Capítulo Vinte e Sete

Victor Jones:

O tempo esfriou gradualmente, e as roupas leves e finas que costumava usar foram substituídas por tecidos mais grossos e pesados. A estação em que se transformar em um picolé sem um aquecedor finalmente chegou à dimensão mágica. Pensei que Anna estava apenas brincando quando me contou sobre isso, mas já vi três pessoas congeladas como picolés.

Se eu soubesse que isso iria acontecer, teria me concentrado em dominar o Elemento Fogo primeiro. Pelo menos assim, poderia passar este inverno com conforto. Enquanto o sol mal se levantava, eu resmungava enquanto praticava "Controle" no meu quarto.

Treinei intensamente por mais um mês. Agora, era capaz de controlar perfeitamente o mundo ao meu redor na dimensão mágica.

O processo de controle da magia espiritual era como um jogo de dominó avançado, cuidadosamente configurado. Era necessário colocar minha concentração e domínio com precisão, sem a menor oscilação, para considerar um passo completo. Qualquer deslize resultaria em um recomeço.

A magia, em essência, exigia que eu mirasse em um ponto específico e usasse meus pensamentos para controlar e direcionar o poder. Durante esse processo, a concentração era vital. Mesmo enfrentando a resistência do mundo espiritual, que muitas vezes resultava em dores de cabeça lancinantes, eu precisava manter meu foco.

Finalmente, abri os olhos e caí exausto na cama. Estava sozinho no quarto, pois Merlin, Duncan e os outros estavam em aula ou em missões para Meteora e os outros mestres.

Enquanto refletia sobre a próxima assembleia, que mais parecia um teste, meu celular começou a vibrar ao meu lado. Peguei-o e vi uma foto do meu irmão, que estava se preparando para uma peça de teatro, ou uma mensagem de Carla reclamando sobre o que Brian estava aprontando.

Ao olhar para essas mensagens, gemi ao pensar na minha vida anterior. Marko pulou em cima da minha barriga e soltou um latido alegre, trazendo-me de volta à realidade.

— Estou com saudade deles — murmurei.

Fui tirado de meus pensamentos por Urlac, que apareceu de repente com um largo sorriso.

— Victor! — Ele ainda parecia um pouco desajeitado com a situação. — Como você está? Parece que estava mergulhado no mundo espiritual. Sua performance está impressionante.

Evitei seu olhar. Como sempre, suas palavras eram diretas. Quando o convidei a me visitar sempre que quisesse, achei que ele ficaria envergonhado, sem saber o que fazer. Agora, estava começando a entender o que significava dar liberdade a alguém que podia se transportar para qualquer lugar.

— Onde estão seus amigos? Não sinto a presença deles por perto — ele perguntou.

— Eles estão em missões ou em aulas — expliquei.

— Missões? — Urlac parecia intrigado enquanto observava minhas coisas. — Parece que nem todos os aprendizes ficam no mesmo lugar por muito tempo.

— As missões são tarefas para os mestres ou para o bem do país. Combatem elementais, demônios, enfrentam magos das trevas ou procuram ingredientes para poções vitais. São coisas que os magos fazem para manter a ordem no mundo mágico e em todas as dimensões — expliquei. — Você sabe, são coisas que mantêm a harmonia em nosso mundo mágico.

— Por que você não foi designado para uma missão? — Urlac perguntou, mas eu engoli as palavras. Se pudesse resumir, diria que ainda era apenas um aprendiz e precisava ser protegido.

— Bem, você parece de mau humor por causa disso? Por ser tratado assim? — Urlac questionou, sorrindo.

Fiquei feliz por ele prestar atenção em cada uma das minhas reações desde que nos tornamos amigos. Enquanto eu pensava nisso, ele fez uma careta engraçada e tentou me fazer rir.

— Acho que só estou cansado de estar preso aqui! — falei, pegando o broche que Rafael me deu e prendendo-o à minha camiseta. Meu celular continuava a vibrar com mensagens do mundo humano, lembrando-me de uma vida que não sabia se seria a mesma quando voltasse. — Os mestres não me deixam sair sem a supervisão dos cavaleiros que as nações enviaram, nem mesmo para dar um passeio na cidade.

— Deve ser realmente sério — Urlac disse, e apontei para a janela. Ele se aproximou e viu uma pixie tentando olhar pelas cortinas, seguida pelos cavaleiros que, em sua forma de falcão, voavam pelo céu acima do meu quarto.

— Viu? Eles estão sempre assim, especialmente quando estou sozinho neste castelo — expliquei. — Meteora e Horeom disseram que estão trabalhando em uma solução para que eu possa ter mais liberdade.

— Isso parece triste — Urlac comentou enquanto se jogava na cama. — Imagino que deve ser difícil, todos te rastreando o tempo todo.

— Infelizmente, essa parece ser minha sina por enquanto — resmunguei.

— Mas eu conheço um jeito de sair daqui sem que ninguém perceba — Urlac sugeriu, e eu levantei uma sobrancelha.

— O que um espírito iria querer no mundo humano? — perguntei.

— Sempre quis provar um doce humano, algo delicioso e único para um espírito — Urlac falou com uma expressão séria.

Embora não tenha conseguido evitar uma risada, aceitei a proposta. Era um pedido tão simples, comprar um doce do mundo humano. Sorrindo amplamente, estendi a mão, e ele apertou com um sorriso igualmente grande.

— Então temos um acordo — afirmei.

— Acho que nunca fui tão bem recebido em toda a minha existência — Urlac brincou.

— Além de Anna, Rebecca, Merlin, Duncan e, acredito, Aurora, o interesse das pessoas por mim costumava ser um fardo — contei.

Mas, não importa onde eu estivesse, as pessoas sempre conseguiam me fazer sorrir. Urlac era uma dessas pessoas. Ele era o filho único do Rei dos Espíritos, uma figura poderosa no mundo espiritual, mas também alguém que havia se afastado da maioria das interações sociais.

Eu também estava ansioso para conhecer o pai de Urlac e ver como ele reagiria a mim. Era irônico que, depois de incontáveis ciclos de vida, eu me tornasse alguém assim no meio de tudo isso. Como posteriormente descobri, o pai de Urlac era não apenas antigo, mas também uma figura essencial para a existência do mundo.

— Eu sei o lugar perfeito para abrir um portal para o outro mundo — Urlac anunciou, e eu segurei a mão dele. Instantaneamente, uma luz surgiu ao nosso redor, seguida pela escuridão, conforme atravessávamos a barreira entre os mundos.

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Quando emergimos na floresta, a tranquilidade e a beleza do local me envolveram. Era exatamente como eu havia imaginado, um refúgio longe de qualquer agitação humana. A luz do sol filtrava-se através das copas das árvores, criando um jogo de sombras e reflexos no chão. Multidões de insetos multicoloridos voavam em enxames, adicionando uma pitada de cores ao cenário verde sombrio.

Urlac se abaixou, claramente exausto, e soltou um suspiro pesado.

— Preciso de um momento para descansar. Viajar com mais uma pessoa drena consideravelmente minhas energias — ele explicou, enquanto lançava um olhar para o meu anel. — Seria possível que eu ficasse dentro do anel até me recuperar?

— Só um segundo — falei.

Sem hesitação, peguei o anel que havia aprendido a modificar recentemente, permitindo que ele armazenasse qualquer coisa necessária. Urlac entrou no anel, e eu o acomodei lá dentro com cuidado. Em seguida, peguei meu celular, pensando em quem seria a primeira pessoa para a qual eu poderia enviar uma mensagem.

Minha primeira parada era minha casa, onde talvez conseguisse encontrar uma desculpa plausível para explicar minha súbita ausência. Neste mundo, sabia que existiam meios de manipular as memórias das pessoas de acordo com nossos desejos.

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Quando finalmente cheguei em casa, deparei-me com meu irmão prestes a sair pela porta da frente. Seus olhos se arregalaram ao me ver, e ele correu na minha direção com entusiasmo.

Max me abraçou com força, girando-me no ar enquanto expressava o quão bom era ter-me em casa. Ele estava segurando uma bolsa que, presumi, continha seus equipamentos esportivos. Enquanto ele me envolvia em um abraço caloroso, coloquei a mão em suas costas, murmurando palavras que iniciavam uma linha de magia ao seu redor. Ela moldaria suas memórias de acordo com o que eu dissesse, sem deixar qualquer espaço para dúvidas.

— Por que você não disse que estava vindo nos visitar? — ele perguntou, piscando os olhos, enquanto a magia fazia seu trabalho.

— Queria fazer uma surpresa — respondi. — A mãe está em casa?

— Ela saiu para um encontro — Max disse lentamente. — Com o Charlie. Sei que é um pouco surpreendente, mas eles têm saído juntos nos últimos meses. — Ele analisou minha expressão. — Eu também fiquei meio relutante no começo, mas acabei me acostumando. Se ela está feliz, isso é o que importa.

Um sorriso se formou em meus lábios ao ver o amadurecimento de meu irmão.

— Espero que... — Minhas palavras foram interrompidas pelo som do celular dele tocando.

— Vi, preciso ir — Max disse, pegando o telefone. — Tenho um treino.

— Sem problemas. Vou aproveitar para fazer algumas coisas pela cidade — expliquei, consciente de que não podia forçar minha presença sem aviso prévio. — Vou ver se a Carla e o Brian podem sair.

Mandei mensagens para ambos, e eles responderam rapidamente, informando que já estavam no centro.

— Vou pegar um ônibus até o centro, então não pode se atrasar um minuto se quiser nos encontrar lá — brinquei.

— Qualquer coisa, me ligue — Max disse, sorrindo, enquanto bagunçava meu cabelo e entrava no carro. — Ah, e ligue para nossa mãe, ela está com saudades.

Concordei com a cabeça, observando-o sair da frente de casa. Em seguida, dirigi-me sozinho ao ponto de ônibus mais próximo. Enquanto aguardava o primeiro ônibus, mexi no celular. Quando o veículo chegou, subi e ocupei um assento. No entanto, logo percebi um homem alguns bancos atrás que não parava de me observar. Sentia seus olhos queimando minha nuca, mas afastei essa sensação, convencido de que ninguém poderia estar me seguindo.

Afinal, eu havia saído das dependências do Castelo de Meteora sem que ninguém percebesse minha ausência.

A paisagem urbana passava lentamente pela janela do ônibus, e cada vez mais eu me afastava da segurança da minha casa e da supervisão dos mestres. Olhei para o anel em meu dedo, onde Urlac descansava, e me senti um pouco mais seguro. Quando finalmente desci do ônibus, estava no coração da cidade, onde as lojas, restaurantes e o movimento das pessoas criavam um cenário completamente diferente da quietude da floresta.

Ao avistar Carla e Brian no café, um sorriso se espalhou pelo meu rosto. O mundo humano ainda tinha suas maravilhas e, por um momento, senti que poderia equilibrar as duas realidades.
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Gostaram?

Até a próxima 😘

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