42 - Reunião de família

Aquela noite estava envolta num clima de festa na casa dos Blackwings, como não era vivenciado há algum tempo. Além dos irmãos e irmãs que viviam na casa, a irmã mais velha de Gálius, Lenora e seu marido, Jaan estavam presentes.

Gálius tinha curativos no rosto, nos braços e nas mãos, devido a escoriações sofridas nas lutas daquela tarde, mas estava feliz, toda a família oferecera brindes em sua homenagem. A única pessoa que não pareceu muito animada ou feliz com aquilo tudo foi a mãe de Gálius. Por ela, lutas ficariam enterradas no passado daquela família.

Gálius não via sua irmã há um bom tempo, mesmo ela visitando os pais com certa frequência. Há tempos estava ocupado demais para estar em casa durante uma dessas visitas. Gálius tinha boas e más memórias de sua irmã, afinal, era ela que praticamente cuidava dos irmãos enquanto a mãe trabalhava fora de casa. Ela parecia outra pessoa agora, seu vestido cinzento parecia muito sóbrio, os cabelos pretos presos sobre a cabeça num coque e um pouco de maquiagem no rosto.

O marido dela, Jaan, era fã de pelejas e vira as preliminares durante aquela tarde, mas duvidou de si mesmo se aquele lutador que viu era mesmo seu jovem cunhado. Foram as descrições entusiasmadas dadas por ele, e não de Gorum ou Kyle, que a família teve durante o jantar. Ele era alto e forte, tinha um nariz engraçado, parecendo que foi achatado e trabalhava como agricultor em Várzea Alta, ao norte de Tleos.

— Tenho certeza, Lius! Você vai ser um campeão.

— Obrigado, Jaan!

Melgosh, Noran e Éctor estava começando uma confusão entre eles que poderia rapidamente virar uma guerra de comida, mas a fala de Lenore os colocou curiosos e quietos novamente.

— Pai, mãe, pessoal... Eu sei que hoje é um dia para celebrar a vitória do Lius nas pelejas, mas tem uma coisa que preciso contar para vocês.

Todos fizeram silêncio.

— Estou com uma criança.

Kyle retrucou — Como assim, criança, que criança, qual o nome dela?

Dora, a filha caçula, logo esclareceu — Pai, ela quer dizer que está esperando um bebê. Você vai ser vovô!

Kiorina saltou de sua cadeia e foi logo abraçar a filha. Houve comemorações simultâneas de quase todos, exceto de Kyle e Gálius. Os dois se encararam longa e seriamente. Aquele olhar transmitia a preocupação com aquilo que só os dois sabiam, sobre a previsões do Rei-Deus que combinavam com as visões de Kyle, sobre um desastre cairia em breve sobre toda Tleos.

Pelo Rei-Deus! Agora mais um bebê para protegermos! Isso não vai ser nada fácil!

Aquela tensão não durou e logo Kyle e Gálius estavam dando beijos e abraços em Lenora e Jaan.

Foi festa em dobro na casa dos Blackwing. Pouco depois, Éctor e Melgosh se juntaram para pregar uma peça em Jaan, e Gorum e Gálius apesar de rir num primeiro momento, logo se puseram a repreender os irmãos mais novos. Coisas assim sempre aconteciam, e Jaan sempre levava tudo na brincadeira. Era alguém querido e integrado àquela grande família.

Foi ficando tarde e os mais novos foram para cama, Jaan e Lenora saíram para voltar para casa escoltados pelos pais. Gálius acabou na cozinha, ajudando Gorum a arrumar as coisas. Era o dia do irmão mais velho, mas Gálius estava de bom humor e também precisando ocupar a mente com algo simples como lavar pratos.

— Que dia, né Lius? — disse Gorum colocando uma pilha de pratos sobre o balcão.

— Puxa... Nem me fala!

— O que está rolando entre você e o papai. — Gorum parou o serviço encarou o irmão de perto.

— Rolando?

— É... desembucha.

Gálius resolveu contar algo que o irmão não sabia — Não é nada. É que ele está me ensinando a manejar espadas, só isso.

— O Melgosh tinha me contado isso. Não acredito que foi nada assim que fez vocês ficarem com aquelas caras quando a Lê disse estar grávida.

— Cara? Que cara?

— Cara de enterro, Lius, não tente despistar, eu sei o que vi.

— Tá bom, vou te falar, mas você não deve comentar com ninguém, promete?

Gorum deu com os ombros — prometo.

— Nem com a Beluna, aliás, principalmente não com ela.

— Que é isso, Luis? Preconceito?

— Não... É só que ela conhece muita gente... Então, pode dar problema.

— Tá bom! Mas fala de uma vez.

Gálius falou baixinho só para garantir que nenhum irmão bisbilhoteiro escutasse aquilo — É o seguinte. Uma coisa ruim vai acontecer. Eu e papai estamos sabendo. Não me pergunte como fiquei sabendo, mas quando estava trabalhando no palácio, soube de uma visão do Rei-Deus, um desastre que vai pegar toda a cidade.

— Desastre?

— Fala baixo!

— Como assim, Lius?

— Sei lá... um incêndio, ou algo pior, não sei.

— E o que o papai tem com isso?

— Eu contei para ele. Ele confirmou isso, você sabe daquela história dele de ter visões. Ele também viu.

— Porra, e vocês não iam contar isso pra gente?

— Olha, é complicado. Nós ainda não sabemos direito o que vai acontecer e também, não queríamos assustá-los.

— Isso vai ser quando?

— Não sei, Gorum. Só sei que estamos bolando um jeito de proteger nossa família. Talvez, fugir da cidade antes do desastre.

— É por isso que ele tá ensinando você a esgrimir?

— É...

— Bom, saiba que a partir de amanhã, eu vou aprender também.

— Não Gorum...

— Nem vem, Lius. Não vou ficar de braços cruzados. Eu posso ajudar e vou ajudar.

Gálius encolheu os ombros e aceitou. Não dava para argumentar.

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