Epílogo

"Nas grandes batalhas da vida, o primeiro passo para a vitória é o desejo de vencer."

Mahatma Gandhi.

Mia estava de frente para a janela, na sua sala do prédio das ciências, o edifício piramidal que, para aquele povo, representava o conhecimento. Olhou para a grande árvore em frente à praça e lembrou-se logo do visitante que recebeu quase dois milênios antes. Pensava se ele teria conseguido resolver o seu problema e se voltaria a visitá-la como tinha prometido. Mia chegou mesmo a estudar dois dos seus idiomas principais na esperança de o agradar, mas já não tinha tanta certeza se alguma vez apareceria. O que mais desejou era vê-lo abrir uma passagem para outro mundo e, infelizmente, achava que nunca teria essa curiosidade satisfeita. Ela nunca contou a mais ninguém, mas desde a visita do mago que estudava o tempo e até conseguiu bastantes avanços na área, conseguindo alimentar o computador com informações preciosas, mas que, apesar de tudo, ainda não solucionou a questão feita dois milênios antes.

Não saberia explicar com precisão para ninguém o que aconteceu, mas o fato é que o disparo do alarme de alteração estrutural, aquele que avisava se uma espaçonave se aproximasse do mundo deles, coincidiu com o exato momento em que viu uma fresta formar-se bem ao lado da árvore. Para ela, parecia que alguém ou alguma coisa havia rasgado o espaço-tempo local para, dentro dessa fresta que se alargava, surgir outro continuum onde aparecia uma praça cercada por cachoeiras e edifícios de cristal. Antes mesmo de se atinar que via a cidade do Igor, o amigo de dois olhos apareceu ao lado de mais três companheiros, passando pela fenda e fechando a passagem com um gesto displicente, como se tivesse dispensado alguém atrás dele.

Eufórica, ela correu para a saída de forma a se encontrar com o mago, que parecia não ter mudado nada.

Aproximou-se e disse, em celta:

– Olá, Igor, que bom vê-lo de novo após tantos séculos. Então conseguiu retornar para o seu tempo?

– Olá, Mia. – Igor sorriu, inclinando-se um pouco. – Como eu prometi, voltei para te visitar, agora no meu tempo. Esta é Eduarda, minha noiva, Caroline, uma Guardiã dos Portais e Hernandez, seu colega e companheiro.

– Sejam bem-vindos a Axt – afirmou a "mulher" fazendo uma vênia similar ao mago. – Que bom que vieram, Igor. Vamos para dentro. Já avisei Mog e ele está a caminho.

– E como vai a situação por aqui? – perguntou Igor, já na sala da convidados e sentando-se com os companheiros. – Vejo o seu rosto bem mais tranquilo e claro que sei sobre o vosso casamento. Parabéns.

– Como pode saber? – perguntou, muito espantada. – Isso mês passado!

Igor riu e contou a breve passagem que fez, mas que para eles ainda faltariam sete mil anos para acontecer, e voltou a perguntar como estavam as coisas.

– A sua visita, há quase dois mil ciclos, mudou muita coisa. O governo tornou-se tolerante e brando, onde Mog ganhou mais força e apoio, sendo hoje o líder principal do conclave. Apesar disso, nunca mais recebemos visitantes.

Mog apareceu nesse momento e cumprimentou-os, também satisfeito com a visita.

– Salve, Magnífico – disse ele, teatral. – Sejam todos muito bem-vindos.

– Por favor, apenas Igor está bom. Não precisa de me chamar pelo título.

– Claro, Igor – sorriu, um gesto muito parecido com o equivalente humano. – O que vos traz aqui?

– Vários detalhes, de fato – respondeu Igor, tranquilo. – O primeiro é que eu gostaria de manter relações diplomáticas com o vosso mundo. Vocês são a primeira civilização que encontramos que possui um elevado grau de maturidade, sem falar que têm a tecnologia que permite viajar entre os planos e planetas, coisa que nunca encontramos em todas estas eras.

– Acredito que isso pode ser bastante vantajoso para ambas as partes – concordou Mog. – E acho que o governo vai aceitar com prazer porque muitas coisas mudaram por aqui.

– Fico feliz com isso – comentou o mago. – A segunda coisa é que gostaria de convidar vocês para as festividades do meu casamento, lá na Cidadela. Vai coincidir com uma festa muito antiga, já perdida pela humanidade do nosso mundo de origem, mas ainda celebrada entre nós, apesar de ser de forma um tanto diferente por ter perdido grande parte da conotação religiosa.

– Aceitamos o convite com prazer – disseram Mia e Mog ao mesmo tempo.

– Bem, quanto ao terceiro e último tópico, é algo bastante delicado, mas de suma importância.

– Agora, deixou-me curiosa, Igor – disse Mia, rindo. – Somos todos ouvidos.

– Eu derrotei e destruí a criatura, conseguindo salvar todos os nossos amigos, só que isso quase custou a minha vida. Em outras palavras, ela não é indestrutível.

– Essa é uma notícia maravilhosa, Igor – disse Mog. – Apenas não entendo onde nos encaixamos nisso.

– Lembra-se que manifestei o desejo de salvar o povo que está no vosso mundo de origem e Mia até me deu uma chave para controlar o computador e as instalações?

– É verdade – respondeu Mog. – Agora que disse, lembro-me. Então, creio que deseja levar adiante o seu plano.

– Exato – respondeu, sorrindo. – Eu tenho que libertar aquela gente. Bem sei que vocês mudaram muito, mas eles têm o direito de seguir os seus caminhos e continuarem de onde foram interrompidos de forma tão brutal. Precisam de levar adiante a sua evolução.

– Pelo que sinto, o senhor precisa de algum tipo de ajuda para os libertar – disse Mia, perspicaz.

– Com toda a certeza, Mia. – Igor preferiu ser o mais sincero possível. – Eu tenho alguma proteção natural que impede a criatura de me assimilar e posso matá-la em um duelo, mas teria de absorver as essências para as devolver aos corpos. Se cinquenta mil quase me mataram, sete bilhões estaria fora de questão. Eu precisaria da vossa ajuda para gerar um campo de força de forma a conduzir a criatura até aos corpos. Lá, eu destruo o monstro e eles ficam livres.

– Que tipo de campo de força? – perguntou Mia, focada no problema, uma vez que ela era a cientista.

– Um similar ao que têm aprisionando a criatura, mas que possa ser movimentado, ou seja, portátil.

– Vou debater com alguns colegas especializados em campos de força e comunicarei os resultados em breve.

– E eu falarei com o governo para prepararmos um plano de emigração em massa e ajuda para os nossos irmãos – disse o marido, convicto. – Isso é o mais certo a ser feito, Igor.

– Eu agradeço muito – disse Igor. Conversaram mais um pouco até que combinaram a data da volta para os pegar e levar ao Mundo de Cristal. Quando se despedira, Mia disse:

– Igor, posso fazer um pedido?

– Claro – respondeu o mago, cortês. – Em que posso ser útil?

– Eu gostaria de ver como se abre uma passagem.

– Sem problemas – respondeu ele. – Abriremos o portal na praça, mas, quando vierem ao meu casamento, vocês mesmos terão a oportunidade de passar por ele.

Na praça, Igor virou-se para Carline e disse:

– Faz as honras, Carol. – A feiticeira inglesa satisfez a curiosidade da cientista e retornaram à Cidadela.

― ☼ ―

O portal surgiu na praça central, como eram as regras tirando, pequenas exceções, e Eduarda atravessou com a amiga e madrinha do casamento, que só soube dizer:

– Bah, tchê, mas que coisa mais linda essa cidade!

– Lembra-te que é segredo, ok? – Eduarda piscou o olho.

O casamento foi simples e bonito, cheio de gente a prestigiá-los. Tanto Eduarda quanto o marido eram uma montanha de felicidade e, depois da festa, começaram as festividades de Beltane, que não eram mais como as da antiguidade, embora muitos optassem por isso nos bosques perto da cidade.

Dois dias depois, Igor devolveu os amigos à Terra e conversou muito com Mia, Mog e os demais governantes de Axt.

Com a máquina alienígena montada e cem dragões a auxiliar, partiram para libertar o povo aprisionado pela criatura. Após muitos milhares de anos, centenas de espaçonaves orbitavam aquele mundo, esperando para levar os sobreviventes para o novo planeta que já fora preparado para eles.

Igor proibiu a esposa de ir, porque concebera o seu tão desejado filho nos ritos de Beltane.

― FIM ―

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