2. capítulo trinta e oito (2)

ㅤㅤㅤAs paredes pareciam se fechar contra eles, e a cozinha pequena era três vezes menor. Sua presença era sufocante. Alice caminhou até a pia, em passos pesados. Os olhos negros estavam atentos, fixos nela como um predador observando sua presa.

ㅤㅤㅤAlice apoiou as mãos na borda da pia, apertando o metal frio enquanto tentava manter a respiração estabilizada. Ela se sentia zonza o suficiente para começar a se perguntar se Adam havia colocado algo em sua bebida, mas era apenas o nervosismo crescente. Por que ele simplesmente não ia embora?

ㅤㅤㅤAdam se aproximou, o calor da sua presença queimando contra as costas de Alice muito antes dele se inclinar em sua direção. Ele pressionou a testa contra a cabeça dela, a respiração quente fazia arrepios involuntários ao percorrer sua nuca. Os dedos dele roçaram levemente no braço dela, subindo devagar até o ombro. Seu toque era delicado, carregado de intenções que ela não queria descobrir.

ㅤㅤㅤAlice apertou a borda da pia com mais força

ㅤㅤㅤ― Você está tensa ― Adam comentou em um tom divertido, a voz baixa e sedutora soprando em seu ouvido. ― Está com medo?

ㅤㅤㅤAlice fechou os olhos por um momento, tentando controlar a montanha-russa que sua mente havia se tornado. Ela sentia o corpo formigando por conta do vinho, mas também havia nervosismo, raiva e o desgosto.

ㅤㅤㅤAdam afastou seu cabelo, jogando-o por cima do ombro e encostando os lábios em sua orelha. As mãos grandes correram por seus braços lentamente, parando sob a suas e ele apertou os dedos, segurando as mãos dela.

ㅤㅤㅤSeus corpos estavam colados, e aquela proximidade era sufocante. O calor dele, a colônia masculina invadindo seu olfato, e a respiração pesada em seu ouvido fazia sua cabeça girar.

ㅤㅤㅤ― Não pode me ignorar para sempre, querida. Eu consigo ver. ― ele murmurou em um tom rouco, fazendo o coração dela disparar. ― Uma hora ou outra você vai ceder, e não estou falando apenas disso.

ㅤㅤㅤ― Nunca ― ela rebateu com a voz baixa, abrindo os olhos e vendo algo brilhar em sua visão periférica.

ㅤㅤㅤ― Não? Então por que você ainda está aqui, deixando isso acontecer?

ㅤㅤㅤEle tem razão.

ㅤㅤㅤAlice respirou profundamente, permitindo com que o cheiro dele fizesse cócegas em seu cérebro. O formigamento causado pelo vinho pareceu se multiplicar e a mente ficou turva.

ㅤㅤㅤEla inclinou a cabeça para o lado, proporcionando uma vista limpa sobre seu pescoço. Foi um movimento instintivo, causado pela tensão daquela proximidade, mas ela só precisava ser esperta o suficiente para usá-lo ao seu favor.

ㅤㅤㅤAs mãos dele soltaram as dela, deslizando até sua cintura. Com um movimento firme, ele a puxou mais para perto. A única barreira entre eles eram suas roupas.

ㅤㅤㅤAdam estava no controle, e ele sabia disso.

ㅤㅤㅤ― Viu? ― Ele murmurou, os lábios roçando em seu pescoço enquanto falava. ― Você pode fingir, mas, no fundo, todos sabemos que não consegue.

ㅤㅤㅤ― Talvez tenha razão ― Alice disse em meio a um suspiro pesado. ― Talvez eu realmente sinta algo por você.

ㅤㅤㅤ― Eu sei ― Um sorriso se alargou, expondo a fileira de dentes afiados que roçavam em sua pele. ― Você não consegue me enganar, Alice.

ㅤㅤㅤAs mãos dele invadiram sua camisa e os dedos frios acariciavam a pele quente de sua cintura. Alice estremeceu com o toque inesperado, sentindo a raiva ferver dentro dela, mas deixou que Adam interpretasse da forma que fosse mais vantajosa para ele.

ㅤㅤㅤMas Adam não sabia que a mente dela estava longe daquele momento, sua visão focando no brilho ao lado da pia. A faca afiada sussurrava coisas para ela, seduzindo-a mais que o homem que a tocava.

ㅤㅤㅤ― Eu vou resolver isso. ― Ele apertou sua carne com força, forçando-a a se virar. Os dedos apoiaram o queixo dela, fazendo ela erguer os olhos para ele.

ㅤㅤㅤAli, na luz fraca da cozinha, as sombras consumiam metade de sua face. O sorriso de Cheshire se alargando até rasgar sua bochecha. Alice prendeu a respiração, engolindo seco.

ㅤㅤㅤ― Depois disso ― Adam murmurou, afastando uma mecha do cabelo dela e colocando-a atrás da orelha. ― Vamos seguir em frente, você e eu. Uma nova vida. Longe daqui... Não é como se você tivesse outra escolha, afinal.

ㅤㅤㅤAs palavras dele eram amargas, incisivas, e Alice sentiu o sangue pulsar em seus ouvidos. A raiva queimava dentro dela, atravessando suas veias como um veneno que preenchia cada célula de seu corpo. Ela queria gritar, afastá-lo, mas sabia que qualquer demonstração de hesitação poderia ser fatal.

ㅤㅤㅤEle estava no controle.

ㅤㅤㅤOs olhos azuis encontraram com os dele, frios e escuros, impossíveis de decifrar. Adam se aproximou, colando suas testas em um gesto íntimo, e os narizes roçaram levemente um no outro.

ㅤㅤㅤ― Você não pode escapar de mim, Alice Taylor. ― Ele sussurrou, a voz baixa e rouca saindo como fumaça e penetrando seus pulmões.

ㅤㅤㅤTalvez, apenas talvez, ele estivesse certo.

ㅤㅤㅤSem aviso, Adam roçou os lábios contra os dela. O toque foi breve, vindo de surpresa. Os olhos azuis se arregalaram, confusos, e Alice não soube dizer o que passou por sua cabeça.

ㅤㅤㅤ― Não precisa mais lutar. ― Adam disse, olhando no fundo de seus olhos, e antes que ela pudesse respondê-lo, ele a beijou de verdade.

ㅤㅤㅤO beijo foi como uma explosão, intenso, onde o controle que ele exercia estava presente em cada movimento. A forma em que ele deslizou a mão por seu pescoço, pressionando o local por alguns segundos antes de segurar sua nuca, mostrava suas intenções verdadeiras.

ㅤㅤㅤAlice sentiu o gosto adocicado do vinho em sua boca, mas havia algo mais que a fez lutar contra a vontade de ceder. Adam estava tão convencido de sua vitória que não percebeu quando ela esticou o braço, tateando o balcão.

ㅤㅤㅤAs mãos fortes a puxavam para si, como se pretendesse unir seus corpos. Alice tinha dificuldades para respirar, mas não queria interrompê-lo. Sua cabeça estava aérea, e ela começava a sentir o corpo pulsando contra o dele. Abriu os olhos apenas um pouco, para ter certeza que ele continuava distraído.

ㅤㅤㅤA ponta dos dedos tocaram o cabo da faca, fazendo um calafrio percorrer seu corpo em meio ao calor. Um gemido involuntário escapou de seus lábios. Ele se afastou, surpreso. Seus olhos brilhavam de uma forma ameaçadora, fazendo Alice se perguntar se ele havia percebido algo. Mas Adam abriu um sorriso vitorioso, acariciando o rosto dela.

ㅤㅤㅤ― Adoro ver você se contorcer por minha causa ― ele disse. ― Mas viu como é mais fácil quando você não luta?

ㅤㅤㅤAlice inclinou a cabeça para trás, para poder vê-lo melhor e deixou o sorriso dele se refletir nos próprios lábios. O enigmático sorriso de Alice Taylor era quase um cúmplice. Ela passou os braços ao redor do pescoço dele, inclinando-se mais para perto e apoiando a cabeça em seu peito rígido. Adam não percebeu a faca escondida na manga do casaco.

ㅤㅤㅤ― Acho que, apesar de tudo... ― A voz dela era um sussurro doce, os dedos acariciando os cabelos negros em sua nuca. ― Você sempre teve razão.

ㅤㅤㅤEle começou a responder, mas a frase morreu em seus lábios quando Alice moveu a mão rapidamente, cravando a faca na lateral de seu corpo, com força.

ㅤㅤㅤAdam arfou, o som cortando o ar entre eles, enquanto tentava processar o que havia acontecido em meio ao choque momentâneo. Alice continuou encarando, o coração batendo descontroladamente, mas não pestanejou. Ela queria vê-lo esboçando uma emoção verdadeira, queria que ele fosse apenas um humano naquele momento.

ㅤㅤㅤMas, ao invés disso, Alice assistiu Adam se transformar em algo ainda mais aterrorizante. O rosto dele se contorceu em uma fúria crua, os olhos negros se tornaram ainda mais escuros, assemelhando-se muito ao um tubarão seguindo o rastro de sangue.

ㅤㅤㅤ― Eu vou te matar agora. ― Adam rosnou, fechando as mãos em torno do pescoço dela.

ㅤㅤㅤAlice se debateu, lutando para se soltar das garras, mas era inútil. Adam era naturalmente mais forte, e a fraca cravada em seu corpo bombeava a adrenalina por suas veias, fazendo suas feições parecerem animalescas. A respiração pesada, os dentes expostos e a forma que ele alternativa o olhar entre seus olhos.

ㅤㅤㅤEla sentia seu coração prestes a explodir e sua visão ficar escura quando ele a ergueu da altura de seus olhos. O ar não conseguia chegar até seus pulmões. As mãos pequenas tentavam afastá-lo, socando e o arranhando, mas ele não se moveu.

ㅤㅤㅤ― Você vai aprender, minha querida ― ele rosnou entre os dentes, o sorriso era mais predatório do que vitorioso. ― Isso não é o suficiente.

ㅤㅤㅤO mundo começava a escurecer, mas em meio ao terror, os dedos encontraram o cabo da faca novamente e ela se agarrou nele, sendo sua última chance. Ela arrancou a lâmina do corpo e a cravou de volta em outro ponto.

ㅤㅤㅤAdam grunhiu, afastando-se instintivamente, e Alice viu a oportunidade que precisava. Ela puxou a faca novamente. Uma parte muito pequena de seu cérebro, percebendo o líquido pegajoso em quente que sujava seus dedos.

ㅤㅤㅤSentindo a adrenalina correr por seu corpo como eletricidade, Alice disparou para longe dele, correndo pelo corredor enquanto ouvia os passos desajeitados dele vindo atrás. Mas o problema era: ela continuava encurralada do mesmo jeito.

ㅤㅤㅤ― Não tenha medo, pode gritar meu nome o quanto quiser ― Adam disse. ― Mas quando a ajuda chegar, já vai ser tarde demais.

ㅤㅤㅤAlice agarrava-se na faca com todas suas forças, respirando com dificuldade, ainda sentindo as mãos dele em seu pescoço. Ela observou a Pessoa de Sombra que a seguia parar no começo do corredor, bloqueando a saída. Era como um filme de terror, mas muito pior.

ㅤㅤㅤO sangue escuro começou a formar uma poça onde ele estava parado, e Adam apoiou a mão na parede para manter o equilíbrio antes de começar a andar em sua direção.

ㅤㅤㅤ― Vai embora, Adam ― Alice guinchou, sentindo o pavor escapar em suas palavras.

ㅤㅤㅤMas Adam não parou.

ㅤㅤㅤOs olhos negros fixos nela com uma determinação que nem o sangue que perdeu seria suficiente para apagar, o sorriso maníaco em seus lábios enviava calafrios por sua espinha. Sem perceber que havia se movido, Alice bateu as costas contra a janela do corredor.

ㅤㅤㅤApertou a faca com mais força, sentindo o cabo escorregadio. Adam parou a menos de um metro dela, a respiração pesada fazendo os ombros subirem e descerem. Em nenhum momento, ele parou de sorrir.

ㅤㅤㅤ― Você não pode mais fugir, Alice ― ele zombou. ― Não se preocupe, vou garantir que viva o bastante para sentir cada segundo de dor.

ㅤㅤㅤAlice engoliu seco, sentindo os dedos ficarem dormentes ao redor do cabo. Os batimentos ecoavam em seus ouvidos, e a cada batida o ambiente parecia diminuir. A respiração ofegante era acompanhada de risos baixos, abafados. Amy?

ㅤㅤㅤAdam estava mais perto, o rosto era mal iluminado pela luz que vinha de fora, mas o suficiente para ela ver o brilho de suor que cobria sua testa. Seu sorriso se alongou de forma grotesca até que os dentes pontudos saíssem de sua boca. No lugar dos olhos dele, ela conseguia enxergar apenas um abismo.

ㅤㅤㅤA mão ergueu a faca diante de seus olhos, mas seu corpo não parecia ser controlado por ela mesma. As risadas aumentaram, cada vez mais distorcidas. E, antes mesmo que percebesse, ela viu a lâmina cortar a distância, deixando para trás um rastro prateado desenhado no ar. Era como um espectro, tremulando, antes de se dissipar como fumaça.

ㅤㅤㅤAlice não ouviu o impacto contra a carne, abafado pelas risadas em sua mente. Mas ela viu o corpo arquear com o golpe, os olhos arregalados exibindo uma mistura de choque e dor. Adam conseguia sentir aquelas coisas?

ㅤㅤㅤPor um instante, o tempo congelou na quietude. Os olhos azuis corriam pelo rosto do homem buscando uma familiaridade perdida, mas não encontrou. Eles se encaravam, estáticos, ambos absorvendo o que havia acabado de acontecer. O sangue quente escorria pela lâmina, tingindo mão dela, mas Alice não registrava aquilo.

ㅤㅤㅤTudo estava em silêncio.

ㅤㅤㅤIsso não pode ser real.

ㅤㅤㅤAdam cambaleou para trás, levando a mão ao peito e olhando para onde a faca se sobressaiu em sua blusa. Os olhos negros encontraram com os seus, e o rosto se contorceu em uma expressão de raiva. Ele estendeu as mãos em sua direção, determinado, porém a quantidade de sangue aos seus pés era preocupante.

ㅤㅤㅤ― Alice... ― A voz saiu baixa.

ㅤㅤㅤCom um último esforço, Adam se lançou contra ela, o corpo pesado esmagando-a contra a janela. O impacto fez ela soltar o ar.

ㅤㅤㅤ― Você vai para onde eu for ― ele sussurrou em seu ouvido. A respiração dele estava ofegante, saindo com dificuldade, e suas palavras saíam cortadas. ― Você é minha, Alice.

ㅤㅤㅤO clique do vidro nas suas costas soou ao ser aberto, e seu tronco foi lançado para trás enquanto a borda da janela era pressionada contra sua coluna, impedindo-a de cair. Alice emitiu um grunhido apavorado, tentando se agarrar nele. O cheiro metálico do sangue e suor preenchia suas narinas. A brisa noturna assanhava seus cabelos e ela sentia os respingos do sereno frio.

ㅤㅤㅤNão posso morrer aqui.

ㅤㅤㅤEla se debatia, tentando lutar enquanto ele continuava empurrando-a para fora. Adam pressionou o rosto dela com uma das mãos, cobrindo a boca e o nariz, forçando sua cabeça para baixo e a impedindo de respirar.

ㅤㅤㅤEu não posso morrer.

Seus olhos encontraram-se com os dele, cheios de ódio. Finalmente, ela viu o que nunca imaginou: a humanidade brilhar fracamente no meio ao ébano. Adam queria destruí-la, mas, ao mesmo tempo, era a força dele que a impedia de cair. A pressão no rosto dela causada pela mão do homem era, ironicamente, o único ponto de equilíbrio do mundo.

ㅤㅤㅤEu preciso conhecer meu bebê.

ㅤㅤㅤEm um ato desesperado, Alice sentiu a adrenalina bombardear suas veias e deu um impulso para frente, empurrando-o com o próprio corpo. Adam vacilou por um momento, os pés escorregando no chão. Um pequeno espaço surgiu entre eles, permitindo que Alice se abaixasse.

ㅤㅤㅤVai.

ㅤㅤㅤSe.

ㅤㅤㅤFoder.

ㅤㅤㅤAdam se virou parcialmente, o olhar confuso e a postura denunciando sua fraqueza; Alice se levantou rapidamente, usando toda força que conseguiu reunir para empurrar seu peito. Ele tropeçou, sem conseguir encontrar equilíbrio. As mãos se agitaram no ar, buscando algo para se agarrar.

ㅤㅤㅤ― Alice! ― Ele cuspiu seu nome em uma mescla de fúria e pânico. ― Não!

ㅤㅤㅤAdam cruzou o limite da janela aberta, os olhos negros arregalados e assustados, a boca aberta em um grito que nunca soou. Por um instante, tudo pareceu seguir em câmera lenta. Então, de uma hora para outra, ele não está mais lá.

ㅤㅤㅤEram quatro andares. A queda foi rápida.

ㅤㅤㅤDo lado de fora, o som do impacto foi um ruído abafado e úmido, o estalo de sacolas de lixo sendo esmagadas sob o peso do homem.

ㅤㅤㅤAlgumas latas rolaram pelo beco.

ㅤㅤㅤUm gato miou longe, assustado com o barulho repentino.

ㅤㅤㅤE Alice permaneceu paralisada, os dedos ainda estendidos na direção da janela, esperando que Adam os segurasse.

ㅤㅤㅤMas ele não estava mais lá.

ㅤㅤㅤMas ele não está mais aqui.

ㅤㅤㅤIsso não pode ser real, pode?

ㅤㅤㅤNão, não, não.

ㅤㅤㅤAlice deu um passo para trás, mas os sapatos escorregaram no chão liso e ela perdeu o equilíbrio, caindo sobre o rastro de sangue que tingia suas mãos e roupas. Atordoada, ela se arrastou até a parede, puxando os joelhos contra o peito e se sentando de forma desajeitada.

ㅤㅤㅤA adrenalina deu lugar a fraqueza pesada e o tremor se espalhou por seu corpo com espasmos involuntários. As lágrimas irromperam repentinamente, quentes e pesadas, e o soluço estava engasgado na garganta. Ela ergueu os braços, pressionando os ouvidos com as mãos em uma tentativa de silenciar um mundo já silencioso.

ㅤㅤㅤAlice não sabia se estava chorando por ele, por ela mesma, ou pelo que havia se tornado. Mas, de uma coisa ela tinha certeza.

ㅤㅤㅤEla estava livre.

https://youtu.be/0LwcvjNJTuM

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