|Capítulo 43 - Fantasia|

Dois dias para a prova final – 14:35

     A princesa caminhava de um lado para o outro, era uma corrida contra o tempo. Ela não sabia o que iria acontecer, quando e de que maneira. Laerte conseguira uma conversa muito rasa com John acerca de relacionamentos. Aquilo lhe colocava em uma situação desconfortável. Era muito pouco tempo para tentar salvar a vida de alguém.

     — Tem certeza que ele não disse nada? Não deu nenhum sinal?

     Laerte balançou a cabeça para os lados, em negação. Ficara mais de três horas fomentando uma conversa que, no fim, não o levara a lugar algum.

     — Pensa, Aveta. Pensa, pensa — ela repetia enquanto olhava para o teto, com as mãos na cabeça.

     Sua mente trabalhava incansavelmente à procura de uma brecha, uma regra quebrada que fosse útil. Mas não, John e Kaya eram “perfeitos” demais para algo que contrariasse o regulamento imposto.

     — É isso. — Ela estalou os dedos.

     Em seguida, a princesa correu até sua cômoda. Suas mãos pareciam nervosas, estavam trêmulas, mesmo que já soubessem exatamente para onde ir. O príncipe apenas observou a figura curvilínea, moldada por um tecido azul escuro muito bem alinhado, virar-se apressada.

     — O que vai fazer? — perguntou ele.

     Ela não respondeu, apenas afastou a mecha castanha que lhe caía sobre a face e a prendeu atrás da orelha. Ajoelhou-se ao lado da cama e jogou o pequeno celular sobre ela. O abriu, arrancou o microchip criado por Tyliard para não ser rastreado, deixando a bateria do objeto, que parecia obsoleto, jogada sobre o colchão. Depois juntou todas as peças e as encaixou novamente, deixando apenas o chip em cima do lençol.

     — Aveta? — ele a chamou, retirando-a daquele estado psicótico.

     — Eu já sei o que fazer, Laerte — disse ela. — Preciso da sua ajuda.


15:07


     O rapaz de postura invejável observava um livro na prateleira, parecia concentrado em encontrar algo. Estava retirando um exemplar de “O elo da magia” de uma das prateleiras quando, pelo vão que havia entre os livros, viu a imagem da princesa misteriosa. Estava com uma cópia, do mesmo livro, nas mãos.

     — Procurando algo para distrair a cabeça também, princesa?

     — Oh, John. Gosta de fantasia também? — ela perguntou enquanto dava a volta e ficava de frente para ele, no mesmo corredor.

     — Não é meu gênero literário favorito, mas quero testar algo novo — ele disse. — Você já leu? — Apontou para o livro em posse de Aveta.

     — Claro. A remessa daquele continente sempre vem abarrotada de criatividade. — Ela sorriu. — Esse aqui em particular — Ergueu a obra, deixando à mostra os traços em azul que deixava a imagem da moça estampada na capa ainda mais em evidência —, fala sobre amizade, confiança. Nos apresenta um mundo novo, todo cheio de particularidades.

     — Olha, me convenceu. — Ele olhou para a réplica que estava em suas mãos. — Acho que preciso experimentar essas sensações. — Deu uma piscadela.

     A princesa olhou para a saída do local, onde viu surgir o seu companheiro. Ele não fez barulho algum, apenas acenou com a cabeça e tomou direção de outro canto da biblioteca.

     — Eu acho que aquele livro ali... — Aveta esticou-se para alcançar uma das obras que estava na prateleira de cima.

     Nesse instante, levou o pé direito à frente do esquerdo, rodopiou sobre a ponta dos dedos e lançou o próprio corpo sobre o de John, que estendeu os braços para ampará-la.

     — Nossa... Eu... Me perdoe — disse ela.

     — Você está bem? — ele perguntou, enquanto ainda a apoiava, com medo de que ela estivesse tonta ou algo do gênero.

     — Sim. — Aveta sacudiu a cabeça e desceu as mãos vagarosamente pelo braço do príncipe. Estou. — Olhou para a porta novamente e notou que a maçaneta girava naquele exato instante. — Com licença, eu preciso ir. — Ela prestou reverência em meio segundo e deu passos em direção à saída, segurando a barra do vestido com uma das mãos.

     Laerte continuou dentro da sala, folheando um livro de mapas ao mesmo tempo em que, discretamente, observava a tudo de soslaio.

     Dois auxiliares de Homero entravam no minuto em que a princesa misteriosa se retirou. John ainda não os havia visto, por estar de costas. Ele sorriu observando a capa do exemplar em suas mãos e sentiu alguém tocar-lhe os ombros.

     — Príncipe John.

     — Algum problema? — ele perguntou.

     — Recebemos uma denúncia — disse um deles, em tom cordial. — Fomos informados de que havia um aparelho eletrônico sob seu domínio.

     John abriu um sorriso, ele tinha certeza de que fora um engano.

     — Me perdoem, mas isso não procede — ele disse. — Como vê, eu estou aqui procurando um livro. — Balançou o objeto, suspenso no ar.

     — Será que pode nos mostrar o interior do paletó, por favor, alteza? — pediu o segundo homem.

     — Mas é claro. Podem comprovar. — Ele desabotoou a vestimenta e afastou as duas metades, deixando a camisa e a gravata à mostra. — Viram, não há nada — falou, olhando para baixo, deixando visíveis os bolsos internos.

     — O que é aquilo ali? — indagou o primeiro.

     — O-o quê? — John gaguejou, o auxiliar parecia convicto.

     — Isso. — O segundo homem puxou o lado direito do paletó do príncipe, fazendo com que o bolso externo desenhasse a imagem perfeita do objeto que ali estava.

     O primeiro auxiliar puxou o aparelho de dentro do paletó e o posicionou sobre o próprio rosto.

     — Eu não sei o que é isto. — John balançou a cabeça freneticamente.

     — Queira nos acompanhar — pediu o segundo auxiliar.

     — Não, não. É um engano, eu... Aveta — ele sussurrou para si mesmo. — Vocês precisam me ouvir, foi ela! Ela pôs isso aqui e...

     — O senhor tem alguma prova? — o primeiro auxiliar perguntou.

     — E-eu não, mas...

     — Por favor, nos acompanhe.

     Os dois homens seguraram ambos os braços do príncipe, que encontrava-se em pleno desespero. Estava tão perto da final, aquilo não poderia estar acontecendo àquela altura do jogo.

     Eles o carregaram para o lado externo e depois o príncipe foi encaminhado para o corredor lateral, para prestar esclarecimentos. Aveta, que estava à espreita atrás de uma das pilastras, observou a cena completa desde o momento em que deixaram a biblioteca. Depois deles, Laerte também saiu olhando para os lados. Quando encontrou a princesa, ele caminhou até ela e também deixou o corpo longe da vista de qualquer um que passasse pro ali.

     — Acha que deu certo?

     — Creio e espero. — Ela olhou para o fim do corredor, depois voltou a olhar para Laerte. — Homero precisava apenas de uma desculpa para mandá-los embora. Isso é melhor que morrer — ponderou.

     — Tem razão — Laerte admitiu.

     — Venha, vamos subir.

Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top