9. Onde elas pulam do trem

Mel só foi terminar a sua "obra prima" quase duas horas mais tarde, quando Eleanor já havia repetido diversas vezes que não precisava ter caprichado tanto.

Apesar que Ellie parecia deixar bem claro que havia adorado.

As duas haviam achado uma enorme muro, que ficava mais na extremidade da cidade e onde dificilmente o xerife passaria, e escreveram em letras vermelhas e berrantes:

"Coronel Marshall: um dos maiores mentirosos e ladrões da história, responsável por roubar o museu da cidade e mentir para todos ".

Era uma frase curta em comparação a tudo o que as duas queriam dizer, mas serviria.

Só que foi em um dos momentos em que Ellie apressava Melanie e a mesma dizia que estava quase terminando, que um homem as encontrou.

- Ei! Vocês duas, o que estão fazendo?! Isso é crime! Vandalismo!

- Merda!- exclama Melanie, imediatamente parando de pintar.

- Senhor, espere, tente entender...- começa a falar Eleanor.

- Irei relatar ao xerife!

Foi nesse momento em que Mel sentiu a mão de Ellie na sua, antes que ela sussurrasse em seu ouvido.

- Acho melhor corrermos.

. . .

Melanie Watson nunca foi uma dama disposta, digamos assim. Na infância, quando lhe davam a opção de permanecer pintando o dia inteiro ou de correr nos campos da vasta propriedade de seu pai, ela escolhia ficar no seu quarto pintando.

Talvez por isso, enquanto corria por sua vida ao lado de uma das mulheres mais incríveis que ela já conheceu, Melanie tenha se cansado com tanta facilidade.

Então, quando as duas já estavam alcançando a estação de trem, ela parou sem fôlego, apoiando as mãos nos joelhos para respirar.

- Vamos, Mel, o trem já vai partir, você consegue!

- Eu... não... consigo...

- Consegue sim! E eu bem que disse que deveria vir de calças! Esse maldito vestido só está atrapalhando.

- E o que quer que eu faça? Tire-o e fique usando as minhas roupas de baixo na frente de todo mundo?

Eleanor engoliu em seco, tentando não pensar na visão de sua prima vestindo nada mais que uma chemise branca e meias longas.

- Tudo bem, mas você precisa se esforçar só mais um pouco, pequena... Estamos quase chegando.

- Pode... ir... sem... mim...

- Essa é a maior bobagem que eu já ouvi você falar, pelo amor de deus- Fala Eleanor aborrecida, e então solta um suspiro- Bem, vejo que não há outro jeito.

- O que...?

Mas antes que ela tivesse sequer a oportunidade de processar o que estava acontecendo, sentiu os braços de Ellie a sua volta, que então a subiram, e logo ela estava sendo carregada.

Seu rosto todo ficou em um tom vivido de vermelho, enquanto ela protestava sem parar.

- Me solte agora, Eleanor Moore! O que você acha que as pessoas vão pensar quando nos ver...

- Para sua informação, também não está sendo exatamente confortável para mim segurá-la.

- Está me chamando de pesada?- perguntou indignada.

Eleanor revirou os olhos. "Por que ela tinha que agir como uma dama sensivel justamente agora?".

- Será que poderia envolver os seus braços em meu pescoço? Só para não ter o risco de você cair- Disse, tentando não demonstrar nervosismo na voz.

Melanie a encara por longos segundos, sem saber o que dizer. Seu coração acelerou ainda mais quando a obedeceu, e encostou quase que por instinto a cabeça em seu pescoço.

As mãos de Eleanor a envolvendo lhe traziam uma sensação absurdamente confortável, mas aquilo era errado de tantas formas...

Para seu alívio, porém, Ellie era forte o bastante para conseguir correr com ela em seus braços, e por isso não precisou se preocupar com os olhares que as pessoas deviam estar lhe lançando, enquanto passavam rapidamente pela multidão da estação e iam até o trem.

- Todos a bordo!- Gritou o maquinista.

As duas só puderam recuperar o fôlego assim que pisaram no trem. Eleanor principalmente, assim que entrega rapidamente a passagem para o maquinista na entrada. O homem viu Mel ser carregada com os olhos arregalados, se perguntando o que diabos estavam fazendo, mas as duas ignoram e vêm ele se distanciar assim que o trem começa a se mover.

- ...Você está bem?- pergunta Melanie por fim, ainda em seus braços- Ellie, nós já chegamos, você pode me soltar.

- Ah, sim, mil perdões...- ela gagueja encabulada, a soltando.

De volta ao chão, Melanie suspira aliviada, e então solta uma risada.

- Eleanor Moore, um dia eu ainda vou morrer por sua causa.

Eleanor sorri em resposta.

- Obrigada, pequena. Por ter me dado coragem de fazer aquilo. Foi arriscado, e poderíamos estar na cadeia a essa altura, mas não me arrependo de nada.

- Eu também não.

E foi no momento em que ambas se olhavam, como se nada mais importasse além daquele momento, que Mel viu, por cima dos ombros de Ellie.

Seu coração disparou, enquanto reconhecia o mesmo homem com um sorriso orgulhoso do museu, correndo em direção ao trem em que elas estavam. Atrás dele, estavam mais um homen, alto e com cara de quem comeu e não gostou.

Ambos tinham uma pistola presa a cintura.

Melanie olhou alarmada para Eleanor.

- Ellie, temos que sair daqui agora!

- O que? Por que?!- perguntou receosa.

Sem responder, Melanie a virou, e Ellie, ao ver o mesmo que ela, paralisou.

- Ellie, acorde! Nós temos que IR.

- Ir para onde?!- perguntou por fim, o pânico presente em cada palavra que pronunciava.

- Qualquer lugar que não seja aqui!

- Merda, merda, merda! Eu não sei! É tudo culpa minha, Melanie, me perdoe...

- Quer calar a boca?!- Melanie exclama, e então envolve o seu rosto com as mãos- Eleanor, não temos tempo para discutir de quem é a culpa. Temos que nos esconder.

Ellie a encara surpresa por longos segundos, até assentir, séria.

- Tem razão- ela olha em volta, e então se foca em um ponto acima do ombro de Mel- Ali, podemos nos esconder em um vagão de cargas.

- Espero que de certo...- comenta relutante, antes de voltarem a correr.

. . .

Elas correram sem fôlego, até perceberem que na verdade o trem não possuía nenhum vagão de cargas.

Eleanor praguejou alto, furiosa.

- Mas que tipo de trem NÃO possui pelo menos UM vagão de carga?!

- Ellie... eles estão vindo!

Eleanor se vira para a direção que Mel apontava, vendo que estava certa. O coronel Marshal e seus homens estavam cada vez mais próximos, atravessando os vagões.

- Merda, merda, merda...

- Vamos nos esconder!- instrui a morena, apontando para os últimos bancos do vagão, que ficavam bem ao lado da porta que não levava para lugar algum além dos trilhos.

Assim que as duas se espremeram entre os bancos forrados, a porta da frente se abriu com agressividade, e elas puderam ouvir as vozes dos Coronel e mais um de seus homens.

- Você procura pelos bancos deste lado, e eu do outro...- instruiu Marshal, com a arma nas mãos- Não podemos deixar aquelas putas escaparem.

Mel nota Eleanor cerrando os punhos e rangendo os dentes, e percebeu que também estava com uma vontade absurda de socar aquele homem, até arrancar todos os seus dentes.

O tempo pareceu transcorrer em câmera lenta, a medida que o capanga do coronel as procurava exatamente na fileira de cadeiras onde estavam escondidas. Melanie olhou para a prima, receosa, perguntando-se se a comida na cadeia seria de fato tão ruim quanto diziam.

Mas antes que o homem pudesse vê-las, Eleanor agiu rapidamente, se levantando e o atacando por trás, agarrando-o pelo pescoço.

O homem esperneou e o coronel virou para as duas. Melanie soltou um grito de protesto, vendo-o erguer a arma, e se jogou em cima dele sem pensar.

Nunca em toda sua vida havia passado por um momento de tanta adrenalina. Ela se sentia como se não tivesse mais controle sobre o seu corpo. Fazia de tudo para machucar o homem alto a sua frente, tentando desviar das tentativas dele de mobilizá-la.

Foi então que, enquanto ouviu Eleanor brigando com o homem atrás de si, ela acumulou todas as suas forças em seu joelho e pela segunda vez na vida, o atingiu no meio das pernas de um homem.

O uivo que o coronel soltou foi quase cômico, mas segundos depois ele a olhou de maneira assassina, fazendo todo o corpo dela se arrepiar de medo. Foi então que ele se jogou em cima dela, com uma risada maníaca.

- Eu irei matá-la, sua vadiazinha sem vergonha! E então farei o mesmo com a desgraçada da sua amiga...- ele então sorri de maneira nojenta, que faz o estômago dela se revirar- Mas irei brincar com vocês primeiro, é claro.

Mel esperneou, em pânico, e então percebeu que ainda segurava algo em suas mãos.

O seu pincel.

Novamente sem sentir que tinha qualquer controle sob seus movimentos, ela juntou todas as suas forças para tirar o braço debaixo daquele homem imundo, e então pegou o pincel no bolso de seu vestido. Sem pensar duas vezes, o atingiu no olho direito com a ponta dura do objeto.

Quando viu o homem gritando de dor, teve a coragem de no último segundo enfiar ainda mais no seu olho, antes dele gritar ainda mais alto e sair de cima dela, contorcendo-se.

Foi então que, ofegante, se virou para Eleanor, a tempo de vê-la tomar a arma da mão do capanga e chutar sua barriga com força o suficiente para fazê-lo se encolher no chão.

Ambos os homens ficaram no chão, gemendo de dor.

Então, quando ambas se olharam, tiveram que lutar contra a vontade de sorrir.

Ellie segurou a mão dela, e então olhou para a porta que levava para os trilhos.

- Nós temos que pular- disse, determinada, vendo que o coronel xingava enquanto pressionava a mão em seu olho ensanguentado.

- Espera, pular?!- Mel a olhou chocada- Você só pode estar louca.

- É só uma questão de tempo para os dois recuperarem seus sentidos, Mel. Não há outra saída. Temos que subir no trem e então pular pela lateral.

- Isso se não morrermos no caminho- choramingou ela.

- Mel, olha para mim- Pediu Ellie, e a morena obedeceu- Eu sei que é difícil, mas por favor... confia em mim.

Melanie a encarou por vários segundos, temerosa. E por fim suspirou, cedendo.

- Está bem.

. . .

Assim que Eleanor conseguiu subir no teto do vagão, seu coração disparou. O movimento da locomotiva era muito mais perceptível quando se estava FORA dela.

Teve que respirar fundo antes de conseguir se equilibrar e se sentir segura o bastante para puxar Melanie. E assim que o fez, a pobre inglesa começou a falar freneticamente.

- Merda, merda, merda. Eu sou nova demais para morrer. Tem TANTAS coisas que eu ainda quero fazer... Eu ainda quero visitar a África, e eu quero ter um pinguim e uma tartaruga de estimação, e também...

E continuo falando sem parar.

- Mel!- exclamou Ellie.

- Eu rezava todos os dias para que eu só morresse com 90 anos, feliz em minha cama. Eu queria me tornar uma pintora famosa e ser reconhecida pelo mundo todo, e eu queria ter beijado muito mais homens, e confesso que mulheres também e... AÍ MEU DEUS EU VOU MORRER VIRGEM.

- MELANIE!- Gritou Eleanor, a interrompendo, apesar de por um segundo ter ficado bem interessada quando a prima disse que tinha interesse em beijar mulheres- Você tem que se acalmar! Se não nunca vai conseguir pular!

A garota a olhou, assustada. Eleanor acariciou seu rosto na tentativa de acalmá-la.

- Vai ficar tudo bem- disse suavemente- Você vai pular primeiro, e eu estarei logo atrás de você.

Ellie viu a prima olhar para baixo, o chão parecendo tão distante, e ainda mais com o movimento incessante do trem.

- Eu não consigo, Ellie. Não sou tão corajosa quanto você- Lamentou-se.

- Tem razão. Você é MUITO mais corajosa do que eu, pequena. Foi VOCÊ quem enfiou um pincel no olho de um dos coronéis mais intimidadores e poderosos da cidade.

Ela sorriu ao ver os olhos verdes dela brilhando, e então ao vê-la estufar o peito com orgulho.

- Ainda não acredito que fiz aquilo.

- Mas fez. E foi incrível.

- Foi mesmo, não foi?- Melanie ri.

Eleanor ri também, e então as duas se olham, sérias.

- Você consegue, pequena.

Ela observou Melanie assentir, e então, relutante, se levantou. Olhou para o chão abaixo, e respirou fundo.

Ela pulou.

E Eleanor foi atrás.

. . .

E então, gostaram? Ksksks espero que sim! E não esqueçam do votinho 🌟

Beijos de canela pra vocês, até a próxima aaa <3

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