³⁴| ᵉ̄ᵇᵃⁿᵒ| Maratona, Cap 4✔️
1.
“O termo vem do latim “ebĕnu”, por sua vez derivado do vocábulo grego “ébenos”
2.
“Ébano está relacionado com a cor preta, e é por isso que esse termo é usado figurativamente para descrever o que é um preto muito brilhante, por exemplo: "cavalo preto como ébano".
⚠️Alerta de gatilho ⚠️
Abuso de remédios
FALLON
— Fallon, está pronta? — minha irmã grita da sala.
— Um segundo! — grito de volta.
É véspera do Natal. E nós estamos indo para a casa dos Campbell.
Acha que estou nervosa? Ainda não viu nada.
Meu vestido é vermelho. E rodado.
Portia perguntou várias vezes se eu me sentiria à vontade com ele depois que peguei do seu guarda-roupa, mas eu garanti a ela que sim. Eu gosto de usar preto porque acho prático, além de combinar com a minha personalidade, mas até eu concordo que preto no Natal pode não ser uma boa ideia.
Então sim, eu fiz questão de usar um vestido vermelho.
Suas alças são finas e o decote é reto, nada muito escandaloso. Seu comprometimento chega até meus joelhos e há um laço nas costas.
Surpreendentemente me sinto bem nele.
Meu cabelo está partido ao meio e eu fiz cachos nas pontas. Minha maquiagem é bem simples e passei gloss nos lábios, além de um pouco de blush.
Graças a Deus eu tirei aquele gesso e minha mão está melhor — consequentemente disse a minha irmã que não precisa mais do remédio.
O colar que Atlas me deu continua em meu pescoço e eu sorrio ao tocá-lo. Então visto meu sobretudo, ponho minha bolsa no ombro e saio do quarto.
Portia já está me esperando. Ela está linda com seu vestido verde com corte reto. Sua maquiagem é tão simples quanto a minha, a não ser pelo batom vermelho.
Seu rosto está franzido, encarando a tela acesa do celular.
— Algum problema? — pergunto.
Sua expressão volta ao normal e ela sorri, guardando o celular.
— Nenhum. Você está linda.
— Obrigada. Você também.
Portia não reclama que estou usando meu allstar e isso é uma das coisas que mais amo na minha irmã. Mamãe nunca teria me deixado usar. Mas felizmente ela não está aqui para reclamar.
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É claro que minha irmã traria uma torta de framboesa mesmo eu dizendo que já teria comida o suficiente. Ela apenas me ignorou e aqui estamos nós na porta dos Campbell.
Eu esperava que Sulie ou qualquer outro empregado viesse abrir a porta, mas me surpreendo com a Sra Campbell nos recebendo.
— Feliz véspera de Natal! — Portia diz.
— Feliz véspera de Natal. — a Sra Campbell nos dá abraços rápidos. — Vocês estão lindas. Entrem, por favor.
Fazemos isso e minha irmã entrega a preciosa torta depois de entregarmos nossos casacos.
A Sra Campbell tem sido gentil nas últimas semanas. Acho que ela está começando a gostar de mim e sei o quanto a opinião da mãe é importante para Atlas.
Ela nos guia para a sala de estar onde Atlas está com Brittany e Drew. Eu fiquei feliz em saber que eles estariam aqui.
Peço licença a minha irmã e a Sra Campbell e vou até eles, parando quando um empregado me entrega uma taça de champanhe no caminho.
— Oi — digo, já abraçando Atlas pela cintura, que está usando um terno, como quando tudo começou.
— Que bom que você chegou. Atlas tava todo nervosinho — Drew diz.
Atlas revira os olhos, mas está sorrindo ao me dar um beijo.
— Você está linda — diz.
— Obrigada. — Devo estar corando, mas não me importo.
— Vocês são tão fofos. — Ouvimos Brittany dizer e olhamos para ela.
— Tá legal, eu não devo ser o único que acho isso estranho — Drew, como sempre, sendo o mais sincero de nós quatro.
— O que é estranho? — Brittany beberica do seu champanhe enquanto segura sua bolsa rosa. Sem surpresa alguma, ela está com um vestido da mesma cor com um casaco de pele branco.
— Vamos ver... — Drew continua. — Que tal começarmos pela parte que você não deixou nem Atlas nem Fallon em paz quando descobriu que os dois estavam juntos? Então, de repente, Fallon é sua nova melhor amiga e você shippa ela com seu ex?
Brittany revira os olhos.
— Você é tão dramático. Eu não fui tão ruim.
Atlas e eu a encaramos.
Brittany suspira.
— Ai, gente, isso é passado, né? Agora eu sou uma nova pessoa.
Nós rimos. Eu realmente gosto do nosso grupo, por mais confuso que seja.
Olho por cima do ombro, para os adultos reunidos do outro lado. Avisto um homem e uma mulher que presumo serem os pais de Brittany e dois garotos mais velhos que com certeza são seus irmãos.
A mãe de Drew está conversando com Portia e a Sra Campbell, enquanto o prefeito está no grupinho da família da Brittany com o...
— Aquele é o Dr Hawkins? — É a segunda vez que digo essa frase em semanas.
Atlas segue o meu olhar.
— Sim. Ele e meus pais estudaram juntos, estão mamãe o convidou, já que ele não tem família.
— Ah.
Volto minha atenção para os meus amigos, então.
Ficamos conversando até Atlas me puxar para um canto.
— Atlântico, o que você está aprontando? — pergunto, rindo.
— Nada. Só queria você para mim por um tempinho. — Ele beija meu pescoço.
— Eu sou toda sua — digo isso propositalmente e Atlas geme, apoiando sua testa na minha.
Olhamos um para um outro por um tempo enquanto ele acaricia minha bochecha e eu brinco com seu cabelo enquanto abraço seu pescoço.
— Estou feliz que você está aqui — diz.
— Eu também. Muito. — Dou um beijo rápido em seus lábios
— Aliás... — Atlas se afasta, olhando para mim e meu vestido. — Você está linda pra caralho.
Dou risada, não contando a ele como amo ouvi-lo xingar
— Acho melhor a gente voltar ou vão achar que estamos fazendo outra coisa — digo ao ouvir a campainha, sendo bem sugestiva para ele entender o que quero dizer.
— Eu gosto dessa ideia. — Ele pisca um olho, mas entrelaça os dedos nos meus mesmo assim, então voltamos para a sala.
Brittany e Drew estão sentados no sofá. Não sei como a família da primeira está reagindo, mas presumo que fazer um escândalo na frente de todos não seja um boa ideia.
Estamos indo nos juntar a eles quando quem tocou na campainha entra.
Entram, no plural, na verdade, pois são meus pais ali, sorrindo para nós.
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Todo meu corpo trava enquanto encaro os dois. Estão conversando com o Sr Campbell, quem abriu a porta, mas sei que em segundos estarão aqui. E eu não sei como reagir porque eles não deveriam estar aqui...
— Eu não os convidei. — Martha Campbell aprece no meu campo de visão.
— Então eles apareceram sem mais nem menos? — Atlas pergunta a mãe, sua mão em minhas costas. Ele percebeu minha mudança.
— Eu juro — Martha continua, atraindo minha atenção para o seu rosto. Ela parece estar sendo sincera. Seus olhos desviam para mim. — Quando convidei você e sua família, você disse que falaria com a sua irmã. Você não citou os seus pais, então eu entendi o recado.
— A culpa é minha. — Ouço a voz da minha irmã que para ao meu lado.
— Você os chamou? — pergunto, achando minha voz.
— Não! Não, eu... Eu encontrei com a mamãe e ela perguntou se não íamos passar o Natal em casa e eu deixei escapar que viríamos para cá. Eu sinto muito.
— Eu posso mandá-los embora — Martha diz. Eu não sei quando ela começou a ser solidária comigo, mas aprecio a sua oferta.
— Está tudo bem — digo. Três pares de olhos me encaram. — Sério. Mandá-los ir embora só causaria fofoca. E eu também não quero estragar o Natal.
— A presença deles já é tóxica o suficiente — Atlas murmura. Eu concordo com ele, mas algo no olhar de Portia chama minha atenção, como se ela estivesse ciente de algo que não estava antes, mas suas sobrancelhas franzidas também diz que ela está confusa.
Ela relaxa ao olhar para mim, dando um sorriso triste.
— Você está bem mesmo? — pergunta.
Faço que sim enquanto Atlas aperta minha cintura, dizendo silenciosamente que está aqui comigo.
— Achamos vocês.
Fecho os olhos por três segundos ao ouvir a voz fingida da minha mãe e tento relaxar ao abri-los outra vez.
Mamãe está elegante em seu vestido, um sorriso simpático no rosto, mas eu a conheço bem o suficiente para saber o que tem por trás da sua máscara. Papai segue no mesmo caminho, de terno e parecendo um homem decente.
— Sentimos muito por aparecer sem avisar — mamãe continua. — Mas quando Portia disse que estaria aqui, imaginamos que o convite fosse para toda a família.
— Certamente — a Sra Campbell diz, com um certo veneno na voz.
— Espero que o incidente de semanas atrás esteja no passado — papai diz. Sinto que dou um passo para trás ao ouvir sua voz.
— O senhor perdoa tão rápido — Atlas fala, me surpreendendo com seu sarcasmo não habitual.
Papai e Atlas se encaram por um momento, o primeiro com certeza não tendo esquecido que o segundo lhe socou a cara várias vezes. E na frente de uma igreja.
Mamãe pigarreia, sendo a mediadora.
— Fallon, querida, você está linda — diz. Sinto meu estômago revirar com a sua aprovação. — Temos sentido a sua falta.
— Tenho certeza que sim — digo, tentando não murmurar.
Papai semicerra os olhos para mim, provavelmente achando a minha reposta imprudente e merecedora de castigo.
Com o peso do seu olhar, eu tenho certeza que dessa vez dou um passo para trás.
— Eu preciso ir ao banheiro. — Sorrio, então tento me afastar deles sem parecer que estou fugindo.
Venho parar no corredor onde Atlas e eu estávamos momentos antes.
Com as costas na parede, fecho os olhos, pondo as mãos na barriga. Inspiro.
— Um, dois, três, quatro, cinco... — Expiro.
Faço isso de novo e de novo.
Eu disse que estava bem, mas fiquei boa em mentir ao longo dos anos.
Eu odeio que apenas a presença deles me deixe vulnerável. Eu queria ser forte e lembrar de tudo o que a minha psicóloga disse além dos exercícios de respiração, mas minha mente está vazia.
— Ei.
Abro os olhos ao ouvir a voz de Atlas, encontrando-o me encarando. Eu já esperava que ele ou Portia viesse atrás de mim.
— Eu estou bem — garanto-lhe. — Só preciso de um tempo sozinha.
— Tem certeza? — É claro que ele estaria preocupado comigo.
Tento sorri um pouco.
— Só me dê cinco minutos. — Eu amo a companhia dele, mas algumas situações tenho que enfrentar sozinha.
Dra Rossi, você estaria orgulhosa de mim agora.
— Ok. — Atlas me dá um beijo na testa e hesita antes de se afastar. — Estamos esperando você.
Anuo e o observo desaparecer pelo corredor.
Fecho os olhos outra vez e volto a contar enquanto inspiro e expiro.
Está tudo bem, eles não irão levar você.
Portia não vai deixar que nada aconteça.
O Natal não é importante para mim como é para a maioria das pessoas. Eu nunca acreditei em Papai Noel ou ganhei o presente dos sonhos. Sempre foi apenas mais um feriado no qual meus pais faziam questão de parecer a família perfeita. Para Portia eles podiam ser isso, claro, mas nunca para mim.
Afasto todos esse pensamentos, lembrando que mesmo com meus pais aqui, essa noite é diferente. Eu não preciso fingir nada. Além disso, tenho meus amigos e meu namorado.
Estou começando a me acalmar quando ouço passos e abro os olhos.
— Você sempre pareceu um ratinho. Sempre se escondendo — mamãe diz com um sorriso. Se ela queria fazer disso um comentário afetuoso, falhou. — Você está pálida. Tudo bem?
— Sim — digo simplesmente. Eu quero gritar com ela para que pare de fingir que se preocupa, mas me contenho. Não é desse jeito que se vence meus pais.
Em um ato que não consegui detectar até que ela estivesse próxima, mamãe me abraça.
Eu não faço nada além de fica paralisada, perguntando-me porque ela se dá o trabalho se estamos apenas nós duas.
— Eu lamento muito — diz, se afastando e segurando meus braços. — Seu pai se descontrolou da última vez.
— Só da última vez? — pergunto, minha voz como ácido. — Como se ele fosse bom o resto do tempo, não é?
— E finalmente você mostra suas garras — a mulher murmura, sorrindo como se soubesse de algo. — Estava me perguntando quanto tempo levaria para a fachada de garota triste e solitária passar.
Tiro suas mãos de mim.
— Quanto tempo a sua de mãe preocupada irá durar? — devolvo.
Mamãe suspira, balançando a cabeça.
— Eu não quero brigar, Fallon. Sim, nós não fomos bons para você, mas precisar nos entender. Você nunca foi uma criança fácil e se tornou uma adolescente ainda pior.
Ela é inacreditável.
— Ok. Eu não quero ouvir mais nada. — Me afasto dela. — Você é louca.
— Você irá se arrepender de desprezar seu pai e eu quando só restar nós dois outra vez para acolhê-la. Sua irmã está indo embora e com certeza esse seu namoro não...
— O que você disse? — Franzo as sobrancelhas. Eu não posso ter ouvido errado quando estou perto dela o suficiente para dicerir suas palavras.
— Não se faça de sonsa...
— Não. Não... O que... Sobre a Portia, o que você quis dizer? — Ela disse, não disse?
— Oh... — mamãe estuda minha expressão então a sua se transforma em pena. — Ela não contou?
— Contou o quê?
— Portia recebeu uma proposta de emprego em Seattle, querida. Ela não te contou?
Eu não respondo, mas está óbvio.
Ela não contou.
Ela vai me deixar...? Depois de toda aquela história sobre ter voltado para Greenwood por minha causa, ela está me deixando? Eu sei que não sou responsabilidade sua, ela é apenas minha irmã, mas... Eu pensei...
Então é por isso que ela tem estado tão área ultimamente? Estava tentando achar um jeito de me contar? Quando ela faria isso? Há quanto tempo ela está planejando ir? E por quanto tempo irá ficar?
— ... mas você não precisa se preocupar — mamãe ainda está dizendo, sua mão em meu braço como se estivesse me consolando. — Seu pai e eu não estamos bravos com você, pode voltar antes da sua irmã ir.
— Voltar? — pergunto já sabendo, mas minha voz treme mesmo assim.
— Sim, querida. Voltar para casa. Com sua irmã indo embora, você finalmente irá voltar para nós.
Voltar para aquela casa. Para eles. Para aquele quarto repleto de memórias onde todas envolvem alguma cicatriz, umas em minha pele, outras em minha alma.
— Eu... Eu preciso ir ao banheiro — murmuro, já me afastando dela.
Tento manter meus passos firmes ao voltar para sala. Olho rapidamente em volta, mas minha visão está meio borrada e eu não encontro minha irmã.
— Você voltou. Quer biscoitos? — Atlas aparece em minha frente.
— Sim, mas agora eu preciso ir ao banheiro — digo o mais normalmente que posso, forçando um sorriso.
— Tá tudo bem mesmo? — Seu tom de voz é baixo e ele põe a mão em minhas costas.
— Sim. Tá, sim. Eu já volto. — Dou um selinho nele, forçando um sorriso e pego minha bolsa no sofá.
Ao virar, meu sorriso de desmancha e eu subo as escadas.
Acho um banheiro rapidamente, ansiosa demais para ir no do seu quarto, e fecho a porta.
Vou correndo até a pia, segurando o mármore com ambas as mãos.
Inspirar e expirar.
— Um, dois, três... — Minha voz treme e eu seguro o mármore com mais força. — Q-quatro, cinc-co...
Mas eu não consigo mais fazer isso e solto a respiração com força, me curvando sobre a pia.
Ela vai embora.
Eu não esperava que ela ficasse para sempre nessa cidade, mas achei que ela podia esperar um pouco até eu terminar a escola.
Talvez se eu falar com ela...
Sim, eu posso pedir isso a ela...
Não, você não pode.
Não seria justo com ela. Sendo minha irmã ou não, não é sua responsabilidade e se ela quer ir... Eu não posso impedi-la.
Mas também não posso voltar para a casa dos meus pais. Pensar nisso...
Me curvo ainda mais sobre a pia quando a ânsia de vômito sobe por minha garganta.
Mas nada sai além de tosse.
Estou trêmula.
Eu não posso voltar a morar com eles. Não posso voltar para aquela rotina de ódio e amargura. Não acredito em mamãe, sei que no primeiro momento que eu puser os pés naquela casa, serei alvo de todo tipo de punição e palavras odiosas.
Eu não posso voltar.
Eu não posso voltar.
Eu não posso voltar.
— Eu não posso — sussurro, lágrimas molhando minhas bochechas.
Eu não posso fazer isso. Os últimos meses tem sido o paraíso, mesmo as minhas ocasionais crises não serão nada comparado ao tormento que será voltar a morar com meus pais.
Mas tudo o que é bom dura pouco, não é?
O que foi que eu disse a Atlas dias atrás? Que tenho medo de ficar feliz demais porque as coisas sempre desmoronam?
Eu estava certa, não estava?
Lembro da minha bolsa e coloco em cima da pia, abrindo e pegando meu celular.
Atlas.
Eu preciso dele. Não sei o que ele pode fazer, mas apenas me abraçar será o suficiente para que eu possa pensar melhor. Eu sempre penso melhor quando estou com ele...
Enxugo meu rosto pois está tudo embaçado e não consigo colocar a senha certa no celular...
Então percebo que esse não é o meu, mas o de Portia.
Eu peguei a sua bolsa por engano.
Deixando o celular na pia, suspirando, fecho os olhos e tento fazer os exercícios de respiração outra vez, mas minha mente está barulhenta e eu não consigo pensar...
Não consigo respirar.
Abro os olhos, lembrando de algo.
Voltando para a bolsa, tiro dela o frasco de remédio, feliz que a minha irmã não o jogou fora uma vez que ela estava responsável por ele depois que contei sobre meu vício.
Eu sei que não devia.
Deus, eu realmente sei disso, mas tudo isso é demais.
Apenas por um momento, é o que digo a mim mesma, preciso de silêncio por apenas um momento e há tanta coisa na minha cabeça me impedindo de pensar...
Abrindo o frasco, despejo todos os comprimidos na minha mão. Não me importo com a quantidade, se há dez deles na minha palma e não dois que é o tolerado.
Não penso nisso ao colocar tudo na minha boca, feliz que vou ter um pouco de silêncio. É só o que eu quero, só o que eu preciso.
Silêncio...
A porta do banheiro abre.
— Ai, meu Deus, te achei! Sabia que o Atlas fica irritado quando você não est... — Brittany para de falar ao me ver, congelando por um segundo enquanto seus olhos deslizam para o frasco aberto na pia e para mim.
Assim que junta as pessoas, seus olhos se arrgalam e ela bate a porta, vindo até mim.
Antes que eu a impeça, sua mão está em minha nuca e ela empurrando meu rosto até a pia.
— Cospe — manda. — Merda, Fallon, cospe agora!
Eu não tenho muita escolha quando ela põe o dedo na minha boca, fazendo eu sentir ânsia de vômito outra vez.
Mas agora eu realmente vomito, engasgando no processo, mas cada comprimido que pus na boca, está agora dentro da pia.
Tossindo, me afasto de Brittany.
Ela também se afasta, suas costas batendo na porta.
Nós duas não falamos nada.
Olhando para a pia, me dou conta do que teria acontecido se Brittany não tivesse chegado.
Ah, meu Deus. O que eu estava fazendo?
Minhas mãos estão tremendo e minha respiração rápida e superficial.
— Eu não ia fazer isso... — sussurro com as lágrimas molhando minhas bochechas. — Eu juro, eu não ia. Eu... Eu... só queria...
— Ei. Tá tudo bem. — Brittany vem até mim, me abraçando.
— Não suporto eles. Eu não posso voltar — sussurro, me odiando por ser fraca e sensível. Por eles fazerem isso comigo.
— Shh... Você precisa se acalmar, ok? — Brittany se afasta, enxugando meu rosto. — Venha, sente-se aqui. — Ela me faz sentar na tampa da privada. — Eu vou pegar um copo d'água para você...
— Não. — Seguro seu pulso, impedindo-a.
— Tudo bem. Eu não à lugar algum. — A loira se ajoelha a minha frente e segura minhas duas mãos. — Vamos fazer um exercício de respiração, tá bom? Isso vai ajudar você a se acalmar.
Quero dizer a ela que já tentei isso, mas sigo os passos de Brittany mesmo assim. Ela respira, contando comigo e murmurando que estou indo bem.
Não estou mais chorando quando me acalmo, mas me sinto uma idiota com a forma como eles têm poder sobre mim.
Me autodepreciar não é o caminho, mas me sinto tão burra ao pensar que tudo ficaria bem comigo morando com a Portia.
Mais uma vez tudo está desmoronando. E o pior é a forma como eu lido com isso. O que poderia ter acontecido caso Brittany não tivesse invadido o banheiro atrás de mim.
Eles teriam vencido, porque eles sempre vencem.
— Ok... Agora me conte o que está acontecendo — Brittany pede, voltando a enxugar meu rosto.
— Minha irmã vai embora — sussuro. Sei que não tenho o direito de me sentir traída, mas o fato de ela não ter contado está doendo. — Meus pais querem que eu volte a morar com eles.
— Eu sinto muito. Você já conversou com a sua irmã?
Faço que não.
— Foi a minha mãe que me contou.
— Tahvez você devesse conversar com a Portia, o que acha? Ela deve ter uma explicação.
— Eu não quero que ela se sinta obrigada a ficar por minha causa. Ela já está fazendo demais ao me deixar ficar na casa dela esse tempo. Eu não quero ser um peso. — Engulo em seco, encolhendo os ombros.
— Você não é um peso, Fallon. Eu vi como sua irmã se preocupa com você. Ela te ama e te quer bem.
Solto minhas mãos das suas e cubro meu rosto.
Em que ponto eu cheguei para ter Brittany me consolando? Não que ela seja ruim — pelo menos não mais — só que isso é algo que eu nunca teria imaginado antes.
Além disso, me sinto envergonhada por ela ter visto toda essa cena. Já é ruim o bastante que eu ocasionalmente perca o controle na frente de Atlas, agora Brittany também, ciente da confissão que eu sou.
— Desculpe por te colocar nessa situação — digo, não olhando para ela.
— Nada de desculpas. Nós somos amigas agora, lembra? — Ela abaixa minhas mãos e sorri. — Você está bem para voltar lá para baixo?
Antes que eu responda, ouvimos batidas na porta.
— Fallon? — Atlas chama.
Olho desesperada para Brittany. Atlas não pode saber o que aconteceu. Pelo menos ainda não. Eu não quero estragar a noite ou que ele fique preocupado comigo.
Eu não digo nada disso em voz alta, mas Brittany parece entender, pois fica de pé num pulo assim que a maçaneta gira.
— Desculpe, banheiro ocupado — a loira diz, segurando a porta e deixando apenas uma fresta aberta. Não há como ele me ver.
— Fallon está aí? Eu não a encontro em lugar algum. — Sua voz preocupada aperta meu coração.
— Está, mas estamos ocupadas. Já vamos descer.
— O que estão fazendo? Por que Fallon está calada?
— É coisa de garota. — Acho que Atlas não cai nessa, pois Brittany diz em seguida: — Não me olhe com essa casa. O que você acha que eu fiz? Matei a garota?
— Agora que você disse, é uma possibilidade, sim.
Aposto que Brittany revirou os olhos pois ela suspira.
— Fallon, dê um sinal para ele, por favor — pede.
— Hã... Oi — digo, mas é baixo e não tão espontâneo como eu queria.
— Oi. Você está bem? Brittany está mantendo você contra a sua vontade?
— Eu estou profundamente ofendida por você apenas cogitar a ideia — Brittany resmunga.
— Eu estou bem — garanto a ele.
— Por que tanto mistério? O que vocês estão fazendo? Por que eu não posso entrar? — Atlas continua insistindo e eu admito que admiro isso.
— Meu Deus, como você é chato! — Brittany explode. — Quer a verdade?
— Eu apreciaria muito isso.
Meu coração para. Ela vai deixá-lo entrar? Ele não pode...
— Se chama mens-tru-a-ção e nós, garotas, fomos amaldiçoadas com ela, mas você certamente não sabe como é isso porque não é você que precisa sangrar todo mês, por dias a fio. Sabe quanto horrível é ter sangue sendo liberado pela vagina? Não! Sabe o que precisamos passar com cólicas horríveis que parece ter um bicho de cabeça no nosso útero? Não! Sabe como nossas emoções ficam alteradas? Não! Sabe...
— Okaaaaaaay — Atlas diz e eu posso dizer com toda certeza que ele está vermelho. — Eu estou indo embora. Você está absolutamente certa, eu não sei nada sobre isso. Eu até sinto muito por ser homem agora e não poder compartilhar tudo isso. Você tem tooooda a minha solidariedade. — Enquanto fala, ouço seus passos se afastando.
— Sabe o que eu quero que você faça com a sua solidariedade agora?!
— Infelizmente tenho uma imaginação muito fértil e consigo imaginar...
— Atlas, apenas cale a boca! — grito, rindo.
— Você quem manda. Eu estou as suas ordens, meu amor. Completamente ao seu dispor.
— Ok. Agora vá embora.
— É pra já.
Sei que ele sumiu quando Brittany fecha a porta, se encostando nela, então nós duas caímos na gargalhada.
— Ai, meu Deus! Por que eles agem como se menstruação fosse uma coisa de outro mundo? — Brittany pergunta em meio ao riso. — É apenas sangue, pelo amor de Deus!
A cena toda parece improvável. Há cinco minutos atrás, eu estava chorando e sendo consolada pela ex do meu namorado que está muito próxima de se tornar minha melhor amiga, então agora estamos rindo como duas hienas.
O peso dos últimos minutos não parece pesar tanto agora e eu me sinto mais leve ao respirar.
Quando nossas risadas cessão, encaramos uma a outra de novo.
— Obrigada — digo, minha voz embargada. Quero chorar, mas não tem a ver com meus pais. Bom, talvez um pouco já que foram eles que me colocaram nessa situação, mas estou agradecida a Brittany por ter vindo. — Se você tivesse chegado um minuto depois...
— Não pense nisso.
— Eu preciso. Um minuto salvou a minha vida hoje. — Olho para ela. — Você salvou minha vida, Brittany. Obrigada.
Ela vem me abraçar e nós ficamos assim por um tempo.
←↑↓→
Fico meio chocada ao perceber que faltam duas horas para meia noite ainda. Achei que tínhamos passado uma eternidade naquele banheiro.
Assim que voltamos para a sala, Portia vem até mim. Não olho para ver onde nossos pais estão. Quero ignorá-los o resto da noite se puder.
— Ei. Onde esteve? — minha irmã pergunta.
— Por aí — é uma resposta seca e ela percebe isso.
Falando mais baixo, Portia pergunta:
— Está tudo bem?
— Melhor impossível. — Olho em volta, avistando Atlas. Não olho para minha irmã ao dizer: — Com licença.
Meu peito dói a cada passo longe dela, porque odeio e por mais que eu esteja fazendo um esforço para ser madura, ainda estou muito magoada para essa conversa. E quando fico magoada, também sou perversa, por isso deixo ela no escuro como ela fez comigo.
Atlas está perto de uma das janelas próxima ao piano, olhando para o ceu, para a lua em todo o seu esplendor.
— Minutos antes de você me arrastar de volta para o escritório, — começo, abraçando-o por trás e espiando a lua por cima do seu ombro — ela estava me fazendo companhia.
— Eu arrastei você, é? — Ele deve estar arqueando a sobrancelha.
— Eu não tenho falado muito com ela desde que você entrou na minha vida.
— Me sinto mal agora. — Atlas entrelaça nossas mãos e beija meus dedos.
Estou com medo de lhe encarar e ele perceber que há algo de errado. Ele sempre sabe, mesmo que Brittany tenha retocado minha maquiagem para disfarçar a cara inchada.
Ficamos assim por vários minutos, apenas ouvindo a respiração um do outro enquanto observavamos a lua. Eu nunca tinha feito isso com ninguém e parece meio bobo, mas eu gosto.
Gosto muito de observar a lua. Gosto muito de Atlas. E eu tenho as duas coisas.
— Por que você está sorrindo? — Atlas pergunta.
Encaro sua nuca, meus olhos semicerrados.
— Como você sabe que eu estou?
— Eu senti.
— Você sentiu? Você começou a adquirir superpoderes de tanto assistir filme de super-herói?
Atlas ri, virando-se para mim.
— Eu vi pelo reflexo da janela, bobinha. Mas foi legal da sua parte achar que eu tenho superpoderes.
Dou um soco em seu ombro, mas ele me vence com seu sorriso, me dando um beijo.
— Na verdade — sussurro contra seus lábios — você tem vários superpoderes.
— Ah, é? — Arqueia a sobrancelha, seu sorrisinho ficando mais largo.
— Uhum...
— Por exemplo...?
— Me fazer sorrir. — Entrelaço meus braços em seu pescoço. — Ser o cafona mais lindo do planeta. Beijar muito bem. — Ele faz exatamente isso. — E o mais importante... — Me aproximo mais para sussurrar em seu ouvido. — Ser um ótimo aprendiz.
Atlas geme, apertando seus braços ao redor de mim e beijando meu pescoço.
— Eu quero tanto fazer amor com você agora.
Rio baixinho, amando fazê-lo perder o controle.
Na verdade, amo muitas coisas em Atlas.
Engulo em seco. Não é a primeira vez que penso coisas assim. E cada vez mais que a palavra amor surge, percebo que não me aterroriza tanto assim.
Quando a palavra amor surge, eu a assimilo a Atlas. Porque ele... O que eu sinto por ele...
— Posso pedir uma coisa de presente? — pergunto.
— Ainda não é meia-noite — diz, brincalhão.
— Por favor?
— Tá bom. Manda.
Passo a mão por seu cabelo e depois por seu rosto porque gosta de observá-lo. É clichê, eu sei, mas eu não ligo.
— Toque para mim.
— Você vai dizer o que há de errado, então?
Sorrio. É claro que ele saberia.
— Mais tarde. Prometo.
— O que eu não faço por você... — Atlas balança a cabeça, se afastando.
— Até parece. Seus dedos estavam coçando para poder tocar.
Ele pisca um olho, sorrindo porque sabe que estou certa, então vai até o piano, sentando-se no banquinho.
Encosto-me no batente da janela e o observo.
Atlas não se importa com o barulho das vozes conversando quando começa a tocar. Ele está sorrindo enquanto seus dedos dançam nas teclas do piano, reproduzindo o som que faz meu coração vibrar.
Eu o vi tocar mais algumas vezes depois daquele dia, mas agora é diferente. Ele está tocando para mim. Isso faz eu me sentir meio boba mais uma vez, ao mesmo tempo que especial.
Fecho os olhos, deixando todo o "drama" com meus pais e Portia sumir por instante e me concentro apenas no som do piano, em como acalma meu coração. Eu respiro de verdade desde a hora que meus pais chegaram.
Ao abrir os olhos, encontro o oceano em suas íris azuis.
— Eu te amo — diz, sem emitir som.
Seguro o colar ao sorrir, ainda encantada com a sua música.
Depois da última tecla ser tocada, os aplausos me fazem olhar em volta e eu percebo que não era a única admirada com Atlas.
Ele fica vermelho quando sua mãe e os outros começam a elogiá-lo. É fofo e eu fico feliz que as pessoas saibam do seu talento.
Seu pai não está na rodinha que cobre Atlas de elogios, mas tenho certeza que vejo admiração em seus olhos.
Aos poucos ele irá perceber a joia rara que é o seu filho.
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Ignorar meus pais é difícil, mas eu me esforço o máximo possível pelo resto da noite. As palavras de minha mãe ainda martelam na minha mente, assim como a vontade de perguntar a Portia, mas eu sei que é verdade. Minha mãe não é a pessoa mais confiável do mundo, mas minha irmã tem andando estranho ultimamente, e mesmo querendo a verdade da boca dela, não lidei bem com isso mais cedo, e não quero lidar agora.
Apesar da tensão que cobre a minha família, os outros presentes e ou não notaram, ou resolvem ignorar, pois o jantar segue normalmente. Fico feliz ao ver a mãe de Brittany conversando com Drew. Parece que tem algo a ver com tecnologia, algo que Drew sabe bastante.
Eu falo pouco, escolhendo observar entre ignorar meus pais. Eu sabia que Atlas cresceu no meio disso, de jantares e festas, mas vê-lo em ação é diferente, ele quase não parece aquele garoto tímido com quem estou acostumada.
Seu pai também ficou quieto durante o jantar, falando apenas algumas coisas, mas eu notei mais de uma vez ele encarando o filho. Espero que ele esteja pensando sobre como é um idiota ao tentar impedir Atlas de seguir seu sonho.
— Acho que você já tomou vinho demais — Portia diz ao meu lado. Demoro um tempo para perceber que ela está falando comigo, levando minha taça para longe quando alguém do buffet tenta enchê-la novamente. Como é natal, os adolescentes foram permitidos a beber vinho, como se já não ingeríssemos bebida alcoólica.
— Eu dispenso sua preocupação — murmuro, mas deixo o vinho para lá.
Um minuto passa enquanto tento prestar atenção no que Atlas está dizendo ao Dr Hawkins, mas antes que eu tenha a chance de entender, Portia volta a sussurrar para apenas que eu ouça.
— Posso falar com você um minuto?
Penso em recusar, mas não quero fazer uma cena, então nós duas pedimos licença e eu sigo minha irmã até um canto na sala, onde ninguém possa nos ver.
— O que há de errado? — Portia é a primeira a falar.
Eu a encaro, considerando mentir. Eu sei que não devo ficar com raiva dela, que é infantil e tudo mais, mas eu me sinto um pouco traída. Apesar disso, tratá-la com ignorância, como eu fiz desde que descobri também não é justo.
— Quando você ia me contar que vai embora para Seattle? — pergunto, mantendo meu tom de voz baixo.
Minha irmã pisca, surpresa, então abre e fecha a boca várias vezes, antes de fechar os olhos e suspirar.
— Como?
— A mamãe fez questão de me dar a grande notícia.
— Claro que ela fez. — Portia abre os olhos, mas não me encara. — Eu recebi uma proposta de emprego em Seattle, sim, mas ainda não aceitei.
— Por quê? — obrigo-me a perguntar. Seus olhos verdes travam com os meus.
— Estava esperando você completar dezoito anos. Se nós fôssemos com você ainda sendo menor de idade, eu teria que entrar na justiça para conseguir a sua guarda, então achei me...
— Espera, o quê? — Franzo as sobrancelhas. Portia também. — Você disse "nós"?
— Sim. Você achou que eu iria e deixaria você aqui? — Não respondo, mas o que quer que ela veja em meu rosto, é resposta o suficiente. — Você achou, não é? Por isso você estava toda estranha comigo, achou que eu abandonaria você.
Desvio dos seus olhos, mordendo o interior da minha bochecha.
— Ah, Fallon... — sussura, um minuto antes de seus braços me envolverem. — Desculpe. Eu deveria ter contado antes, eu só não sabia como você reagiria com a ideia de se mudar. Não pensei que a mamãe seria... a mamãe.
— Ela disse que eu teria que voltar — murmuro.
— Você nunca vai voltar para aquela casa. — A forma como ela fala faz os pelos da minha nuca se arrepiarem.
Mas eu acredito nela. Seja porque ela nunca me deixaria voltar, ou porque eu não me permitiria.
~•~
O que acharam do capítulo?
Acham que a Fallon vai se mudar com a Portia?
Último capítulo dessa maratona!
Esperam que tenham gostado! Vou tentar voltar a postar regularmente 😘♥️
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2bjs, môres♥
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