Não Vá
Na cozinha, puxei a cadeira e me sentei junto de Mariane. Mamãe que terminava de arrumar a mesa para o almoço, também logo se acomodou em uma das cadeiras de frente para nós.
Depois de alguns minutos comendo em silêncio, Pedro entra na cozinha, ainda com os cabelos molhados como quem tinha acabado de sair do banho, falando em voz alta:
_ Estava precisando mesmo de um bom banho.
Disse ele.
Sentou na cabeceira da mesa onde era o lugar onde meu pai sempre sentava.
Aquilo meio que me incomodou, porque ninguém sentava mais ali desde que meu pai tinha morrido. Era como se estivesse invadindo um espaço que não lhe pertencia. Um lugar sagrado.
Olhei com reprovação para meu tio Pedro e mamãe percebendo o quanto eu não estava gostando daquilo, logo tratou de harmonizar o ambiente.
_ Prove um pouco da salada, meu irmão.
Disse mamãe, servindo os legumes no prato dele.
_Obrigado. Estou mesmo morrendo de fome.
Silêncio outra vez e só se ouvia o som dos talheres.
Depois de um bom tempo, Pedro me olhou, como se somente naquele momento tivesse se dado conta de que eu existia.
_ Então, esse é o famoso Alexandre_ disse, bebendo seu suco e falando direto pra mim _ Achei que nunca teria a chance de um dia conhecer o filho de Humberto e olha só agora, estou bem aqui diante dele. A última vez que te vi, garoto, você ainda era um bebê de colo.
Só eu que senti um tom meio sarcástico quando ele falou em meu pai?
Mesmo com esse pensamento, continuei calado, Afinal estava aborrecido com essa história de querer levar Mariane embora.
_ Ele é um menino muito bom pra mim. Eu não poderia ter tido sorte melhor na vida.
Minha mãe falava como se tentasse se explicar ou como se tentasse mostrar que eu não era um peso pra ela.
_Que bom! Rosa, Que bom!Porquê como você deve saber, Sorte é algo relativamente raro, tratando-se de pessoas hoje em dia..._ Disse irônico_ Você não concorda comigo, garoto?_ perguntou pra mim e mexi a cabeça como se dissesse um "tanto faz"
Conheço mamãe e ela parecia não estar muito à vontade com o rumo que aquela conversa estava tomando e ofereceu mais salada a ele.
Mariane durante todo aquele tempo não tinha tocado muito em sua comida.
Sempre de cabeça baixa apenas brincava com sua refeição, girando tiras de macarrão em seu garfo.
_ Filha, você não vai comer? Mal tocou na comida! É melhor se alimentar direito pra ter forças pra encarar a estrada.
Disse Pedro, vendo o seu desanimo em relação ao almoço.
_ Estou sem fome.
Respondeu ela, friamente ainda de cabeça baixa.
_Querida, tome pelo menos um pouco de suco...
Disse minha mãe.
_ Eu não estou com fome. já disse!
Meio impaciente.
_ Mas o que isso, Mariane? Cadê a educação que eu dei a você?_ Pedro jogou o garfo e a faca dentro do seu prato, fazendo um pequeno barulho._ Responda direito a sua tia!
_ Eu só disse que não estou com fome... _Olhando firme para ele _ Não podem me obrigar a querer comer também.
_Mas Do quê mais estamos lhe obrigando? Que história é essa?
_ O senhor estar praticamente me obrigando a abandonar tudo aqui.
Pedro juntou as mãos sobre a mesa e tentou explicar resignadamente.
_ Se você estar assim por causa da escola, essa é uma questão fácil de se resolver, minha querida. É só pedir a transferência para uma escola da nossa cidade... Simples! E quanto aos amigos que você fez por aqui, eles podem ir te visitar sempre que puderem, não há problema nenhum _suspirou _ Porque isso agora? Sua vida não é aqui! nunca foi.
_Mas agora eu tenho uma vida aqui, pai... Uma vida que eu quero muito continuar_
Mariane dizia com toda firmeza que existia dentro dela.
_ Continuar ? Mas continuar o que?_ seu pai perguntou_ Lembre-se, você mora nessa casa de favor. Você veio pra cá sabendo que seria só por um ano, até que eu terminasse o trabalho... Agora que estou voltando pra casa, não há mais necessidade de ocupar a casa de sua tia.
_ Eu não quero voltar,pai.
_ Mariane, chega! Tá bom? você não é mais criança! Vai voltar comigo e pronto! Fim da história!
_ Não!_ Disse, já de saco cheio. Precisava me manifestar e levantei continuando bastante determinado_ Ela não vai há lugar algum.
Mamãe mostrou- se nervosa, deixando derramar seu copo de água na mesa.
_Como é quê é?_ Pedro pareceu não acreditar.
_ Alexandre, meu filho, não se intrometa, isso é um assunto que deve ser resolvido entre pai e filha_
Dizia Mamãe, tentando apaziguar as coisas.
_ Mas a senhora não está vendo, mãe? Mariane quer ficar e ele estar forçando ela à ir _ Falei como se pedisse apoio.
_Quem você pensa que é Pra falar comigo desse jeito?_ As maçãs do rosto de Pedro tornaram se vermelhas e ele se ergueu_ A filha é minha e você não tem nada a ver em se meter nessa história.
_ Pois fique o senhor sabendo que eu tenho muito a ver com essa história sim!_
Desafiei.
_ Quer saber? Estou indo embora agora mesmo!_ se retirando da mesa_ Não vou ficar aqui aturando desaforo de um moleque qualquer. Venha Mariane, vamos embora!
Pedro fez um gesto com as mãos como chamando Mariane para perto de si mas ela continuou sentada entre nós dois.
_ Eu já falei, ela não vai com o senhor pra lugar nenhum se assim ela não quiser._
Continuei com minha audácia.
_Alexandre? O que você está fazendo?_
Mamãe desesperada.
_Ele não pode leva-la a força, mãe.
_ Mas meu filho, Pedro é o pai dela!E nós não temos nada a ver com isso. Eles que precisam resolver. Sozinhos.
A mãe, coitada, ainda tentava.
_ Claro que tenho!
Cheio de razão.
_ Você tá se achando algum dono dela? É isso? _ Pedro perguntou, olhando cheio de ira para mim.
_ Ele não tá achando nada, pai_ Mariane respondeu por mim antes que eu falasse alguma coisa... levantou calma e serena e continuou _ Mas como vamos nos casar, o senhor não pode agir dessa forma.
Ficaram todos de olhos arregalados em Mariane, inclusive eu, que achei que ela não aceitaria meu pedido de casamento.
Minha mãe exclamou um "Meu Deus" e cobriu o rosto com as mãos em tormento.
Pedro parecia que há qualquer minuto iria sofrer um infarto ou algo do tipo, porque simplesmente ele parou de respirar e só depois de alguns segundos conseguiu pronunciar alguma palavra.
Ele surtou.
_ O que você está dizendo, Mariane? Mas Que palhaçada é essa?_
Totalmente atordoado.
_ Não há palhaçada nenhuma_ respondeu_ Apenas estou comunicando que Alexandre e eu vamos nos casar.
Dei um sorriso satisfeito, por vê-la tão decidida e tão sólida em suas palavras.
_Você está louca?_ Pedro perplexo_ Você ao menos tem ideia quê está falando, menina?...
_ A gente se ama, pai... E queremos muito ficar juntos... Não vejo nenhum absurdo nisso.
_ Eu amo a sua filha, senhor Pedro... E não vou abrir mão disso. A gente vai se casar, mesmo que vocês dois não aceitem_
Completei, olhando diretamente para ela.
Toda a fúria que existia na terra, tenho certeza que se apossou do corpo de Pedro.
_Sabe quando isso vai acontecer? Nunca! Porque nem morto eu permitiria uma aberração como essa!_
Disse Pedro, com olhos chamuscados.
_ Aberração? _Eu disse sem compreender o que ele queria dizer_Mas que aberração?
Minha mãe se levantou tentando conversar comigo ou tentando não aprofundar muito nesse assunto.
_ Você já parou pra pensar no que está falando? Você só tem dezessete anos!... Nem emprego você tem, meu filho...
_ Eu posso arranjar um emprego, mãe, e outra, que eu saiba, idade não determina maturidade de ninguém... E se todo esse drama é porque somos primos... Não existe nenhuma lei que impeça isso.
Falei destemido, e pelo o que senti, Mariane gostou do que eu disse, pois ela sorriu pra mim. Ele é quem não gostou muito, pois seu olhar ainda soltava chamas de indignação em minha direção.
_ Mariane, pegue suas coisas e venha comigo. Agora!_
Dava a ordem para a filha mas não tirava os olhos de mim.
_Pai, por favor, _ pediu Mariane_ Será que o senhor ainda não entendeu? Isso não é uma brincadeira. Estamos falando sério!
_Cala essa boca! garota! _ Pedro gritou furioso, sendo totalmente grosseiro com a filha _ Você não sabe de nada! Não vai ficar aqui mais mais nenhum segundo! E tão pouco se casar com quer que seja! A única coisa que você realmente vai fazer, é vir embora comigo!
Saiu, puxando Mariane pelo o braço com uma certa violência.
Fiquei inteiramente cego e louco com o modo que ele falou com Mariane e muito mais com o jeito que a agarrou.
Saí de mim.
Ele saiu arrastando Mariane até a sala enquanto ela se debatia.
Apressadamente o segui e puxei ela de volta para mim.
_Solta ela!
Gritei.
Eu juro que não senti o punho forte de Pedro no meu rosto.
Quando dei por mim já estava no chão com minha mãe chorando e me amparando.
_Pai! _ gritou Mariane_ Meu Deus! Não!_ Mariane chorava com as mãos na face sem acreditar no ato dele.
_Meu filho! _ mamãe, desesperada, me segurando, de joelhos no chão.
Pedro por um instante, confuso, como se tivesse caído a ficha da bobagem que tinha acabado de fazer _ E-Eu não sei o que deu em mim... Eu... Eu não quis fazer isso...
Olhou pra filha com angústia e ela lhe respondeu com um olhar frio.
Mariane chorando correu até as escadas, dirigindo- se para seu quarto.
_ Mariane, filha, me perdoe..
Disse Pedro, enquanto a via subindo as escada se desmanchando em lágrimas.
Arrependido tentou me ajudar a se levantar
_Você está bem?
Não conseguia responder. Eu estava ainda meio zonzo.
_ Ele vai ficar bem... Pode deixar... Eu cuido do meu filho... _ Mamãe tentando se livrar do homem_ Vá para o seu quarto, meu irmão, me deixe sozinha com ele.
Ele baixou a cabeça envergonhado e saiu.
Depois disso, fiquei com minha mãe no chão, em seus braços, limpando o sangue que escorria do canto da minha boca.
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~AngellMoura~
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