CAPÍTULO 3-JOANA À BEIRA DE UM INFARTO
Doutora Joana Medeiros esperou algum tempo até que confirmou que Kaila tinha ido embora do laboratório.
"No amor e na guerra, vale tudo", a mãe havia concluído, quando viu os rumos que a pesquisa da filha estava tomando. Não que ela pudesse chamar aquilo de uma guerra, porque tinha sido tão fácil tirar Kaila do páreo que aquilo no máximo poderia ser chamado da lei do mais forte, ou melhor, a já conhecida superioridade intelectual.
Kaila era inteligente, Joana reconhecia, mas não era páreo para a mãe! Por mais que a filha se esforçasse, Joana avaliava, nunca chegaria onde ela chegou...a discípula jamais se igualaria e muito menos superaria a mestra!
Joana via a filha demonstrando uma ambição pequena demais diante de uma grande descoberta. Ela tinha acompanhado cada etapa do que a filha fazia, sempre vigilante aos avanços da pesquisa e tinha certeza de que poderia finalizar os trabalhos sozinha e, como das outras vezes, receber os aplausos pelo sucesso de mais aquele projeto.
O risco maior foi conseguir envenenar as cobaias, sem que Kaila percebesse. Ultimamente, ela só faltava dormir no laboratório, o que dificultou um pouco o trabalho da mãe que sabia que precisava, ela mesma fazer o trabalho. Algo tão sério não poderia ser da responsabilidade de outra pessoa!
Pressionar a pesquisadora daquele jeito surtiu exatamente o efeito que Joana queria. Ela avançou em menos de trinta dias, o que talvez não tivesse avançado em cinco anos!
Algumas pessoas poderiam dizer que aquilo era desonestidade e falta de escrúpulos, mas aqueles funcionários eram dela e deveriam reportar a ela qualquer avanço em suas pesquisas. Era mais do que justo que ela assinasse a finalização de mais aquele trabalho, concluiu Joana sem remorso algum por passar também a filha pra trás!
No início, Kaila havia brigado com a mãe por causa disso e agora, se tornaria a vítima da mesma armadilha. Por isso Joana teve que assassinar as cobaias e ainda jogar a filha no fundo do poço a humilhando mais uma vez, ou então, provavelmente, Kaila tomaria a decisão de começar novos testes.
Joana Medeiros agora tinha todas as informações para fechar com chave de ouro a pesquisa...era hora de pegar o seu prêmio, afinal, arrematar aquilo seria brincadeira de criança. O que Joana não contava era com os contratempos que vieram depois e que a deixariam à beira de um infarto!
Angélica Rosa Ferreira, assistente de Kaila, se surpreendeu quando Joana mandou uma mensagem para ela informando que estava indo pessoalmente recolher as amostras que supostamente haviam falhado na pesquisa da filha.
Foi naquele momento que o coração de Angélica praticamente parou!
Aquelas lembranças invadiram a mente da ex-assistente de Kaila com muita clareza naquele momento! Ela lembrou-se que no meio daquele caos, ela não havia levado as ampolas para o descarte!
Angélica lembrou-se, somente naquele momento, que ela havia deixado as ampolas junto a outras caixas e que pretendia tirá-las dali depois!
A garota correu até onde havia deixado as ampolas, mas elas não estavam mais lá! Simplesmente, haviam desaparecido, junto com todas as outras caixas que ela havia visto ali mais cedo!
Ela sabia que seria mais fácil falar com a doutora Joana que havia obedecido a filha dela e descartado as ampolas, do que agora confessar que as havia perdido!
_Meu Deus, não! _ a garota agarrou a cabeça entre as mãos e já começou a avaliar a gravidade da sua irresponsabilidade.
Joana percebeu a inquietação da ex-assistente da filha assim que chegou ao laboratório de Kaila.
A garota chorava desesperada e parecia a ponto de enlouquecer!
Angélica ficou sem ar quando a chefe em pessoa passou pela porta do antigo laboratório da filha.
_Doutora Joana! A senhora aqui? _ falou num fio de voz.
A médica não fez rodeio indo direto ao assunto:
_Alguma coisa errada, Angélica?
Angélica teve naquele momento a oportunidade de mentir para a chefe e dizer que as amostras já tinham sido destruídas, devidamente descartadas, como Kaila tinha ordenado...mas não conseguiu dizer nada!
Com a boca e os olhos muito abertos, Angélica simplesmente encarava a chefe completamente transtornada!
Doutora Joana Medeiros ignorou de propósito um sinal de alerta que insistia em berrar dentro de sua cabeça que algo muito ruim estava a caminho!
_Fale logo o que aconteceu, garota, que eu não tenho o dia todo!
Naquele momento, acreditou Angélica, as suas chances de seguir naquela carreira simplesmente já não existiam mais.
As implicações do erro cometido iam muito além da ética, do teor confidencial que ela sabia que os projetos desenvolvidos ali sempre precisavam ter. Uma fórmula que havia resultado nas mortes das cobaias havia se extraviado e ela sabia que a gravidade disso era enorme!
Tão fácil seria simplesmente jogar a culpa sobre Kaila...dizer que ela havia ordenado o descarte e que ela simplesmente havia obedecido...talvez mais tarde Angélica se recriminaria por não ter mentido e acabado com a sua participação ali mesmo. Seria dispensada, o seu papel naquela história terminaria ali, e ela iria embora do laboratório deixando a ira da médica cair sobre a filha!
Aqueles olhos acusadores, aquela presença que metia medo em Angélica...era a carreira dela em jogo...mas também era a vida de pessoas lá fora!
A moça chorou, antes de responder, sentindo sobre os seus ombros o peso das vidas das pessoas que ela seria responsável por envenenar!
Joana Medeiros percebeu que precisaria ser mais firme com a funcionária:
_Fale logo, criatura, que eu não tenho o dia todo e esta sua lamúria já está me irritando! Onde está o material que eu te pedi?
Naquele momento, o que Angélica queria era só expulsar do peito um pouco daquele peso que certamente a perseguiria até o fim dos seus dias! Quem sabe, com o poder que a mãe de Kaila tinha, ela pudesse consertar aquilo tudo?
_Eu fiz uma besteira, doutora Joana! Estava prestes a ligar para a doutora Kaila, quando a senhora entrou...
Um alerta se acendeu na mente da cientista que interrompeu a outra firme:
_A minha filha já não faz mais parte da minha equipe e tudo o que acontecer aqui a partir de agora é da minha inteira responsabilidade, entendeu bem?
_Sim, doutora!
_Agora fale logo o que aconteceu!
_Eu não sei onde foram parar aquelas ampolas, doutora Joana! _ berrou a garota como se aquilo a sufocasse. _Eu as perdi!
_Eu não entendi... _ falou a neurocientista rezando para ter escutado errado. _Você fez o quê?
Angélica até que tentou explicar o que havia acontecido e como o erro se dera, mas a mulher a sua frente simplesmente a agarrou pelos ombros e a sacudiu com força repetindo fora de si:
_Você fez o quê, sua maldita?
Finalmente, a garota confessou que havia se distraído e deixado que as amostras que eram pra serem descartadas fossem levadas junto com outras caixas.
Joana soltou Angélica e deu um passo atrás, como se quisesse insanamente sair correndo e fingir que nada daquilo estava acontecendo!
Angélica continuou a falar atropelando as próprias palavras entre lágrimas desesperadas:
_Eu estava desnorteada, doutora Joana...eu não estava me sentindo bem...a doutora Kaila estava indo embora...eu só pensava que iria perder o meu emprego...aí eu coloquei as caixas ali enquanto ia ao banheiro lavar o rosto e quando eu voltei, elas não estavam mais lá...haviam sumido junto com as outras...
Joana perdeu o controle completamente e sacudiu a garota como se ela fosse uma boneca de pano:
_Sua irresponsável! Você tem ideia do que fez?
_Sim, doutora ...reconheço o meu erro...
Angélica fechou os olhos com força tentando expulsar os pesadelos que a assombrariam a partir daquele dia, imaginando insanamente zumbis se arrastando pela cidade sob o efeito do material que ela havia abandonado sem supervisão.
Joana tentou focar no que realmente interessava naquele momento!
_Você precisa encontrar este material o mais rápido possível! _ urrou Joana sentindo o coração quase lhe saindo pela boca.
_Mas vai ser praticamente como procurar uma agulha num palheiro, doutora Joana..._ Angélica se desesperou sem saber exatamente por onde começar a procurar.
_Isso já é problema seu, idiota! _ Joana assumiu um tom realmente ameaçador. _ Ou você me traz estas ampolas de volta, ou eu mesma vou dar um jeito de não apenas te demitir e impedir que você tenha a sua licença, como também te garanto que vou te mandar pra cadeia!
Angélica sabia que o erro que havia cometido era passível de sofrer aqueles castigos, mas ouvir aquilo de uma pessoa de quem ela já tinha medo foi apavorante!
_Misericórdia, doutora Joana...não faça isso comigo... _ suplicou a garota.
A médica sacudiu a garota com violência novamente:
_Você vai encontrar este material e eu não quero que uma palavra sobre isso seja dita, entendeu bem? Isso não pode sair daqui, entendeu, Angélica?
_Sim, doutora...eu entendi!
A médica reforçou:
_Eu vou acabar com a sua vida se este erro dentro do meu laboratório vazar, ouviu bem, sua imbecil?
_Ouvi sim, doutora...
A moça entendia bem aquilo. Uma coisa assim poderia acabar inclusive com a carreira da médica e também determinaria o fechamento daquele laboratório!
Angélica sabia que a sua vida dependia do sucesso de sua busca pelas ampolas perdidas!
Ela cruzou dados, rastreou as caixas que haviam sido levadas dali e finalmente descobriu o paradeiro de cada um dos pacotes que haviam sido entregues até que chegou à fábrica de produtos de limpeza onde Max, namorado de Ed, trabalhava.
Angélica finalmente conseguiu entregar a lista com os nomes dos quatorze funcionários que tinham sido submetidos ao material que deveria ter sido descartado.
Doutora Joana olhou para a lista ainda tensa e viu que o nome de Anselmo estava riscado.
_E este nome riscado aqui?
_Este riscado morreu, um dia depois de receber a droga.
Doutora Joana olhou em pânico para a moça que apressou-se em esclarecer:
_Certamente não sob o efeito da droga da Kaila. Anselmo levou um tiro quando resistiu a um assalto, doutora. Já chegou morto no hospital. Vi o atestado de óbito e a causa da morte realmente foi o tiro que ele levou.
O coração da chefe do laboratório se aliviou um pouco.
_E os outros treze? Quem são?
_São todos trabalhadores do mesmo setor e estão aí os nomes completos de cada um, o dia e a hora em que tomaram a droga. Se alguma reação fosse acontecer, já teria acontecido, porque já se passaram...
Doutora Joana foi fria quando interrompeu a garota que parecia aliviada e esperançosa de ser perdoada pela chefe ao demonstrar sua eficiência ao juntar tantos dados:
_Você está demitida. Saia agora mesmo do meu laboratório!
Angélica viu as suas esperanças ruírem cedo demais!
_Como assim? A senhora está me demitindo, doutora Joana?
A neurocientista falou num tom de voz que gelou o sangue da moça:
_Uma palavra sobre o que aconteceu aqui e você irá pra cadeia, entendeu bem? Acho que está na hora de aprender o peso do que estava escrito no contrato que você assinou quando entrou aqui. Estamos falando de segurança nacional! Pode ter certeza de que vigiarão cada um dos seus passos a partir de agora, assim como ficarão de olho em suas conversas ao telefone, em suas mensagens...um deslize que leve o pânico à população e você vai pedir pra não ter nascido!
Desempregada, arrasada e em pânico, a garota decidiu voltar para a casa dos pais a fim de lá permanecer isolada de tudo até que as coisas se aquietassem. Iria torcer para que a neurocientista conseguisse reverter o quadro, antes que o pior acontecesse!
Com Angélica fora de cena, foi a vez de Joana pensar em como faria para tirar de circulação, sem chamar muito a atenção, os treze homens que carregavam no corpo uma amostra da droga que poderia revolucionar a ciência mundial. Sabia que precisava ser rápida, porque se o tal Anselmo foi enterrado sem que nada de anormal fosse detectado em seu corpo, ela não poderia contar com uma sorte semelhante para um segundo caso.
Treze cobaias humanas estavam soltas fora do campo de visão da neurocientista e a seriedade disso a fazia estremecer de nervosismo!
Não foi a primeira vez que Joana Medeiros precisou recorrer a um alto funcionário do governo a fim de apagar com eficiência todos os rastros de um incidente tão grave quanto aquele!
A grandeza do que estava em risco, avaliou a profissional, a isentava de todo e qualquer sentimento de remorso sobre o que precisaria fazer para recuperar o controle da situação!
_Desaparecer com treze pessoas não é tão difícil assim, doutora Joana. _ afirmou o estrategista Ramiro Dantas convocado para fazer o serviço. _Já fiz isso com um número bem maior sem deixar rastros!
Joana tentou ficar confiante no sucesso daquela missão arriscada:
_Pois então faça o que tiver que fazer pra trazer estes homens sem um arranhão pra mim e sem levantar suspeitas, Ramiro!
Ramiro examinou novamente o serviço e decretou:
_Não vai ficar barato, doutora. Vou ter que contratar uma equipe especializada, providenciar os atestados de óbito...garantir que os treze caixões serão lacrados sem levantar suspeitas...
A médica levantou-se impaciente, temendo que a insegurança a dominasse novamente:
_Fale logo o seu preço que a transferência ocorrerá em menos de um minuto, rapaz!
Ramiro suspirou visivelmente excitado com o dinheiro que iria receber:
_Se é assim, considere o serviço feito ainda nesta semana, doutora.
O dinheiro foi depositado na conta de Ramiro imediatamente e ele saiu disposto a fazer jus a sua fama de precisão cirúrgica, sigilo total e de cem por cento de satisfação dos seus clientes de alto nível social e econômico!
Joana sabia que aquele homem não entenderia a importância de um prêmio Nobel na vida de um cientista. Se entendesse, certamente teria pedido o triplo do que havia pedido para trazer as treze cobaias humanas sãs e salvas pra ela!
_____&&&&&_____
Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top