|Capítulo 28 - Quando O Arrependimento Bate À Porta|
Os passos apressados da princesa não foram suficientes para que alcançasse Laerte no meio do caminho. Então ela seguiu até o quarto dos dois e encontrou a porta ainda aberta. O companheiro estava sentado na própria cama, com uma das mãos sobre a boca enquanto a outra era utilizada para segurar o envelope preto de bordas douradas, que encontrara jogado no chão assim que chegou.
— Laerte, eu... Isso é um aviso? — ela inquiriu.
— Não. É uma carta — respondeu ele, olhando o nome escrito atrás do envelope —, pra mim.
Ela sentiu o peito apertar e hesitou em seus passos de aproximação. Mas o fez.
Laerte leu o conteúdo do papel em silêncio. Sua feição era indecifrável.
— Posso ver? — ela perguntou.
O príncipe estendeu a carta a ela e se levantou.
— Vou tomar um banho e descer para almoçar — ele disse, enquanto ela encarava o papel.
— Eu queria falar com você. Será que pode me esperar para irmos juntos?
— Não dá — ele respondeu. — Preciso resolver uma coisa. — Pegou a troca de roupas que estava estendida sobre a cama e foi até o banheiro, batendo a porta com força.
A princesa sentou-se onde antes ele estava e começou a ler, palavra por palavra, sem pressa para não equivocar-se na interpretação.
Prezado, a corte, em sua plena consciência de poder momentâneo, escolheu alguns dos participantes para participar ativamente do evento de flexibilidade, que realizar-se-á ao pôr do sol do dia de amanhã. A proposta é que alguns de vocês tenham a oportunidade de trocar os pares. Todavia, essa escolha trará consequências aos que forem substituídos, sendo eles desligados do programa real para a escolha dos futuros governantes.
Cláusulas para a troca
1 – Só pode ser realizada a troca consentida, ou seja, a pessoa que irá substituir o seu par, caso queira, só poderá ser alguém que aceite a substituição.
2 – O par do(a) escolhido(a) para a substituição terá a oportunidade de escolher ficar, se aceitar associar-se a(o) substituído(a) do par oponente, salvando-o(a) do desligamento permanente, mas as chances de irem para final serão reduzidas drasticamente.
3 – Será a única oportunidade de rever o jogo, portanto, essa escolha deve ser muito bem orquestrada.
4 – Os escolhidos da corte que, porventura, escolherem trocar, estarão automaticamente na final.
Terminamos o presente comunicado destacando que essa é uma tarefa que deve ser pensada antes de executada, pois será de suma importância.
Boa sorte.
Ela não podia acreditar, era uma tremenda injustiça e, apesar de já saber que aquilo aconteceria, achava um disparate que ela pudesse ser expulsa do jogo por uma decisão que nem ao menos era dela. Aquela disputa lhe parecia cada vez mais insana, e pela primeira vez Aveta sentiu medo real de não ter mais tempo ali. Não queria ser aliada de Kayo, e com as chances reduzidas seria ainda mais difícil conseguir o seu objetivo.
Os seus olhos passearam outra vez sobre todas as palavras, ela procurava uma brecha que a pudesse salvar de ter todos os planos encerrados.
Laerte saiu do banheiro com os cabelos ainda molhados, nem ao menos quis saber o que ela pensara sobre a carta. Penteou as mechas mescladas, ajeitou a gravata borboleta e saiu do quarto. Aveta estava imóvel com o papel em mãos. Permaneceu assim até que um estalo ecoou em sua mente.
A moça correu para o chuveiro, tinha que descer para o almoço, precisava agir, precisava encontrar uma saída. Não conseguiria contornar a situação trancafiada naquele cômodo. Ela vestiu-se rapidamente, ainda com gotas de água escorrendo por sua pele amendoada. Aveta não secou os cabelos, apenas passou o pente nas partes mais embaraçadas e calçou um salto baixo. Nem reparou que o vestido que pegou, por ser o primeiro da gaveta, era um tanto simples. Um dos modelos que havia levado para usar sozinha, dentro do quarto, e não para se apresentar aos demais. O tecido branco e leve mais lembrava um pijama, e deixava seu corpo demasiadamente à mostra.
— Droga — sussurrou ao olhar para o próprio corpo. — Dane-se — comentou e bateu a porta do quarto, com pressa.
Aveta passou pelos corredores e desceu as escadas rumo ao refeitório. Todos já estavam lá, sentados, o que rendeu um momento de constrangimento quando apareceu com as bochechas ruborizadas pela corrida e o peito subindo e descendo freneticamente.
Ela observou pelos cantos, procurando a figura de Laerte, até que o encontrou sentado sozinho na mesa onde costumavam ficar. O clima naquele lugar não estava nada agradável, o comentário principal era aquele que mais a angustiava: a carta. Era possível ouvir o que era dito em meio ao burburinho, Kaya fora uma das selecionadas para a troca. Assim como Felícia, par de Henry, Germano, par de Manuela, e claro, Laerte.
Ela caminhou entre as mesas e chegou ao seu destino. O príncipe saboreava uma taça de vinho, calado.
— Posso me sentar?
— Não mando em você, princesa — respondeu ríspido.
Não era bom estar do outro lado.
Ela colocou-se em sua frente e respirou fundo.
— Laerte. Eu queria me desculpar pela minha imprudência — começou. — Eu estava nervosa e incomodada pela sua proximidade com Romana.
— Foi assim que eu consegui a sequência certa, princesa Aveta.
— Eu não... eu pensei, depois que Alessa se foi, que Romana não teria mais nenhuma informação útil.
— Ela não. Mas Jullian disse a Kayo o que fazer, e por consequência Romana sabia. Mas você não confiou em mim. Todo aquele discurso de “tudo pelo jogo”, mas quando a atenção não foi inteira pra você, se irritou e quase pôs tudo a perder. Eu não estou pronto para lidar com pessoas egoístas, egocêntricas e cheias de si mesmas. Éramos uma parceria, Aveta.
— É-éramos? — ela questionou, com a voz entrecortada.
Ele desviou o olhar e assentiu.
O almoço foi servido, Laerte e Aveta permaneceram em silêncio absoluto durante todo o tempo. A carne descia cortando a garganta da princesa, e para Laerte não era diferente. Tomar a decisão final lhe sobrecarregava demais. Mas ele já estava decidido e não voltaria atrás.
Assim que terminaram a refeição, Laerte avisou que iria até o jardim, mas que não queria ser acompanhado. Aveta não quis parecer fraca, então pôs um sorriso no rosto, que escondia todo o seu medo e angústia, e retirou-se para o quarto, onde permaneceu sozinha durante toda a tarde, novamente.
O príncipe retornou já na hora do jantar, que ela outra vez preferiu não saborear, e também decidiu não ir. Não obstante, enfiou a face no livro e permaneceu assim até a hora de dormir.
Fora a pior noite desde que ela chegara ali. Mesmo em tão pouco tempo, não se via dividindo o quarto com outra pessoa, senão Laerte. Ele a compreendia, entendia e fora capaz de suportar suas crises. Era ousado, determinado e inteligente. Ela o observou enquanto ele dormia, parecia tranquilo. Aveta até tentou fazer o mesmo, mas foi impossível se aprofundar no sono. Infelizmente, sua personalidade difícil lhe custara o seu maior aliado.
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