𝗖𝗮𝗽𝗶́𝘁𝘂𝗹𝗼 𝗜𝗜𝗜 - 𝖠 𝖤𝗌𝗍𝗋𝖺𝗇𝗁𝖺 𝖭𝗈𝗂𝗍𝖾.
Eveline estava passando as compras do último cliente no balcão, quando o rosto de Dona Rose veio a sua mente. Ela estava tão desapontada com a falta de resposta de Eveline, estava absurdamente ansiosa para ter uma resposta, mas a garota só percebeu depois, depois que ouviu aquela voz em sua mente.
Ainda sentia seu estomago doer, por causa do estresse, e por causa da fome. Ela sorriu se despedindo do senhor que pegou as sacolas. Respirando profundamente, olhou o relógio vendo que já era hora de fechar.
A porta da frente se escancarou.
— EVELINE!
Ouvir aquela voz fez Eveline arrepiar.
A garota olhou assombrada para a porta de vidro do estabelecimento. Um rapaz jovem, de cabelos curtos e negros olhou para Eveline como se vê-la fosse um alívio.
— Oh, minha, doce, doce, Eveline! Soube apenas a pouco que você se encontrava aqui — Ele se aproximou de Eveline se apoiando no balcão. — Oh, Eveline, aquela que guia meus tristes dias, como não ouvi sua música? Quando sou o mais apreciador de sua bela arte...
Ela fechou os olhos com força, como se tentasse esquecer que ele parecia em prantos. Era muito constrangedor para si, ter que ouvir esses poemas tão bregas e teatrais.
— Armand...
— Espere, minha Eveline, tenho que dizer, não a nada melhor do que ver que estás bem!
— Eu agradeço, Armand — Ela tirou uma mecha do rosto — Mas estamos fechando, poderia se retirar?
Com a boca formando uma espécie de "O", ele concordou vagarosamente, antes de se virar uma vez mais para ela.
— Esperá-la-ei, na Leão Rubro — Sorrindo largamente, saiu.
Eveline sentiu o peso sair de seus ombros. Armand, era um admirador dela, muito exibicionista, que sugava cada pingo de respeito e serenidade que habitava nela.
Conheciam-se a anos, e bom, ela preferia a época em que Armand era tímido demais para se confessar. Agora ele andava vestido com roupas de burguês falsificadas, de mangas bufantes e chamativas. Sem contar que sempre que se encontram, ele tinha de fazer uma declaração em público, definitivamente cafona.
Thomas saiu mais cedo. Havia muitos clientes a serem atendidos, então Eveline pediu para atendê-los no lugar do homem, já que ele aparentava estar demasiadamente cansado.
Eveline trancou o caixa, e caminhou até a porta de vidro trancando-a. A lua já estava no céu quando ela se alongou se preparando para começar a caminhada de retorno.
— Hoje foi bem lucrativo... — sussurrou.
Tentando manter os olhos abertos, Eveline começou a andar em direção a saída da aldeia. Sua bolsa pesava em seu braço, naquele momento um certo arrependimento, de ter ficado até tarde, a assombrava.
Estava tudo bem silencioso, com exceção da música baixa que vinha das tavernas e hospedarias um pouco distantes. Eveline ouviu passos por perto, mas manteve sua atenção ao caminho que, quanto mais perto do bosque estava, mais escuro ficava.
Ao encarar o chão, entediada, ela percebeu que uma luminosidade amarelada se aproximava dela. Eveline olhou para trás.
— Boa noite.
Seus olhos arregalaram ao verem um par de olhos violetas encarando-a. Duas mechas brancas caíam em cada lado de seu rosto, enquanto o resto do cabelo estava preso em um meio coque, ele vestia um casaco pesado para o frio da noite e sua barba havia crescido, minimamente, mais.
— Bo-boa noite...
Ele seus finos lábios exibiram um sorriso de canto.
— Desculpa a intromissão, mas você é gaga?
Eveline ficara estática por algum tempo tentando assimilar a pergunta e aquela voz aveludada, mas então focou na pergunta e, só assim, esqueceu da voz. Os segundos de mágica, que ela sentiu, voaram junto a brisa que acariciou sua pele exposta.
— Que? — Ela franziu o cenho, perplexa.
— Acho que me enganei — Soltando um riso baixo, ele desviou o olhar — Vejo que iria entrar no bosque sozinha nessa escuridão, permita-me acompanhá-la, é muito perigoso andar por aí a esse horário.
Estava confusa, primeiro é parada pelo homem que viu na clareira na noite anterior, depois ele questiona se é gaga, e agora quer acompanhá-la. Muitas informações foram dadas em menos de cinco minutos. Eveline o olhou espantada.
— Quem me prova que o perigo não é o senhor?
— Não irei fazer mal algum a senhorita — olhou-a serenamente — Seus amiguinhos secretos podem confirmar.
Algo se agitou dentro de seu peito. Como ele sabia de seus amigos? Ela olhou seu rosto tentando esconder o pânico.
— Como você...?
— Do mesmo jeito que você lê as pessoas, eu leio você, apenas não preciso de música para isso. — Ele suspirou e ajeitou a lamparina em sua mão — Posso acompanhá-la? Se não gostar de minha companhia eu dou meia-volta.
Quando olhou diretamente nos orbes violetas, pôde jurar que eles cintilaram. Eveline sentiu um aconchego abraçá-la. Ela bocejou.
Os dois começaram a andar em direção ao bosque.
No início o silêncio foi foco de ambos. Sem conversas, sem constrangimento. Mas algumas perguntas coçavam na garganta de Eveline, e ela deixou escapar a primeira.
— Como sabe de meus...amigos? — Ela olhou-o de relance.
Era essencial para a garota ter essa resposta, afinal, seus amigos estavam expostos ao desconhecido, naquele momento.
Depois de uma curta espera ela ouviu a voz aveludada soar, e aquilo acariciou seus ouvidos.
— Digamos que eles também são meus amigos.
Ela se virou para ele.
— Você consegue entendê-los também?
— Não como a senhorita, mas o suficiente para terem uma certa lembrança de que eu os ajudei e eles me ajudaram.
Era tão estranho. Leander, como assim se nomeou, era estranho e silencioso, mesmo que respondesse suas perguntas parecia muito maluco.
Eveline deu alguns passos mais, em completo silêncio pensando no que deveria questionar. Mas pensou tanto que, nos finalmente, ela resolveu não falar nada elaborado demais.
— De onde veio? — O silêncio a seguir foi um tanto constrangedor— Nunca te vi pelas redondezas.
— De onde vim?! — Ele parecia estar tentando ser enigmático — Vim de onde você precisa estar preparada para saber da existência.
O olhar feminino recaiu sobre ele indignado.
Você é um maluco.
Ela sussurrou tão baixo que sua voz quase se misturou com o roçar dos pés no chão.
— Não sou maluco, apenas temos realidades diferentes. — Seu tom era tão calmo que deixou Eveline arrepiada.
— Já que não posso saber de onde veio, diga o porquê veio! — Ela segurou suas próprias mãos.
Leander pensou muito antes de suspirar como se estivesse cansado. Ele trocou a lamparina de mão, e olhou para o céu. Eveline percebeu que ele tinha o maxilar marcado, e seu rosto tinha um perfil tão bem desenhado que parecia uma pintura.
Ela piscou.
— Leander!
— Desculpa, me perdi em pensamentos — Ele riu e coçou a cabeça — repita, por favor.
— Por que você veio?
Novamente seu olhar foi vago. Eveline ainda sentia dúvida em seu espírito. Olhando-o a espera de resposta, abriu a boca pronta para chamá-lo novamente.
— Vim em busca de uma musicista.
Seu coração disparou.
— Vai montar uma orquestra? Ou algo do tipo?
Ele a olhou sério.
— Preciso dela para cumprir uma profecia.
Eveline estranhou o rumo que a conversa estava levando.
— Foi previsto... — Começou ele pigarreando — que uma jovem mulher musicista ajudaria o príncipe Arkan a acabar com o Despedaçador de Estrelas.
Parando abruptamente de andar, Eveline abriu a boca, mesmo sem palavras, e olhou ao redor rindo.
— Tá, então vai me dizer que você veio de um mundo mágico em busca de uma musicista que muito provavelmente é tão habilidosa que tem poderes? Hum, eu sou idiota, agora? — Seu riso foi maldoso.
Leander ficara, sério.
— Não estou brincando!
Ela estava muito em dúvida entre achar que ele realmente era louco, ou se ela tinha virado um alvo de alguma gozação muito "engraçada".
— E eu sou uma princesa que veio de um país distante para tentar viver a vida de camponesa. — Ela começou a andar rápido.
— Eveline, eu não tenho o porquê ficar contanto lorotas por aí, tenho mais coisas a fazer do que isso...
— Ah, então você é o príncipe sei-lá-das-quantas? — Ela parou para encará-lo — Pois bem, está falando com a musicista errada.
— Eveline!
— Volte para a aldeia.
Leander franziu o cenho.
— Não...
— Volte para a aldeia, agora! — Ela começou a marchar, revoltada, pelo caminho que seguia — se não quer contar o porquê veio, não precisa criar histórias mirabolantes sobre profecias! Seu maluco.
Ela disparou seguindo em frente tentando chegar em casa o mais rápido que conseguia. Pela primeira vez ela entendeu o porquê sua mãe sempre foi tão insistente de ela estar acompanhada a noite. Percebeu que, malucos como Leander, podiam existir.
Ela sentiu seu pulso ser agarrado bruscamente, mas não o suficiente para machucá-la. O mesmo sentimento de anos atrás, quando achou que seria morta por um animal selvagem, na Clareira do Lago Espelho de Prata, tomou-a.
Leander a olhava sério.
O interior de Eveline se acalmou quando ela sentiu, certo medo e desespero emanar dele. Ela não sabia se ele era capaz de manipular sentimentos, mas ele parecia estar desesperado para que ela acreditasse nele.
— Eu jamais mentiria para você.
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