⁴⁰|ˡᵃᵛᵃⁿᵈᵃ

1.
“A tonalidade suave é o resultado da mistura entre os tons de azul, roxo e branco. Por isso, a cor lavanda significado é calma e espiritualidade.
2.

O nome lavanda vem do latim “lavare”, que significa “lavar”.”

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⚠️Alerta de gatilho⚠️

Violência
• Menção a abuso sexual



ATLAS

Antes

Faz quinze minutos que Drew e eu estamos esperando dentro do meu corro, em silêncio, enquanto observamos o homem lá dentro, que não faz ideia do que o aguarda.

Talvez a raiva que eu sinta agora seja irracional, mas estou calmo. A explosão de antes — quebrar a janela do banco de trás do meu carro — foi substituída por uma frieza que eu não reconheço, mas que é bem vinda enquanto aguardo pacientemente.

Drew sugeriu que fizéssemos isso à noite, mas seria mais difícil seguir Morris o dia todo, e apesar da minha calma, não posso garantir que é permanente, que se passar mais quinze minutos, não irei entrar lá e arrastá-lo pelo asfalto.

Cinco minutos depois que penso isso, o homem sai do estabelecimento. Ele caminha tranquilamente enquanto acende um cigarro, guardando o esqueiro no bolso antes de tirar as chaves e abrir a caminhonete, entrando nela em seguida.

Eu espero trinta segundos antes de ligar meu carro e seguí-lo quando ele sai do estacionamento.

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Talvez o universo esteja do meu lado, afinal de contas, porque seguimos Morris até a saída da cidade. Talvez ele pretendesse ir embora de vez. Essa foi a única coisa que me fez hesitar antes de decidir que não me importo e ultrapassar o carro dele.

Girando o volante, paro o carro de modo atravessado na pista, obrigando Morris a frear.

— Tem cordas no porta-malas, pegue-as — aviso, mas sem encarar Drew ao sair do carro, minha atenção fixa no homem saindo do próprio veículo. — Depois estacione.

— Parece que você escolheu um lugar bem peculiar para parar seu carro, garoto — Morris diz, olhando para mim e meu corro. — Há algo que eu possa fazer por você e seu amigo?

Eu devia ter tirado o meu terno, penso enquanto dou passos lentos até ele, como se eu não estivesse me corroendo por dentro para socar sua cara. E sobre o terno, será um incomodo daqui há alguns minutos, tenho certeza, mas deixo de pensar nisso por um segundo.

— O quê, você é mudo? — Morris já parece estar perdendo a paciência. — Eu realmente não quero chamar a polícia, mas...

Ele cala a boca. Bom, eu dou um soco nele, então ele cala a boca.

Eu não sinto a dor em meu punho ao encarar Morris, que está com a mão no rosto, praguejando, antes de se concertar e olhar para mim. Está furioso.

— Você ficou maluco? Quem é você?

Ele não me conhece, isso é bom. Tão bom que eu o acerto novamente. Dessa vez, ele tropeça, batendo as costas na frente do seu carro.

Ele se recupera mais rápido dessa vez, porém.

— Olha aqui, seu...

Eu o acerto uma terceira vez, e uma quarta ao lhe dar um soco no estômago.

Morris cai no chão. Minha respiração está alta para os meus próprios ouvidos e minha mão está latejando, mas é uma dor distante comparada a raiva que emana por meu corpo.

Enquanto Morris tosse no chão, Drew aparece ao meu lado.

— Estacione o carro dele também — peço. Já é arriscado ter dois carros estacionado no acostamento, porém melhor do que no meio da pista.

Drew vai fazer o que eu falei e eu me agacho, pegando os braços de Morris e amarrando seus pulsos para trás. Eu tenho essa corda para me exercitar, além das minhas corridas diárias. Eu a mantenho no carro por um motivo que não me lembro mais, mas que é bem conveniente para o momento.

— Eu não sei o que você quer comigo, mas vai se arrepender! — Morris esbraveja quando eu o ergo, empurrando para que ande.

Ele é um homem grande, mas não tanto. Além disso, é velho. Eu queria que Fallon tivesse tido a mesma facilidade que eu tive de imobilizar Morris. Mas ela não teve e esse pensamento só me faz empurrar o homem com mais força.

Morris cambaleia, mas continua andando em direção a mata.

Sempre brincamos na escola que Greenwood foi construída no meio de uma floresta, porque é rodeada de árvores, matos e caminhos escondidos. Eu não andei muito por essas florestas quando era criança, mas conheço o suficiente para saber que quando paro com Morris com várias árvores a nossa volta, ninguém irá nos encontrar aqui até termos terminado.

O homem me olha de forma ameaçadora, mesmo amarrado tentando manter alguma dignidade e provavelmente esperando que eu recue diante a ameaça silenciosa em seus olhos.

Eu não faço isso, porém. Pelo contrário, eu acerto seu rosto com outro soco, fazendo-o dar alguns passos para trás e cuspir sangue em seguida.

— Que tipo de homem é você, que encurrala outro e o apunhá-la enquanto está amarrado? — Morris questiona.

— Esse é um assunto que você sabe bem, não é? — pergunto, rondando-o. — Encurralar e se aproveitar.

Observo sua postura enrijecer, apesar de ele continuar calado. Pergunto-me se ele está pensando em Fallon, se está lembrando do que fez com ela.

Pensar nisso me faz acertá-lo novamente. Nessa altura, seu rosto já está com hematomas e sangue escorre por seu nariz e pelo canto da boca. Pouco. Isso é muito pouco comparado ao que ele merece.

— Achei isso aqui na caminhonete. — A voz de Drew se sobressai no rugido em minha cabeça quando ele aparece com com pé de cabra na mão, o olhar duro em Morris.

Os olhos do homem se arregalam quando Drew me entrega a ferramenta. É o primeiro sinal de medo real que ele demonstra, mas nem isso me faz recuar.

Entretanto, Morris tenta correr. Acho que seu plano era derrubar um de nós enquanto passasse correndo, mas Drew acerta um soco em seu rosto, fazendo-o voar para trás e cair no chão.

Ele torna a tossir, arrastando-se para trás e cuspindo sangue. Sentindo o metal gelado em minha mão, busco por algum arrependimento, algo que me faça voltar atrás, mas conforme olho para o homem caído no chão, tudo que quero fazer é continuar, fazê-lo pagar.

— Eu tenho dinheiro, se é isso que você quer.  — Morris tenta, se contorcendo no chão. — Não precisamos falar do que aconteceu aqui com ninguém, se vocês me deixarem ir.

— Você não a deixou ir, não é, Morris? — pergunto calmamente ao me agachar ao lado da sua cabeça. — Por que eu deveria deixá-lo ir, então?

Ele não responde de imediato, até eu olhá-lo.

— Eu não sei do que está falando. Você está me confundin...

— Fallon Marshall. Treze anos de idade — recito as palavras, apertando firmemente o pé de cabra em minhas mãos até os nós dos meus dedos ficarem brancos. — Lembra-se dela, Morris?

Ele está nervoso. Eu vejo isso na forma como ele respira rapidamente, tentando rastejar para longe de mim quando a compreensão brilha em seu olhar. O desgraçado se lembra dela.

— Eu posso... posso explicar — gagueja.

— Explicar? Diga-me, como se explica ter estuprado uma criança, seu filho da puta — Drew esbraveja, chutando Morris no estômago.

Morris urra de dor, respirando pesadamente.

Eu fico pé, olhando fixamente para ele.

Explicar. Ele acha que pode explicar o que fez? Que tem uma justificativa? Que foi sem querer?

Pego-o pela camisa e o jogo em uma árvore, segurando-o para que olhe em meus olhos.

— Ela tinha treze anos! — grito, enfurecido. — E mesmo que fosse mais velha, você a estuprou. Como pode pensar que há uma explicação para isso, seu doente de merda?!

Afasto-me dele, passando minha mão por meu rosto e depois por meus cabelos, enquanto ando de um lado para o outro.

— Você é o namorado dela, não é? — Ouço Morris perguntar. Não respondo. — Eu tenho uma outra pergunta.

— Se eu fosse você, calaria a porra dessa boca — Drew adverte.

Morris, porém, o ignora, perguntando a mim:

— Ela ainda é tão boa como era quando mais nova?

Eu paro de andar.

— Eu a vi no mercado, sabe. E, cara... Ela fica tão bem naquele short...

Eu perco a cabeça. Qualquer raciocínio se perde em minha mente e tudo que consigo ouvir é o rugido dos meus batimentos cardíacos quando acerto o pé de cabra na cara de Morris.

E de novo.

E de novo.

E de novo.

Eu perco a conta de quantas vezes meus braços sobem e descem num ritmo constante no pedaço de merda que é o corpo de Morris.

Antes de bater em Mark, eu nunca tinha agredido ninguém, mas enquanto descarrego todas as minhas forças em garantir que eu esteja batendo em Morris com força o suficiente para ele nunca esquecer, não me sinto nenhum pouco mal. Mas também não me sinto bem. Eu continuo com raiva, continuo lembrando o que foi feito a Fallon, continuo vendo-a encolhida na cama, ouço seu choro e seus gritos de terror.

Eu não tenho consciência de mais nada além disso até alguém estar me segurando.

Encaro os olhos castanhos de Drew enquanto inspiro e expiro pesadamente, sentindo meu corpo quente de fúria e perguntando-me por que ele me afastou, por que não me deixou continuar.

— Chega. Basta, Atlas — Drew está dizendo, suas mãos em meus ombros, detendo-me. — Ele já teve o que merecia.

— Ele não teve nem a metade — retruco, minha voz rouca e estranha.

— Continue e irá matá-lo.

Eu pisco para o meu amigo, antes de olhar para a coisa encolhida no chão. De início, tudo o que vejo é sangue e apenas depois de alguns segundos de raciocínio, percebo o peito subindo e descendo lentamente.

Morris. Vivo, mas inconsciente.

Tensiono a mandíbula.

— Ele merece mais do que isso — digo.

Drew anue.

— Sim, mas não podemos fazer mais nada. Ok? Vamos embora daqui. Alguém deve passar em breve e ver o carro dele, então parar para dar auxílio e achá-lo aqui. Vamos — repete quando fico parado.

Eu não discuto mais, deixando meu amigo me levar embora.

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Isso foi há três dias.

Agora, eu encaro Fallon após contar o que eu fiz.

Seu semblante esteve do mesmo jeito desde que comecei a contar: inexpressivo. Eu não faço ideia de como ela consegue se manter tão neutra, mas está me deixando nervoso.

— Diga alguma coisa, por favor — sussurro, sentindo as batidas rápidas do meu coração.

Eu não estou com vergonha do que eu fiz ou arrependido, mas com medo do que Fallon pode começar a pensar de mim agora, de toda essa violência.

— Eu não... — começa, desviando dos meus olhos, antes de balançar a cabeça. — Você... — Ela inspira, voltando seus olhos para mim. Numa questão de segundos, todas as emoções estão de volta em seu rosto e eu encaro sua expressão de desespero e agonia. — Você é louco. Eu não acredito que você... — Ela passa as mãos no rosto, voltando a abaixá-las em seguida. — Deus, você pode ser preso! Ele pode identificar você. Atlas, ele pode estar fazendo isso agora mesmo. E o Drew... Oh, meu Deus. Vocês dois podem ser presos!

— Espere... — Pisco algumas vezes, sentindo um pouco da tensão se desfazer. — É com isso que está preocupada? Que eu seja preso?

Fallon me olha como se eu fosse realmente louco.

— E com o que mais seria?! Isso tudo é culpa minha. Você fez isso porque achou que devia e agora vai ser preso e eu não posso fazer nada. Não há como ele não saber quem é você numa altura dessas. E você ouviu o que Portia disse? A polícia está procurando os responsáveis! Vão chegar até vocês...

— Fallon, ei. Acalme-se, ok? — peço, segurando seus ombros. Ela está respirando rápido demais e eu a conheço muito bem para saber que está tendo uma crise agora.

Porra, eu fui tão egoísta, pensando que contar isso a ela poderia assustá-la, que não me passou pela cabeça que ela poderia ter uma possível crise de ansiedade. Causada por mim.

— Eu sinto muito, não queria deixá-la assim — digo, realmente me sentindo culpado.

— Você precisa contar ao seu pai. Você e Drew precisam de um advogado. Talvez por ser filho do prefeito, eles deixem isso passar, certo? — Fallon me olha preocupada, não parecendo ter ouvido o que eu disse ou estar ciente que está tremendo. — Talvez Morris se sinta intimidado por isso, não é?

— Fallon — seu nome sai dos meus lábios como uma ordem, o que obviamente é incomum, mas a faz parar de falar descontroladamente. — Respire, ok?

Ela anue, engolindo em seco.

— Ok.

Nós respiramos juntos e em sincronia por um tempo, sem tirar os olhos um do outro. Eu apoio minha testa na sua, segurando seu rosto entre minhas mãos.

— Tudo bem? — sussurro depois de um tempo.

Ela balança minimamente a cabeça, negando ao fechar os olhos.

Eu espero.

— Ele pode matar você — diz finalmente, depois de um tempo.

— O quê? — Afasto-me, apesar de ainda segurá-la.

— Quando... Quando tudo aconteceu, ele disse que mataria Portia se eu contasse a alguém. Eu acreditei nele porque pude ver que estava sendo sincero. — Ela engole em seco outra vez. — Ele pode vir atrás de você.

— Ele não vai vir atrás de mim — garanto a ela. — Está tudo bem, ok? O máximo e o que provavelmente ele fará, é me denunciar. E se eu for preciso, tudo bem, vou assumir o que fiz.

— Não! Você já tem dezoito anos, pode ficar anos na cadeia. — Seus olhos se arregalam. — Você não vai poder entrar na Juilliard com uma ficha criminal! 

Com certeza essa não é a atitude mais correta quando sua namorada está surtando, mas beijo Fallon para que ela cale a boca por um segundo. 

Ela me deixa beijá-la, o que é um alívio e eu me afasto depois de um momento.

— O que você está fazendo? — pergunta, confusa.

— Eu estou pedindo para que você fique calma. Vai ficar tudo bem. Pode acreditar em mim, por favor?

Fallon hesita, parecendo debater algo consigo mesma, mas anue por fim.

— Eu quero ouvir você dizer — peço.

Seus olhos encaram os meus por mais outro momento, até ela dizer:

— Vai ficar tudo bem. Eu acredito em você.

Eu sei que isso não vai impedí-la de se preocupar e pensar demais, mas ela fez uma promessa, então eu estou confiante de que ela vai se preocupar um pouco menos.

— Melhor eu ir — digo.

Fallon assente.

— A gente se vê amanhã na escola? — pergunta baixinho.

— Ou eu posso passar aqui e nós vamos juntos.

— Ah, ok.

Beijo seus lábios e sua testa, antes de me afastar, lhe dando as costas e indo em direção ao meu carro.

Eu quero dar espaço a ela, para... processar tudo. Não deve ser todo dia que alguém ouve que seu namorado espancou outra pessoa. Mesmo que essa pessoa tenha merecido e que ainda não ganhou o suficiente. Acho que nem a cadeia seria merecido o bastante para aquele bastardo.

— Atlas.

Paro, virando-me para Fallon, apenas para ser surpreendido por ela se jogando em meus braços.

— Eu te amo — sussurra quando eu a abraço de volta, inspirando seu cheiro. — Acho que eu te devo um obrigada.

— Você não me deve nada. Eu te amo. Eu faria qualquer coisa por você.

Isso só faz com que ela me abrace mais forte.

Nós ficamos assim por um tempo e a cada minuto que passa, fico mais feliz por nada ter mudado entre a gente.

Eu vou embora logo depois, após ter certeza que ela entrou dentro de casa. Então eu vou para a minha.

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FALLON


— A enfermeira disse que a senhora não tomou seus remédios hoje — digo como cumprimento ao me encostar no batente da porta do quarto da vovó.

Vim visitá-la achando que sentaríamos perto da janela e comeríamos biscoitos com chá, mas assim que cheguei, a enfermeira me informou que vovó está fazendo greve de remédio. Aparentemente ela já fez isso antes, mas papai quem resolveu a "situação". Ela já estava indo ligar para ele, quando eu pedi um tempo para lidar com isso.

— Eu não quero aquelas porcarias — a mais velha resmunga, não tirando os olhos do que está tricotando.

Aquelas porcarias a mantém sã e saudáveis. — Saio da porta, adentrando o quarto. É simples, com uma cama, uma cômoda, uma mesinha e uma poltrona, na qual ela está sentada.

— Eu estou muito bem, não preciso disso.

Reprimo um suspiro, sentando-me em sua cama.

— Vovó — chamo, um pedido para que ela olhe para mim. Quando ela faz, sorrio de modo gentil. — A senhora poderia, por favor, tomar os remédios? Apenas para que eu não me sinta culpada se você morrer depois que eu for embora?

Vovó semicerra os olhos, sabendo que estou tentando fazer graça para convencê-la, mas suspira, revirando os olhos.

— Tanto faz. Me dê logo essas porcarias. — Ela estende a mão, fazendo um gesto apressado para que eu lhe entrege os remédios que coloquei no bolso da minha jaqueta. Não sei como ela sabia que eu os tinha, mas entrego, ficando de pé em seguida para colocar um pouco de água num copo, da jarra que tem em cima da mesinha.

— Obrigada — digo após ela tomar os medicamentos. Vovó não parece ter ouvido.

Ficamos em silêncio quando ela volta a  tricotar. Eu pego uma lã azul e suas agulhas reservas, começando a tricotar também enquanto minha mente vaga para o dia de ontem. Para Atlas.

Ele bateu em Morris. Eu não sei exatamente o que pensar sobre isso. Devo me sentir grata? É errado me senti grata? Eu queria ser o tipo de pessoa altruísta que diria que o que Morris merece é ficar anos na cadeia e que espancá-lo não resolve nada. Mas eu não sou e depois que parei de surtar com a probabilidade de Atlas ser preso, senti satisfação.

É algo estranho, ficar satisfeita com o fato do seu namorado ter espancado um homem. Mas não era um homem qualquer, foi o monstro que tirou de mim aquilo que na época eu nem sabia que podia ser roubado.  Então não, eu não consigo me sentir culpada por ficar satisfeita e feliz pelo que foi feito a ele. Ele não é um homem bom e não parece ter mudado nada, pelo o que Atlas me contou, o que Morris disse sobre mim.

O pensamento dele me reconhecendo no mercado e se... deleitando e fazendo comparações me deixa enjoada e ainda mais grata que Atlas e Drew tenham dado uma lição em Morris.

Eu sei que Atlas disse que não tenho culpa de ele ter feito isso, mas ainda me sinto culpada, pois ele se sentiu na obrigação de fazer alguma coisa porque é meu namorado. Eu tentei não pensar no fato de que se não estivéssemos em um relacionamento, ele e Drew não teriam se metido nisso, mas é difícil.

— Com o que você está tão incomodada? — Ouço vovó perguntar e levanto a cabeça, parando de tricotar.

— Como assim?

Vovó me olha como se eu fosse idiota.

— Apesar do seu pai ter me enfiado aqui quando você tinha dezesseis anos, eu a conheço bem o suficiente para entendê-la. Então vou perguntar de novo: o que está te incomodando?

Me remexo na cama, desconfortável e volto a tricotar.

— Não é nada com o que a senhora deva se preocupar. — Mas como sei que ela não vai de contentar só com isso, acrescento: — Meu namorado fez algo por mim e eu ainda estou pensando sobre isso.

— O garoto de olhos azuis — contesta.

— Sua memória está boa, o que significa que os remédios estão fazendo efeito. — Sorrio, fazendo vovó resmungar.

— Engraçadinha. Você não vai me dizer o que foi que ele fez?

— Não.

Vovó suspira, fazendo cara feia para mim. Aposto que ela estava louca por uma fofoca.

— Eu disse que o amo — conto a ela ao invés disso, lembrando que da última vez que estive aqui, eu estava em conflito comigo mesma e com um bloqueio enorme para dizer as palavras que Atlas merecia ouvir.

— Teve fogos de artifício? Porque já estava na hora.

Dou risada.

— Na verdade, teve, sim. — Diante dos olhos semicerrados de vovó, esclareço: — Foi no ano novo.

— Parece ter sido emocionante e como não tenho nada para fazer, pode ir me contando essa história.

Sorrio, animada e começo a contar tudo a vovó enquanto nós duas tricotamos.


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Como sempre acontece depois que visito vovó, me sinto mais leve. Não sei explicar, mas passar algumas horas com ela sempre melhora meu humor ou me dá algum tipo de paz.

Portia e eu ainda não conversamos sobre tirar vovó do asilo, mas acho que já está na hora de falarmos sobre isso. Sei que o que decidirmos irá depender de para onde irei depois da escola e o próximo emprego de Portia, mas sei que ela irá concordar comigo que precisamos tirá-la daqui.

O lugar não é ruim, mas eu sei que vovó se sentiria muito melhor se morasse com sua família.

Saindo do asilo, não é o carro de Portia que eu encontro parado depois dos portões.

— Ei — digo assim que entro no veículo.

— E aí — Osmar cumprimenta de volta. Portia me mandou mensagem perguntando se tudo bem se ele viesse me buscar. — Tudo bem?

— Sim e você? — Não tivemos um tempo sozinhos desde que minha irmã disse que eles tinham voltado. Ele fica lá em casa algumas vezes, mas Portia está sempre presente.

— Iden.

Balanço vagamente a cabeça, a paisagem me chamando atenção quando o carro fica em silêncio.

Repasso o que tenho que fazer hoje a noite, e a maioria é dever de casa. Comecei a me dedicar mais ao francês também, e com a ajuda de Atlas, já consigo entender algumas frases. Minha pronúncia é horrível, mas tem sido legal aprender uma língua nova.

— Então... — Osmar diz de repente, fazendo-me parar de recitar mentalmente o alfabeto francês. — Tudo bem mesmo, sabe, eu namorar a sua irmã de novo? Depois de tudo...?

Olho para Osmar, para seu cabelo comprido até os ombros e suas tatuagens. Ele ainda tem a barba e usa roupas pretas, mas claramente largar as drogas fez bem para ele. Está mais saudável e com a lucidez em seus olhos castanhos que não estava lá quando eu apareci na sua casa aquele dia.

— Eu não culpo você — vou logo ao ponto, praticamente repetindo o que eu disse a Portia. — O que aconteceu aquele dia foi minha culpa e me responsabilizo por isso. Então sim, tudo bem você namorar a minha irmã.

Osmar parece voltar a respirar novamente, relaxando no banco do motorista.

— Mas se você a machucar de novo, eu vou fazer você se arrepender — digo. Apesar de séria, as palavras saem tranquilamente.

— Eu não vou.

Anuo, satisfeita e esperando que ele cumpra suas palavras. Portia merece ser feliz e se ela escolheu Osmar, nunca vou questioná-la, mas se ele a fizer sofrer, eu não vou deixar passar.

— Está tudo bem entre você e o seu namorado? — Osmar pergunta após um momento.

Viro minha cabeça para ele de novo, franzindo as sobrancelhas.

— Sim, por quê?

O namorado da minha irmã dá de ombros, batucando o polegar no volante.

— Você voltou sozinha para dentro de casa ontem e parecia um pouco abatida. Portia ficou preocupada, mas não quis perguntar, então eu estou perguntando.

— Ela te mandou perguntar? — eu não ficaria surpresa com isso, mas também não chateada, pois sei que ela está tentando me dar espaço, mas que ainda se preocupa.

— Não. — Fico calada e ele pergunta: — Vou precisar dar um susto nele?

— O quê? — Arregalo os olhos.

— Ele certamente fez algo. Eu preciso fazê-lo se arrepender? — Osmar diz isso tão tranquilamente que por um momento penso que ele está brincando. Mas quando olha de relance para mim, sei que não está.

— Não! Meu Deus, claro que não. Deixe-o em paz, ok? — Acho que estou um pouco horrorizada, ao mesmo tempo que acho fofo ele tentar me "proteger" de alguma forma.

— Ok. Mas se precisar... — Ele não termina a frase, mas deixa claro o que quer dizer.

Eu reviro os, voltando a olhar pela janela e me concentrar no alfabeto francês.

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Encontramos minha irmã no mercado, que disse precisar comprar algumas coisas. Eu prefiro evitar o mercado por um tempo e eu vejo a reação de Portia que ela tenta esconder ao notar o por quê não quero entrar lá.

— Vou pedir para Atlas vir me pegar — garanto a ela, pois também não quero ficar mofando dentro do carro.

— Eu posso levá-la e voltar para buscar você depois — Osmar diz a Portia quando estou saindo do carro para que Osmar possa trancar.

— Eu disse que não precisa, mas obrigada — digo aos dois, me encostando no veículo e pegando meu celular no bolso da minha jaqueta.

— Ok — Portia diz. Não estou olhando diretamente para ela, focada no meu celular, mas posso jurar que ela hesita antes de dizer: — Por que você não aproveita e chama o Atlas para jantar conosco?

Isso rapidamente faz eu esquecer meu celular e encarar minha irmã.

— Você acabou de surgir que eu chamasse o Atlas para jantar com a gente? Tipo, literalmente? — Ergo as sobrancelhas. Provavelmente estou exagerando, mas UAU.

Portia revira os olhos, dando de ombros.

— Sim. Eu amo você e ele também, não podemos continuar com isso. Eu vou ser a mais madura dessa situação e dar o primeiro passo.

Arqueio a sobrancelha para ela.

— Se for para continuar com esse comportamento, um jantar não vai resolver nada.

Portia dispensa minas palavras com um gesto com a mão.

— Eu vou ser uma nova mulher quando nos encontrarmos no restaurante.

Osmar e eu nos encaramos, ele dando de ombros e eu suspirando.

— Ok — digo.

— Tá, a gente se vê daqui a pouco.

Eu observo os dois irem enquanto ponho o telefone no ouvido, já tendo discado para Atlas.

Ele não demora de atender.

— Tá ocupado?

Pra você? Nunca.

Reviro os olhos apesar de sorrir.

— Jantar, hoje, com Portia e Osmar. E eu, obviamente.

Por quê?

A resposta certa é "claro, amor, eu adoraria".

Claro, amor, eu adoraria.

— Bom. Agora vem me buscar no mercado, por favor?

Chego em dez.

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Eu tomei banho assim que cheguei em casa e depois vesti um vestido preto que vai até o meio das coxas, de gola alta e mangas compridas. Pus minha bota preta de cano alto e fiz uma maquiagem leve — delineado, rímel e gloss. Deixei meu cabelo como estava: solto.

Pronta, eu hesito. Eu tinha planejado algo para Atlas e apesar de ainda termos meia hora para irmos para o restaurante, não me sinto muito confiante agora.

Atlas está sentado na minha cama, fazendo carinho em Deimos, vestindo calças e uma camisa social branca dobrada até os cotovelos.

Ele levanta o rosto, provavelmente me sentindo olhando.

— Eu acho que preto nunca caiu tão bem em alguém quanto em você — diz, sorrindo. — Está linda.

Mordisco meu lábio, sentindo minhas bochechas ficarem quentes.

— Obrigada.

Apesar de não ser o tipo que mudaria seu jeito de se vestir para agradar alguém, fico feliz que Atlas nunca tenha tentado mudar isso em mim. Antes, eu usava preto porque é o que pessoas sombrias usam, mas acabei me apegando a cor e por mais que esteja começando a usar outras coisas agora — como aquele vestido vermelho ou algumas peças coloridas que há no meu guarda-roupa e que às vezes eu ponho junto com uma outra peça preta —  o preto sempre será presente.

— Eu tenho algo para você — digo antes que perca a coragem.

Atlas ergue as sobrancelhas loiras.

— O que é?

Sento-me na cama de frente para ele e pego o violão que deixei em cima da escrivaninha hoje de manhã.

Minhas mão estão tremendo levemente, mas respiro fundo, tentando me manter no controle.

— Eu nunca toquei para ninguém antes, então... — digo, mas não completo, esperando que ele entenda o que quero dizer. Às vezes que Portia me viu tocando foi apenas porque ela chegou de fininho e ficou lá ouvindo sem que eu a visse — então o fato de eu estar nervosa é normal.

Não encaro os olhos de Atlas, mas sua camisa, vendo quando ele anue.

Pigarreio, posicionando o violão de forma correta, me curvando um pouco.

Inspirando fundo outra vez, coloco o nervosismo de lado e deixo meus dedos cantarem a melodia.




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Ooooooi, môres! Tudo bem?

Tá aí o capítulo, a tão aguardada surra no Morris. Confesso a vocês que ainda não foi o suficiente, mas eu não quis fazer do Atlas um assassino (KKKKKKK)

Enfim, espero que tenham gostado!

Beijos de luz pra vcs e até mais.

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2bjs, môres♥

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