Prólogo

Todos estavam se reunindo na sala do conselho do palácio. Poderia-se dizer que era uma confusão de vozes e murmúrios, vindo de todos os lados, tornando-se cada vez mais ansiosos a cada segundo que passava. Então, o rei levantou a palma da mão, calando cada indivíduo, e deu a palavra ao homem à sua frente.

— Deixem-no continuar a falar! — ordenou o rei, visivelmente irritado.

— É um oráculo! É a palavra do mundo, dizendo que já devemos procurar o novo guardião! — disse um rosto animado, seguido por uma voz segura. De certa forma, o dono da voz se sentia até animado, como se voltasse aos seus tempos de juventude. Esse era Horeom, o sumo sacerdote de Florença, o país mais poderoso da dimensão mágica. — Deixe-me apresentar, Vossa Majestade! Eu sou o Sumo Sacerdote Horeom. Venho dizer que o mundo falou depois de séculos em nossas terras e em nossa dimensão! — o sacerdote falou finalmente, sentindo-se aliviado. Havia anos que o mundo mágico não recebia um oráculo sobre a localização do guardião, ou muito menos qualquer indicação de algo positivo. — Finalmente! Afinal, ainda existe esperança para cada nação dos continentes, e não fomos abandonados pela luz.

Horeom olhou na direção de uma pessoa por alguns segundos; ela era sua amiga mais antiga.

Meteora, aquela que comandava o treinamento dos jovens magos, olhou para o amigo com ansiedade. Enquanto isso, cada um dos membros do salão estava grudado em seus assentos, como se estivessem colados, olhando para o sacerdote sem respirar, esperando suas próximas palavras.

O rei, por outro lado, olhava sem expressão para o sumo sacerdote.

— Já se passaram cem anos, certo? Desde o último oráculo. E agora você me diz que é sobre o guardião, que até esse exato momento não deu sinal de seu surgimento em nenhum lugar do mundo mágico ou em nenhuma das crianças que nasceram até agora — disse o rei, pensativo. — Isso é algo completamente interessante de se ouvir ou uma enorme besteira.

— Isso é mais do que um fato, Vossa Majestade — respondeu o sacerdote. — Assim que soube deste oráculo, tive que vir o mais rápido possível para falar com o senhor e com os membros da corte. O oráculo realmente se trata do novo guardião.

Era um oráculo descendo sobre o mundo mágico pela primeira vez em cem anos. Mas o rei Orwen olhava para o sumo sacerdote com grande indiferença a cada segundo que passava. Como alguém que não tinha interesse em oráculos ou em suas consequências, ele não mostrou nenhuma reação às palavras do sumo sacerdote, ao contrário dos outros ao redor. No entanto, ao mencionar o guardião, os olhos do rei brilharam com curiosidade e anseio.

Isso aliviou o coração do sumo sacerdote, pois o rei, assim como os outros membros da dimensão mágica, respeitava profundamente a figura do guardião.

Horeom ajoelhou-se diante do rei, passando por vários sacerdotes que se reuniram, agitando suas vestes brancas puras. Então, juntando as duas mãos e fechando os olhos, começou a recitar a palavra do mundo.

Todos deram um passo à frente, atentos, enquanto a imagem de uma pessoa se levantando em meio à escuridão aparecia. A história do oráculo era contada para cada um deles, tratando-se de um milagre que acontecera sob a orientação daqueles que seriam considerados esquecidos pelos jovens magos ou simplesmente abandonados pela dimensão mágica.

— Sua rebeldia trará glória e prosperidade sem fim aos mundos. Pela decisão de ir ou ficar, as trevas retornarão e tentarão devorar a luz. Eventualmente, a batalha levará os mundos a ruírem e novas realidades surgirão — disse Horeom calmamente. — Os esquecidos pelas linhagens dos magos serão os aliados mais fiéis do novo guardião, e as escolhas dele serão suas.

Um silêncio profundo se instalou após Horeom terminar de proferir o oráculo.

Então, o rei Orwen se levantou de seu assento, caminhando lentamente até Horeom, que olhava para o chão. O som de seus sapatos descendo as escadas era duro e firme, fazendo todos se calarem ainda mais e apertarem-se em seus lugares.

— Está dizendo que essas foram as palavras do oráculo? Que o guardião irá se juntar a um grupo de esquecidos de nossas linhagens? Aqueles que traíram muitas de nossas causas e fizeram milhões morrerem? — Orwen falou calmamente, finalmente chegando até Horeom e olhando para ele com uma expressão cética. O rei pisava nas vestes brancas que cobriam o chão com grande indiferença. Ele então levantou o olhar na direção de Meteora, que estava congelada no lugar. — Vocês são realmente arrogantes. Aparecem com algo sem sentido como um oráculo, onde dizem que o guardião se unirá a pessoas inexperientes na magia e ainda afirmam que os filhos de traidores serão nossa salvação.

Meteora apertou as unhas contra as palmas das mãos. Queria gritar e dizer que as crianças nunca deveriam pagar pelos pecados dos pais, mas sabia que o rei iria rir e retrucar da pior maneira.

Isso era o que mais desesperava Meteora.

— Senhor, não tem como mudar o que me foi mostrado ou muito menos dizer que estou querendo usar esse oráculo ao meu favor — disse o sacerdote, trazendo os frios olhos verdes de Orwen em sua direção e agradecendo internamente por ter livrado sua amiga dessa responsabilidade. — Esse é o destino do mundo e a realidade que iremos enfrentar futuramente.

O rei riu ceticamente.

— Não seja arrogante demais, sumo sacerdote. Oráculos não são de grande ajuda, e não podemos nos apegar tão fortemente ao que eles dizem. As crianças daqueles que traíram a dimensão mágica não são a solução para nada e nunca serão! Declaro, neste instante, o fim da nossa reunião. Nada deve ser vazado sobre esse oráculo para os demais ou para as outras nações e impérios. Ainda estamos nos preparando para dar fim aos últimos traidores — disse Orwen, e o som de seus passos diminuía conforme ele se afastava da sala do conselho, enquanto as sombras do lado de fora pareciam se agitar como se rissem.

Foi assim que o caso parecia ter terminado para a família real, o restante dos nobres e sacerdotes presentes na sala do conselho.

Meteora olhava para o amigo com pesar; nessa ocasião, eles precisavam de uma vitória após tanto tempo.

No final, ambos precisavam de uma vitória.

********************************

Horeom não parecia ter consciência de que acabara de pisar em uma maçã podre enquanto andava para longe do salão do conselho. Desde o seu nome até suas botas, tudo nele era malvisto, e parecia que a situação piorara após o que acontecera na reunião. Ele estava ocupado apalpando a capa, procurando algo, mas parecia ter consciência de que estava sendo vigiado. Ergueu a cabeça de repente, encontrando o olhar de Meteora, que continuava a observá-lo conforme ele andava. Por algum motivo, a visão dela pareceu diverti-lo.

Ela era sua amiga mais antiga, desde os tempos em que ele era um mago inexperiente, antes de se tornar sumo sacerdote e antes de ela assumir o cargo que tinha atualmente. Lembrar dessa época fez com que ele soltasse uma risadinha.

— Eu devia ter imaginado que algo desse tipo fosse acontecer, ou ao menos que o rei reagiria dessa maneira — disse ele, quando sua fiel amiga se aproximou. — Nosso rei odeia oráculos e qualquer coisa que pareça definir o destino. Envolver a ajuda de traidores seria como jogar um enorme feitiço de fogo em mim mesmo.

Meteora suspirou, sentindo o peso das palavras do amigo. A situação era delicada, e qualquer passo em falso poderia resultar em consequências desastrosas.

— Sabíamos que não seria fácil, Horeom. Mas precisamos continuar lutando, mesmo contra as probabilidades — disse ela, com uma determinação silenciosa nos olhos.

Horeom assentiu, seu olhar suavizando um pouco ao encontrar o dela. Eles sabiam que o caminho à frente seria difícil, mas estavam determinados a seguir em frente, buscando a esperança que o oráculo prometia.

— Não podemos ser tão dramáticos, mas eu deveria ter falado ou pensado em uma maneirada de você ter ido com mais calma no que fez na reunião do conselho  — disse Meteora, batendo no ombro dele e tentando soar positiva, embora não soubesse se daria certo. — Os outros do conselho acreditam nisso e vão ficar de olho nas crianças que nasceram nos últimos cinco anos.

— O que leva a crer que a criança nasceu em algum lugar do mundo mágico? — Horeom perguntou divertido. — E o mundo humano? Talvez tenha nascido lá.

— Ah, é — Meteora falou, revirando os olhos. — Esqueci da existência desse lugar. Faz séculos que não nasce nenhum mago ou ser mágico lá, e a falta de vestígios de magia complicaria nossa busca.

— Acho que já houve uma época em que você era mais humilde com aquelas pessoas — disse Horeom, estalando a língua. — Mundanos não são completamente desinteressantes como você pensa ou tenta fazer parecer.

— Acredito nisso — retrucou a mulher, mal-humorada. — Mas não é razão para perdermos a cabeça com curiosidades tolas. Os mundanos são desinteressantes na área mágica, andando pelas ruas em plena luz do dia, sem entender nada do que está ao redor deles — lançou um olhar atento ao amigo, esperando que ele falasse algo, mas ele permaneceu calado, então continuou. — Seria engraçado se, no dia em que o guardião surgisse, os mundanos descobrissem nossa existência. Suponho que realmente tenha nascido no mundo humano, não é, Horeom?

— Parece que não há dúvida. Temos muito o que agradecer com esse oráculo — disse Horeom, e algo vibrou em seu bolso. — Acabei esquecendo do meu bichinho.

— Seu bichinho? — Meteora perguntou, confusa.

— Sim, um bichinho virtual. É uma invenção dos mundanos, chamado tamagotchi. Tenho que cuidar dele, dando comida, brincando e colocando para dormir. Acredite, eles fizeram isso sem usar mágica, apenas inteligência — Horeom falou, mostrando a pequena tela com um bichinho pixelado sorrindo. — Não é fofo?

— Não, e acho loucura que um sumo sacerdote tenha algo assim — Meteora disse friamente. Não achava que deveriam se misturar com os mundanos, especialmente em um momento de tensão como aquele. — Voltando ao assunto, mesmo que o guardião tenha retornado, ainda não sabemos quem ele ou ela é atualmente.

— Minha amiga, uma pessoa sensata como você certamente pode encontrá-lo. Toda essa bobagem de não saber... você, mais do que ninguém, sabe quem vai encontrá-lo, assim como eu sei e os demais do conselho — Horeom falou, fazendo com que a amiga franzisse a testa, mas ele continuou cuidando do bichinho virtual. — Afinal, todos ficaram tão confusos, mas os fatores apontam para uma família que recentemente foi esquecida ou, melhor, apagada dos registros mágicos, e suas crianças ainda estão vivas.

— Sei que você não vê — Meteora disse, parecendo meio exasperada, meio admirada. — Mas é diferente. Se for a família que surgiu em minha mente, está completamente fora do nosso alcance.

— Espere um segundo, por que está tão pessimista? Você não é a protetora legal das crianças da família Shinewood? — disse Horeom, piscando um olho para a amiga, que ficou envergonhada. — Lembro que quando a mais nova nasceu, você assumiu a guarda de todos e ainda espera a sentença por essa decisão até hoje.

Meteora lançou um olhar severo ao amigo.

— As fofocas não são nada comparadas aos boatos que correm. Sabe o que todos estão dizendo? Maryse e Demétrio são jovens, mas foram sentenciados à morte, e seus filhos quase seguiram esse caminho se eu não tivesse me intrometido e assumido a guarda das crianças — Meteora falou, apertando as mãos sobre o colo, fechando-as com força.

Aparentemente, ela havia chegado ao ponto que estava ansiosa para discutir, a verdadeira razão pela qual estava esperando o dia todo para conversar com o amigo. Nunca havia fixado um olhar tão penetrante no sacerdote como agora. Era óbvio que, embora ela ouvisse o que "todos" estavam dizendo, não acreditaria até que Horeom confirmasse ser verdade.

— O que estão dizendo — continuou ela — é que Maryse e Demétrio estavam entre aqueles que permaneceram leais àquele mago corrupto e asqueroso, agarrados às suas palavras, mas eles são inocentes.

— No caso, é isso que deseja acreditar — disse Horeom, finalmente encontrando o olhar da amiga. — Sei como é difícil. Afinal, fomos nós que os treinamos e cuidamos deles desde a infância, e agora traíram o templo e a própria magia da ordem por trivialidades de um desejo que foi distorcido. Bem, foi isso que notei ao ler suas mentes e corações. A pior coisa para mim foi ver que eles se arrependeram quando foram presos, mas já era tarde para isso.

Meteora suspirou, sentindo o peso das palavras do amigo. A situação era complicada e dolorosa.

— Eu sei que você está certo, Horeom. Mas ainda é difícil aceitar que aqueles que amamos e cuidamos poderiam se desviar tanto do caminho. — Ela olhou para o chão, lutando contra as lágrimas.

No início do ano, o grupo conhecido como Centauros realizou uma Ascensão durante a assinatura dos Novos Acordos nos templos da magia, entre as nações mágicas. Seu ataque deixou cicatrizes profundas nas relações entre as nações, tornando a já frágil trégua ainda mais tensa. Os membros do grupo estavam armados com armas demoníacas e acompanhados por demônios, marchando diretamente para o salão do conselho com a intenção de perturbar a assinatura e enviar uma mensagem de ódio contra aqueles que aceitavam tratar outras criaturas como iguais. O caos se instaurou, mas os defensores chegaram a tempo de impedir um desastre ainda maior. No final, os inimigos foram derrotados, mas muitos dos integrantes foram mortos.

Os membros restantes do grupo, que haviam sobrevivido, foram capturados e julgados pelo templo dos magos e por cada nação mágica. Maryse e Demétrio, que tinham filhos pequenos, incluindo um recém-nascido, foram sentenciados à mais cruel das punições para magos: toda a família pagaria pelos seus crimes. No entanto, Meteora interveio, voluntariando-se para cuidar das crianças e forçando um novo tribunal para decidir o destino delas.

Horeom assentiu, e Meteora sentiu o coração doer ao pensar nos seus melhores alunos, agora perdidos e sem pensar nas consequências para seus filhos.

— Não posso acreditar... Não quero acreditar... Ah, já tinha visto algo do que eles faziam, mas os pecados deles cairão sobre as crianças, e eles nem se arrependeram de nada — disse Meteora, com lágrimas nos olhos. O amigo estendeu a mão e deu-lhe um tapinha no ombro. — Eles me viram e nem pediram misericórdia por seus filhos... seu julgamento sobre as crianças foi pior do que eu imaginava.

— Eu sei... eu sei... — disse Horeom, deprimido. — Conheço nosso mundo o suficiente para saber que essas crianças serão marcadas para sempre só por serem filhos de quem são. Se as pessoas souberem o que vi, as crianças serão mortas e o caos será ainda pior. Mas se minha visão estiver correta, o melhor lugar para elas é ao seu lado. O tribunal sobre a guarda delas deve decidir isso, mas o rei Orwen não será benevolente e vai te prender a um único lugar.

Meteora suspirou e olhou para os pulsos.

— Sei perfeitamente que essa será a sentença, mas não dou muita importância — sussurrou.

— Sei que está mentindo para se fazer de forte na minha frente — disse Horeom com um sorriso sincero. — Acredito que o futuro deles será diferente. A honra de sua família será restaurada, e você será livre para fazer o que quiser.

Meteora sentiu uma pontada de esperança e medo. A ideia de que o mundo pudesse mudar era ao mesmo tempo aterradora e reconfortante.

Horeom tocou o ombro da amiga com delicadeza.

— Posso dizer que pode contar comigo para tudo. Somos a família um do outro — disse ele, com ternura.

Uma brisa fria arrepiou os arredores, silenciosa e calma sob o negror do céu. Aquele era o último lugar onde alguém esperaria que coisas espantosas acontecessem. Duas pessoas torcendo para que uma simples profecia se concretizasse, e que seus destinos fossem diferentes do que já havia sido traçado.

______________________________________

Gostaram?

Até a próxima 😘

Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top