As Verdadeiras Intenções de Mainz
Senti uma pontada gelada atravessar o meu coração. Tive medo de saber quais eram as verdadeiras intenções de Mainz. Mas eu estava em um caminho sem volta. Eu tinha que seguir em frente e sair do escuro de uma vez por todas.
— Como assim as verdadeiras intenções do general? — perguntei. A voz saiu falha, quase um cicio.
Curupira passou a mão sobre o queixo. Sua face denotava comiseração.
— Você está sendo levado para uma armadilha! — revelou.
Como assim estou sendo levado para uma armadilha?, perguntei para mim mesmo com incredulidade.
— Você está dizendo que meu p-pai...
— Não! — contestou o pequenino antes que eu completasse gesticulando negativamente com a mão aberta. — Suponho que ele não tenha ideia. — Ele parou por um segundo parecendo escolher bem as palavras. — Veja bem — prosseguiu —, seu pai está sendo movido por desejo de vingança — disse meneando a cabeça.
Mais uma vez fiquei sem entender o que isso significava. Antes, porém, que eu perguntasse, Curupira explicou:
— Mas primeiro, para que você realmente possa entender tudo, preciso te contar o verdadeiro motivo das intenções do general — falou e mais uma vez se ajeitou sob o assento. — Mainz foi levado ainda muito pequeno para AnToren, assim que descoberta sua predisposição para a manipulação do metal. Na verdade, não somente ele, como também todas as outras crianças que manifestaram vocação para o mesmo dom.
"O objetivo era criar uma nova ordem de guerreiros que pudesse proteger o Rei através do uso de seus dons. Para isso, Gauren trouxe de Oren Zotar, continente do Ar, um dos maiores guerreiros que este mundo já conheceu, o espadachim Aaori, também conhecido como O Uivo do Vento.
"Aaori treinou as crianças no estilo zotariano, criando a poderosa ordem de espadachins aaori, da qual seu pai se destacou como principal guerreiro.
"Durante muitos anos, sob a bandeira da ordem aaori, Toren foi mantida em segurança. Ao todo eles eram trinta e três guerreiros, conhecidos como A Irmandade das Lâminas. Eles eram como verdadeiros irmãos, já que todos foram criados igualmente longe de suas verdadeiras famílias.
"Entretanto, em uma emboscada em um dos embates entre os aaoris e o exército do império, quase toda a irmandade foi dizimada. Ali, Mainz perdera quase todos os seus irmãos, com exceção de alguns deles e Gamel, que foi o traidor.
Gamel, foi ele que lutou contra papai em Anzare. Ele também era um usuário de metal. E por isso eles se trataram como irmãos, lembrei.
— E não parou por aí — continuou Curupira. — Conhecendo o poder da Irmandade das Lâminas, Tarus orquestrou um terrível massacre em MinasToren assassinando cruelmente as famílias de todos os guerreiros. Seu objetivo era eliminar a possibilidade de uma nova geração de aaoris. E o imperador foi muito bem sucedido nisso — exprimiu num tom lamurioso.
— Mas o que isso tem a ver com as atuais intenções de meu pai? — indaguei, irrequieto, sem conseguir entender a lógica das conexões.
— Mainz pretende se vingar de Tarus — afirmou num tom seco. — E esse não é o problema. A questão é que Mainz treinou você como um aaori e sempre soube do seu dom. No fundo, ele projeta a expectativa de que você possa fazer o que a ordem aaori jamais conseguiu: destruir Tarus e livrar Toren do jugo do Império do Fogo.
Ao ouvir isso minha cabeça pareceu girar.
— Então meu pai sempre soube quem eu era? — perguntei aturdido.
— Na verdade, ele nunca soube quem você é de verdade — admitiu. — Mas ele sempre soube o que você pode fazer. E foi por isso que ele decidiu criá-lo como seu próprio filho — assegurou Curupira.
Uma pitada de desconfiança transpassou-me a mente...
— Mas como você sabe disso? — inquiri revelando ceticismo.
Ao ser questionado Curupira não demonstrou hesitação. Sua feição tornou-se reflexiva como quem procurasse pela melhor resposta.
— Já disse, foi o próprio Pantanus que me enviou — justificou. — Não há nada que se passe em Toren que escape ao conhecimento do grande Ser Vivente da Terra.
Recebi a justificativa com suspeição. Vendo que ainda não estava satisfeito, Curupira argumentou:
— Quando se encontrar com o seu pai assim que sairmos daqui, pergunte a ele sobre o oráculo. Creio que isso será o bastante para acabar com sua desconfiança. Até lá, preciso que me dê pelo menos o benefício da dúvida — argumentou.
O Benefício da Dúvida! Ao ouvir essa expressão imediatamente recordei das aulas de lógica com mamãe. Certa vez, estudando sobre Os Fundamentos da Verdade, onde aprendi a analisar as bases de supostas verdades, mamãe citou essa obra. Seu argumento consiste em nunca rejeitar uma afirmação ou argumento sem análise prévia. "Primeiro você deve investigar os fundamentos e depois julgar se algo é falso ou verdadeiro", lembrei da minha mãe me dizendo isso enfaticamente.
Decidi confiar desconfiadamente em Curupira até poder checar se o que dizia era de fato verdade, e, então, fiz sinal para que ele continuasse.
Sem desviar os olhos, o pequenino revelou-se inabalável. Pelo menos não demonstrou nenhuma reação à minha desconfiança, pelo contrário, estava muito seguro de si mesmo e de sua história. E essa é uma das características de quem fala a verdade.
— Bom, vamos ao que realmente importa — prosseguiu como se nada estivesse acontecendo. — O ponto importante aqui é que Mainz está indo para AzToren. Lá se encontra a última resistência toreana contra o domínio do império. O problema é que, a mando de Cazel, subordinado de Tarus, AnToren, ArToren e MinasToren em breve marcharão para o Sul e uma terrível guerra está prestes a acontecer. E... — Curupira demonstrou certa hesitação — Os planos de Mainz incluem levar você junto com ele, colocando-o no meio de tudo isso — afirmou balançando a cabeça e abrindo bem os braços.
Eu não poderia ignorar o fato de que toda aquela história fazia sentido. E outra, o que Curupira ganharia em me contar tudo isso caso fosse mentira? Seria ele um inimigo? Na mesma hora a imagem de como ele havia destruído os dois naelins surgiu em minha cabeça. Provavelmente não. Pelo menos, pelo que eu havia presenciado, sabia que o guardião da floresta era forte o suficiente para nos coagir a fazer sua vontade. E ele ainda contava com a ajuda da floresta inteira a seu dispor. Só o Mapinguari já causava espanto o suficiente.
A história era convincente e o pequeno ser não demonstrou em nenhum momento as características de um mentiroso.
Mais uma vez ergui a cabeça com os olhos fixos no céu escuro e busquei o ar que me escapava pelos pulmões. Meu coração estava apertado e comprimido como se estivesse amarrado e pressionado por geladas correntes metálicas.
E agora... O que irei fazer?
Mais uma vez senti uma grande falta de minha mãe. Ela teria a resposta. Ela é verdadeiramente a minha mãe! A compreensão disso me trouxe conforto e refrigério. Nela eu poderia confiar...
— Você não pode seguir para o AzToren — recomendou Curupira. — Você não deveria mais continuar seguindo Mainz — disse e fez um breve silêncio. Esse conselho fez borbulhar-me o estômago. — O general já cumpriu o seu papel com você!
Se o que ele disse realmente fosse verdade eu não deveria mesmo seguir para AzToren. Ao ir para lá eu poderia estar fazendo exatamente a vontade de Zaitã, facilitando as coisas para ele.
— Eu sei que não será fácil para você ter que decidir assim — tentou me consolar —, mas o general está completamente obstinado com suas motivações egoístas. Só que algo muito maior está em jogo — atestou crispando os lábios e abriu as mãozinhas com as palmas viradas para cima.
Esfreguei o rosto com as mãos na esperança de desanuviar as vistas e a mente inquietantemente turvadas e mais uma vez olhei para o céu.
— Por que isso tudo está acontecendo comigo? — pensei em voz alta.
Um breve intervalo silencioso sobreveio. A mente estava fervendo acelerada.
— Não sabemos como as coisas se sucedem, mas sabemos que existe um plano para tudo isso. E nós — disse e levantou o indicador direito — somos pequenas peças que compõe esse grande quebra-cabeças da existência — falou Curupira com sua voz infantil tentando conferir algum sentido em tudo aquilo.
Por um instante, senti como se estivesse conversando com um ancião senil. Mas a voz infante e a forma diminuta do guardião da floresta constantemente traíam minhas percepções.
Encarando o imenso tapete escuro que se estendia acima de nós, tentei buscar compreensão e significado em tudo o que ouvira, porém, independente de meus esforços, apenas o céu nublado, escuro e sem estrelas se me apresentou como resposta. E se estivermos enganados? E se Ele não exis... Antes que prosseguisse com o meu pensamento, uma pequena réstia de luz branca rompeu pela beiradinha de uma nuvem soprada pelo vento lançando um pouco de luminosidade em toda aquela escuridão.
Já sei o que vou fazer!
— Obrigado por me fazer saber de tudo isso — agradeci ao pequenino que apenas assentiu generosamente com a cabeça. — Agora, precisamos ir. Eu já sei o que preciso fazer — afirmei decidido.
Continua...
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Eita... E agora... O que será que o Ravel irá fazer?
De uma coisa eu tenho certeza, não deve estar sendo fácil para ele!
Como você acha que o Ravel deveria resolver tudo isso?
Quem sabe sua teoria não se torna realidade? Vem criar comigo! 😀
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