10. Onde elas vão a uma tribo

Por mais que fosse algo óbvio de se esperar, Melanie nunca pensou que iria doer TANTO assim.

Quando tentou se mover, ainda deitada, sentiu um fio ardente de dor percorrer todo o corpo, e então ficou imóvel novamente.

Tentou se acalmar. Sentia como se tivesse sido esmagada por um elefante. Como se cada osso do seu corpo tivesse se quebrado em milhares de pedaços.

O seu pânico só foi diminuir quando, minutos depois, ela ouviu uma voz familiar gritando seu nome.

E então, quando Eleanor a avistou ainda no chão, correu até ela. Melanie fez uma careta, perguntando-se como é que ela não estava gritando de dor.

- Você está bem?! Quebrou alguma coisa?- perguntou preocupada.

- Eu... acho que sim. Se eu morrer agora mesmo, não ficarei surpresa- gemeu.

Eleanor, para sua indignação, sorri.

- Não seja tão dramática. Afinal, estamos vivas!

Melanie choramingou.

- Que alívio- falou com ironia.

- Tudo bem, onde está doendo?

- Em todo lugar...

- Onde está doendo MAIS?

- Acho... acho que o meu pé.

Eleanor vai até o pé dela e desce as mãos para tocá-lo. Quando o faz, Melanie solta um gritinho em protesto.

- Desculpe, pequena, mas eu preciso ver se ele está quebrado ou não...- E então, ela voltou a tocar o pé. Mel se encolheu em reflexo, e mordeu os lábios para não gritar de novo- Droga... Acho que está torcido.

- Tem certeza? Está mais para quebrado.

- Não, não é tão ruim assim- Diz Ellie com um sorriso consolador- Mas ainda assim... vai doer bastante por um tempo. Talvez eu tenha que carregá-la de novo.

- Merda- resmungou.

E então, levantou um pouco a cabeça para olhá-la nos olhos.

- Mas quer saber? Tem razão. Pelo menos estamos vivas.

Eleanor ri.

- E você ainda tem chance de ter uma tartaruga e um pinguim de estimação.

E então, Melanie a acompanha, e as duas começam a gargalhar alto. Riem até ficarem sem fôlego e começarem a lacrimejar.

- Meu deus, eu realmente enfiei um pincel do olho dele?

- Sim, enfiou.

- Eu amava aquele pincel- Lamentou-se, mas então voltou a rir- E agora, pelo menos, temos a arma que você roubou daquele homem.

- Sim- Eleanor sorri maliciosamente e tira a pistola que estava presa a sua calça, a segurando como um mafioso- Agora seremos indestrutíveis, baby.

- Que intimidador.

- Quero ver tirar sarro de mim depois que me ver usando essa belezinha de verdade.

- Você realmente sabe como atirar?

- Bem, eu nunca usei uma pistola antes, mas não deve ser muito complicado, certo? É como um arco... só que um pouco mais pesado. E letal.

- Bem mais letal- Melanie ri.

Então, elas mergulharam em um silêncio surpreendentemente confortável. Mel consegue, com muito esforço, se sentar, e então as duas ficaram observando o horizonte, admirando os enormes planaltos de pedra e a paisagem desértica que parecia não ter fim.

- Estamos completamente fodidas, não estamos?

- Senhorita Watson, olhe o linguajar!- repreende Eleanor, rindo- Se Hariet estivesse aqui, ela iria lhe dar um sermão enorme.

- Bem, não acho que valha a pena me preocupar com o linguajar agora que vamos morrer.

Eleanor suspira.

- Teria como você ser MAIS otimista?- pergunta irônica.

- Tudo bem, ainsa existe uma pequena possibilidade de sobrevivermos, isso se por algum milagre alguém que tenha condições de nos salvar nos ache no meio do nada e tenha um coração grande o suficiente para sentir pena das nossas pobres almas- Então ela olha para Ellie, e percebendo sua expressão preocupada, da um leve empurrão em seu ombro- Ei, estou brincando. Tenho quase 100% de certeza que não vamos morrer.

- Que tranquilizador- fala revirando os olhos.

- Eu sei, sou péssima em aliviar as coisas. Mas pelo menos...- Ela se interrompe.

- O que foi?- pergunta Ellie curiosa, vendo a expressão dela ser tomada por empolgação.

- OI!- Grita Melanie- SOCORROOOO!

- Você está maluca?!

- Não! Tem alguém ali, não está vendo?

- Ótimo, agora você vai começar a ver miragens...

- Ellie, quer pelo menos olhar para onde estou apontando?!

Ellie a obedece a contragosto e, para sua surpresa, de fato havia uma pequena silhueta, há uns bons 100 metros de distância de onde elas estavam. Pelo tamanho, provavelmente era um homem.

Tomada por esperança, ela começou a acompanhar Mel e gritar, torcendo para que ele as visse.

Para o alívio completo das duas, foi exatamente o que aconteceu. Logo a pequena silhueta foi ficando cada vez maior, até ambas conseguirem vê-lo nitidamente.

Mas Melanie, que antes tinha um sorriso enorme de felicidade nos lábios, começou a murchar a medida em que enxergou a pessoa com mais clareza.

Viu a sua pele morena, o rosto pintado e sério. Um acessório de penas na cabeça, um manto cobrindo os braços e uma calça folgada.

Um nativo. Um selvagem.

Um comedor de gente.

Melanie engoliu em seco, apertando o braço de Ellie e sendo possuída pelo pânico.

- Ellie, rápido, aponta a sua arma.

- O que? Por que?- Ela pergunta, a olhando com estranheza.

- Porque ele...- Então ela tentou reformular o que estava prestes a dizer. Sabia que ela havia sido praticamente criada por pessoas como ele- Ele pode ser perigoso.

- Você sequer está se ouvindo? Está pedindo para eu ameaçar a única pessoa capaz de nos salvar nesse momento?

- Capaz de nos salvar ou de nos devorar vivas, você quer dizer.

Mas ela se arrepende do que diz no mesmo segundo, ao ver Eleanor se levantar de maneira brusca.

- Eu não sei como eu acreditei por sequer um segundo que você era diferente.

- Diferente?

- Eu pensei que você procurava conhecer as pessoas antes de julgá-las, Melanie. Acho que a superestimei- disse, parecendo realmente decepcionada e fazendo Mel sentir um aperto doloroso no peito.

Antes que ela tentasse falar qualquer coisa, Ellie se virou para o índio e começou a andar na direção dele. Mel observou a tudo, ainda sentada e mortificada. Era sério que ela sequer pensava na mínima possibilidade daquele homem ser agressivo?!

. . .

Eleanor respirou fundo antes de começar a falar. Torcia para que a habilidade de falar o seu idioma não estivesse tão travada ao ponto que impedisse uma comunicação.

Pigarreou antes de falar.

- Olá.

O homem a olhou assustado, provavelmente sem conseguir acreditar que uma branca falava a sua língua.

- Não precisa ter medo, nós não vamos machucar. Só precisamos de um lugar para dormir e restaurar nossas energias.

O nativo a encarou por longos segundos, desconfiado.

- Eu sei que é difícil acreditar em nós, mas realmente não temos má intenção. Se quiser podemos dar alguma coisa em troca... Temos roupas, tecidos. E se não for do agrado, prometemos recompensar você e sua tribo futuramente com coisas mais valiosas.

Ela falou isso tudo com calma e suavidade. Sabia bem que elas não seriam ajudadas sem oferecerem nada em troca. Não era pelos índios não serem solidários, mas simplesmente precisavam ganhar algo como símbolo de gratidão.

Então, para afim de convencê-lo melhor, ela decidiu contar a história delas: que haviam sido perseguidas por homens e foram obrigadas fugir.

O nativo então a analisa de cima a baixo, e faz o mesmo com Melanie bem atrás. Parece pensativo por uns segundos, até balançar os ombros.

- Não tenho poder de determinar se podem ficar. Mas o líder pode. Levo vocês até ele.

Ellie arquejou, feliz, e então juntou as mãos em um gesto de gratidão, inclinando levemente a cabeça para baixo.

- Obrigada.

Então, ela se virou para Mel, com um sorriso enorme. A garota a olhou por alguns segundos desconfiada.

- O que ele disse?- perguntou.

- Disse que irá nos levar até o líder da tribo dele, e então irá perguntar se permite que fiquemos com eles por pelo menos uma noite.

- Tem... certeza que é uma boa ideia?

- Mas é claro! Não precisa se preocupar, eles são mais amistosos do muitos americanos por aí, isso eu lhe garanto.

. . .

Para o completo pânico de Melanie, o tal índio se ofereceu para carregá-la. A primeira coisa que fez antes dele pegá-la nos braços foi olhar para Ellie, em busca de ajuda. Preferia um milhão de vezes que ELA a carregasse. Mas sabia que se dissesse isso iria parecer uma criança mesquinha e mimada, e Ellie já estava com raiva o suficiente dela, não queria piorar as coisas. O ânimo inicial surgiu apenas porque o índio deixou que elas o acompanhassem.

Então, Mel se deixou ser carregada.

Enquanto andavam pelo que pareciam horas no deserto, ela finalmente lembrou que havia esquecido a mala no trem, ou seja, não tinha mais roupas para vestir e perdera grande parte dos seus vestidos. Choramingou.

. . .

Tempo depois, ela finalmente conseguiu avistar algo semelhante a uma tribo. Haviam várias barracas feitas de galhos longos de madeira recobertas de peles de animais. No centro de tudo, havia um círculo, com uma foqueira no centro.

A medida que se aproximavam, percebeu que os índios antes imersos em suas atividades começaram a encará-los com surpresa, o que era uma atitude bastante compreensiva.

O índio que a carregava -que ela descobriu através de Ellie que se chamava Takoda- foi até o centro da tribo, com Ellie o seguindo.

E então, antes que sequer tivessem tempo de reagir, um homem alto e ainda mais musculoso que o próprio Takoda se aproximou, apontando uma lança para Ellie. A ruiva prendeu o fôlego, sentindo a lâmina perfurar superficialmente a pele de sua bochecha.

Melanie ouviu apavorada Ellie tentando convencê-lo a não atacá-las. Ninguém parecia se importar caso acabassem mortas ou não, até que mais um dos índios se aproximou. Ele parecia ser o mais velho da tribo, com longas tranças brancas e uma pena enorme no meio da cabeça.

Viram o senhor conversar com Takoda apressadamente, e então falar com o homem da lança. Enquanto isso Mel estava começando a ficar levemente sem graça, ali no colo de Takoda e com todos aqueles olhares em sua direção.

Foi então que Ellie falou pela primeira vez. A ruiva olhou com uma mistura de surpresa e choque para o velho, que então a olhou com a mesma expressão.

E então, para a completa surpresa de Melanie, o senhor ordenou que o índio da lança parasse de apontar para Ellie, e foi até a ruiva para abraça-la.

"Droga, o que diabos está acontecendo?" se perguntou ela, aflita "Será que ela me ofereceu como oferenda de algum ritual antropofágico?! Eu a magoei tanto assim?!"

. . .

Eleanor não conseguia acreditar no que estava acontecendo.

Nuvem Vermelha -a mesma pessoa que acolheu ela e seus pais com tanto carinho, e sempre lhe dava vários conselhos e fazia questão de tratá-la como uma integrante da tribo, apesar de não parecer com nenhum deles- estava a sua frente, vivo e saudável.

Depois de tantos anos ouvindo do terrível extermínio que andava ocorrendo com as tribos no período de expansão, Ellie sofrera, pensando se ainda existia pelo menos a mínima chance da tribo na qual foi criada -Sioux- estivesse intacta.

E ali estava ele, o líder e portador espiritual, que cuidava dela quando os seus pais tinham que sair para trabalhar: vivo. Queria gritar de alegria, e foi exatamente o que fez.

E então, o abraçou, fazendo com que todos os outros índios a sua volta arquejassem de surpresa.

Ficou repetindo para Nuvem Vermelha o quanto estava feliz em vê-lo, o quanto sentira saudades. Logo as lágrimas desciam, enquanto o senhor ria e dizia que sentira o mesmo.

Então, quando se descencilharam, ela explicou tudo.

. . .

Esse foi o capítulo! Espero que tenham gostado <3

Não esqueçam de votar caso tenha sido o caso, e vejo vocês na próxima ♥️

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