|Capítulo 4 - A Positivo|

     Depois de todas as escolhas feitas, Homero ordenou que limpassem o salão e que Catarin fosse se trocar antes das argumentações. Os três príncipes que não foram escolhidos, ao contrário do que fora pensado, não foram mandados embora. Os auxiliares os levaram para uma das dependências do Castelo das Pedras que não tinha contato direto com o local onde ficariam os demais concorrentes.

     De pé, um ao lado do outro, Aveta e Laerte espreitavam o salão tentando compreender o acontecido, mas ela parecia desconfiada. Suas linhas de expressão marcadas enquanto semicerrava os olhos na direção de Jullian demonstravam o quanto aquilo lhe parecia estranho.

     — Alguma coisa não bate — disse ela.

     — O que disse?

     — A briga, o casal, Homero. Alguma coisa está errada — comentou sem parar de fitar o príncipe Jullian.

     — O que pressupõe?

     — Repare. — Ela continuava a olhar para o rapaz sem juntar as pálpebras pelo menos por quinze segundos. — Jullian parece comovido?

     — Pode estar em choque, talvez.

     — Não, Laerte. Olhe bem. Os traços dele não lhe são familiares?

     Laerte entreviu todos os que estavam ali presentes e seus olhos pairaram no homem que até então só lhe despertada uma curiosidade: a frieza diante das situações.

     — Homero — disse ele.

     — Essa foi a primeira prova, Laerte. — Ela olhou para o príncipe ao seu lado. — Não as escolhas, as reações.

     — Acha que a princesa Giulia não morreu?

     — É claro que ela morreu. Ela era a única que não sabia do plano, pobre coitada. Jullian tem algum parentesco com Homero, isso é claro. Só não sei ainda quanto mais a Catarin sabe sobre a disputa e sobre as próximas provas.

     — Ela pode ser um peão — retorquiu Laerte.

     — Ou um bispo. — Aveta ergueu as sobrancelhas.

     — Acha que ela se colocaria em risco por causa de um plano medíocre que a deixaria com fama de maluca?

     — Não só pelo plano. Ela acredita que Jullian é o escolhido por ser parente de Homero, talvez filho ou sobrinho... Não tenho certeza. Mas o que interessa é que ela acredita que ao lado dele vai ser garantida no trono. O que não é verdade. Homero não é quem manda nas decisões. Ele faz as provas, e quem decide são...

     — Os criados.

     — Como? — Ela parecia curiosa com a fala do príncipe.

     — Os criados, Aveta. Não são criados, são os jurados. A corte não é a corte, são atores. Percebi no momento em que entrei no salão. — Laerte estava convicto.

     — E como chegou a essa conclusão?

     — Os membros da corte não esboçaram reação alguma durante a briga, mas um dos criados, a moça da bandeja, para ser exato — Apontou para onde a tal estava, perto da mesa com algumas frutas —, bem me pareceu anotar algo em uma espécie de bloco. A pergunta que eu estava fazendo a mim mesmo era: para que ela anotaria as coisas que aconteceram durante a briga? Agora, juntando as peças que eu tenho com as suas suposições, tudo faz sentido — completou.

     — ATENÇÃO DE TODOS, POR FAVOR! — chamou Homero.

     — Ei, qual o seu tipo sanguíneo? — perguntou Aveta em tom baixo.

     — A positivo, mas por quê?

     — Só uma coisa que precisava saber.

     — Vamos começar as argumentações. Por favor, façam uma fila de casais — ordenou o anfitrião.

     — Deixe-me responder, ouviu? — a princesa misteriosa disse, e Laerte acatou, estava curioso.

     Os primeiros chamados foram Kaya e John, depois deles o segundo casal formado e assim por diante. Todos usaram questões emocionais para argumentar as suas escolhas, que fosse pela “rainha que enxerguei nela”, ou “pelo sorriso que me arrebatou de imediato”, todos seguiram pela mesma linha completamente inútil, superficial e previsível.

     — Princesa Aveta e Príncipe Laerte. Digam o motivo da escolha de vocês.

     Eles se entreolharam.

     — Puramente estratégica — disse ela sem nem mesmo vacilar. Homero assustou-se, mas gesticulou para que ela continuasse. — Conversamos um pouco antes da escolha, nossos tipos sanguíneos são compatíveis. Óbvio que se nos tornarmos rei e rainha de Salazar teremos de deixar descendentes para que ocupem o trono e para que não precisemos mais recorrer ao recurso da disputa. Necessitamos de gestações tranquilas, de fetos saudáveis e crianças predispostas geneticamente à força e saúde. Não nos conhecemos, não poderíamos arriscar o trono por causa de uma falsa sensação de conforto ou um possível amor à primeira vista, que, na verdade, nada mais é que a presença de níveis altos de feniletilamina, dopamina e norepinefrina no organismo.

     Laerte sorriu olhando para baixo.

     — Muito bem. — O anfitrião estava surpreso. — Podem se direcionar aos aposentos de vocês. Um dos auxiliares irá levá-los até lá.

     Laerte estendeu o braço para que Aveta se encaixasse no apoio e assim ela o fez. Atrás de um dos homens que ajudavam Homero, seguiram até o corredor onde ficava o quarto dos dois. A decoração daquela parte do castelo era mais simples, as paredes eram brancas e as portas, pretas. Não havia arabescos.

     — Queiram entrar, altezas.

     — Obrigada — disse a princesa antes de colocar o primeiro pé dentro do cômodo.

     Ela viu suas malas no canto, junto um par de pantufas e um vidro de perfume, eram mimos do reino. Assim como os que estavam junto da mala de Laerte.

     Aveta retirou os sapatos, ainda de pé, depois soltou um riso contido.

     — Olha, mataram os sonhos de clichê das emocionadas — comentou enquanto sentava-se à cama e arrancava os brincos.

     — Clichê? — Ele questionou enquanto puxava sua mala para cima do edredom e a abria.

     — É, de ter uma cama só e elas precisarem dormir junto com os príncipes. Aliás, esse castelo me surpreende cada vez mais.

     — Em que sentido, princesa?

     — Imaginei umas tochas nas paredes, uns castiçais com velas. Olha só essa janela, o vidro é blindado. Estou extremamente decepcionada — brincou olhando para a decoração moderna do local, que destoava do resto do palácio.

     Laerte riu do que ela dizia enquanto puxava a roupa e a jogava sobre o monte de peças espalhadas sobre a cama.

     — Vai ficar nu? — ela perguntou.

     — Se incomoda? E aquela história de gestação? — caçoou o príncipe e ela revirou os olhos. — Para a sua tristeza e possivelmente uma noite sem dormir, não, princesa Aveta. Vou apenas tirar a camisa e pôr outra. Preciso rever algumas coisas antes de ir tomar um banho.

     Ela puxou também as suas coisas para cima do colchão, estava pronta para abrir as malas e retirar delas seus pertences, mas foi interrompida por batidas fortes e ininterruptas na porta, seguidas de um pedido ensandecido de socorro. Era uma voz feminina. Laerte olhou para Aveta e os dois ponderaram entre sair ou ficar. Poderia ser mais um teste e eles não sabiam exatamente qual reação era a esperada pela corte. Depois de olharem algumas vezes para a porta e um para o outro, decidiram ver o que estava acontecendo.

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