Capítulo 14

Pablo me levou para fora do carro, onde pude sentir as gotas de chuva atingirem a minha pele. Eu estava tão quente, que podia jurar que assim que me tocavam, as gotas evaporavam novamente.

- Se sente mais fria? - ele perguntou. Balancei a cabeça em negativo. Eu estava literalmente fervendo.

- O que a gente vai fazer? - San perguntou tentando acalmar o gavião-preto, que se mantinha inquieto graças a nós.

- Eu não sei... É muito perigoso para nós ficarmos perto dela agora, mas não podemos deixá-la sozinha.

As vozes deles cada vez mais se tornavam distantes. Eu estava zonza, completamente desnorteada.

A última coisa que me lembro de ter visto foi a expressão de desespero de Pablo, e seus braços me envolvendo em seguida. Tudo ficou escuro.

Nunca havia desmaiado antes, e não sei dizer qual foi a sensação. Apenas sei que quando acordei estava dentro do carro novamente, com o corpo encolhido no banco traseiro e com a cabeça apoiada no colo de Pablo, que me observava atentamente.

O céu estava sem nuvens, e a luz do sol incomodava meus olhos, que demorou a se acostumar com a claridade. 

- Você ficou desmaiada por horas. - Pablo disse, me ajudando a me levantar devagar. - Por sorte, seu corpo se esfriou, e esperamos o Tiago chegar, por sorte ele conseguiu atrasar os subliminares que querem te pegar.

Quando olhei para frente, lá estava o primo do San, que ao contrário das fotografias em sua casa, agora não estava mais tão parecido com o priminho. Agora possuía uma barba rala, e o cabelo castanho estava mais escuro, também estava com muito mais músculos.

- É um prazer conhecê-la, Ariana! - ele disse, com um sotaque português bem mais fraco que o de San.

- Igualmente. - falei, sentindo uma leve dor de cabeça.

- Vamos tirar você do país. - Pablo disse, colocando as costas da mão em minha testa, certificando a minha temperatura. - Vamos levar você para a sua mãe.

- Se nada acontecer no caminho, é claro, é provável que amanhã mesmo começamos a voar. É bom ver que o Pablo e o Santiago cuidaram bem de você.

- Voar? - perguntei, tentando me certificar de que estava entendendo tudo o que diziam.

- Sim, vamos pegar um helicóptero, nos mandarão mais reforço. Falta pouco para encontrar sua mãe, Ariana.  - Tiago disse em um tom animado e esperançoso.

- Não é perigoso, eu não posso sei lá, explodir a qualquer momento? - falei, o encarando.

Ele olhou para Pablo e depois para o San, como se esperasse que algum dos dois interferisse. Mas eles não fizeram isso.

- Bom... Nunca vi isso acontecer, Ariana. - ele disse , mantendo seus olhos na estrada e não em mim. - É mais provável que você nos exploda.

Ele riu sem graça, como se fosse para que aquilo não soasse tão ruim, mas eu fiquei em um extremo estado de preocupação.

- Não liga pra ele, Ariana, ele não é muito bom em manter contato com pessoas por mais de dois minutos. - San disse.

Fiquei me perguntando se era por ele ter uma certa conexão com os animais que isso o fazia se sentir mais desconfortável ao redor de muitas pessoas. De início isso não fez muito sentido em minha cabeça, mas se os meus olhos agora possuem chamas e minha mãe é líder de um grupo de pessoas com super poderes, o que pode ser impossível?

Pablo também se mantinha olhando a estrada, brincando com pequenas gotículas de águas, fazendo com que elas girassem no ar. Ri comigo mesma ao observar aquilo. Pelo jeito graças a isso ele nunca ficava no tédio.

San ligou o rádio do carro, fazendo com que alguma música de funk que eu desconhecia começasse a tocar.

- As músicas do Brasil são tão animadas. - ele disse, ajustando o volume. - Adoro ouvir.

- Eu odeio. - Tiago se pronunciou, e eu concordava plenamente com ele. Acho que de todos os rítmos espalhados pelo Brasil, o único que sou apaixonada é o pagode, o que de acordo com Carolina, não combina nem um pouco comigo e com o meu histórico de Adele e Katy Perry. Mas fazer o quê? Meu mundo não seria o mesmo sem ouvir Raça Negra.

- Eu apenas ignoro. - Pablo disse, fazendo com que as gotas de água ficassem no formato de um cavalo marinho.

- Como você faz pra água te obedecer exatamente como quer? - perguntando, ainda não entendendo bem como esse lance de controle funciona.

Ele olhou para mim e trouxe a água mais próximo, para que eu pudesse ver melhor.

- Você só precisa visualizar. - ele disse, e a pequena quantia de água foi aumentando, pude sentir o ar ficando cada vez mais seco. E em poucos segundos, aquela água estava com o meu rosto, extremamente sorridente. - Ela me obedece conforme o que eu penso, ou o que sinto. É como se você fosse um artista, podendo criar a obra que quiser.

Fiquei admirando aquilo, e me imaginei se poderia fazer isso também. Era simplesmente sensacional.

- Vocês fazem coisas incríveis. Como podem se manter escondidos de todos? Olha as coisas que vocês podem fazer! - falei, vendo a expressão dele mudar para uma mais séria.

- Não podemos, Ariana. Isso foi decidido há muito tempo atrás. Nosso poder é belíssimo, mas também traz o caos e o sofrimento. - ele disse, desfazendo a "escultura" do meu rosto. - Quando nosso poder se revela é em carga máxima. Subliminares podem se defender da destruição causada, mas as pessoas comuns não. É melhor ficarmos nas sombras, do que matarmos pessoas inocentes. Vai entender isso um dia. O preço de ter tanto poder é muito alto. Somos abençoados, e ao mesmo tempo amaldiçoados.

Fiquei cabisbaixa, tentando imaginar quantas pessoas eles não tiveram que deixar para trás, assim como eu estou deixando.

- Vocês não podem mudar isso, não podem escolher não ter poderes? - perguntei, na esperança de quando tudo isso acabar, eu poder voltar a viver como vivia antes.

- Apenas aqueles que controlam células podem mudar isso, assim como podem transformar pessoas normais em subliminares. Mas são tão raros. Nos dias de hoje, não existe nenhum. Eles não nascem há muito tempo.

- Você ainda vai entender tudo isso, Ariana. - San disse, entrando por uma estrada de terra. - Eles vão te explicar tudo o que precisa saber. Provavelmente de uma maneira mais otimista que esse bobão aí.

Pablo franziu o cenho, não acreditando no que San acabara de dizer, e mesmo com tanta preocupação após ele ter dito tudo aquilo, me permiti rir.

Em poucos minutos, nós chegamos a um pequeno bairro, com casas bem afastadas umas das outras, e San estacionou em frente a uma casa amarela, com várias roupas no varal, e um pequeno cachorrinho com muito fôlego para latir.

- Por que estamos aqui? - perguntei.

- Reforços. - Pablo disse, saindo do carro.

Dos fundos da casa, uma garota magrinha, com os pés sujos de terra veio até nós, com um enorme sorriso no rosto, balançando as mechas loiras conforme andava.

- Oi, eu sou a Sibelly. - ela se apresentou, estendo a mão para mim com um sorriso simpático. - Irei ajudar vocês a saírem do país em segurança.

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