uma cota de malha, mais prática de manipular, como uma manta, mas pesada e que devia ser muito resistente a objetos cortantes. Finalmente, uma espécie de jaqueta de couro almofadada, provavelmente para amortecer impactos e tinha junto um pequeno alforge. Quando terminaram isso, ficou apenas uma camisa e ceroulas, que deram vontade de rir em Apolo. Assim que estava vestido, não sem alguma dificuldade, sir Allan passou a parecer um homem normal, mas bastava abrir a boca para estragar tudo.

Apolo colocou a armadura na bagageira do carro, mas, o mais difícil, entretanto, foi convencer o homem de que não podia andar em público com a espada na cintura. A seguir, Allan olhou desconfiado para o carro, só que a curiosidade venceu e entrou.

– Nunca estive em uma cadeira tão confortável como esta, nobre Apolo – afirmou, quando o feiticeiro entrou.

Curioso, olhou o que ele fazia e agarrou-se quando o motor deu partida, assustado. Apolo olhou para ele e deu um sorriso tranquilizador, enquanto o ensinava a colocar o cinto de segurança. Assim que o carro começou a andar, ficou mais calmo quando viu que nada acontecia, mas também ficou maravilhado com a velocidade desenvolvida, muito maior do que um cavalo.

– Esta carruagem é incomparavelmente mais rápida do que uma parelha – disse espantado. – Não imaginei que fosse possível galopar tão rápido!

– Meu amigo, para onde eu vou, um cavalo levaria muitos dias a chegar, mas este carro fará o percurso em apenas oito horas, se o trânsito ajudar. No momento vamos devagar porque a estrada não é boa, mas, no asfalto, tudo vai melhorar.

– Vós falais coisas que eu não entendo, senhor – disse o cavaleiro, coçando a cabeça com uma careta. – Para onde vamos?

– Eu vou para o Rio de Janeiro – respondeu. – Você, vai depender muito do que me explicar. Então, trate de contar direitinho tudo o que aconteceu e por que raio se materializou à frente do meu carro quase perdendo a vida com isso.

– Quereis que eu conte tudo? – perguntou ele. – É que antes...

– Antes estávamos no meio da rua e havia risco de acidentes. Sou todo ouvidos.

― ☼ ―

No seu trabalho, em Belo Horizonte, uma mulher dava alguns telefonemas. Entre eles, ligou para um detetive particular conhecido seu. Teve uma conversa rápida e combinou de se encontrar com ele em um café ali perto em cerca de duas horas.

Sem pressa, Mônica resolveu vários assuntos pendentes e problemas pelos quais foi chamada mais cedo. Mais tarde, olhou para o relógio e viu que era hora de sair, se não desejasse chegar atrasada. Pegou uma pasta de papéis que imprimiu durante a manhã, e foi para o café, encontrando o detetive que já aguardava.

Sentaram-se e conversaram bastante enquanto a moça abria a pasta e tirava várias fotografias, mostrando-as. A primeira delas era do amigo, coisa que deixaria Apolo com a pulga atrás da orelha se soubesse. Foi apresentando as imagens e falando bastante, dando instruções detalhadas, ora apontando uma das fotografias para depois apontar o amigo. A penúltima fotografia era da Helena e foi uma das que mais falou até que passou para a última, do Carlos e onde se demorou ainda mais, terminando já perto do anoitecer.

Quando acabou, deixou a pasta e um cheque com o sujeito, pagou a conta e saiu.

― ☼ ―

– Bem – começou por dizer Allan. – Sir Morgan me chamou para uma missão importante, muito importante...

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