Capítulo 4


Após a morte misteriosa de Thayane e do professor Feitosa, Helena se afastou ainda mais de Luís. A polícia sabia que acontecera um homicídio, mas não conseguia chegar a um culpado. Não haviam câmeras no prédio e nem sinal de arrombamento no apartamento, mas havia indícios de combate no corpo de Thayane, que era uma das únicas pistas de que o que ocorrera ali foi um homicídio.

Helena estava devastada e desde o enterro de Thayane, ela se afundava em uma depressão terrível. Não devia ter deixado a amiga voltar para casa com Feitosa. Devia tê-la convencido a ir para seu apartamento, onde provavelmente estaria mais segura. Helena sabia que não devia se martirizar daquela forma, mas era impossível não pensar nas possibilidades quando a sua mente estava tão sobrecarregada.

Ela queria que as coisas voltassem a ser como antes, e desejava que o último mês fosse apenas um pesadelo longo e indesejado. Queria acordar e ver o rosto vivo e corado de Karina, os cabelos dourados brilhando e o jeito maluco de Thayane, com as bochechas redondas e o cabelo despenteado.

Helena praticamente se arrastava feito um zumbi pela faculdade. Todos olhavam para ela quando a notavam, o que fazia a garota se irritar profundamente. Ela odiava aqueles olhares estranhos e julgadores que diziam que ela e seus amigos estavam amaldiçoados.

Sim, eles diziam isso.

Helena sentou de forma desanimada do lado de Antonio e Marcelo no campus da faculdade. Já haviam se passado umas cinco semanas desde a morte de Thayane, e o humor do trio não melhorava.

Luís resolveu se materializar na mesma hora. Ele caminhou em sua direção com uma postura confiante e mesmo sabendo que estava negligenciando o que os dois tinham, Helena ainda sentia seu coração disparar sempre que o via.

— Gente, esse é o Luís. — Helena apontou para seu amor assim que ele parou na frente da mesa deles. Antonio e Marcelo o encararam enquanto faziam uma análise minuciosa do rapaz.

— Até que enfim conhecemos o misterioso boy da nossa amiga! — disse Antonio cumprimentando Luís alegremente, mas dava para ver que era uma alegria falsa a que ele demonstrava. Luís se sentou ao lado da namorada e depositou um beijo na bochecha dela. Marcelo se contorceu de desgosto.

— Estranho, nunca te vimos por aqui. — Marcelo disse, tentando manter um sorriso amigável. Luís se irritou com a provocação "gentil".

— Sou um cara difícil de distinguir na multidão.

— Nós conhecemos alguns alunos de artes cênicas, por isso achamos estranho não termos te visto. — observou Antonio, desconfiado.

— Bom, eu tenho que ir. Meu grupo está me esperando para um trabalho. — Ele depositou um beijo leve nos lábios de Helena antes de se levantar.

— Você está no grupo de quem? — questionou Antonio, fazendo Helena estranhar a sua atitude. Geralmente, Antonio é amigável com todo o mundo, mas ele exibia um brilho de desconfiança no olhar.

— Olha, eu já estou atrasado e não preciso provar nada para vocês. Até mais tarde. — Luís se afastou antes que Antonio ou Marcelo respondessem. Eles não viram o brilho maligno que os olhos do fantasma emitiam.

— Helena, esse cara é estranho e perturbado! Ele emite uma energia muito estranha, credo! — Antonio sacudiu a mão no ar, tentando espantar o que quer que ele estivesse sentindo.

— Você mal o conhece. Para de julgar o cara!

— Eu também não curti muito ele. Eu perguntei para meus amigos e não tem nenhum Luís Carlos na sala deles.

— Ele está no segundo período, você só conhece os mais veteranos. — Helena revirou os olhos, irritada com aquelas desconfianças. Ela não queria dar razão aos amigos, mas realmente era estranho que eles estudassem juntos e nunca tivesse lhe visto antes publicamente. Helena já tinha preocupações demais na cabeça, ela só queria ter uma vida normal. Um relacionamento normal. Será que era pedir muito?

— Abre teu olho com esse cara. Eu não gostei dele, sei lá, ele passa uma vibe meio negativa. — Antonio fitava a amiga com profunda preocupação.

— Olha, eu tenho que ir. Preciso devolver uns livros que peguei na biblioteca. Vejo vocês depois. — Helena depositou um beijo na bochecha de Antonio e depois na de Marcelo antes de se levantar.

Por mais que quisesse, ela não conseguia ignorar os avisos de seus amigos acerca de Luís.


Antonio entrou em seu carro assim que a aula acabou. Ele queria ir para casa cedo para poder maratonar uma série nova que tinha entrado na Netflix. O trânsito estava livre. Antonio entrou numa rodovia e levou um susto ao ver o rosto de Luís Carlos pelo retrovisor do carro.

— Feliz em me ver? — indagou Luís, fazendo Antonio soltar um grito. Com o susto, Antonio freou o carro bruscamente enquanto o fantasma enforcava Antonio com um cinto de couro. Antonio perdeu o controle do volante e o carro capotou na pista, rodando de cabeça para baixo no asfalto por três vezes antes de finalmente parar.

Inabalado, Luís olhou para o rosto ensanguentado de Antonio. Ele não tinha estrangulado muito o seu algoz, mas com certeza a batida de carro seria fatal. Talvez Antonio já estivesse morto, ao julgar pelo estado em que se encontrava. Era bem crítico.

Satisfeito, Luís assumiu sua forma etérea e saiu dali, com um sorriso triunfante no rosto, deixando um Antonio inconsciente e um carro amassado para trás.'


Nos próximos dias Luís se manteve seguindo Helena, mas ela não o procurava. Uma irritação surgiu nele, estava decepcionado. Luís sentia como se Helena estivesse lentamente saindo de seu controle e que não havia nada que ele pudesse fazer. Enquanto os amigos dela continuassem a falar em seu ouvido, nada daria certo entre eles como casal, mas agora só restava Marcelo e após a morte dele enfim ela só teria Luís para ouvir e se consolar. Ele acompanhou Helena durante todo o tempo e teve uma notícia pior ainda: Antonio estava vivo. Ele foi até o hospital em que ela visitou o amigo.

O jovem se mantinha vivo, mas para sua sorte, estava em coma e em estado grave. Porém, Luís não podia deixar de se preocupar, pois ouviu da boca dos próprios médicos que Antonio podia acordar a qualquer instante e se isso acontecesse ele iria abrir a boca para Helena. Mesmo que fosse algo difícil de se acreditar, após tudo que Helena vinha passando e todos os avisos que tinha recebido, Luís imaginava que ela poderia terminar com ele por precaução. Então tudo isso tinha de acabar o mais rápido possível. Nesta noite quando o hospital estivesse mais vazio e as enfermeiras menos ativas, Luís entraria no quarto de Antônio e terminaria o serviço.

Quando a noite caiu, Luís ainda estava no hospital. O fluxo de funcionários e pacientes já estava muito menor e ele passou pela porta de vidro do quarto onde estava Antônio. O jovem rapaz deitado na cama hospitalar tinha uma aparência moribunda. Estava pálido e claramente mais magro, mais frágil e respirava por aparelhos. Os ferimentos no corpo estavam enfaixados. Luís não sabia como funcionavam essas máquinas e se por acaso soariam algum alarme ou bipes para avisar alguém que algo está errado. Mesmo assim resolveu arriscar. Luís puxou um dos travesseiros debaixo da cabeça de Antonio e o pressionou contra a face do mesmo. Grunhiu apertando com força enquanto olhava para o monitor do ventilador pulmonar. Ele não entendia sobre essa máquinas, mas ao ver as linhas descendo imaginou que estava funcionando e quando o aparelho começou a bipar teve a certeza. Antonio foi parando de respirar e Luís apertou mais ainda o travesseiro com o antebraço e o sufocamento foi inevitável. Quando o enfermeiro responsável chegou ao quarto, Luís já havia retornado a sua forma etérea.

Satisfeito, Luís saiu do hospital e foi direto até a casa de Helena. Ela já estava dormindo, com a mesma camisola que viu pela primeira vez. As olheiras dela estavam profundas, o cabelo seco e quebradiço, as pernas dela estavam mais finas e a cor lívida de agora o assustava. Sentado na beira da cama ele resistiu em abraça-la, pois sentia que era isso que ela precisava, mas não podia fazer isso agora. Porém não havia problema. Quando tudo isso acabasse ele poderia ajudar ela de verdade e não como os amigos idiotas dela estavam fazendo. Se Helena está assim agora, é total culpa deles e dos conselhos terríveis, mas tudo iria acabar bem. Luís agora tinha certeza. Só faltava Marcelo e ele ia ser o último, então ele e Helena poderiam ser felizes novamente.

Ali, sentado na beira da cama, Luís permaneceu a noite toda.

Luís viu Helena se levantar de manhã e pegar o celular. Ele ainda não havia entendido muito bem toda essa tecnologia, mas como hábito ficava atrás dela para ver as mensagens e o que estava fazendo. Luís então viu que Helena havia apertado em uma mensagem de voz de Marcelo e a voz dele soou pelo quarto no alto-falantes do celular.

— Eu sei que é de manhã e essa não é a notícia que você precisa ouvir, mas aconteceu algo terrível. Antonio está morto e acalme-se por favor, você precisa ouvir isso: Não chegue perto daquele cara de jeito nenhum! Seu namorado, o tal Luís Carlos. Não deixe que ele se aproxime de você. Eu vou deixar um link aqui de uma matéria no Jornal.

Helena estava atônita e ele assombrado. Luís viu as mãos trêmulas dela apertarem na mensagem de baixo e uma matéria jornalística se abriu na tela do celular. Luís então viu ele mesmo na capa de uma notícia. Havia câmeras naquela UTI e todo o assassinato havia sido gravado.

Helena deixou o celular cair no chão e Luís saiu de lá. Ele correu o mais rápido que conseguiu até a universidade. Precisava trocar de roupas imediatamente e encontrar Helena. Ele tinha de provar que isso tudo era um engano. Ela tinha de ajudar ele. Não podia tudo se acabar assim.

Helena se sentia magoada e confusa. A sua cabeça estava tão transtornada que ela já não conseguia mais esconder o que sentia. Enquanto caminhava de modo desgovernado até a faculdade, as lágrimas jorravam incessantemente de seus olhos. Ela pegou um táxi qualquer e sob os olhares de estranhamento do motorista, que perguntava constantemente se Helena estava bem, ela se focava na notícia sobre Luiís.

A garota não conseguia acreditar que seu namorado tinha matado seu melhor amigo. Não podia acreditar que ele era capaz de uma coisa dessas.

Com o celular na mão, ela começou a pesquisar o nome Luís Carlos na internet. Porém, ela mal pôde acreditar no que encontrou.

"Empresário milionário é encontrado morto a facadas em sua própria casa".

Com as mãos trêmulas, Helena clicou na notícia e quase derrubou o telefone ao ver uma reportagem bem antiga, tanto que a foto era um recorte de jornal amarelado que parecia ter sido escaneado de forma precária. Luís Carlos estava na foto, logo abaixo do título da manchete. Ele usava um terno e estava sorrindo.

Outra enxurrada de lágrimas tomou conta da face de Helena, que ficava cada vez mais confusa e horrorizada conforme lia as matérias que encontrou.

Ela se questionava o tempo todo sobre o que estava vendo, porque não era possível que aquilo estivesse acontecendo.

Porque caso fosse verdade, isso quer dizer que Helena esteve namorando um cara que morreu nos anos 80.

O caminho até a faculdade pareceu mais demorado do que gostaria. O táxi mal tinha parado o carro quando Helena saltou para fora, não sem antes jogar o dinheiro da corrida de forma apressada no colo do motorista.

A garota estava tão desnorteada que só conseguiu murmurar um obrigada para o motorista antes de adentrar a faculdade.

Uma parte de si não queria acreditar nas coisas que tinha descoberto, então ela caminhou até o prédio de artes cênicas. Ela conhecia alguns alunos por causa de Antonio e Marcelo.

Tentando conter o coração acelerado e as lágrimas, Helena parou na frente de uma roda de amigos que pintavam os rostos uns dos outros.

— Com licença, vocês conhecem esse cara? — Ela perguntou, estendendo na direção deles uma foto de Luiz que ela achara no Google. Os alunos se curvaram para a frente e apertaram os olhos para enxergar.

— Não, sinto muito. — disse um deles com um suspiro. Helena agradeceu e foi até o prédio administrativo. Ela conhecia uma pessoa que podia confirmar se havia algum Luís Carlos como seu namorado estudando ali, pois ela tinha acesso a lista de chamada de todas as turmas, inclusive a de artes cênicas. Era uma das assistentes da reitoria.

A morena tentou se recompor antes de ir falar com ela, mas era evidente que tinha algo errado em sua aparência, devido ao rosto vermelho e inchado pelo choro.

Helena sabia que era loucura o que estava vivendo, mas ainda queria acreditar que tudo aquilo não passava de um mal entendido.

Ela correu até a colega, que apesar de estranhar a avidez com que Helena queria aquela informação, resolveu ajudar.

— Bom, tem um Luís Carlos que estuda aqui de manhã, mas ele é careca. Não tem nada a ver com esse da foto que me mostrou. — Helena ofegou, sentindo o ar se esvair de seus pulmões.

— Tem certeza? — Ela fez que sim com a cabeça.

— Você está bem, Helena? Soube o que aconteceu com seu amigo... — disse a assistente, levantando a mão para acariciar o ombro de Helena, que se esquivou, caminhando de forma urgente até o lado de fora do prédio administrativo.

— Obrigada! — Helena gritou para a colega, saindo do prédio de artes cênicas enquanto puxava o celular do bolso para mandar uma mensagem de áudio para Marcelo.

— Marcelo, estou na faculdade, saindo do prédio de artes cênicas. Eu descobri que o Luís é um fantasma! Estou te mandando o link das matérias que achei. Sei que é loucura, mas acho que isso explica como Karina e Thayane morreram. Me encontre na biblioteca, por favor. — Ela soltou o botão e enviou o áudio, e mesmo sabendo que Marcelo não era o tipo de cara que costumava ignorar áudios de Whatsapp, resolveu reforçar a informação de sua localização digitando onde estaria e pedindo para ele encontrá-la. Abaixo, encaminhou os prints e links das matérias que viu.

O campus da faculdade não estava movimentado devido ao horário, o que deixava Helena aflita demais. Tinha medo de que Luís pudesse aparecer, então ela entrou na biblioteca, que parecia um lugar público e seguro. Marcelo logo visualizou as mensagens dela e disse que chegaria em quinze minutos. Helena começou a mexer os pés de forma impaciente enquanto esperava.

15 minutos era muito tempo.

Luís pegou as primeiras roupas que conseguiu encontrar no achados e perdidos. Uma calça jeans azul desbotada e uma camiseta preta suja de tinta. Ele não tinha tempo. Ali mesmo ele bagunçou o cabelo. Apenas precisava parecer diferente da foto no jornal e se desse sorte conseguiria encontrar Helena ainda na casa dela. Ele já estava na rua da universidade quando percebeu que não teria de ir até a casa de Helena. Marcelo e ela saíam agora e caminhavam na direção do que parecia ser o carro de Marcelo. Luís não perdeu tempo e correu até o Sedã prata. Atravessou a porta como fantasma e ficou no banco de trás esperando que os dois entrassem.

Marcelo se sentou no banco do motorista e colocou a chave na ignição. Helena com os cabelos bagunçados e com as olheiras maiores ainda se sentou no banco do passageiro. Ela estava com a expressão de quem havia chorado. Ela estava ofegante quando se sentou e ouviu Marcelo dizer:

— Fique calma Helena, agora ficará tudo bem. Meu pai terminou de construir um condomínio fechado e não há moradores ainda. — Marcelo girou a chave e o motor do carro começou a funcionar. — Eu tenho a chave de uma das casas. Podemos ficar lá e não terá como o desgraçado te achar de jeito nenhum. — Luís sorriu ao ser chamado de desgraçado e imaginou a ironia que era ele estar logo ali atrás enquanto Marcelo pensava estar seguro. Ele girou o volante todo e começou a sair da vaga que tinha estacionado. — Então ao chegar lá vamos contatar a polícia. Eu também acho que ele tem a ver com a morte dos nossos amigos.

— Policia? Mas ele é um fantasma! A polícia não pode nos ajudar. — disse Helena com a voz rouca. Luís viu no olhar de Marcelo pelo retrovisor que ele não acreditava naquilo.

— Sim, eu sei, mas ainda não quero descartar outras possibilidades, a polícia irá ajudar, mas antes é melhor saímos da vista dele o mais rápido possível. — Enquanto o carro passava pelas ruas do bairro que Luís passara a conhecer muito bem, ele pensava em como faria para matar Marcelo.


Quando chegaram ao condomínio de luxo, Luís viu Marcelo descer do carro para destrancar o portão e poderem entrar. Ele pensou se deveria pular para o banco do motorista e fugir de lá junto de Helena, mas resolveu esperar. Marcelo arreganhou o portão de aço e voltou correndo para dentro. Então o carro voltou a deslizar pelo asfalto agora do condomínio recém construído. Havia apenas casarões e mansões naquele condomínio. Então ele é rico, pensou Luís. Ele dirigiu por alguns minutos e parou em frente a uma casa menor do que as outras, mas ainda sim bem construída.

— Vamos Helena, tenho alguns mantimentos lá dentro e podemos comer um pouco.

— Não estou com fome. — Ela respondeu. Marcelo suspirou.

— Eu sei, mas você precisa comer algo, também precisa descansar. Vamos entrar. — Os dois então desceram do carro. Luís atravessou a porta como de costume e seguiu os dois pelo caminho de pedra entre o jardim esverdeado. Eles chegaram até a porta e Marcelo tirou o molho de chaves do bolso procurando a chave certa. — Você sabe que eu nunca confiei nesse cara, na verdade ninguém nunca confiou. — Ele disse. Helena suspirou.

— Eu estou desesperada e cansada, por que você quer jogar isso na minha cara logo agora?

— Não estou jogando na sua cara. Só estou dizendo. Sempre que eu desconfio de algum de seus namorados eles dão motivo para isso. — Ele encontrou a chave e colocou no buraco da fechadura enquanto Luís ouvia atentamente a conversa. — A polícia irá resolver tudo a partir de agora que estamos seguros e as coisas vão melhorar, mas da próxima vez que for se envolver com alguém e não quiser se machucar, vá atrás de alguém que você já conhece. — Luís viu Helena concordar com a cabeça. Não sabia ele se era por cansaço e para acabar logo com essa conversa ridícula ou se realmente concordava, mas Luís mordeu a mandíbula e sentiu vontade de socar ele ali mesmo, mas resistiu a vontade. Esse homem iria morrer, pois agora Luís tinha certeza que ele tinha a intenção de acabar com o amor entre ele e Helena. Mas precisava ser na hora certa.


Helena estava com medo. Apesar de se sentir um pouco melhor por estar com Marcelo, as palavras que ele usou mais cedo sobre suas escolhas amorosas não foram nada reconfortantes. Ela sabia que grande parte disso era causado pelo ciúme, já que Marcelo nunca soube esconder bem o fato de que era louco pela amiga, mas isso não queria dizer que Helena era obrigada a corresponder os seus sentimentos.

A polícia que Marcelo chamara não havia aparecido, e Helena começou a achar que Marcelo não havia entrado em contato com ninguém. Ela estava tão aflita com tudo o que estava acontecendo que não queria deixar seu amigo sair de perto dela. Não sabia se Luís estava por perto, se os observava naquele momento, mas não se sentia segura e temia pela segurança do único amigo que havia lhe restado.

A confusão, a tristeza e o medo de Helena quase a consumiam. Pensar que estava se relacionando com um psicopata que já morreu era muito para sua cabeça. Era difícil conceber a ideia de que havia se apaixonado por alguém que não existia mais.

— Eu preciso ir ao banheiro. — Marcelo se levantou do sofá e Helena se levantou logo em seguida, a urgência e o nervosismo transpareciam em seus poros.

— Está tudo bem, estamos seguros aqui. — Ele segurou os pulsos da amiga e a encarou com firmeza. — Não precisa vir atrás de mim. Seria muito estranho se você me visse fazendo xixi.

— Então eu vou ficar atrás da porta.

Helena estava irredutível, Marcelo pôde perceber. Ele soltou um suspiro, mas não a contestou.

Enquanto Marcelo fazia suas necessidades, Luís o encarava em sua forma etérea. Ele estava enojado, mas precisava mata-lo naquele momento. O ódio o consumia e o queimava por dentro tanto quanto o amor que sentia por Helena. Ele era um obstáculo para o amor dos dois e o único que havia restado do grupinho idiota de amigos de sua amada.

Só haviam duas ocasiões que o faziam se sentir vivo novamente: Quando ele via Helena e estava com ela e quando sentia raiva. O amor e o ódio eram tão intensos dentro dele que se inflamavam constantemente e seu coração parecia pulsar tanto de raiva quanto de alegria. Agora, a raiva o dominava. Luís se aproximou do rapaz e em sua forma corpórea agarrou o pescoço do Marcelo enquanto ele terminava de abotoar a calça.

Porém, Marcelo era forte e deu-lhe uma cabeçada que fez Luís cambalear para trás. Marcelo chutou a virilha do fantasma, que ficou ainda mais enraivecido do que já estava. Helena ouviu a movimentação do lado de fora e abriu a porta do banheiro, encontrando seu namorado fantasmagórico desaparecendo antes que Marcelo pudesse acertá-lo mais uma vez.

— Que merda é essa? — O pânico na face de Marcelo fez Helena se dar conta de que agora ele acreditava totalmente na história do fantasma. A ficha de Helena também havia caído naquele momento, pois até então, ela ainda tentava se convencer de que Luís não era o mesmo das reportagens que lera.

— Nós temos que sair daqui! — Ela puxou Marcelo para fora do banheiro, mas Luís, armado com uma faca, apareceu na frente dele já enfiando a faca na barriga do Marcelo. Ele se esquivou, e a faca lhe acertou de raspão na costela.

— MARCELO! — Helena gritou, puxando Marcelo para o outro lado do corredor.

— Eu estou bem. — garantiu ele, observando a camiseta furada e um filete de sangue que escorria. Helena estava assustada e horrorizada, mas continuou correndo ao lado de Marcelo, que foi puxado violentamente para trás pela camiseta.

— Por que está fazendo isso? — indagou Helena para então seu ex namorado fantasma. Lágrimas vertiam de seus olhos, e ver que ele era o causador delas não o deixou nem um pouco entristecido. Luís ainda estava tomado pelo ódio, e via Marcelo somente como um mero obstáculo que o separava de sua amada.

— Por você, Helena. Somente por você. Você não vê? Eu te amo! — Os olhos de Luís emitiam um brilho doentio. Seu rosto pálido, o ar gelado, tudo a sua volta parecia errado e desconexo, e Helena sentiu medo. Ela não sabia como combater aquilo e nem se poderia se livrar disso. — Tudo o que eu fiz, foi para que pudéssemos ficar juntos. Seus amigos nunca compreenderam o que nós temos. Eles precisavam ser eliminados.

— Meus amigos eram importantes para mim. Eu os amava! E você tirou a vida deles. Você não tinha esse direito!

— Está zangada comigo agora, mas depois que tudo isso acabar você vai entender, Helena. — Marcelo se debatia como um gato fugindo da água, mas apesar de seus esforços, Luís também era forte. Ele desferiu um golpe certeiro na barriga de Marcelo com a faca. Helena tentou impedir a segunda investida, mas Luís a chutou para longe.

Marcelo levou a segunda facada bem no estômago, a terceira e a quarta, mas ainda conseguiu se desvencilhar de Luís com um chute na virilha. Fraco e completamente ensanguentado, ele se arrastou pelo chão e com a ajuda de Helena, ele conseguiu se levantar, mas logo parou quando se deu conta de que não iria conseguir. Suas tripas pularam para fora e Helena tentou coloca-las para dentro de novo com as mãos trêmulas.

— Não posso continuar. — murmurou Marcelo, com os lábios ensanguentados.

— Me desculpe...

— Eu sempre te amei, Helena. — Ele segurou a lateral do rosto da amiga com carinho e abriu um sorriso manchado de sangue. — Apesar do que eu disse antes, a culpa não é sua.

— Por favor, precisamos continuar. — Ela pediu, já sem forças para levanta-lo. Pelo canto do olho, viu que Luís se aproximava. Helena deixou lágrimas caírem em cima de Marcelo. Ela estava em negação. — Por favor... — pediu, desesperada.

— Não há mais tempo para mim. Mas para você sim. Sobreviva. — Os olhos de Marcelo se tornaram sem brilho e a vida deixou seu corpo no instante seguinte. Helena se debruçou sobre o corpo ensanguentado do melhor amigo sem se preocupar com as tripas do lado de fora. Ela não tinha mais forças para nada, estava sozinha e sem amigos. Por sua culpa, todos eles estavam mortos.

Luís deu uma gargalhada gutural e sinistra e Helena levantou os olhos cansados para ele. 

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