"Compassion"
Júlia parou a moto na parte de trás do terreno do armazém – que para muitos parecia estar abandonado – e agora talvez estivesse. Soltou um suspiro, puxando o capacete de sua cabeça e sacudiu o longo rabo-de-cavalo que seus fios longos faziam ao estarem presos na nuca. As botas de cano longo pisaram o chão danificado e os olhos azuis analisaram todo o perímetro com atenção, antes de puxar a arma prateada que ficava por trás das calças justas. Ela odiava o facto de Konstantine estar se expondo daquela forma e, ainda por cima, estar causando a ira da 666. Nunca tinha tido detalhes, mas sabia que chegar ao nível de ser o Diabo dentro da Organização era algo quase impossível e, estar na mira de Angel não era algo propriamente bom.
Pisou a relva alta, afundando suas botas na areia escura e apreciando o silêncio como seu maior aliado. Tinha avaliado as câmaras antes de ir até ali, mas todas tinham sido vilipendiadas, e tudo o que lhe tinha restado era um satélite que ao menos serviu para procurar alguma alma viva do lado de fora daquele lugar. Quem é que do grupo deles nunca tinha ido parar ali? Era um hospital para bandidos e tinha permanecido por muitos anos no anonimato até aquele momento.
Ouviu o bater das asas de vários pássaros que levantaram voo de uma árvore de caule grosso e entortado, junto do chilrear que ecoou por todos os lados. Num único gesto firme, com as duas mãos agarradas a sua arma, ela disparou contra o telhado e avistou um Anjo cair. Todo vestido de branco e, ainda assim, camuflado de um jeito desconcertante, se embateu contra o chão num baque seco e ruidoso. Ela caminhou com pressa, empurrando a grande porta de ferro que deslizou para o lado, o suficiente para que conseguisse passar. O chão de cimento se alastrava por todo lado, as luzes brancas eram fortes demais e a fizeram pestanejar. Corpos da equipe se espalhavam ensanguentados, muitos ainda de olhos abertos, o que a fez engolir em seco, sabendo não deter de muito tempo antes de completar a ordem de Konstantine.
Recuperar Martino. Pensou e revirou os olhos, sem concordar que a própria vida valeria a de um cidadão comum qualquer, e não podia negar que tinha protestado e até sugerido outros colegas para irem em seu lugar. Não que fosse covarde, na verdade era a única mulher da 666 a provar que merecia estar naquele lugar, mas ainda não tinha conseguido completar aquele quebra cabeça de forma alguma.
— Parado aí! — Os grandes olhos azuis verificaram uma figura que se mexia de um lado para o outro, por detrás de grandes cortinados de plástico que isolavam a área onde normalmente ocorriam as cirurgias. Os passos lentos e laterais lhe acrescentavam charme, assim como toda atenção que seus instintos lhe ofertavam. — Eu. Disse. Parado!
Em nenhum momento a pessoa pareceu acatar suas ordens, continuava se movimentando apressadamente, ignorando-a por completo. Ela esticou uma de suas mãos de dedos finos e enluvados e afastou o véu translúcido que os separava. Desceu o dedo para o gatilho quase ao mesmo tempo que o homem vestido de médico levantou as mãos sujas de carmim para o alto. A máscara cobria sua boca, mas os olhos esverdeados como um mar paradisíaco se destacaram acima de qualquer coisa. Júlia olhou para outro homem deitado numa maca e com um ferimento suturado na barriga.
— Quem é você? — Perguntou num tom ameaçador, deduzindo com facilidade que aquele inconsciente seria o dito Martino.
— Eu estava na ambulância quando o ataque começou de surpresa. — Apontou para o veículo branco sem placa que normalmente era usado para evacuar alguém de algum lugar. — Me escondi.
Ela estreitou os olhos, sem acreditar muito naquelas palavras que escutava.
— Esperei um pouco até sair e encontrei-o a agonizar. A ética veio em primeiro lugar, não podia simplesmente fugir e deixar um ferido a meio de uma cirurgia. Removi a bala — explicou com calma e apontou para a pequena bacia de metal com o projétil dentro.
— Não conheço você.
— Acredite. Estava precisando de uma grana e aceitei esse trabalho. — Puxou a touca e revelou os fios curtos e escuros. Era jovem e muito bonito, com um rosto muito harmonioso tal como a expressão humilde. — Se soubesse nem teria saído de casa. Estou morto agora, pois não?
— Quase... — Júlia baixou a arma e andou até estar perto do ferido. Não fazia sentido algum que Angel o tivesse poupado, mas iria compreender quando Konstantine lhe explicasse tudo com mais atenção. Tinha a ideia que se tratasse de algum terror psicológico em relação àquela que tinha despertado o lado mais sombrio do seu amigo ou, então, era algum possível ato de compaixão. — Me ajude a tirá-lo daqui.
— Encontrei um chip dentro dele — contou e o mostrou dentro da pequena bacia junto do projeto.
— Hmmm... — Júlia estreitou os olhos. — Destrua.
— Poderei ir para casa depois?
— A depender do seu envolvimento... veremos.
Ele engoliu em seco, mas continuou sério. Começou por se desfazer do equipamento médico e jogar tudo no lixo, procurando algum isqueiro para queimar tudo.
— Não precisa. O lugar está programado para explodir assim que eu tirar o meu rabo daqui. Então se apresse e me ajude a colocar ele na ambulância. — Segurou o poste de metal com soro e deixou que o homem empurrasse a cama com rodas.
— Eu sou o Bill, e você?
— Não vai querer saber.
— Paixão? — Andreza estava quase sem forças, principalmente por ver o estado catatônico que a prima tinha mergulhado. Sentiu a garganta arder e tentou se mexer, mas seu corpo em nenhum momento a obedeceu. — Eu vou encontrar esse envelope, está ouvindo?
Lara ainda permanecia séria, os olhos pareciam uma noite fria e totalmente perdidos no que seriam seus pensamentos. A mão estremeceu ao de leve e sequer piscou quando voltou a encarar o cheque em branco que estava no lugar da carta.
— Está tudo bem — disse finalmente e se levantou numa postura ereta embora em automático. Chegou a gargalhar sozinha.
— Não está, e a culpa é minha. Prometo voltar aqui com a carta! — A prima mais nova caminhou até a mesa e recuperou o que pertencia a Trevor Davidson, o maldito deputado arrogante.
— Eu resolvo.
— Não, Paixão. — A culpa estava estampada no rosto redondo e os lábios se apertaram numa convicção sem medida. Balançou a cabeça sem parar e segurou Lara pelos braços finos. — Era meu dever... só guardar um maldito...
— Está tudo bem. — A Designer levou a mão para a testa e voltou a sorrir de nervoso. — Preciso de... — Não conseguia raciocinar direito sequer e por alguns instantes duvidou que o coração ainda batesse em seu peito. — Vou para casa.
— Me perdoe, eu não queria...
— Não se martirize agora. Não quero que fique assim, por favor — pediu e passou a mão no cabelo crespo e com algum volume que rodeava a cabeça da prima mais nova. — Feche tudo depois. E... — Parou de andar quando a mão alcançou a maçaneta da porta. — Não tente nada, Deza. Conheço você.
— Hmmm... — A prima não concordou ou desmentiu, se manteve calada roendo uma culpa maior do que poderia suportar. Não demoraria sequer dois minutos para ir atrás daquele homem intragável e que tinha o que lhes pertencia.
Por sua vez, Lara saiu seguida de Veludo que a encarava com uns olhos muito expressivos, os dois subiram os degraus até ao andar de cima e ela agradeceu pela porta já ter sido eficazmente substituída. As novas chaves estavam suspensas na fechadura, apenas girou-as devagar e entrou em casa a sentir o mesmo vazio de sempre. Espreitou o quarto, averiguando as novas janelas blindadas e se despiu no mesmo instante, ainda com os pensamentos perdidos. Abriu as torneiras para encher a banheira e rumou até a cozinha, sabendo que, quando menos esperasse talvez uma bala acertasse o centro de sua testa e que morreria com o seu segredo nas mãos de um estranho. Encheu o prato de Veludo que ladrou em agradecimento, depois abriu uma garrafa de vinho e levou uma taça até ao banheiro.
Se sentou dentro da água quente, procurou o controlo da música ambiente e deixou Roses tocar por todas as colunas de som que se espalhavam pela casa. Bebeu um gole a sentir o sabor forte em sua boca e fixou o teto, completamente alheia e distante. Se pensava que tinha aprendido a lidar com seus demónios, agora sabia que fazia parte deles e só tinha nenhuma forma de os livrar. Não soube quanto tempo ficou ali a beber todo o líquido quente que escorregava por sua garganta com muita facilidade e a escutar a repetição da mesma melodia que parecia cantar suas feridas. Riu quando esvaziou a garrafa e se deixou escorregar para o fundo da água agora fria. O que era aquilo para quem tinha sobrevivido um mar gelado?
Soltou bolhas de ar, sabendo que um de seus maiores talentos era o de conseguir suster o ar em seus pulmões. Os olhos abertos viam o banheiro distorcido por cima das águas e nunca desejou tanto que tudo aquilo acabasse num piscar. Podia ouvir a voz de sua mãe cantando alegre em tigrínia e dançando nas areias vermelhas da aldeia onde moravam na Eritreia. Antes que ela pudesse vivenciar aquela memória, uma mão mergulhou – apanhando-a desprevenida – e apertou seu pescoço, puxando-a para cima.
Lara tossiu alto. Os pulmões queimavam e a garganta reclamou.
— O que pensa que está fazendo, Paixão?
— Como entrou aqui? — Ela encontrou o bonito rosto de Konstantine que a encarava com atenção. — O que faz aqui?
Odiou ver um sorriso sombrio subir pela lateral do rosto másculo, assim como os olhos azuis que a fitavam com uma intensidade que provocou arrepios em sua pele escura. Havia poder naquela mão que podia desfazer seu pescoço num único estalar.
— Ajudando você a não se matar? — Respondeu a segunda questão e finalmente a soltou, se erguendo em toda elegância que pareceu roubar a luz do banheiro, pois a sombra dele a cobriu por inteiro. O longo casaco preto que roçava os calcanhares se destacava na camisa azul e nas calças cinzas de corte perfeito. — Não se trava o vento com as mãos, Paixão.
— Não é o que você quer? Me ver morta?
— Não. — O Diabo se aproximou da prateleira que tinham toalhas de várias cores dobradas na perfeição e puxou uma de lá. Em seguida estendeu a mão para Lara que hesitou antes de aceitar ser impulsionada para longe das águas frias, mas que sentiu um calor lhe subir quando os olhos frios desenharam seu corpo nu. — Eu quero matar você, é diferente.
— Me mate.
— Ainda temos muito por conversar... — Sussurrou no mesmo tom que se naquele momento tivesse cor, estaria pálido.
— Precisa me ajudar.
— Mais ainda? — Uma sobrancelha subiu para cima num gesto irónico e a cobriu com a toalha, sem deixar de lembrar dos tempos passados em que sempre a enxugava fosse com um pano ou com a própria língua. Seu membro ganhou vida só com a maldita lembrança e se amaldiçoou secretamente.
— Eu escrevi uma carta, no caso de algo me acontecer e... — Os olhos escuros e sedutores dançavam de um lado para o outro, hipnotizando-o. — Houve uma confusão e foi parar nas mãos do deputado Davidson. Precisa recuperá-la, por favor. Os segredos que estão lá podem...
— Fala sobre o nosso filho? — Konstantine a apertou pelos braços numa força capaz de a erguer como papel. Aproximou o rosto para averiguar cada expressão do semblante de Lara, até onde sabia, era uma boa mentirosa.
— Fala. — Soltou um suspiro em resposta e quase perdeu o equilíbrio quando ele a soltou de imediato, como se tivesse uma doença contagiosa. O Diabo se apressou para fora do banheiro, mas parou quando a ouviu prosseguir. — Eu o perdi. Saiu de mim como se não tivesse coragem de ter uma mãe que tinha matado o próprio pai. Era como um castigo de Deus. — Se manteve firme. — Eu estava pagando pelos meus atos e... meu bebé morreu, tinha matado você e estava morta em vida.
— Por isso foi pegar a Andreza?
— Ela era tudo o que me restava. — Os olhos dela se encheram de lágrimas e baixou a cabeça, mas foi surpreendida quando sentiu as mãos fortes e raivosas que a empurraram contra a parede de azulejos escuros. Konstantine estava dentro da banheira, sem se importar em mergulhar os sapatos caríssimos da Casa Testoni.
Ele urrou em desespero, as veias da testa se destacaram assim como os olhos se tornaram carregados de uma dor forte. Apertou-a até o nó dos dedos das mãos se esbranquiçarem e trincou os dentes destacando o maxilar forte. Era como se pudesse desfazê-la naquele mesmo instante, tamanha foi a raiva em forma de dor.
— Eu. Odeio. Você. Paixão... — Rosnou, ainda doente por dentro por tanto desgosto. — Não é a mulher que um dia conheci e amei. Adla teria vergonha de você.
— Eu sei... — Lara deixou as pálpebras se fecharem numa aflição. — Eu também me odeio. Todos os dias.
As mãos dele afrouxaram ao perceber como se fragilizou e finalmente a soltou, cerrando os punhos em seguida. O coração traidor ainda batia por aquela que tinha atirado nele. Era burro de certeza, mas não conseguiu evitar ser inundado por uma compaixão que nem sabia ter. Não era apenas ele que estava em sofrimento.
— Charles...
— Não mencione esse nome. — Advertiu um quanto ácido, mas não se moveu quando a viu se desembaraçar da toalha – que caiu para a água se ensopando em seguida – e levantar os braços que o agarraram. — O que quer agora?
— Precisa me punir. Você tinha razão, eu iria implorar... eu preciso... — Estava em desespero e estremeceu quando as mãos enluvadas repousaram em suas costas cheias de Cicatrizes. Ele voltou a apertá-la contra a parede fria, desta vez encostando o grande corpo musculado junto ao dela. Os seios grandes se empurravam contra seu peito que subia e descia impaciente.
Lara procurou os lábios dele num desespero, encostando-os ao de leve e procurando um beijo que nunca chegou. Abriu os olhos escuros e encontrou os azuis amargos que a fitavam.
— Você é fodida — garantiu sabendo que não conseguiria resistir por muito tempo. Já tinha esperado treze anos. — Sempre foi... — Ele levou a ponta dos dedos aos dentes e puxou a luva da mão esquerda, deixando que caísse também na água, apenas para apertar o seio com o bico do mamilo arrepiado. Não apertava devagar, pelo contrário, torcia com afinco e engoliu em seco quando um gemido escapou dos lábios dela.
— Eu estou... — Lara ainda lutava em busca dos lábios que fugiam como se fosse a própria cascavel pronta para partilhar de seu veneno. Mas não foi por muito tempo, pois Konstantine a puxou contra seu corpo, e finalmente tomou os lábios para junto dos seus, aceitando a língua atrevida que invadiu a boca que de início pareceu rígida, mas logo se deixou roubar pelo sabor mágico que fez o coração dele bater em disparado.
A mão dele desceu para tocá-la no centro pulsante, e os dois gemeram em uníssono. As línguas se enroscavam com intensidade, chupando o gosto que jamais tinham esquecido e que era perfeito demais para a situação que se encontravam. Por um momento, foi como se voltassem para o passado.
— Você lembra, Paixão? Adorava sua comida, embora não mais do que te comer... Zigni era o nome do guisado que me fazia correr para os seus braços... — Sussurrou e afundou um dedo dentro dela. Parecia uma conversa aleatória, mas ambos sabiam bem que não...
Charles carregava uma sacola quando entrou na cabana às seis da noite, acompanhado de Veludo. Dentro tinha um pedaço de carne de vaca, tomate, cebola, coentro, limão, paprica e alho. Tudo o que tinha conseguido trazer por conta da insistência dela que afirmava poder preparar a melhor comida que iria experimentar.
Lá dentro a iluminação era reforçada pela labareda da lareira, e o cão correu para lamber os pés descalços e se empolgar ao redor dela.
— Txarles voltou. — Ela estava bonita para variar e largou as luvas dele que cosia com um talento de saltar a vista. Pareciam novas, nada se comparavam as velhas que estavam furadas. Seu dom de costura não passou despercebido aos olhos azuis calorosos.
— Sempre volto. Como prometido. — Largou a sacola por cima da mesa e sentiu o estômago revirar. Não era de fome, pelo menos não uma que se saciasse pela boca.
— Por quê? Por que Txarles volta? — Ela perguntou, ansiosa para provar aqueles lábios que a devoravam todos os dias, respeitando seu corpo acima de qualquer coisa. Observou como ele mancava, parecia dolorido. — Problema?
— Não se preocupe — disse e se aproximou. Sabia que bastava estar ao lado de Adla, então tudo ficava bem. Só lamentava ter deixado a mãe depois do que o pai bárbaro lhes tinha feito em toda a loucura permanente. Agora que os barcos tinham parado de chegar, eram eles que pagavam um preço alto.
— Txarles triste... — O tom de voz dela baixou, mostrando uma compaixão pela expressão pesarosa que escurecia o olhar dele.
— Não mais. — Soltou um esgar dolorido e subiu a mão para tocar o rosto dela. — Meu... meu lar, é muito triste...
— Por isso volta?
— Volto porque aqui tem paixão.
— O quê?
— Neste lar... — Apontou para a cabana. — Neste lar há paixão.
— Larapaixão?
— Lar-há-paixão.
— Ahmm... — Pareceu compreender. — Lara Paixão.
Nhommm eu não aguento. Kkkkk amo esses dois mais que tudo. Nossa. Vão ser fofos assim na casa da Maria que meu core non aguenta mais. Kkkkkk.
Sim, eu sei que demorei. Estava com bloqueios quando a esta história, mas peguei o rumo novamente. Acho que está ficando bem pesada, mas nós somos da pesada nue non?
Agora já sabem de onde vem o nome dela. Awnnn. Tava louca por mostrar. E bora confabular? O que acharam do Bill? Suspeito? Kkkkkkkk Será que a Júlia vai descascar esse dito médico? E a Andreza hein? Vai tacar o terror no Trevor? Kkk
Não se esqueçam de apoiar seu autor. Votem e comentem muito para ajudar. ISSO É MUITO IMPORTANTE E DÁ MOTIVAÇÃO.
AH! E Ta rolando SORTEIO DE DOIS EBOOKS para oferta no meu grupo do Facebook Leitura Ami Ideas. Basta me seguir aqui, minha página do Face Ami Ideas e entrar no grupo. Corre lá!
Beijos Konstantinados. Aqui há Paixão!
Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top