"Memories"


             — Não. — Lara dirigiu os olhos para o rosto dele, levantando um pouco o queixo e mudando completamente de semblante. — O contrato só é válido após o casamento. Até lá, não tem qualquer poder ou direito sobre mim. Eu decido ainda e, não. Você não vai foder comigo.

O Diabo passou a língua pelos lábios, ficando claramente excitado pelo desafio a que era imposto naquele momento. O quanto adorava aquela versão parada na sua frente, só ele sabia, mas só pela forma como a própria respiração se descompassou, percebeu que o sangue agitado não o obedecia e corria tresloucado por suas veias.

— Tem certeza disso, Paixão? Quer apostar que antes dessa semana acabar vai estar nos meus braços? Tentando sugar toda minha energia vital, e não só... — Konstantine desceu os olhos azuis num gesto demorado, parando para observar o pescoço desnudo sem nenhum sinal do colar com o dente do marfim. — Tem coisas que simplesmente nunca mudam.

— Me leve embora agora. Cansei do seu espetáculo, preciso trabalhar. — Ela se apressou e desviou os olhos que rastrearam o chão antes de se curvar para apanhar a camisola que vestiu num único movimento rápido, aflito e quente.

— E o que mais?

— Quero que me leve para ver Martino. — Passou as duas mãos para alisar o cabelo na parte da frente, ciente de que alguns fios estariam soltos.

— E quer ser levada pela carruagem do papai noel junto das renas mágicas ou prefere um botão de teletransporte? — Cruzou os braços sem abandonar o ar sério de quem estava incrédulo por ter que escutar tamanhas exigências. — A única coisa que vai fazer é sentar sua bunda na cadeira do seu escritório até eu chegar, entendeu? Nada de nenhuma artimanha, Paixão, ou eu deixarei que sinta como é ser atingida por uma bala, e se for no meio da testa não sei sequer se tenho lágrimas para chorar.

Lara revirou os olhos, sem conseguir parar de morder o canto dos lábios enquanto procurava pela bolsa. Seu corpo parecia ter o dobro do peso só pela forma como sentia dificuldade em se movimentar direito, tal como se ele tivesse roubado todo o oxigénio daquela sala só pela maneira como se prostrava com arrogância a desenhar seu maxilar.

— Outra coisa, arrume a cama direito porque vamos dormir juntos esta noite.

— Não seria mais inteligente ficar num lugar onde não tenham acesso fácil para nos descobrir?

Não. — Ele sussurrou e levantou uma sobrancelha. — Quero que venha até mim. Estou me exibindo e o ego dele não irá perdurar até me enfrentar.

A Designer abriu a boca, mas o celular começou a vibrar forte dentro da bolsa. Correu o fecho com vagar e retirou de lá o objeto de última geração, quase julgou ser Andreza, no entanto o sobrolho grosso se uniu no centro da testa. Era normal receber ligações de números estranhos por causa dos clientes, mas não podia acreditar que em pouco tempo Martino estivesse recuperado.

— Algo está errado... — balbuciou, olhando da tela para o rosto de Konstantine que moveu o queixo para frente numa ordem expressa para que atendesse a chamada. Ela engoliu em seco, receando o pior. Atendeu em viva voz. — Alô... Martino?

Lara Paixão?

— Quem é?

Hummm... Quero que saiba que não tenho nada contra você, nadica de nada. Negócios são negócios, e apenas estava cumprindo um trabalho requisitado por um cliente. Só que agora o jogo virou, pois não? O que uma mera designer de vestidos de noiva poderia fazer para conseguir sobreviver a assassinos profissionais? — A voz masculina era carregada como uma nuvem cinzenta que ameaçava inundar tudo com facilidade. — Contratar um assassino.

— Angel? — Ela perguntou e não demorou a perceber que tinha dado um passo em falso quando tudo ficou num silêncio crucial e Konstantine a aniquilou só com um olhar devastador capaz de desfazer seus ossos em pó.

Hummm... Bem vejo que está mais inteirada do que seria possível. — A voz fria decidiu prosseguir após a pequena pausa reflexiva. — Diga para o seu assassino que irei descobrir quem ele é e a que Organização pertence em vinte e quatro horas. Até lá, irei matar tudo o que estiver na minha frente, senhorita Paixão. Não pouparei ninguém até finalizar o meu trabalho, mas antes teremos uma conversa. Pretendo descobrir por que sua cabeça vale tanto dinheiro.

— Faça o que quiser. — Engoliu em seco e a mão tremeu. — E o... o meu amigo?

Hummm... Digámos que de momento será um presente para a senhorita porque está sedado. Qual é a graça de matar alguém que sequer pode gritar, não é mesmo? Quanto a equipe toda, meus mais sinceros sentimentos. Nos veremos em breve — concluiu a ligação logo em seguida, fazendo com que Konstantine estreitasse os olhos antes de dar uma gargalhada que fez com que ela pulasse no lugar.

— Que sujeito brega. E aquele "hummm" irritante? — Tateou o próprio bolso em busca de qualquer coisa que não encontrou e parou ao vê-la em completo estado de choque. Expeliu ar pelos lábios macios e se impacientou. — Vamos lá, Lara. Estou ficando irritado com essas suas alterações de humor.

— Estou nervosa, com medo e sem saber o que fazer! — Confessou de olhos bem abertos e irritada demais por ver como ele se mostrava sereno a meio de todo aquele caos. Todos os últimos anos conseguira se manter num anonimato válido, o nome trocado e não aparecer em público tinha garantido sua segurança. Uma pena não poder dizer o mesmo agora. — Ele vai matar todo mundo.

— Não vai — garantiu e revirou os olhos. — Angel é muito meticuloso, não gosta de balbúrdias. Certamente vai pegar um ou dois, mas o tempo que levará para concluir o assassinato e te aterrorizar com isso, será o suficiente para que eu o apanhe.

— Matar um ou dois? — A voz dela quase falhou.

— Sim. Não aja como se fosse uma novidade, ambos sabemos bem que sacrifícios precisam ser feitos para que possamos sobreviver. Aliás, você sabe melhor do que ninguém. — Lhe piscou o olho e torceu os lábios, se demorando em seus pensamentos. — Thierry lhe levará para casa.

— Ótimo!

— Até parece que está aliviada por ficar umas horas longe de mim. Assim me deixa triste...

— Pare! Apenas pare!

— Não vou parar — afirmou, mostrando que atormentá-la seria um prazer diário que o satisfaria bastante. — Enquanto isso, vou recuperar o seu querido Martino.

— Traga-o lá para casa, por favor.

— Não sei que drogas anda experimentando, mas é melhor parar.

— Estou farta de você!

— E depois de treze anos é assim que sou recebido — dramatizou de propósito e levou a mão para o peito. — Juro que estou curioso para saber o que foi que você fez com o nosso bebé.

Os olhos de Lara se dilataram e a mão tremeu sem parar até apoiar no encosto da cadeira, pois o chão pareceu girar e lhe roubar todo o equilíbrio. O encarou por tempo indeterminado, a respiração cessou e a garganta secou por completo. Foi como sentir garras afiadas atravessarem suas costas deixando aquelas marcas já existentes.

— Você...

— Ah, Paixão. Minha única tolice foi acreditar que me amava de verdade, de resto, sempre fui muito mais inteligente que você. Pensou que não sabia? — Deu um passo em frente, os olhos azuis raiados de uma raiva contagiosa de tão forte que refletia. — Espero que tenha um bom argumento quanto a esse assunto. Não queira saber o que farei ao descobrir que se livrou dele como fez comigo.

— Você não sabe o que...

— Mas irei saber, Paixão. A bem ou a mal, você vai me dizer — rosnou de um jeito ameaçador que a fez engolir saliva com força. A mão grande apanhou a sineta em cima da mesa e a balançou de um lado para o outro deixando o som irritante tilintar sem parar.

— Senhor Diabo. — O mordomo sinistro se materializou na sala, sempre elegante e educado, não deixava antever nada do que realmente existia por trás de toda a aparente calmaria.

— Leve a senhorita Paixão para a loja.

— Com certeza. Por favor, senhorita Paixão, me acompanhe. — Thierry pediu no tom sereno e quase paternal que deixava tudo ainda mais sinistro e lhe estendeu a mão a indicar a porta da saída. Lara apanhou seus pertences e logo deu as costas começando a caminhar.

— É assim que me despede? — O sussurro do Diabo veio como uma língua intumescida que provocou sua pele, mas ela não travou, apenas levantou o dedo médio da mão direita arrancando um brilho no olhar azul magnético.

Ela seguiu Thierry e atravessou o pequeno caminho até ao carro, estava tensa quando se sentou no banco de trás, seus músculos reclamavam de dor e seus olhos ardiam como se estivesse diante do fogo.

— Precisa de alguma coisa, senhorita? — O mordomo a encarou pelo espelho. — Um calmante?

— Estou bem — mentiu e entrelaçou os dedos numa tentativa vã de impedir que tremessem sem parar. Ele sabia! Não conseguia parar de repetir aquilo e mais do que nunca, tinha que encontrar Andreza para que lhe devolvesse o maldito envelope.

Encostou a cabeça na janela, fechou os olhos e prendeu a respiração. Tinha a certeza de ter feito a escolha certa quando atirou em Charles, por muito que lhe doesse até ao fundo de sua alma, sabia que se voltasse no tempo não teria feito diferente. Mas quanto ao bebé...


Charles estava deitado ao lado de Adla na cama e apontou para uma janela. Veludo cirandava de um lado para o outro, as unhas afiadas arranhavam o chão e deixavam um barulho irritante.

— "Djanela."

— Isso. E aquilo? — Girou o dedo para a entrada velha.

"Porrta".

— Muito bem. E isto?

"Fougoh".

— Fo-go.

— "Fogoh".

Ela parecia maravilhada enquanto anotava tudo na sua cabeça esperta. Nas últimas semanas, o ambiente em North Folk parecia ter acalmado com a diminuição da chegada de imigrantes. Patrulhar as áreas se tornava desnecessário por enquanto, pois fazia dias que nenhum navio ou barco era visto nas redondezas. A procura por Credence e Jack também tinha parado, muitos acreditavam que tinham sido vítimas dos intrusos que foram assassinados a sangue frio diante de todos da cidade.

— Eu homem...

Charles riu e seus olhos se estreitaram no processo.

— Não. Você é mulher.

— Eu mulher. — Ela também riu se revirando na cama e se sentou, olhando para o rosto do homem que a encarava com atenção.

— É bom ver você sorrindo novamente. — Ele murmurou e sentiu o mesmo formigueiro que se apossava de seu estômago sempre que estava ao lado dela. Desde que lhe entregara o colar da mãe, a tinha visto choramingar pelos cantos e completamente consternada.

— Sorri...?

— Sorriso. — Os lábios curvaram para cima e lhe mostrou ao levar o dedo para os lábios. — Sorriso.

Txarles sorriso bonita.

— Bonito. — Corrigiu e a viu franzir. — Você é bonita e eu... — aponto para o peito. — Bonito.

— Ah... Eu sorriso bonita!

Ele riu. Realmente a gramática não era algo fácil, sem contar que para as poucas lições que tinham, Adla se mostrava perfeitamente capaz de assimilar tudo com uma rapidez invejável. Lá fora uma chuva fina se ouvia principalmente pelos pingos que entravam por um furo no telhado e caía para a bacia perto da mesa a qual tiveram que evacuar os poucos livros. A lareira crepitava, aquecendo o interior da cabana, mas não chegou nem perto do calor que ele sentiu quando ela subiu para se sentar no seu colo.

— O que está fazendo? — Perguntou a sentir um arrepio nada púdico o consumir e a respiração desacelerar quando ela tirou a blusa velha de mangas compridas.

— Obrigada.

— O quê?

— Obrigada.

Konstantine demorou a compreender até vê-la se despir deixando os seios a mostra. E então negou com a cabeça.

— Não. — Puxou o lençol para a cobrir. — Não é assim como me agradece.

Adla baixou os olhos, confusa, e só aquele gesto o compadeceu por inteiro.

— Mamã, comida, homem, barco. — Juntou as palavras que conhecia sem conseguir formar uma frase completa. — Obrigado tirar roupa.

— Não. Não. Não precisa disso para me agradecer. — Charles ficou pálido quando compreendeu o que lhe dizia e se sentou, sem lhe tirar do seu colo, mas finalmente a envolveu em seus braços. Era estranho poder dizer o que realmente sentia quando estava tão perto porque ninguém alguma vez lhe explicou como era aquele turbilhão de sensações. Todas as manhãs quando voltava para casa se sentia vazio, passava o dia em automático até chegar a hora de se escapulir. Por sorte sempre tinha feito algo de género e por isso ainda não tinha levantado suspeitas. — Eu... — Engoliu sem seco. — Eu gosto de você.

Ela deixou o sobrolho grosso se unir ao de leve, tentando identificar algo que compreendesse, mas não foi fácil. Então sentiu quando ele segurou na sua mão e a levou até ao seu peito largo que subia e descia com pressa.

— Você aqui dentro. — Explicou de um jeito para que ela pudesse compreender. Só não disse como adorava vê-la brincar na neve, a forma como os lábios se mexiam quando tentava se expressar, os olhos carinhosos que imploravam por afeto. A forma como andava pelo espaço pequeno da cabana, e acima de tudo, como ficava feliz quando o via chegar.

Txarles aqui. — Adla deixou cair o lençol e não se importou de levar a mão quente por cima do seu seio onde batia o coração com muita força. Ele então apoiou a cabeça por baixo do queixo dela e se deixou respirar o cheiro da pele natural, enquanto os braços fortes a rodeavam pela cintura. Estremeceu quando a mão se enterrou nos fios de seus cabelos, traçando caminhos eletrizantes com a ponta dos dedos.

Charles se afastou, erguendo a cabeça na altura da dela e se demorou ao examiná-la, ansioso demais para a própria sanidade e, sem hesitar, colou os lábios ávidos junto aos de Adla que o correspondeu com urgência.


— Senhorita Paixão? Chegamos.

Lara abriu os olhos de repente e ficou sem graça ao perceber que lágrimas marcavam seu rosto. Sua cabeça doía e demorou a se situar até ver a porta de vidro com letras que diziam Bordados & Paixão.

— Obrigada. — Ela enxugou as lágrimas com uma flexibilidade invejável e abriu a porta sem dar tempo para que Thierry lhe fizesse as honras. — Até mais.

O homem acenou em resposta, ainda atento nela que saiu disparada e a olhar para os lados sem esconder o receio. Espalmou as mãos na porta e empurrou, entrando para dentro da sua loja como uma criança que encontra os braços da mãe após uma noite de pesadelos. A sala de espera estava cheia de mulheres que reclamavam junto ao balcão e que respiraram sossegadas quando finalmente a viram.

— Senhorita Paixão!

— Um momento. — Despachou uma delas, sendo seguida por Veludo que a acompanhou até sua sala e ladrou quando esta se jogou na cadeira de qualquer jeito. Parecia poder adivinhar o transtorno que a colmatava.

— Lara! — Andreza entrou logo em seguida. O rosto bonito e redondo apresentava uma expressão mesclada de preocupação e alívio em simultâneo. — O dia está um caos. O noivo da senhorita Fuertes veio aqui fodido atrás de você e temos marcações que estão atrasadas.

— Cancele tudo.

— O quê?

— Cancele tudo, Deza. E avise que a Bordados & Paixão estará fechada para pedidos novos, apenas vamos concluir os já feitos.

— O que está acontecendo, meu Deus?

— Martino foi baleado — contou sem nenhuma preparação. — Quero tudo pronto para entregas e iremos encerrar a loja.

— Que loucura é essa?

— Termine de pedir para as noivas voltarem amanhã e depois venha, vamos conversar lá em cima. — Estava pálida e os olhos inquietos assustaram a prima. — Antes me traga o envelope que lhe dei.

— Tudo bem.

A Designer observou a prima sair aflita, mas não deixou de pensar que precisaria mandá-la para bem longe dali o quanto antes. Se Angel estava atrás das pessoas que a cercavam, provavelmente ia começar por quem mais gostava. Apoiou as mãos na cabeça, o coração batia na boca, e nem soube quanto tempo passou até Andreza voltar com o envelope em mãos.

— Aqui está.

— Obrigada e desculpe por estar fazendo você passar por tudo isso.

— Não se desculpe, Paixão. Eu estou com você em tudo! Para sempre.

Lara deixou um sorriso nervoso passar em seus lábios e recebeu o envelope com certa apreensão. Apertou os olhos.

— Aqui... Tem todo o meu passado. Quero que leia depois — disse e rasgou a parte de cima do papel, mas congelou ao tirar um cheque em branco. Olhou para a prima. — O que é isto?

Andreza sentiu as pernas ficarem como gelatina e os olhos aumentarem igual dois pires. Abriu a boca num O perfeito e quase teve um ataque.

— Meu Deus, Lara.... Meu Deus!


Opaaa!! E agora? Phodeu geral! O envelope ta lá com o senhor noivo "Quero matar Lara" ahahahahahah. Andreza ta metida numa enrascada hein?

Desculpem a demora. De repente bloqueei um pouco para escrever esta história, mas vamos que vamos. Que tal ajudar uma autora? Votem, comentem muito e partilhem com as amigas e azinimigas também kkkkkkkk Apoiar o autor é uma forma de ativar inspiração.

O passado de Adla e "Txarles" é tão fofinho né? Boraaaaaa Diabinhas.

BeijosQuentes e Gelados.  AHHH E BORA CANTAR PARABÉNS PARA A ANDREZA DA VIDA REAL. Feliz niver, guria! 


Procurando uma história nova para ler? Venham conhecer a de Iara, escrita por Mira_Jones. Muito bem escrita e desenvolvida. Tenho certeza que vão amar.

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