⁸|ʳᵒˣᵒ
1.
"Também chamado de violeta, obviamente por comparação com as pétalas dessa linda flor. O nome dela em Latim era viola, daí a palavra atual. E roxo é do Latim russeus, “vermelho-escuro”.
2.
A cor roxa (ou púrpura) está ligada ao mundo místico e significa espiritualidade, magia e mistério. O roxo transmite a sensação de tristeza e introspecção. Estimula o contacto com o lado espiritual, proporcionando a purificação do corpo e da mente, e a libertação de medos e outras inquietações."
⚠️ ALERTA DE GATILHO ⚠️
Abuso sexual
FALLON
Braços me rodeiam. Percebi isso antes mesmo de perceber que, de fato, há dois braços ao redor de mim. Só notei isso pois não costumo acordar no quente. Minha cama é geralmente fria e eu sempre durmo encolhida. E com certeza não costumo acordar com uma respiração aquecendo meu rosto.
Os braços de Atlas são firmes ao meu redor como se ele temesse que eu fuja. Bom, levando em consideração que fugi dele duas vezes, além de eu tê-lo evitado por três dias...
Contemplo seu rosto bonito, percebendo que nunca tinha parado para admirá-lo, apesar de ter visto ele me olhando várias vezes. Não como os garotos costumam me olhar, com luxúria e malícia. Não, o olhar de Atlas é... puro. Belo. Ele é completamente belo.
Estou com meus lábios nos seus um segundo depois de ter esse pensamento. Duvido que ele esteja dormindo quando sua língua encontra a minha e ele geme, murmurando algo que não consigo compreender.
Viramos uma mistura de línguas e dentes, braços e pernas, até ambos estarmos ofegantes.
— Bom dia. — sussurro contra seus lábios, um pouco surpresa por estar sorrindo pela manhã.
— Bom dia — o sorriso sonolento de Atlas me faz sorrir ainda mais. — Você dormiu bem?
— Uhum. — muito bem na verdade, apesar da noite de merda. Não lembro muito do que aconteceu, além da festa e Atlas me levando embora.
— Que bom — Atlas põe uma mecha do meu cabelo atrás da orelha e seu polegar acaricia minha bochecha. — Você... Você está bem?
Franzo as sobrancelhas diante da sua hesitação. Para ele perguntar isso...
— Nós transamos? — sou tomada pela surpresa. Não acredito que pude ter esquecido....
— Não. Não, precisa se preocupar com isso.
— Ok. Mas... Você sabe que eu gostaria que isso acontecesse, né? Eu só quero estar sóbria quando acontecer.
— Tudo bem. — Atlas ri, mas seu sorriso se dissipa um pouco, lembrando-me que algo aconteceu.
— O que foi?
— Promete que não vai fugir?
Porque eu fugi dele duas vezes. Mas faço que sim. Atlas não encara meus olhos quando conta.
— Você estava no banheiro... chorando e falando algumas coisas — meu coração para de bater por alguns segundos quando ele prossegue: — Você falou sobre o que aconteceu quando tinha treze anos.
Viro para o teto e fecho os olhos, soltando um suspiro entrecortado. Eu devia estar tão bêbada que...
— Fallon, olhe para mim.
Balanço a cabeça, negando. Não quero o seu olhar de pena ou de quem não acredita em mim. Suportei isso uma vez quando tive coragem para contar e em troca, apanhei por minha mãe achar que eu estava mentindo, que tinha inventado uma história para não confessar que havia perdido a virgindade com algum garoto do colégio.
— Fallon...
Então estou naquele verão de 2016 de novo.
Era verão e eu estava animada porque Portia e eu íamos passar uma semana em Miami, como despedida já que ela voltaria para universidade.
Estava em meu quarto, fazendo alguns dos meus rabiscos quando mamãe gritou do andar de baixo:
— Fallon, venha cá. Agora.
Tentei não ficar com medo. Ainda havia hematomas em meu corpo depois de um dia em que papai chegou em casa bêbado e... Não acabou muito bem para mim. Tentei ao máximo não chorar e mostrar que era forte, mas o quanto mais eu resistia em não derramar uma lágrima, mais ele me batia.
Arrumei meu vestido, um que mamãe comprou há várias semanas, mas que mandou que eu usasse hoje. Não obtive resposta ao perguntar o por quê.
Meu cabelo longo estava preso em uma trança que serpenteava por minhas costas enquanto eu descia as escadas até a sala, onde mamãe e papai estavam, além de um homem que nunca tinha visto na vida. Ele tinha uma barba escura da mesma cor que o cabelo. Não parecia ser mais velho que papai, era alto e tinha uma postura rígida.
— Essa aqui é a Fallon, nossa caçula. — papai me apresentou ao homem. Ergui a mão para apertar a sua.
— É um prazer, Fallon. Eu sou o Alfred Morris. — a mão dele era áspera e cheia de calos, bem diferentes das de papai.
— O prazer é meu, senhor Morris. — sorri, como mamãe me ensinou a fazer.
— Você é muito bonita. — o senhor Morris disse e me perguntei se meus pais notaram o olhar estranho que ele me deu. Mas mamãe sempre dizia que eu via coisa onde não tinha.
— Ela é, não é? — papai balançou meus ombros, parecendo orgulhoso de mim pela primeira vez.
Depois das apresentações, papai explicou que o senhor Morris ia ficar conosco durante o verão. Ele não me disse o por que e também não perguntei. Para mamãe, certos assuntos não deviam ser discutidos com crianças, mesmo que eu já tivesse treze anos.
Naquele noite, fui dormir mais cedo. Fazia isso todos os dias, esperando que passassem rápido e Portia e eu pudéssemos fazer nossa viagem. Estava um pouco triste porque ia sentir muita falta da minha irmã, mesmo eu sabendo que ela só tinha voltado para as férias, mas faria daquela semana inesquecível, assim sempre que sentisse saudade dela, me lembraria disso.
Faltavam apenas dois dias para nossa viagem, eu estava ansiosa. Muito. Já havia levado uma bronca da mamãe por estar tão eufórica e não parar quieta. Pela primeira vez, agradeci pelo senhor Morris estar lá, pois assim mamãe não me bateria. Eu não gostava muito do senhor Morris. Não sabia dizer o por que, mas vi ele me olhando daquele jeito de novo mais vezes. Daquele jeito que os homens olham para as mulheres, mas não tinha por que ele me olhar assim se eu tinha apenas treze anos, uma criança, como dizia mamãe.
Falei para mim mesma que era coisa da minha cabeça, então deixei para lá.
Naquela tarde, papai tinha saído para uma emergência no hospital. Alguém havia sofrido um acidente. Rezei para quem quer que fosse, que ficasse bem. Mamãe também não estava em casa, era dia de chá com as amigas e minha irmã estava trabalhando, então era apenas o senhor Morris e eu.
Como eu disse, não gostava muito dele e não queria ficar sozinha com ele também, então dei uma desculpa qualquer e subi para o meu quarto. Queria refazer a minha mala e provar meu biquíni novo de novo.
E foi o que fiz. Naquela cidade, era raro, até mesmo no verão, termos um pouco de sol que dava para passar uma tarde no lago, então era bem raro que eu usasse biquíni. Para meu alívio, as marcas da última surra haviam sumido com o passar dos dias, então eu estava sorrindo, contente com isso enquanto me olhava no espelho, vestindo meu biquíni novo...
Quando eu ouvi o ranger das tábuas. Bem na porta do banheiro tinha duas tábuas com esse problema e papai nunca consertou. Foi isso que me avisou que eu não estava sozinha no meu quarto. Foi o que me fez olhar para cima e ver o senhor Morris me encarando através do espelho, por uma brecha na porta.
Gritei, assustada por ele estar ali e estar me olhando. Homens mais velhos não devem olhar crianças como ele estava me olhando. Conhecia aquele olhar, já vi homens da idade dele olharem assim para minha irmã. Ela odiava e mandava todos irem para o inferno. Era o que eu queria fazer, mandar o senhor Morris para o inferno e que saísse do meu quarto. Mas além do grito, nada mais saiu e meus lábios pareciam selados.
— Não precisa ter medo, Fal, não vou machucá-la — odiava aquele apelido e aquele sorriso dele. — Por que não vem cá para fora? Você deveria se vestir.
Mas ele estava certo. Eu precisava me cobrir para que ele parasse de olhar. Queria arrancar os olhos dele.
O senhor Morris saiu do caminho da porta e não o vi mais. Devia ter ido embora. Isso me tranquilizou quando saí do banheiro.
Olhei em volta apenas para ter certeza e...
Uma mão forte estava tapando minha boca, silenciando meu grito e um braço forte estava me rodeando, me segurando enquanto eu esperneava.
— Fique quietinha, Fal. Não quero machucar você. Se ficar quieta, eu vou soltá-la. — seu hálito era podre quando disse isso em meu ouvido.
Eu sabia que não podia acreditar nele, já tinha me enganado um vez, mas talvez fosse só uma brincadeira... Então eu cedi, não tendo muita escolha.
— Eu sabia que você era uma garota obediente.
O senhor Morris me levou até a minha cama e me fez deitar. Por um breve momento achei que ele fosse me colocar para dormir, mas não tinha por que ele fazer isso quando montou em mim.
— Você não vai gritar ou contar nada para ninguém quando acabar, entendeu? Se abrir a boca, vou matar a sua irmã.
Pela primeira vez em toda a minha, eu senti medo. Um medo real, aterrorizante e que fez meu coração bater tão forte que minhas costelas doíam.
Eu já tinha sentido a dor. Quando mamãe me batia por eu não ser uma boa garota, quando papai me batia também por eu apenas respirar errado em um dia ruim para ele... Então eu recebi aquela dor também. Era diferente das outras, parecia dilacerar algo dentro de mim, como se tivesse me rasgando de dentro para fora. E era tanta dor... Tanta dor que comecei a chorar em algum momento. Eu chorei porque não sabia o que levou o senhor Morris a fazer aquilo comigo. Chorei porque sabia que algo estava sendo tirado de mim naquele momento. Chorei porque sabia que eu não seria mais uma garotinha...
Eu chorei enquanto olhava a parede, para os rabiscos nas folhas coladas ali. As folhas brancas com rabiscos pretos e soube que minha vida seria como aquelas folhas: preto e branco. Sabia que nada nunca mais teria cor para mim. Então chorei por isso também
Quando o senhor Morris acabou o que estava fazendo comigo, me fez levantar e tomar banho. Ele me deu banho. Penteou meu cabelo e me contou a história que eu deveria contar a minha mãe: eu me sujei com sorvete e precisei me lavar. Ele até trocou os lençóis da minha cama por outros idênticos para que não desconfiassem.
E não desconfiaram. Ninguém notou que eu estava estranha; papai continuava rindo do que o senhor Morris falava e mamãe sorria para ele, educada como sempre. Queria gritar o que ele fez comigo, contar que ele não era um bom homem e que havia me machucado, mas então eu ouvi a risada da minha irmã, vi aquele sorriso em seus lábios e lembrei da ameaça do senhor Morris. Ele também pareceu se lembrar quando fez um movimento discreto, para que eu ficasse em silêncio.
Naquela mesma noite eu não suportei dormir na minha cama, então dormi debaixo dela, encolhida. Eu devia viajar com minha irmã na manhã seguinte, mas ao invés disso, levantei do chão e cortei meu biquíni. Era tudo culpa do maldito biquíni, era o que eu dizia entre as lágrimas enquanto fazia picadinho do tecido.
Depois, fiz o mesmo com meu cabelo. Tinha que ter sido meu cabelo idiota também. Mamãe dizia que cabelo comprido chamava atenção e deve ter sido por isso que o senhor Morris fez aquilo comigo.
Portia chegou quando eu já tinha cortado até acima dos ombros. Ela tentou me impedir e eu estava tão cega de raiva, raiva de mim mesma por ter um cabelo grande e um biquíni novo, que cortei minha irmã sem querer.
Eu não me desculpei. Não contei a ela o que tinha sido feito comigo, que não era só meu corpo que doída, mas minha alma também.
Não viajei com Portia para Miami quando ela saiu de casa com a mão enfaixada.
~•~
Eu quero dizer o quanto odeio esse capítulo. Como senti nojo de escrever e revisar ele. Não tenho palavras pra dizer o quanto me dói o que aconteceu com a Fallon, principalmente o fato de ser algo que realmente acontece na vida real.
Eu sinto muito se isso causou gatilho em alguém, mas não foi a minha intenção. O objetivo do capítulo era mostrar de onde vem a dor da Fallon, a raiva por si mesma. Ela não é apenas uma adolescente rebelde que gosta de usar preto e ir a festas. Ele é uma vítima, como muitas garotas são.
Próximo capítulo dia 24 (sexta-feira)
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